FORMULAÇÃO, DETERMINAÇÃO DA DOSE LETAL (DL50) E ENSAIO ECOTOXICOLÓGICO DO BIOINSETICIDA BTI Adriana Ramos Arcy(1) u ano do curso de Engenharia Ambiental da Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE. Ketlyn Vollmann Farmacêutica pela Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE. Mestre em Engenharia Química pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Millena da Silva Química Industrial pela Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE. Mestre em Engenharia Química pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Doutoranda em Engenharia Química pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Professora colaboradora nos Departamentos de Engenharia Ambiental, Engenharia Química, Engenharia de Produção, Farmácia e Biologia na UNIVILLE. Ozair Souza Engenheiro Químico pela Universidade de São Paulo – USP. Mestre em Biotecnologia pela Universidade de São Paulo – USP. Doutor em Biotecnologia pela Universidade de São Paulo – USP. Professor do Programa de Mestrado em Engenharia de Processos e dos departamentos de Engenharia Química, Ambiental e de Produção Mecânica da UNIVILLE. Endereço(1): Avenida Santos Dumond, 1225 – Bom Retiro – Joinville – SC – CEP: 89223-000 – Brasil – Tel: (47) 91776243 – e-mail: [email protected] FORMULAÇÃO, DETERMINAÇÃO DA DOSE LETAL (DL50) E ENSAIO ECOTOXICOLÓGICO DO BIOINSETICIDA BTI INTRODUÇÃO A excessiva população de borrachudos é o resultado do desequilíbrio ambiental por nós concretizado nos últimos anos. São sugadores de sangue e por isso podem transmitir doenças para os homens e animais. Algumas espécies servem de veiculadores da oncocercose, doença causada por um verme fininho que se desenvolve no sangue do homem e que produz grandes tumores sob a pele (PAIVA, 2002). O controle, tanto das espécies transmissoras de doenças como das populações incômodas pela densidade do seu ataque, tem sempre se constituído um grande desafio na área de saúde pública (ANDRADE; BRANCO Jr., 1991). Pestes na agricultura e em setores da saúde pública têm sido tradicionalmente controladas por pesticidas químicos (BRAR et al., 2005). Existe uma preocupação pública e científica sobre a utilização indiscriminada de substâncias químicas sintéticas para o controle de insetos. O acúmulo dessas substâ ci s o so o e e çóis d’águ pode ter diversos efeitos ocivos sobre o mbie te e ao próprio homem. Além destes danos ao meio ambiente, em razão de não serem específicos para o inseto alvo, existe ainda o problema da resistência desenvolvida pelas espécies às diferentes formulações (GOBATTO, 2006). A ausência de especificidade e os riscos para a saúde humana e para o ambiente apresentados pelos defensivos agrícolas sintéticos acentuam a necessidade de ferramentas como o controle biológico na otimização dos sistemas de agricultura sustentável (BATISTA Jr. et al., 2002). O biocontrole pode ser conseguido através de práticas que favoreçam os antagonistas nativos ou através da introdução no solo de microrganismos selecionados cultivado em substratos no solo. O seu sucesso depende das propriedades antagonísticas e dos mecanismos de ação do hiperparasita (REMUSKA; PRIA, 2007). O Bacillus thuringiensis var. israelensis (Bti) é uma bactéria entomopatogênica, Gram-positiva, formadora de esporos que, durante a esporulação, sintetiza um cristal protéico parasporal (δ-endotoxina) em adição ao endósporo que, quando ingeridos, são solubilizados no intestino de larvas susceptíveis, onde as protoxinas são liberadas, formando poros na membrana, causando a morte da larva (Figura 01). Normalmente, para o controle de mosquitos, os bioinseticidas são aplicados em corpos de água limpos e muitas vezes, em córregos e rios com fortes correntezas. A variedade de locais de aplicação exige formulações complexas dos bioinseticidas, envolvendo o uso de antioxidantes, dispersantes e floculantes, entre outros aditivos. A busca de maior potencialidade do produto no controle biológico de insetos-alvo não pode contrapor à conservação do meio ambiente. O objetivo do presente estudo foi produzir, formular e realizar testes de bioensaio (Aedes albopictus) com o produto Bti-Univille em comparação aos produtos comerciais Vactobac AS® e Teknar HP-D® e do químico ABATE 500E (Temephos). Paralelamente a estes ensaios, foram feitos testes de ecotoxicidade a organismos não-alvo de diferentes níveis tróficos: o flagelado Euglena gracilis (produtores), o microcrustáceo Daphnia similis (consumidores primários) e