XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NA CIDADE DE MANAUS: RELATOS DE EXPERIÊNCIA NA ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS DIFERENCIADOS E ESPECÍFICOS JHONES RODRIGUES PEREIRA MESTRANDO EM EDUCAÇÃO FACED/ UFAM RESUMO Este trabalho tem a finalidade de descrever as experiências pedagógicas com a elaboração de materiais didáticos específicos das comunidades indígenas da cidade de Manaus: Watchimaucü (Povo Tikuna) e I’apyrehy’t (Povo Sateré-Mawé) utilizando editais de valorização da cultura indígena: Programa de apoio a arte e cultura da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas (PROARTE/ SEC, 2007) e Programa de Ciência na Escola da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (PCE/ FAPEAM, 20011). Objetivamos revitalizar os jogos e brincadeiras como forma a preservar o patrimônio material e imaterial dessas populações utilizando como estratégia oficinas e aulas participantes no centro cultural de cada comunidade. O método utilizado foi o etnográfico que contempla o emprego de uma variedade de técnicas para coletar o maior número de dados o que nos deu validez e confiabilidade nos resultados; Neste método o pesquisador permanece no campo o tempo suficiente para assegurar uma interpretação correta dos fatos observados (Wilcox 1993). Para o levantamento dos utilizamos as seguintes técnicas: observação participante, aula participante, entrevista semi-estruturada o tuxaua, presidente da comunidade, professores (as), pais e comunitários. Foram apresentados dois livros bilíngues como resultados concretos da pesquisa: “Bu’ûgü i tikunagü arü i’âwe’etchiga - O livro de brincadeiras do povo tikuna” (publicado pelo ministério do esporte) e Wo’okyry saterémawé wepokuat há - Os jogos e brincadeiras Sateré-Mawé da comunidade I’apyrehy’t em Manaus (a ser publicado). Será necessário (re) descobrir junto as comunidades indígena envolvidas as formas de aplicabilidade pedagógica em sala de aula ou em suas atividades festivas étnicas os significados culturais de cada atividade – jogos e brincadeiras, fortalecendo assim, os saberes milenares da cultura corporal dos Povos Indígenas. Palavras-chave: Escola Indígena; Escola Tikuna; Escola Sateré-mawé; Cultura corporal; Etnomateriais didáticos. INTRODUÇÃO A variedade de grupos étnicos na cidade de Manaus, cuja estimativa é de 40.000 pessoas (Alves, 2007) com histórias, saberes, culturas e línguas próprios, remete-nos a pensar na riqueza sociocultural advinda dessas culturas. Esses conhecimentos tradicionais, filosofias e ciências específicas da diversidade étnica foram construídos ao longo de milênios. Cada povo indígena desenvolveu experiências particulares quanto a suas organizações sociais, econômicas e políticas, suas formas de ver e pensar o mundo, Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002718 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 2 a humanidade, a vida, a morte, o tempo, o espaço, o lazer e suas histórias. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 217, estabelece que “é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais como direito de cada um”, especialmente quando se fala em povos indígenas (c.f, 1988). Na elaboração de projetos esportivo-educacionais, é preciso considerar tais diretrizes (C.F., 1988) para garantir o oferecimento de políticas públicas na área do esporte e lazer, o desenvolvimento de ações sócio-culturais que valorize a cultura e as tradições dos povos indígenas. No entanto, contrário ao que está posto na lei, a condição atual desses povos, apresenta as seguintes situações: Há uma diversidade de povos indígenas residentes no Município de Manaus, que vivem em áreas geográficas distintas: Zona Urbana, Zona Rural Rodoviária e Rural Ribeirinha (Rio Negro e Rio Amazonas); Essas populações têm dificuldade de sobrevivência, relativa à falta de emprego, saúde, educação, saneamento básico, transportes e lazer; sofrem discriminação tendo sua cultura e saberes tratados como folclore; os princípios, valores e saberes tradicionais precisam ser respeitados, considerando a especificidade de cada povo. Nesse sentido, os jogos e brincadeiras em suas diversas variações, são atividades que podem contribuir para a valorização cultural desses povos, pois ajudam no desenvolvimento