Anais do IX Seminário de Iniciação Científica SóLetras – CLCA – UENP/CJ - ISSN 18089216
AS VIAGENS DE SIMBÁ O MARUJO: CONTO FANTÁSTICO QUE FAZ PARTE DA
OBRA AS MIL E UMA NOITES
Tânia Dolores Pires Cardoso
Débora Noemia da Silva Nascimento
(G – CLCA – UENP/JAC)
Mônica Aguiar Moreira Garbelini
(Orientadora – CLCA-UENP-CJ)
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo apresentar um estudo do conto fantástico As Viagens de Simba,
o marujo, que é uma das histórias apresentada na obra As Mil e Uma Noites, que
transcenderam a barreira do tempo e do espaço, fazendo parte do patrimônio coletivo da
humanidade. A narrativa apresenta as sete viagens de Simba por lugares exóticos e muitas
vezes inexplorados do antigo oriente, repletos de aventuras e perigos, com a presença do
maravilhoso e do fantástico. Outro fator importante da obra é a enorme influência na literatura
e na técnica do conto, no desenvolvimento e aplicação da imaginação, no campo estético,
assim como na forma de conhecer e interpretar o espírito oriental
Introdução
Originalmente Alf Lailah Oua Lailah – As mil e uma noites é um clássico
da literatura árabe, considerada também como uma das obras mais sedutoras e repletas de
magia, sendo a maior obra literária já produzida pela Humanidade. Ela é uma obra coletiva e
anônima, cujos contos têm origem diversa, e os temas originários da Índia, chegaram aos
árabes através dos persas. O núcleo da obra foi constituído pelos Mil contos traduzidos do
persa antes do século X, os outros foram acrescidos em Bagdá no século X, e mais outros
foram incorporados no Cairo, por volta do século XII e no século XIII ou XIV foram ainda
inseridos contos didáticos, estruturando-se As mil e uma noites na forma como passou a ser
conhecida. No conto central da obra As mil e uma noites, a história de Sherazade era de
origem indiana e o elo entre as histórias contadas por ela era a sua situação, em relação à pena
de morte estabelecida pelo Sultão a todas as suas mulheres, no amanhecer seguinte à noite de
núpcias. Sabiamente, Sherazade pediu ao Sultão, autorização para contar uma história para a
sua irmã, mais nova, antes do amanhecer. Ele consentiu e ficou fascinado pelas histórias, que
diariamente antes do sol nascer, Sherazade contava para sua irmã e também para ele, que por
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sua vez, curioso por saber o desenrolar das narrativas, não mandava matar a moça ao
amanhecer. Assim, se passaram mil e uma noites, até que o Sultão, apaixonado por Sherazade,
suspendeu a ordem de matar suas esposas. Para prender a atenção e a curiosidade do Sultão,
preservando assim a sua própria vida, Sherazade intercalava uma narrativa na outra, criando
uma aventura dentro da outra, retomando histórias e personagens de outras aventuras, criando
assim, uma rede hipertextual em que a sua própria história estava envolvida, pois foi dentro
dela que todas as outras foram criadas. Nessas tramas a realidade de Sherazade, em si uma
situação a princípio angustiante e delicada, contrastava com as aventuras fictícias que
envolviam suspense e eram muitas vezes surreais. E as características principais dessas
histórias eram os elementos fantásticos, maravilhosos e sobrenaturais, com intervenções de
gênios, fadas, feiticeiras, gigantes, espíritos e amplos elementos mágicos e fantasmagóricos,
contendo também narrações de amor, de sedução, de aventuras e de crueldade.
Antoine Galland (1704-1717) foi o primeiro tradutor europeu a traduzir As
mil e uma noites para o francês, tornando-se um sucesso no mundo mulçumano e também em
outras culturas, sendo ele um escritor orientalista francês, especialista em manuscritos antigos
e línguas orientais. A primeira dessas narrativas foi a do marinheiro Simbá, publicada em
1701, a partir de um manuscrito avulso.
Simbá foi uma criação da narradora Sherazade, que ao contar a história para
o rei Schariar, o califa de Bagdá, não usou só o código linguístico, mas também os
movimentos corporais miméticos, as encenações e o fonético para seduzir o rei. Isso tudo, faz
o receptor participar ativamente da transmissão da mensagem, por meio de comentários e
perguntas. Esses artifícios, ainda são usados, pois é uma estratégia para envolver o leitor na
trama da história. Assim, como Sherazade era uma moça astuta e inteligente ela criou Simbá a
sua imagem, um personagem corajoso e sábio, capaz de lutar por seus ideais, ele era um
homem surreal.
A obra As mil e uma noites teve grande influência na literatura universal e
também na forma de interpretar o mundo e o espírito orientais, além de ser a coleção de
contos mais conhecida no mundo, depois da bíblia, foi à obra mais traduzida em todo o
mundo. Dentre as histórias d´As mil e uma noites, a narrativa de Simbá ainda é a mais
popular, pois já foi adaptada para diversas mídias, como: música, teatro, cinema, desenhos
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animados e quadrinhos. Porém, essas adaptações se diferenciam bastante dos originais, pois a
origem desse ciclo de histórias é do antigo Oriente Médio, Simbá é o protagonista e herói
dessas histórias, é um marinheiro fictício originário de Bagdá e suas sete viagens ocorrem nos
mares, a leste da África e ao sul da Ásia.