o peixe Danio rerio (consumidores secundários). Figura 01: Mecanismo de ação da toxina do Bti MATERIAIS E MÉTODOS Para a produção e formulação foi empregada metodologia utilizada por Silva (2007) que consistia na utilização do micro-organismo Bacillus thuringiensis var. israelensis IPS 82, sorotipo H-14, com meio de cultura composto de água de maceração de milho e farelo de soja ém dos sais essenciais ao crescimentoe esporulação. O cultivo submerso foi realizado no biorreator BIOSTAT B, da B. BRAUN com cuba de 4L, condições de agitação variando de 450 a 750min-1, aeração 0,5vvm e temperatura de 30oC. A determinação de açúcares redutores foi feita através do método do DNS e para a determinação do número de esporos foi empregada diluição seriada de amostra do meio de cultivo, seguida de plaqueamento e contagem do número de colônias após 24 e 48 horas. Posteriormente o caldo fermentado foi submetido à centrifugação para redução de volume e, então, formulado com a adição óxido de zinco (1), éster de sorbitol (2), lecitina de soja (3) e cafeína (4). 1, 2 e 3 com propriedades dispersantes e 4 como um potencializador da atividade larvicida. As quantidades dos aditivos foram adicionadas de acordo com trabalho realizado por Fischer (2010). Esta formulação acrescida de aditivos recebeu o nome de Bti-Univille. Para os bioensaios a metodologia utilizada foi a proposta por Draft (1999) onde larvas de 4º ínstar inicial do organismo Aedes albopictus foram então coletadas com auxílio de micropeneira malha 1 mm e transferidas para copos circulares de polietileno transparente e preenchidos com 100 mL de água destilada. Cada copo recebeu um total de 25 larvas. Foram testadas cinco diferentes concentrações de bioinseticida, além da testemunha, sendo realizadas três repetições para cada, em dias alternados. A leitura da atividade larvicida do bioinseticida em questão foi realizada 24 horas após a adição do produto no respectivo copo quantificando-se as larvas vivas, e determinando-se o número de imaturos mortos. A concentração letal responsável pela morte/inibição de 50% dos organismos testados (LC50) foi determinada a partir do programa estatístico Probit. As análises de mobilidade foram realizadas utilizando o sistema automático ECOTOX, que consiste de uma câmera CCD montada em um microscópio compacto fixado em posição horizontal conectados a um computador compatível IBM equipado com software. O software é baseado na análise de movimentos da alga verde unicelular Euglena gracilis. Nove movimentos e parâmetros de orientação como mobilidade, direção de nado, velocidade e forma celular são calculados durante uma medição. Os parâmetros de orientação são controlados por dois fatores: luz (fototaxia) e gravidade (gravitaxia). A concentração letal responsável pela morte/inibição de 50% dos organismos testados (LC50) foi determinada a partir do programa estatístico Probit. Para os testes de ecotoxicidade com Daphinia, a metodologia seguiu o descrito na NBR 12.713 (ABNT, 2003) e no Manual de Implementação de Testes de Toxicidade no Controle de Efluentes Líquidos (CETESB, 1990). Este teste consiste na exposição de indivíduos jovens de Daphnia similis a várias concentrações do agente tóxico por um período de 48 horas, nas condições prescritas neste procedimento. A norma ABNT: NBR 15088:2004 foi utilizada para os testes com o organismo Danio rerio. Em cada concentração testada, foram colocados 5 peixes, inclusive no recipiente controle. Foi observada a mortalidade e comportamento dos indivíduos após 24 e 48 horas. RESULTADOS E DISCUSSÃO Laranja e Bicudo (2001), demonstraram em seu estudo que a borra de café bloqueia a postura e o desenvolvimento de ovos de A. aegypti. Segundo os autores 500 µg de cafeína, da borra de café, por mililitro de água, bloqueiam o desenvolvimento da larva no segundo estágio de seu desenvolvimento e reduz o tempo de vida de mosquitos adultos. A potencialidade do uso da cafeína no combate à larvas do mosquito Aedes aegypti já foram demonstradas em vários trabalhos desenvolvidos por Itoyama (Itoyama et al, 1992; 1995; 1997; 1998; 2000). Contudo, em nenhum dos trabalhos foi avaliado o efeito ecotoxicológico do produto no meio ambiente; A formulação bioinseticida produzida demonstrou ser eficiente para o controle de larvas de A. albopictus com valores de LC50 de 3,97 mg/L. Comparando o produto Bti-Univille com os bioinseticidas comerciais Vectobac AS (LC50 = 0,019mg/L) e Teknar HP-D (LC50= 0,013mg/L) é