Arquiteta: Professora Doutora Solange Souza Araújo Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Arquitetura [email protected] / 55 71 87885809 As fontes de água em Salvador da Bahia da função à memória A ocupação da cidade do Salvador sempre teve uma relação intrínseca com a abundância de água na região. Salvador é escolhida como "cabeça" do Brasil não apenas por sua posição estratégica, mas também pela presença abundante de água. A cidade foi construída “num sítio sadio e de bons ares, com água abundante e magnífico porto”. Conforme a coroa portuguesa ordenava a Tomé de Sousa, este a fez num alto e longo promontório, cercado de água por todos os lados (PMS/FGM. Regimento do Governador e General Tomé de Souza, Salvador, 1998). (...) “na sua procura de um bom lugar para a povoação grande e forte, conseguiu encontrar “um monte que tinha para o lado de terra um ribeiro bem farto e numerosos olhos d água nas encostas, condição essa muito vantajosa, pois havia que contar com muita água para os gastos caseiros e ainda o preparo da argamassa das taipas com que se fariam as casas, a cerca e os baluartes” (PMS/FGM. Regimento do Governador e General Tomé de Souza, Salvador, 1998). Arquivo: UFBA - FAUFBA – CEAB, 1998. No início do século XVII, a cidade já havia duplicado o seu tamanho. Esta expansão acelerada e desordenada vai provocar um sério comprometimento das fontes de água. A velocidade de crescimento foi tão espantosa que no início do século XVIII Salvador já era a segunda cidade do Império Português, sendo menor apenas que Lisboa e o porto mais importante das Américas. Vilhena, em suas Cartas Soteropolitanas, dizia que na Cidade Baixa havia as fontes da Preguiça, dos Padres, do Pereira e de Água de Meninos. Esta última servia como "água de gasto", que era para abastecimento dos navios. Já na Cidade Alta, as fontes eram do Queimado, das Pedras, Fonte Nova, Gravatá, do Tororó, do Barril, do Coqueiro e de São Pedro - que segundo ele tinha a melhor água. Nesse período quase todas as casas possuíam um poço, não apenas para consumo interno, mas também para comercialização de água (UFBA Faculdade de Arquitetura - CEAB, 1998). Com o contínuo e desordenado crescimento de Salvador, os rios urbanos e fontes sofrem poluição tornando-se inutilizáveis – sendo o exemplo mais clássico dessa degradação o rio das Tripas, mais tarde aterrado. Os dejetos eram continuamente despejados em suas nascentes e leitos. Em 1785 é possível encontrar documentos nos quais a Câmara Municipal de Salvador solicita ao rei que intervenha para que as águas de rios próximas da cidade sejam canalizadas. Neste sentido, pode-se constatar que desde o final do século XVIII já se evidenciava a 1 Arquiteta: Professora Doutora Solange Souza Araújo Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Arquitetura [email protected] / 55 71 87885809 necessidade de trazer água de fora dos limites da cidade para abastecê-la por meio de encanamento (MATTOSO, 1978, p.48). As fontes – principais locais de abastecimento da população do período – sempre representaram um problema para a administração. Eram locais de muitos conflitos, pois se caracterizavam como territórios dos aguadeiros, em sua maioria escravos que vendiam água. O espaço público soteropolitano, de modo geral, era o espaço do negro, do trabalho escravo e de ganho (SILVEIRA, 2003). 1. Fonte dos Padres 10. Fonte do Tororó 2. Fonte do Pereira 11. Fonte do Barril 3. Fonte de Água de Meninos 12. Fonte do Coqueiro 4. Fonte do Queimado 13. Fonte de São Pedro 5. Fonte de Santo Antônio 14. Fonte do Unhão 6. Fonte do Baluarte 15. Poço do Maciel 7. Fonte das Pedras 16. Poço de São Miguel 8. Fonte Nova das Pedras 17. Fonte N. S. da Graça 9. Fonte do Gravatá 18. Fonte Chega Nego Fonte: CEAB - Engº. Adolfo M. Los Rios / Maria Juliana Silveira, 2003 No inicio do século XIX em Salvador, principalmente depois da Independência (1822), surgem novos padrões de higiene e estética urbana – posturas essas que geraram um tipo de negação à cidade antiga. Essa aversão era agravada, principalmente, pelas péssimas condições higiênicas e a proliferação de epidemias, tais como cólera e febre amarela que são responsáveis – na metade do século XIX - pela dizimação de uma parte significativa da população de Salvador (ARAÚJO, 2006). O nascimento da Companhia do Queimado reflete essa nova visão do viver urbano, a nova idéia de civilidade que vai fazer com que a cidade cresça e se estenda para fora dos seus limites, para que possa atender aos novos padrões urbanísticos, como sejam: tamanho de ruas e de lotes e uma outra estética arquitetônica. A Cia do Queimado vai ser criada pela Lei Provincial Nº 451 de 1852 com a finalidade de distribuir água potável à população através de chafarizes, casas de venda de água e penas d'água. A partir desse contrato inicial previa-se a construção de doze chafarizes, entre os quais cinco na Cidade Baixa - entre Água de Meninos e a Conceição da Praia - e sete na