A REPRESENTAÇÃO DA PERSONAGEM FEMININA NA OBRA DE MACHADO DE ASSIS: DOM CASMURRO. MELO, Kelly1; TAVARES2, Carla R. da S. RESUMO Este artigo é resultado de um Trabalho de Conclusão de Curso realizado no 9º semestre do Curso de Letras da Universidade de Cruz Alta – UNICRUZ. A presente pesquisa teve como objetivo fazer uma análise sobre a representação da personagem feminina na obra Dom Casmurro (1899), de Machado de Assis, em meio aos demais elementos que compõem o romance. O estudo objetivou, ainda, destacar, nessa grandiosa obra, a ambiguidade, característica explorada com maestria pelo autor, a fim de levar o leitor a se questionar, se Capitu traiu ou não seu marido Bentinho, ou se realmente tudo não passou de um forte ciúme que o perturbou até os últimos dias. Com o intuito de compreender melhor o espaço da mulher no contexto social do século XIX, também foi feito um breve comentário sobre o papel da personagem feminina e suas dificuldades na época em que a mulher servia apenas para procriar e criar os filhos. Por outro lado, procurou-se mostrar, também, a sua ascensão, a partir da Revolução Francesa, na sociedade contemporânea, discussão que se estabelece com o intuito de fornecer maior suporte para o trabalho desenvolvido. PALAVRAS-CHAVE: Mulher. Gênero. Literatura. Ciúme. INTRODUÇÃO Dom Casmurro traz um episódio aparentemente do cotidiano, a suspeita de Bentinho de que sua esposa Capitu o traiu com Escobar, seu melhor amigo, suposição que o faz entrar em um círculo de ciúmes, deixando-o obcecado pela idéia de sua amada ter mantido relações 1 Professora de Educação Básica. [email protected] A presente pesquisa está vinculada ao GEPELC – Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Linguagens e Comunicação da UNICRUZ. 2 Professora da Universidade de Cruz Alta – UNICRUZ. Doutora em Letras – Estudos Literários pela UFRGS. Orientadora do TCC. Coordenadora do GEPELC. [email protected] sexuais com outro homem e gerado um filho do amante e não do seu sangue. O surpreendente nessa obra é a forma como Machado de Assis conta a história. Bentinho, o marido é quem ocupa a posição de narrador. Ele relata os acontecimentos, de acordo com suas lembranças, levando o leitor a acompanhar os desdobramentos exclusivamente do ponto de vista do marido, ou seja, conhece apenas um lado da história, no caso, a versão apresentada por Bentinho. DESENVOLVIMENTO Para essa pesquisa, foi necessário analisar as personagens femininas no romance Dom Casmurro. Usou-se também referências básicas, como: Bosi (2001); Fadel (2001); Coutinho (2004); Montenegro (2006), dentre outros. Metodologicamente a pesquisa apresenta-se em quatro capítulos. No primeiro capítulo, faz-se um breve resumo do Realismo como movimento estético-literário, definindo-se as transformações econômicas e sociais, nessa época. O Brasil também sofreu influências europeias nesse período. Seus ideais estiveram em alta com a ascensão da sociedade. No segundo capítulo, as abordagens são referentes à personagem feminina e sua trajetória, a partir da Revolução Francesa. No terceiro capítulo, por sua vez, é apresentado um resgate da trajetória de Machado de Assis, enquanto crítico da elite brasileira, bem como o papel da mulher na sociedade da época, a partir das obras machadianas. Já no quarto, é feita a análise da personagem feminina, no romance Dom Casmurro, ao lado dos demais elementos da narrativa. Na pesquisa realizada cita-se as origens do Realismo (período da obra em destaque) e sua importância para a história, fundamentando todo o processo desse período no Brasil, desde sua introdução no país até as mudanças concretizadas literariamente. O Trabalho de Conclusão de Curso teve também como objetivo refletir sobre a estética realista, em termos sociais, especialmente as características pertinentes à construção dos personagens do século XIX, verificando-se a oposição realista ao sentimentalismo romântico. Para alcançar os objetivos propostos, estudou-se sobre a representação da personagem feminina Capitu, na obra Dom Casmurro, de Machado de Assis, bem como o próprio retrato da mulher brasileira e suas dificuldades até a ascensão da classe, assim