completo do ser humano. A manifestação da cultura de movimentos se faz necessária a partir da prática esportiva e do desenvolvimento das atividades lúdicas. Pereira 2006 , identifica diversos jogos tradicionais (Atividades Físicas Étnicas), realizados por esses povos, de forma lúdica ou por sobrevivência, além de jogos não tradicionais (Atividades Físicas Interétnicas - esportes) . Será necessário (re) descobrir junto as comunidades indígena envolvidas as formas de aplicabilidade pedagógica em sala de aula ou em suas atividades festivas étnicas os significados culturais de cada atividade – jogos e brincadeiras, fortalecendo assim, os saberes milenares da cultura corporal dos Povos Indígenas. Continuando a conversa apresentaremos um breve histórico sobre as comunidades que foram pesquisadas. TICUNAS EM MANAUS Na cidade, os problemas se ampliam. Sem formação escolar, falando mal a língua portuguesa, sem qualificação profissional não conseguem emprego fixo, relegado a desenvolver atividades informais, submetendo-se a baixos salários. Sem emprego fixo, Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002719 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 3 restam-lhe a produção e venda de artesanato para o sustento da família. Outros, no entanto, tornam-se pedintes; humilhados, acabam no vício da bebida alcoólica, no consumo da droga e na prostituição. Porém, os indígenas na cidade também aprenderam a ser organizar, a constituir rede de relações interétnica que lhes permitem sobreviver aos novos contextos sociais. Organizados em Associações e Cooperativas, articulam-se politicamente, reivindicando formação escolar e profissional, saúde, apoio a projetos econômicos, moradia, esporte lazer. Em muitos casos, as comunidades indígenas/urbanas se articulam com as das aldeias tradicionais de modo a melhorar a vida econômica dos grupos. São as chamadas “redes relacionais”, onde instituições ou pessoas constituem relações de reciprocidade, apoio e ajuda mútua. É neste universo pluricultural que encontramos o agrupamento do povo Ticuna que vieram morar no bairro Cidade de Deus, Zona Leste da Cidade de Manaus / Amazonas, em uma área de 200 m² , aproximadamente, cercados por não indígenas. Conforme depoimento do Tuxaua Domingos, a primeira família Ticuna a chegar nesta localidade foi a do Reginaldo em 1994, vindo em seguida a do Bernardino Alexandre Pereira. Atualmente, são cerca de doze (12) famílias, com um total de sessenta (60) pessoas. Dentre estas, existem cerca de trinta crianças em idade escolar, dez (10) jovens freqüentam o ensino fundamental e quatro (4) fazem o ensino médio. Sobrevivem de subempregos, serviços gerais e a venda de artesanatos no centro da cidade. Suas moradias são de madeiras, com saneamento precário, sem pavimentação e rede de esgoto: “quando chove isso aqui vira um lamaçal só, muito sujeira vem lá de cima pra cá. Tem que colocar asfalto e rede de esgoto”, comenta o Tuxaua Domingos. No ano de 2003, com a colaboração do Centro de Direitos Humanos da Arquidiocese de Manaus, com ajuda do Conselho Indigenista Missionário e a Universidade do Amazonas, é constituído o CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) da Comunidade – viabilizando a possibilidade de parceria com instituições governamentais, não governamentais e indígenas. Em Fevereiro de 2004, com a ajuda do Consulado da Irlanda, do Centro dos Direitos Humanos/ CDH, foi inaugurados o Centro Cultural Wotchimãucü, com o objetivo de divulgar e afirmar a cultura do Povo Ticuna, ajudar na obtenção de recursos necessários à sobrevivência da comunidade com a venda de artesanato. Paralelamente as este período, a Universidade Federal do Amazonas, através da Pró Reitoria de Extensão, realiza um convênio de apoio ao fortalecimento e recuperação da Língua Ticuna, Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002720 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 4 contratando o Professor Aldenor como professor indígena da comunidade. Em outubro de 2005, estabelecem convênio com o Banco da Amazônia para a impressão de mil CDs (Compact Disc) de música Ticuna, criando mais uma alternativa econômica para a comunidade. Quanto à educação escolar das crianças Ticuna, destacam-se dois momentos: o ensino da língua e da cultura