PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO: UM ESTUDO DO SEU PROCESSO DE
DIVULGAÇÃO
Eliane Teresinha Gheno1 - UNISINOS
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Fonte de financiamento: CAPES
Resumo: O trabalho refere-se a uma análise documental nos arquivos da Assessoria de Imprensa do
município de Esteio, concernente a forma de divulgação do Plano Municipal de Educação na
comunidade durante o ano de 2006, período em que foi elaborado o PME da cidade. Foram
examinados sete jornais correspondentes aos meses de março a dezembro de 2006, período que
compreende desde as primeiras divulgações da construção do plano até a sua aprovação pela Câmara
Municipal.
Palavras-chave: Esteio; Plano Municipal de Educação; divulgação
O presente trabalho refere-se a uma análise desenvolvida em jornais que fazem parte
do acervo de clipagem documental, arquivados pela Assessoria de Imprensa do Município de
Esteio, concernente a forma de divulgação do Plano Municipal de Educação (PME) na
comunidade local durante o ano de 2006, período em que foi elaborado o PME da cidade.
Foram examinados os arquivos correspondentes aos meses de março a dezembro, recorte
temporal que compreende desde as primeiras divulgações da construção do PME com a
organização das equipes para discutir o documento, até a sua aprovação pela Câmara
Municipal.
A investigação contou com a observação em sete jornais locais: três deles possuem
uma circulação ampla que atinge todo o Estado do RS, como o Jornal do Comércio, o Correio
do Povo e o Zero Hora. Os demais jornais - Vale dos Sinos, Destaque, Eco dos Sinos e Jornal
Oficial - abrangem a comunidade do Vale dos Sinos e municípios próximos2. Os arquivos
pesquisados eram numerosos por serem compostos pelas mais diversas reportagens que fazem
referência ao município de Esteio, não limitando-se apenas à temática educacional. Dessa
forma, o volume de fontes verificadas exigiu uma disponibilidade grande de tempo para a
pesquisa, além de um exame trabalhoso e atento dos materiais disponíveis.
A motivação para esta investigação vem ao encontro aos estudos que venho
desenvolvendo neste município da Região Metropolitana de Porto Alegre, em minha pesquisa
de mestrado na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), sob a orientação da
professora Dra. Flávia O. C. Werle., abordando a temática específica do PME. Numa tentativa
1
Licenciada em História e mestranda da Linha de Pesquisa Educação, História e Políticas no Programa de PósGraduação em Educação da UNISINOS, orientada pela professora Dra Flávia O. C. Werle.
2
O referido material encontra-se disponibilizado na sala da Assessoria de Imprensa, no prédio da prefeitura
municipal
2
de buscar maiores esclarecimentos para meu foco de pesquisa que pretende verificar a
maneira como a SME procedeu à divulgação da construção do PME nas comunidades
escolares presentes no município, objetivando com isso verificar a forma de participação dos
atores escolares nas discussões que permearam a construção deste documento, iniciei este
estudo nos jornais para verificar a incidência de noticias sobre o Plano Municipal de Ensino
na imprensa local e a forma como essas reportagens abordavam o assunto.
Em fevereiro de 2007 realizei uma entrevista com a Secretária Municipal de Educação,
Magela Formiga, cuja declaração foi de que o ano de 2007 seria de divulgação do PME à
comunidade, uma vez que o PME possui “um conjunto de metas para a educação do
município como um todo”. Naquele momento a Secretária também disse que os PPPs das
escolas e os regimentos escolares passariam por modificações em virtude do novo documento,
enfatizando que a construção do PME deu-se de forma democrática e participativa, conforme
também foi destacado no site oficial que relatavam as notícias acerca do PME3.
Conforme aborda Campos (1990) ao trabalhar sobre o conceito de accountability,
sabemos que em nossa sociedade não há uma cultura participativa nos processos de
fiscalização de políticas e nem de discussões acerca delas. Dessa maneira, apoiada na teoria
da Análise de Conteúdo, procurei verificar se o discurso oficial de construção democrática e
participativa ocorreu de fato e se houve políticas de incentivo à participação comunitária
dentro desse processo, pois, conforme Cury (2002) a gestão é democrática quando ela leva a
um novo modo de administrar a realidade, que é em si mesma democrática, “já que se traduz
pela comunicação, pelo envolvimento coletivo e pelo diálogo” (p.165).
As investigações nos jornais durante o período de construção do PME mostraram
pouco sobre o documento, havendo, por outro lado, muitas notícias referentes a outros
acontecimentos na educação municipal, como por exemplo atividades esportivas gratuitas,
campanha para localizar os analfabetos do município, projeto de alfabetização aos
funcionários municipais, Projeto Escola Aberta, Projeto Jovem Cidadão Consciente, etc. Os
destaques foram dados aos projetos que vinham sendo realizados pela administração
municipal, ficando comprovados se observarmos a forma e a freqüência com que esses
assuntos eram abordados na imprensa.