como a mulher na sociedade contemporânea. CONCLUSÕES DA PESQUISA Dom Casmurro inaugura o Realismo no Brasil, como um movimento estéticoliterário que se contrapõe à concepção romântica de arte e de mundo. Autor que se tornou famoso pela sua habilidade literária, Machado de Assis preocupava-se em denunciar e criticar, através de suas obras, a sociedade em que vivia, e também ressaltar a questão da ambiguidade na composição do enredo e de seus personagens, sendo que a narrativa em apreço faz menção aos assuntos característicos do período. O presente estudo oportunizou a verificação e análise da personagem literária feminina no contexto narrativo de Dom Casmurro, em meio aos demais elementos, com destaque especial à exploração da ambiguidade. As características que compõem Capitu a tornam uma personagem ambígua: de um lado está a esposa, mãe e dona de casa, de outro lado está a mulher dissimulada, sobre a qual paira a suspeita de adultério, que não demonstra emoção. Esse aspecto enigmático apresentado torna Capitu uma mulher misteriosa. Em termos teóricos, constatou-se, através das fontes consultadas, em especial Rosso (acesso web), que, com o tempo e a evolução dos conceitos sociais, tornou-se imperativo repensar a condição feminina, enxergando a mulher, não como um complemento da família, mas como importante agente de mudanças, pela função que exerce na sociedade. Vale ressaltar que até a segunda metade do século XIX, no Brasil, não havia praticamente nenhum escritor que tivesse exaltado a personagem feminina, dentro de uma visão realista. Já em 1855, com o poema “Ela”, Machado de Assis, aos dezesseis anos, dava início a uma brilhante história na literatura brasileira e, embora com toques românticos, exaltava a personagem feminina. No decorrer de sua carreira, especialmente na fase realista, observou-se que a intenção não era apenas “edificar” a mulher em suas obras, mas sim, indiretamente, destacar amores e frustrações vivenciadas. Ao longo da trama de Dom Casmurro, constata-se que o objetivo de Bentinho parece ser o de caracterizar Capitu como uma jovem, capaz de lidar facilmente com situações adversas, fazendo uso da dissimulação. Se por um lado ela se mostra, até certo ponto submissa ao esposo, não apresentando nenhuma objeção, quando é levada para a Europa, por outro lado, ela, não se indignando nem se revoltando com toda a situação, acaba reafirmando o que ele pensa a seu respeito. Na verdade, Capitu destaca-se na história como uma mulher que, a seu modo, enfrenta os problemas e ajuda seu marido e filho, mas, principalmente pelo olhar indecifrável de “ressaca”. Em vista dos argumentos apresentados, no decorrer deste estudo, é possível afirmar que, em nenhum momento, na obra, houve ou não constatação da traição de Capitu com Escobar; essa permanece como uma dúvida até hoje, pois o narrador não apresenta provas de suas desconfianças. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Considerando alguns elementos apontados acerca da ambiguidade mencionada no trabalho, conclui-se que a obra Dom Casmurro apresenta uma armadilha narrativa, pois Machado de Assis deixou bem claro, do início ao fim de sua obra, que todas as considerações seriam, a partir da visão do narrador, que também é personagem e parte interessada no desenrolar da história, baseando-se na teoria que um leitor pode ou não julgar a personagem. Assim, encerra-se este trabalho, reafirmando a ideia de que todas as desconfianças de adultério, motivo de todo o ciúme do protagonista nunca foram comprovados. REFERÊNCIAS ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. São Paulo: Klick, 1998. BOSI, Alfredo. Entrevista sobre Machado de Assis. Disponível em: http: www.mec.gov.br/ Acesso em: 18 de junho de 2008. ______. História concisa da Literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 2000. COUTINHO, Afrânio. Machado de Assis. In: A literatura no Brasil. São Paulo: Global, 2004. FADEL, Tatiana. Português: língua e literatura. São Paulo: Moderna, 2001. MONTENEGRO, Fernanda. O olhar feminino - Uma nação Capitu. Disponível em: http://epoca.globo.com/especiais/rev500anos/olhar.htm Acesso em.20 de outubro de 2008.