Ticuna na comunidade e o ensino formal na escola regular. Em um período alternado da escola formal, as crianças têm aulas de reforço dos conteúdos estudados na “escola do branco” no Centro Cultural. Conforme depoimento do Professor Indígena Aldenor: “as crianças tem aula de revisão dos assuntos que eles estudaram na escola; depois nós trabalhamos o ensino da língua Ticuna, conversamos sobre nossas histórias e mitos”. Na escola regular não são tratados assuntos relacionados à cultura Ticuna. Conforme o Prof. Aldenor: “nossas crianças precisam de escola indígenas para não deixar nossa cultura morrer. Por isso estamos pedindo ao prefeito que implante uma escola em nossa comunidade, pague um professor indígena para ensinar a língua Ticuna e um professor não indígena para ensinar os conhecimentos dos brancos”(Dep. 12/04/2005). SATERÉ – MAWÉ EM MANAUS Os Sateré-Mawé são um grupo indígena de tronco lingüístico tupi, habitantes da área cultural Tapajós/Madeira entre as divisas dos Estados do Amazonas e Pará. Representam hoje a segunda maior nação indígena no Estado do Amazonas, com cerca de 5.825 índios. A terra indígena Andirá-Marau foi identificada em 1980, onde o processo de demarcação ocorreu em 1983 e homologado em 1986, conforme Decreto nº 93.069, de 06/08/86 e registrada no Cartório de Registro de Imóveis e Departamentos de Patrimônio da União em 1987. A área total abrange uma superfície de 788.528 hectares e perímetros de 478 Km. Diversos sub-grupos são encontrados ao longo dos rios Andirá, Marau, Miriti, Urupadi, Manjuru e igarapé afluente destes rios, e também na região do baixo rio Madeira. Na história de vida do povo Sateré-Mawé os clãs assumem papéis importantes dentro do contexto sócio-cultural, histórico e político deste grupo como forma de legitimar sua identidade étnica que vem dos antepassados, bem como de suas relações de parentesco. Em função disto é comum os conflitos internos entre as famílias pela Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002721 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 5 posse da terra ou de outros bens em disputa. Os principais clãs são: Moi – Cobra, Awato – onça, Warana – guaraná, Wasa,i – Açaí, Akuri – Cutia, Gap – caba, Hywi – Gavião, sãri – Formiga, Urit,i – Inambu, Sateré – Lagarta de Fogo, Sawara – Sateré com Guaraná, Mawé – Papagaio Falante e outros. Entre os rios Tapajós e Madeira, sempre perto do Amazonas, viviam os Mawé. Ali foram encontrados pelos jesuítas do século XVIII e ali mesmo reunidos em missões, conduzidos e escravizados, conforme aceitavam ou se opunham á subjugação realizados pelos religiosos e colonos. Sedentários, com a chegada dos luso-brasileiros, foram se afastando das margens do Tapajó para as cabeceiras dos rios Mariacauã, Andirá, Araticum, Mawé-Açu, Mawé-Mirim, Abacaxis, Canumã e paranás do Ramos e Urariá. O habitat tapajônico, produtivo e abundante, fornecia-lhes a caça, a pesca e os produtos agrícolas. Mas os deslocamentos dos civilizados ao longo do rio, atrás de ouro de escravos índios, fizeram-nos abandonar seus aldeamentos e roças e migrar para os aldeamentos dos brancos. Atualmente, como a maioria dos povos indígenas no Brasil, o Povo Sateré Mawé estão organizados em diversas instituições, visando garantir a execução dos direitos conquistados na Constituição de 1988, bem como estabelecer parcerias com os órgãos públicos e entidades civis na tentativa de buscar maior autonomia econômica e política do Estado Nacional. As principais organizações são: Conselho Geral das Tribos SateréMawé (CGTSM), Organizações Indígenas dos Professores Sateré Mawé (OPISM), Organização dos Agentes de Saúde Indígena Sateré Mawé (OASISM), Associação das Mulheres Indígenas Sateré Mawé (AMISM), Agente Indígena de Saúde Oral (AISO). Em função de todo processo de colonização (escravização) industrialização (Projeto Agro-minerais, Zona Franca de Manaus), recentemente, a expansão da soja e arroz na Amazônia – os Territórios indígenas continuam sendo invadidos, seus ecossistemas e áreas de modos desequilibrados têm ampliado a dispersão e a migração de enumero povos por toda a Amazônia. Todavia, os povos indígenas contrariaram as projeções feitas em relação a sua total extinção. Pelo contrário, dentro do espaço do contato, redefinem e atualizam