possível observar que para atingir a mesma potencialidade em DL50 dos produtos comerciais seria necessário empregar 200 vezes mais produto em relação ao Vectobac e 300 vezes mais em relação ao Teknar. Outros autores encontraram resultados semelhantes, Majori e colaboradores (1984) obtiveram resultados de LC50 contra o organismo Anopheles gambiae na ordem de 0,011 mg/L para Vectobac e 0,066 mg/L para Teknar. Já Bisset et al (2009), encontraram um valor de LC50 de 0,0012 mg/L para Temephos contra larvas de Aedes aegypti. Na determinação da LC50 o químico Themephos mostrou-se mais eficiente (LC50 = 0,002mg/L) no combate as larvas do mosquito. Tais resultados podem ser explicados devido ao químico possuir alto grau de toxidez. Para os ensaios com E. gracilis, observa-se que, pra todos os bioinseticidas testados as concentrações foram muito superiores (1,5 g/L para Bti-Univille; 1,2 g/L para Vectobac e 0,9 g/L para Teknar) aos valores de LC50 encontrados para Aedes albopictus indicando que estes produtos não afetariam a população de algas do ecossistema ao qual o bioinseticida seria empregado. Já para o inseticida químico estes valores foram muito pequenos (abaixo de 10-4), ou seja, uma concentração menor que a LC50 é suficiente para afetar a população de E.gracilis comprometendo assim os organismos produtores do ecossistema. O bioinseticida Bti-Univille formulado demonstrou ser mais seguro ao organismo não-alvo Daphnia similis (LC50E= 130mg/L) que os produtos comerciais Vectobac AS® (LC 50E= 50 mg/L) e Teknar HP-D® (LC50E= 32 mg/L) requerendo uma maior dose para provocar a mesma letalidade. Já o químico Temephos apresenta uma LC50E abaixo de 10-5 (limite máximo de diluição testado até o momento para este produto), indicando que este produto tem um efeito altamente tóxico para D. similis. Para todas as formulações bioinseticidas testadas os valores de LC50E à D. similis foram superiores aos de LC50 estimados para o inseto-alvo. Frente ao peixe Danio rerio, nenhuma das amostras bioinseticida testadas demonstrou toxicidade em doses até 100 mg/L. Apenas o inseticida químico apresentou valores inferiores (13,5mg/L) aos definidos na ABNT: NBR 15088:2004 (100mg/L). O uso da cafeína como aditivo na formulação do bioinseticida Bti possibilitou a obtenção de um produto de maior eficiência no controle biológico de larvas do mosquito Aedes. CONCLUSÕES Os bioinseticidas comerciais testados, bem como o bioinseticida Bti-Univille apresentaram valores de LC50 inferiores aos valores de LC50E. Isto significa dizer que estes bioinseticidas são seguros para serem aplicados em um ecossistema complexo, pois a concentração requerida para eliminar a população de larvas de mosquitos é inferior à concentração requerida para afetar a população de organismos produtores e consumidores primários. O inseticida químico Temephos apesar de ter apresentado o melhor valor de LC50 comparado aos bioinseticidas, foi também o que apresentou menores valores de LC50E, isto é, a aplicação do inseticida químico além de controlar a população de larvas de mosquitos também afeta a população de organismos produtores e consumidores primários não se apresentando seguro. Embora tenha-se obtido resultados satisfatórios quanto à ação bioinseticida da amostra Bti-Univille, seu processo de formulação ainda deve ser desenvolvido, visando potencializar seu efeito larvicida e equiparar sua efetividade aos produtos comerciais disponíveis no mercado, bem como, manter níveis aceitáveis de LC50E. REFRÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12.713: Ecotoxicologia aquática - Toxicidade aguda - Método de ensaio com Daphnia spp. (Cladocera, Crustacea). Rio de Janeiro, 2003. 16 p. 2. ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15.088: Ecotoxicologia aquática - Toxicidade aguda - Método de ensaio com peixes. Rio de Janeiro, 2004. 19 p. 3. DRAFT. Determination of the Toxicity of Bacillus thuringiensis subsp. Israelensis and B. sphaericus products, p. 29 – 33. Ln: WHO/CDS/CPC/WHOPES/99.2 Guideline Specifications for bacterial larvicides for public health use, p. 33, 1999. 4. LARANJA, A. T.; BICUDO, H. E. M. C. O uso da cafeína e da borra do café no controle de Aedes aegypti. In: 47° Congresso Nacional de Genética, Águas de Lindóia, 2001. 5. SILVA, M. Alternativas para a produção de bioinseticida Bti: uso do processo semicontínuo e do processo em estado sólido. 2007. Dissertação De Mestrado. Universidade Federal De Santa Catarina - UFSC, 2007.