Sem pretender desmerecer a importância dessas políticas realizadas, às quais se
atribuiu tanto respaldo, parece se sobressair a preocupação com o marketing da própria
administração, numa tentativa de divulgar de forma bastante insistente os trabalhos que vêm
3
http://www.esteio.rs.gov.br. Acesso em 06/08/06
2
3
sendo realizados. Não haveria problema nisso se fosse conferida a mesma importância a outro
tema de interesse da comunidade que é a elaboração de um documento norteador para a
educação municipal por um período de 10 anos. Os números reduzidos de reportagens que
fazem referência ao PME nos sugerem outra reflexão, a de que este documento, longe de ter
sido uma prioridade, obteve pouco respaldo e divulgação, dificultando o acesso à informação
para a comunidade.
De março a agosto encontrei apenas quatro notícias referenciando o PME. A primeira
delas encontra-se no Jornal Vale dos Sinos (VS) do dia 16 de março de 20064. A reportagem
faz menção à I Conferência Municipal de Educação que visa divulgar a construção do PME,
com a presença da prefeita municipal e autoridades, bem como da representante da
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) no
Estado do Rio Grande do Sul (RS) Marisa Tim Sari. Nas palavras da presidente do CME,
“[...] a participação nas Comissões que formatarão o Plano Municipal de Educação, segundo
Edna Oliveira Ilha, é aberta a qualquer cidadão de esteio, desde que tenha algum vínculo
direto ou indireto com a educação no município. ‘Alunos, pais de alunos e professores
poderão integrar as comissões’”.
A reportagem ainda faz a seguinte colocação referente a esta conferência: “[...] além de
encaminhar diretrizes na área da educação na rede municipal, estadual e particular, a I
Conferência de Educação pretende implementar políticas educacionais a partir de um
processo de efetiva participação da sociedade”. Esta declaração parece ser contraditória com o
que condiz o artigo 2º do próprio PME quando afirma que “[...] a partir da vigência desta Lei,
as Escolas do Município deverão elaborar sua Proposta Político Pedagógica e o Regimento
Escolar observando as Metas e Ações do Plano Municipal de Educação, na área de sua
competência”. A lei dá a entender que o PME abrange apenas a rede municipal de ensino e
não as demais (estadual e privada).
A segunda notícia encontra-se no Jornal Vale dos Sinos de 20 de março de 20065. Logo
no início da formação das oito Comissões Temáticas, a notícia relatava a dificuldade em
formar essas comissões por falta de integrantes. Fazia um chamado aos interessados em
participar do mapeamento da realidade da educação no município, solicitando entrar em
contato com o Conselho Municipal de Educação (CME).
As outras duas notícias encontradas datam de 04 e 05 de julho, e encontram-se,
respectivamente, nos seguintes jornais: Vale dos Sinos e Jornal do Comércio. Ambos faziam
4
5
Sem número de página.
Sem página
3
4
referência à plenária aberta à comunidade a realizar-se com discussão da temática da
educação infantil.
De setembro a dezembro, período da reta final de elaboração do documento, encontrei
apenas quatro notícias, sendo apenas notas informativas sobre a realização das plenárias que
já haviam ocorrido, conforme é possível verificar nos jornais Destaque de 26 de outubro Vale
dos Sinos de 28 de outubro de 2006.
É importante destacar que o caráter seleto de divulgação se justifica por uma
divulgação maior das plenárias de discussão do PME via Internet, o que restringe o acesso
para a maior parte da população que ainda está privada deste meio de informação.
A democracia se constrói com diálogo e participação, e não pela adesão pura e simples
das decisões (BUCCI, 2004), que muitas vezes são tomadas por um pequeno grupo de
burocratas que elaboram as leis de dentro de um gabinete, sem conhecer a realidade a quem a
lei se destina. Portanto, discutir acerca do processo de divulgação do Plano Municipal de
Educação de Esteio, significa importar-se com a forma de construção de uma política pública,
pois entendo que quando uma instância federada elabora um documento da importância do
plano de educação, com vigência para dez anos, todas as discussões que permeiam em torno
dele fazem parte do seu processo de divulgação, não se restringindo a sua divulgação apenas
à fase pós oficialização do documento. Todos os momentos implicados na sua formulação,
desde os primeiros contatos, as primeiras reuniões, as primeiras discussões, a busca por
materiais para servir de base referencial, o estudo do diagnóstico da realidade municipal, etc,
fazem parte deste processo. Isso implica em dizer que quando a SME realizou cada um dos
passos para a elaboração do PME, já é possível de se perceber se este processo foi
democrático ou não, pois quando levamos em conta a ausência de uma cultura participativa
em nossa sociedade, como bem apontam Campos (1990) e Boaventura (1997) devemos levar
em consideração que se uma gestão democrática pretende que suas políticas advenham de um
processo participativo, é necessário haver, por parte desses gestores, uma série de ações
provocativas, que instiguem e despertem o interesse da comunidade para participar, pois é
bastante comum na nossa sociedade as pessoas nutrirem o pensamento de que não podem
contribuir em nada nesses espaços de discussão e acharem que sua opinião não servirá para
nada. Dessa forma, isentam-se de participar e abrem mão do seu direito de cidadania.