suas identidades ora se identificando como caboclos, ribeirinhos e outros. Em Manaus, o Povo Sateré-Mawé, está disperso em diversos núcleos populacionais no perímetro urbano e rural da cidade. Sua maior concentração está localizada na área verde do bairro Santo Dumont, mais precisamente na rua Noberto Won Gal. Conforme depoimento de Dona Tereza Ferreira da Silva do clã Gavião, o Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002722 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 6 núcleo se formou em 1981 com a chegada de quatro matriarcas oriunda da aldeia Ponta Alegre, no rio Andirá, município de Barreirinha. A referida área é composta de 111,30 m². Em 1988 a FUNAI autorizou formalmente a permanência dos indígena no local. Porém, ao longo do tempo, não indígenas foram ocupando a área destinada aos Sateré. Atualmente, três clãs ocupam esta localidade: I’APYREHY’T (pronuncia-se IAPIRARIR), INHAÃ-BÉ (NHAMBÉ), WAYKYHU (UAIKIRU). Apesar de parentes e estarem próximos um dos outros, a divergência clãnica permanece, provocando migrações para outras localidades da cidade. Conforme, Moisés Ferreira, Tuxaua da comunidade I’APYREHY’T, existem cerca de 17 famílias nesta localidade, perfazendo um total de 40 pessoas aproximadamente. OBJETIVOS GERAL Desenvolver atividades educativas e culturais que busquem a revitalização e valorização dos jogos e brincadeiras da Comunidade Wotchimaücü do bairro cidade de Deus – Povo Tikuna e na comunidade I’apyrehy’t no bairro Santos Dumont – Povo Sateré-Mawé. OBJETIVOS ESPECÍFICOS Identificar as atividades cotidianas que estejam voltadas para o lazer e o bom desenvolvimento corporal das comunidades envolvidas; Incentivar a prática corporal dos jogos e brincadeiras das etnias; Publicar livros (bilíngues: 1– Tikuna/ Português; 2 – Sateré-Mawé/ Português) com os jogos e brincadeiras catalogados. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Será fundamental, neste trabalho, observar o cotidiano da aldeia. Todas as atividades diárias estão cercadas de significados que perpassam por um olhar voltado a educação étnica. Neste sentido, o jogo e a brincadeira estão presentes em todas as fases da vida dos seres humanos, tornando especial a sua existência. De alguma forma o lúdico se faz Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002723 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 7 presente e torna-se um ingrediente indispensável no relacionamento entre as pessoas, possibilitando que a criatividade aflore. O lúdico está presente em todas as fases de desenvolvimento do ser humano, fazendo parte de sua educação. “O brincar é a ludicidade do aprender. A criança aprende brincando. O faz-de-conta, que é o momento de ênfase à imaginação é vivenciado por idéias. Dramatizar, contar, viver e elaborar histórias criando seu espaço lúdico. No brincar com outras pessoas a criança aprende a viver socialmente, respeitando regras, cumprindo normas, esperando a sua vez e interagindo de uma forma mais organizada. Por meio da brincadeira a criança envolve-se no jogo e sente a necessidade de partilhar com o outro. Ainda que em postura de adversário, a parceria é um estabelecimento de relação. Esta relação expõe as potencialidades dos participantes, afeta as emoções e põe à prova as aptidões testando limites. Brincando e jogando a criança terá oportunidade de desenvolver capacidades indispensáveis a sua futura atuação profissional, tais como atenção, afetividade, o hábito de permanecer concentrado e outras habilidades perceptuais motoras” (Rojas, 1997). Utilizar as práticas lúdicas como ferramenta para dinamizar as aulas pode ser uma estratégia para aplicabilidade pedagógica diferenciada. Em suas pesquisas com povos indígenas Kishimoto (1993), relata que o lúdico está presente em todo o momento da vida étnica podendo ser transmitido entre as gerações indígenas, essencialmente no que diz respeito aos jogos e brincadeiras étnicas: “Imitar animais são comportamentos místicos tanto de adultos como de crianças, reflexos de símbolos totêmicos antigos. Adultos e crianças, cantam, imitam animais, cultivam suas atividades e trabalham para sua subsistência. Mesmo os comportamentos descritos como jogos infantis não passam de formas de conduta de toda a tribo. As brincadeiras não