Gênero em foco: Conto
O conto Simbá, o marujo é definido como um conto popular ou
maravilhoso, que é uma “forma mais universal de transmissão da cultura de um povo, ainda
na face da oralidade, esse tipo de conto retrata os usos, costumes, fórmulas jurídicas, folclore
etc”. (D’ONÓFRIO, 1995: 110).
Nos contos, as narrativas acontecem do jeito que o homem imagina, com
final feliz e o triunfo do bem sobre o mal e vão além da realidade, sendo um desafio à mente
humana, visto que a vida em geral é trágica. Por isso, o conto popular é um desafio a própria
morte e isso pode ser visto no conto do Simbá, um homem que após superar vários
obstáculos, inclusive a morte, foi feliz para sempre e que se não morreu na história contada
pela Sherazade, supõe-se que ainda vive no desejo dos leitores ou ouvintes.
Outro aspecto a ser destacado é a classificação de conto na concepção do
especialista brasileiro “Luís da Câmara Cascudo, autor do famoso Dicionário do Folclore
brasileiro, apresenta os contos de encantamento – histórias de fadas, da carochinha e de
magia, onde predomina o elemento sobrenatural”. (D’ONÓFRIO, 1995: 110). E ainda,
existem outras classificações, mas a que está dentro do contexto da obra As Mil e Uma
Noites é exatamente essa, a do sobrenatural e da magia. Além disso, tem as características do
conto popular que são: a antiguidade, o anonimato, a oralidade e a persistência. No conto
Simbá o marujo, os espaços onde ocorrem as aventuras não são identificados, porém existem
no texto elementos que levam o leitor a identificar os países e as cidades. Assim, a fórmula
“Era uma vez....”, assinala a entrada no mundo da ficção e da magia, levando o leitor a um
tempo indefinido e eterno, que pode ser passado, futuro ou o presente, visto que o passado se
renova constantemente, tornando se modelo.
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A relevância do narrador para a verossimilhança do conto
O narrador teve a preocupação em descrever os lugares por onde o
protagonista visitou, as montanhas repletas de diamantes, os castelos, os costumes de alguns
povos, porém não se tem exatidão dos locais, nos quais ocorreram os fatos. Esse detalhe ficou
para a imaginação do leitor, sendo também de responsabilidade do narrador a verossimilhança
do conto. No entanto, quando a história é contada, o narrador dá algumas pistas que leva o
leitor a interpretar o local, a região e, às vezes, o país em que a história aconteceu.
(CARNEIRO, 2004: 116-117).
O espaço do imaginário
Concorda-se com Carneiro (2004), em relação a sua análise de contos
orientais, que no âmbito dos acontecimentos relatados em cada uma das viagens de Simbá, o
marujo a seleção do tipo de narrador, a organização do espaço e do tempo aludem a uma
hábil maneira de se construir uma narrativa insólita, cujos componentes espaciais estão
firmados, ora em dados próximos dos reais, ora em fatos inusitados, mantendo-se, com
maestria, a ambiguidade textual. Diante disso, o leitor é instigado a enxergar através da
imaginação, por meio de um trabalho discursivo que pormenoriza os componentes descritivos.
Quanto à tessitura espacial, há descrição de universos duplos antagônicos: o
real e o sobrenatural; o externo e o interno; o visível e o imaginário. Como se comprova “[...]
Desta vez, nosso itinerário não foi traçado pelo capitão do navio, mas pelo dedo impiedoso do
destino que parou um dia numa ilha distante e desconhecida, que não aparecia em nenhum
mapa.” (GERVÁSIO, 1973: 89). Essa é a descrição do espaço feita pelo narrador na terceira
viagem de Simbá, Portanto, ele experimenta todas as oscilações existenciais e consegue
estabilidade, graças a sua astúcia e, sobretudo, graças ao acaso, ou ainda, a ajuda do
sobrenatural. (CARNEIRO, 2004).
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A magia em Simbá, o marujo
A magia não está submetida ao real, mas à criação permanente de atos
extraordinários e sobrenaturais. Em uma de suas viagens, Simbá, o marujo, traz ao
conhecimento do leitor, por meio de um trabalho discursivo o qual descreve minuciosamente,
uma de suas visões fantástica, um pássaro roca se alimentava de filhotes de elefantes e
serpentes, (GERVÁSIO, 1973), mostrando a presença do fantástico e do maravilhoso, pois no
decorrer do conto, ele é carregado por esta ave, contudo ele consegue se equilibrar e descobre
o vale dos diamantes.