Cidade Alta - entre a Cruz do Pascoal e o Largo da Piedade. Em 1856 estava construído o reservatório, assim como o encanamento na Cidade Baixa e na Cidade Alta, e se encontravam assentados os chafarizes de Água de Meninos, da Prata no Comércio, do Terreiro de Jesus, do Largo do Teatro e da Praça da Piedade (SILVEIRA, 2003). Mesmo na República, 50 anos após a implantação do sistema de abastecimento, Salvador continuava a ter carros-pipa puxados por animais. O sistema até então implantado não era capaz de dar conta dessa cidade, que estava crescendo vertiginosamente. Passou-se assim a se perceber que não era mais possível dissociar o projeto de abastecimento do plano de esgotamento sanitário. É nesta linha que em 1893 Adolfo Morales de Los Rios e Justino França elaboram uma proposta que não chegou a ser efetivada (SILVEIRA, 2003). 2 Arquiteta: Professora Doutora Solange Souza Araújo Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Arquitetura [email protected] / 55 71 87885809 No início do século XX Salvador já demonstrava a necessidade de novos mananciais. Nesse sentido, Teodoro Sampaio elaborou a Bolandeira e uma série de serviços na represa do Prata, na Mata Escura, no Saboeiro, em Pituaçu, na Cruz do Cosme e em Duna Grande. A cidade passou a recorrer a lugares cada vez mais distantes na busca de água de melhor qualidade (SILVEIRA, 2003). O engenheiro Saturnino de Brito, em 1925, assumiu a tarefa de elaborar um novo sistema de abastecimento para a cidade e acabou por propor um extensivo plano urbanístico. A influência de muitas das diretrizes traçadas neste pode ser percebida nos presentes planos de abastecimento da cidade. Atualmente Salvador é servida por rede de água tratada pela EMBASA. Assim, Salvador que já foi conhecida como a “cidade das mil fontes” pela sua riqueza na produção de água potável, perdeu essa condição para buscar o fornecimento hídrico distante. Muitas das fontes originais da cidade já estão desaparecidas e as que ainda existem estão em total processo de abandono. A gestão das fontes soteropolitanas é de responsabilidade da Câmara Municipal do Salvador. Hoje, dentro deste mesmo escalão, esta gerência foi passada para a Fundação Gregório de Mattos – FGM, instituição vinculada a patrimônio e cultura, desde 1986. A primeira fotografia mostra a Fonte dos Padres localizada na encosta do antigo Colégio dos Jesuítas. Em 1587 Gabriel Soares já registra a sua existência, em 1628 é remodelada com o acréscimo de duas bicas. Equipamento foi tombado pelo Estado, desde 1981, e nos dias atuais encontra-se totalmente seco. A segunda fotografia mostra a Fonte de Água de Meninos 1764/1800 (construção e reforma). Abastecia a Feira de São Joaquim e aos saveiros, e na atualidade funciona parcialmente. Arquivo: Araújo, S. Fonte das Pedreiras ou Solar do Unhão - Uma das fontes mais antigas do Salvador. Em 1587 Gabriel Soares já registra a sua existência. A segunda fotografia mostra a Fonte do Santo Antônio, também citada por Domingos Rebelo, em Corografia do Império do Brasil, 1829. Reedificada em 1889. Arquivo: Araújo, S. / Jaime Nascimento. 3 Arquiteta: Professora Doutora Solange Souza Araújo Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Arquitetura [email protected] / 55 71 87885809 Fonte do Dique do Tororó - Inaugurada em 1875 e Fonte das Pedras, de 1875, atenderam a demanda de águas para a Av. Joana Angélica até o início do século XX. Arquivo: Araújo, S. / Jaime Nascimento. A primeira fotografia: Largo Dois de Julho - aguadeiros fazendo abastecimento da cidade; as seguintes: Chafariz (1861), no Terreiro de Jesus, homenageia os principais rios da Bahia: Paraguaçu, Jequitinhonha,Pardo e São Francisco; e marco comemorativo da Independência da Bahia. Arquivo: Faculdade de Arquitetura UFBA – CEAB e ARAÚJO, Solange. Bibliografia 1. ARAÚJO, SOLANGE. Tipomorfologia das Praças e Largos de Salvador. Tese de Doutorado. Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo, UFBA, 2006. 2. MATTOSO, Kátia M de Q. A Cidade do Salvador e o seu Mercado no Século XIX. Editora Hucitec Ltda., São Paulo e Secretaria Municipal de educação e Cultura, Prefeitura Municipal do Salvador, 1978. 3. (PMS/FGM. Regimento do Governador e General Tomé de Souza, Salvador, 1998). 4. RABELO, Domingos A. Corografia do Império do Brasil, in Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, nº. 55. 1929. 4 Arquiteta: Professora Doutora Solange Souza Araújo Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Arquitetura [email protected] / 55 71 87885809 5. SILVEIRA, M Juliana. O discurso do saneamento e a modernização da cidade: Salvador, 1890-1930. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo, UFBA, 2003. 6. UFBA - Faculdade de Arquitetura – CEAB. Evolução Física de Salvador. Fundação Gregório de Mattos, Pallotti. Salvador, 1998. 7. Arquivo: ARAÚJO, Solange. 8. Arquivo: NASCIMENTO, Jayme. 9. Arquivo: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA. Faculdade de Arquitetura. CEAB. 5