pertencem ao reduto infantil. Os adultos também brincam de peteca, de jogo de fio e imitam animais. Não se pode falar em jogos típicos de criança indígena. Existem jogos dos indígenas e o significado de jogo é distinto de outras culturas nas quais a criança destaca-se do mundo adulto” (Kishimoto, 1993). Nessa mesma linha de raciocínio, Melià (1979), proporciona-nos em suas colocações a visão de mundo indígena, partindo suas observações educacionais de dentro da aldeia Guarani, vivendo o cotidiano e participando das manifestações culturais desse povo. Para que outrora a sociedade envolvente possa entender um pouco do que é específico, diferente e multicultural. E aponta o jogo/ a atividade física como um dos aspectos relevantes na educação indígena: Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002724 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 8 “Possivelmente é o jogo um dos elementos mais importantes da educação indígena. Sabe-se que a criança aprende brincando. A originalidade aqui é que o índio, já desde pequeno, brinca de trabalhar. Seu brinquedo é, conforme o sexo, o instrumento de trabalho do pai ou da mãe. O índio, que brincar de trabalhar, depois vai trabalhar brincando” (MELIÀ, 1979, p.19). E continua, afirmando que a relação entre ludicidade e o trabalho são fatores importantes para a educação étnica, a intensidade e a relação da comunidade indígena com o meio em que vive, mostra a riqueza vivenciada: “(...) o seu jogo é brinquedo, não lhe deu ilusões, que depois a vida lhe negará. Pequenos arcos e flechas nas mãos de um menino ou pequenos cestos dependurados da cabeça de uma menina, que vai com a mãe buscar mandioca na roça encanta qualquer pessoa que passe por alí” (MELIÀ, 1979, p. 19). E, é neste sentido que Freire (1996), o autor de Pedagogia da Autonomia e outras obras de referência de valor inestimável para a área de educação, vêm contribuir de forma significativa neste trabalho, pois quando se trata de liberdade no pensar, no produzir, em ser feliz, nos remete às formas de ensinar e aprender das populações indígenas que, primam por uma educação construída coletivamente. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Este trabalho tem a finalidade de descrever as experiências pedagógicas com a elaboração de materiais didáticos específicos das comunidades indígenas da cidade de Manaus: Watchimaucü (Povo Tikuna) e I’apyrehy’t (Povo Sateré-Mawé) utilizando editais de valorização da cultura indígena: Programa de apoio a arte e cultura da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas (PROARTE/ SEC, 2007) e Programa de Ciência na Escola da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (PCE/ FAPEAM, 2011). O método utilizado foi o etnográfico que contempla o emprego de uma variedade de técnicas para coletar o maior número de dados o que nos deu validez e confiabilidade nos resultados; Neste método o pesquisador permanece no campo o tempo suficiente para assegurar uma interpretação correta dos fatos observados (Wilcox 1993). Para o levantamento dos dados utilizamos as seguintes técnicas: observação participante, aula participante, entrevista semi-estruturada o tuxaua, presidente da comunidade, professores (as), pais e comunitários. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002725 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 9 O trabalho foi desenvolvido na comunidade Wotchimaücü que possui aproximadamente 18 famílias perfazendo um total de 120 pessoas (crianças, jovens e adultos). Está situada no Bairro Cidade de Deus na Cidade de Manaus/ Amazonas (Fonte: Núcleo de Educação Escolar Indígena – NEEI/ SEMED, 2005); e na comunidade I’apyrehy’t/ Sateré-Mawé no bairro Santos Dumont onde existem cerca de 17 famílias perfazendo um total de 40 pessoas aproximadamente. (Moisés Ferreira, Tuxaua da comunidade, 2011). É importante deixar registrado que o período pretendido para o desenvolvimento dos trabalhos conforme organização pessoal e preocupação com a veracidade dos dados compreendeu os finais de semana, feriados, ou conforme o cronograma de atividades. Os recursos utilizados foram os seguintes: materiais: 10 dvd´s; 20 Passagens de ônibus ida e volta para as comunidades; 06 Bolas de Futebol; 06 Bolas de Voleibol; Lápis de cor; Papel cartão; Cartolina; Papel