Conto no ensino: uma proposta metodológica
As mil e uma noites é uma obra que pode ser aplicada no ensinoaprendizagem da criança no intuito de fazê-la adquirir o gosto pela leitura. Isto porque,
estimula a curiosidade e o interesse do aluno em ler e saber mais sobre o personagem que é
visto como um homem corajoso e ousado. Além disso, esses contos apresentam uma
linguagem simples e clara fazendo com que a criança entenda a história. Isso é um fator muito
importante no processo de aprendizagem da criança.
Em Simbá, o marujo, o protagonista, homônimo ao título, viveu aventuras
fantásticas e enfrentou perigos horríveis: cavalos recobertos de escamas de prata, homens
canibais, montanhas repletas de diamantes, monstro marinho, enfim, coisas difíceis de
descrever.
Iremos, aqui, narrar uma das viagens de Simbá, o marujo. Entre as sete
viagens, escolhemos a terceira, que nos pareceu mais fascinante.
Mais uma vez ansioso por novas aventuras, Simbá parte de Balsorá para
outra expedição. E o dedo impiedoso do destino através de uma tempestade o levou
juntamente com toda a tripulação a uma ilha habitada por homenzinhos inusitados. Esses
tinham aparências desagradáveis, não mediam mais que três pés de altura; eram cobertos de
pelos, como macacos e tinham braços longos e fortes, que enrolavam em volta do busto. Eles
pulavam das árvores soltando gritos selvagens. Após roubarem o barco de Simbá, deixam-no
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com sua tripulação em uma ilha deserta. Depois disso, os tripulantes foram conduzidos pelo
capitão do navio, um homem muito corajoso, a saíram dali, por meio de uma jangada. Assim,
todos chegaram a um castelo habitado por um gigante muito mal, descrito como alguém com
uma boca enorme à semelhança de uma caverna, com dentes pontiagudos e longos como as
presas de javali e, também, um único olho vermelho que brilhava como brasa no centro da
testa. O gigante com suas mãos enormes e peludas, unhas pretas e retorcidas agarrou os mais
gordos e os mais apetitosos do grupo. A primeira presa foi o capitão, morto com um tapa do
gigante. Esse, em seguida, o assou, comeu e depois dormiu. Enquanto o gigante dormia,
Simbá e os seus companheiros traçaram um plano para escapar dali. Primeiro construíram
uma jangada e depois fizeram uma imensa armadilha. Então, Simbá começou a gritar e a
lançar pedras, atiçando a fúria do gigante que se levantou e foi em direção do marujo, que
fugiu, fazendo com que o outro caísse na armadilha para ele preparada. Assim, Simbá e os
homens correram para a praia e escaparam na jangada. Quando eles estavam em alto mar,
foram resgatados por um barco que ali passava. Durante a viagem de volta, eles viram coisas
bem estranhas, peixes que se pareciam com bezerros e outros com jumentos, e até viram o
nascimento de uma concha, um pássaro com barbatanas iguais as de tubarão, coisas tão
espantosas que encontraram, as quais seriam difíceis descrevê-las.
Considerações finais
Conclui-se pela análise apresentada, que se pode inferir a moral de “quem
tem coragem e ousadia vence todos os obstáculos”. Além disso, esses contos adaptados
possuem uma linguagem simples, sendo um instrumento muito bom para o ensinoaprendizagem do aluno. Também estimula o educando a tomar gosto pela leitura e a ter senso
crítico, refletindo sobre o mundo. Por isso, é indicado para alunos do ensino fundamental,
entre o 6º, 7º e 8º anos.
Referências
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Paulo: Max Limonad, 1983. p. 71-78. (A Obra Futura).
CARNEIRO, Neryney Meire. Tese: O Caleidoscópio de José J. Veiga: intersecções
estruturais em narrativas insólitas. 160 p. Unesp /Assis 2004.
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D’ONÓRIO, Salvatore. Teoria do texto 1: pralegômenos e teoria da narrativa. São Paulo:
Ática, 1995.
GERVÁSIO, Sabá. Adaptação de As Mil e Uma Noites, editor: Victor Civita, 1°edição. São
Paulo 1973.
GIRON, L. A. Imaginação restaurada no romance o Calígrafo de Voltaire. Revista Época,
São Paulo. ed. Globo, ed. 273, 11/08/2003. p. 100-101.
MADDAD, J. A. Introdução ao conto árabe. oriente e ocidente. Revista do livro. Rio de
Janeiro. MEC, 1959, ano IV.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Antoine_Galland (acessado dia 24/09/12).
http://pt.wikipedia.org/wiki/As_Mil_e_uma_Noites (acessado dia 24/09/12).
http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo=1354 (acessado dia 9/10/12).
http://artigos.netsaber.com.br/resumo_artigo_427/artigo_sobre_literatura_arabe (acessado dia
16/10/2012).
Para citar este artigo:
CARDOSO, Tânia Dolores Pires; NASCIMENTO, Débora Noemia da Silva. As viagens de
Simbá o marujo: conto fantástico que faz parte da obra As mil e uma noites. In: IX
SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA SÓLETRAS - Estudos Linguísticos e
Literários. 2012. Anais... UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná – Centro de
Letras, Comunicação e Artes. Jacarezinho, 2012. ISSN – 18089216. p. 310-316.
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