O conceito de gestão democrática utilizado e entendido aqui parte das formulações de
Cury (2002) para quem, a palavra gestão vista a partir da origem etimológica e filosófica
apoiada na maiêutica socrática, “implica um ou mais interlocutores com os quais se dialoga
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5
pela arte de interrogar e pela paciência em buscar respostas que possam auxiliar no governo
da educação segundo a justiça” (p.165), incluindo-se também nesta descrição o diálogo, que é
entendido como uma forma superior de encontro dos indivíduos na busca da solução de
conflitos.
Ao referenciar a gestão democrática na Constituição Federal de 1988, na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Plano Nacional de Educação, Cury aponta
caminhos para que eu possa problematizar o processo de elaboração do Plano Municipal de
Educação de Esteio, questionando aspectos como a ausência de práticas cidadãs, o seu caráter
democrático, participativo e autônomo – uma vez que seguiu a risca o texto do PNE, se forem
levados em conta os princípios que regem uma gestão democrática.
Discutir processo de divulgação exige também referenciar o papel da mídia e sua
responsabilidade no que tange a questões de interesse público, como a questão do PME. Ao
falar acerca da mídia pública6 e da função social que ela possui, Bucci (2004) afirma que os
meios de comunicação social têm a tarefa de democratizar a informação, permitindo à todos
informações com transparência quanto ao exercício dos direitos de cada cidadão. Para o autor,
em uma sociedade democrática não é o mercado que organiza a mídia “mas a vontade política
das nações, com base em mecanismos e critérios consolidados pelo funcionamento da própria
democracia” (BUCCI, 2004, p. 29), pois a origem da imprensa está relacionada ao
funcionamento da democracia, tendo em vista que a informação é uma condição essencial
para que a população fiscalize o governante. Para ele, o direito a informação não foi um
presente concedido pelo mercado, foi uma conquista política “que se firmou como tal e entrou
na lista dos direitos fundamentais do cidadão” (BUCCI, 2004, p.31). Para o autor ainda, a
cidadania é uma condição abstrata do ser humano que, infelizmente tem sido encoberta pela
dimensão do consumo. Dessa forma, é importante e necessário ter uma mídia que exerça a
função de informar sobre os direitos, “uma mídia pública que abra um canal para acesso à
cultura e ao conhecimento, para compor o campo de debate que é o espaço público político na
democracia. Esta informação é uma função pública” (BUCCI, 2004, p.30).
Ao analisar o processo de elaboração e de divulgação do PME de Esteio, a partir da
concepção de gestão democrática, levando em conta critérios como a transparência de
informações e a impessoalidade, sendo estes princípios referenciados tanto na CF de 1988
quanto na LDBEN (Lei 9394/96) e no PNE (Lei 10172 de 09 de janeiro de 2001), questiono a
forma como procedeu a SME de Esteio quanto à elaboração do seu plano de ensino, pelo fato
6
Por mídia pública o autor entende as estações de rádio, televisão e agências de notícias como jornais e revistas.
5
6
de sua elaboração ter deixado à margem parte importante das comunidades escolares
presentes no município, se considerarmos as redes de ensino existentes no espaço municipal
como a Estadual e a privada, e não apenas a municipal.
Acredito que para que o PME tenha êxito, é necessário que todo o seu processo, desde
a elaboração até a sua execução sejam intermediados por uma divulgação massiva, que
instigue à participação, pois sem a participação, além de se caracterizar como uma forma
política nada democrática, consiste em algo ilegítimo, pois foi feito sem a participação
daqueles a quem a lei se destina (GHENO, 2007). Concordo com CURY (2002) quando diz
que “os cidadãos querem mais do que serem executores de políticas, querem ser ouvidos e ter
presença em arenas públicas de elaboração e nos momentos de tomada de decisão. Trata-se de
democratizar a própria democracia” (p. 172).
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1979.
BAUER, Martin W. Análise de conteúdo clássica: uma revisão (p.189-216). In Pesquisa
qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002.
(editores) Martin Bauer e George GASKELL. (Vários autores)
BOAVENTURA, Edivaldo. A educação brasileira e o direito. Belo Horizonte: Nova
Alvorada, 1997.
BUCCI, Eugênio. A mídia pública e sua função social. pp.29-33 in DINES, Alberto (org.).
Mídia, comunicação pública e participação social. Brasília: Banco do Brasil, 2004.
CAMPOS, Anna Maria. Accountability: quando poderemos traduzi-la para o português?
Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, p.30-48, fev./abr. 1990.
CURY, Carlos Roberto Jamil. Gestão democrática da educação: exigências e desafios. in
Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Porto Alegre, v.18, n.2,
jul./dez. 2002. pp.163-174
GHENO, Eliane T. Políticas públicas educacionais a partir dos planos municipais de
educação. I Simpósio Nacional de desigualdades, direitos e políticas públicas. São
Leopoldo: UNISINOS, 08 a 11 de outubro de 2007
Acervo de Clipagem da Assessoria de Imprensa – Prefeitura Municipal de Esteio
6
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