vergê; Gravador de voz; Recursos financeiros: Edital de financiamento do Programa de arte e Cultura da Secretaria de Estado de Cultura do Amazonas PROARTE/ SEC) e do Programa Ciência na Escola da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (PCE/ FAPEAM). Recursos humanos: 01 Coordenador de projeto; 06 jovens Pesquisadores e 02 tradutores Indígenas Tikuna 03 tradutores indígenas Sateré-Mawé . RESULTADOS A pesquisa mostra os esforços constantes que as comunidades indígenas residentes na cidade Manaus enfrentam para galgar as políticas públicas de Educação em benefício do bem estar e qualidade de vida de seus habitantes. Foram meses de atividades constates na comunidade Wotchimaücü no bairro cidade de Deus na cidade de Manaus, e na comunidade I’apyrehy’t no bairro santos Dumont, observando e participando das aulas desenvolvidas pelos professores indígena Tikuna e Sateré-Mawé. Como resultado desta pesquisa, apresentamos livros bilíngue Tikuna publicado pelo ministério do esporte e livro bilíngue Sateré-Mawé (ainda a ser publicado - anexo). Nestes livros vários alunos indígenas das respectivas comunidades retrataram em forma de desenhos as brincadeiras que fazem diariamente. Alguns alunos fizeram pesquisa com os seus pais, avós e até anciãos do local a fim de descobrir as atividades recreativas que eles praticavam quando crianças. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002726 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 10 Os resultados alcançados estão colocados à disposição da comunidade indígena para que este tipo de atividade possa acontecer periodicamente na comunidade, ajudando assim, no processo ensino – aprendizagem da Educação Escolar Indígena. Será necessário colocar à mostra o patrimônio material e imaterial obtido com o desenvolvimento do trabalho, haja vista, que a sociedade necessita conhecer e participar do processo de valorização da cultura corporal (patrimônio material e imaterial) dos Povos Indígenas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho objetiva a revitalização dos jogos e brincadeiras tradicionais dos Povos Tikuna e Sateré Mawé residentes na cidade de Manaus como forma de contribuir para a preservação dos saberes milenares. No primeiro momento, o coordenador do projeto e equipe de trabalho (alunos e apoio técnico) reuniram-se nas comunidades para planejar atividades propostas em cronograma de trabalho. Após a socialização pedagógica do cronograma, a equipe fez o levantamento bibliográfico para elaboração das técnicas e dos métodos para a coleta de dados do trabalho. O processo de pesquisa independente oportuniza ao agente investigativo atuar de forma objetiva e reflexiva, haja vista, a total liberdade em escolher metodologias específicas para estudar os Povos Indígenas. Um dos fatores mais importante para a aceitação desta pesquisa foi a possibilidade e a facilidade em desenvolvermos materiais didáticos feitos na própria comunidade, ou seja, utilizando a realidade local como objeto de estudo. Pela primeira vez as comunidades têm livros bilíngues de jogos e brincadeiras podendo estudar em sua língua, em seus costumes e em suas próprias formas de educação e de lazer e recreação. Foram constatados ainda que existem poucas políticas públicas de educação voltadas ao preenchimento do tempo livre das crianças e dos moradores daqueles locais. Esta constatação pode fragilizar o bom convívio dos Povos Tikuna e SateréMawé dentro do espaço urbano da cidade de Manaus, podendo os males urbanísticos (drogas, prostituição, marginalização, entre outros) alcançarem – nas camuflados em Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002727 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 11 “outras formas de lazer”, prejudicando a continuidade das atividades nas aulas dos seus centros culturais. Em destaque, cito ainda que o preconceito é o maior dos problemas sociais para as comunidades indígenas urbanas. Vive-se em um Estado (Amazonas) onde a maioria da população é indígena falante de mais de 60 dialetos diferentes, possuindo sua própria cultura e processos próprios de aprendizagem (C.F. 1988), e mesmo assim, ela é tratada como atrasada, preguiçosa, entre outros. Com este trabalho poderemos (re) descobrir e (re) construir junto às comunidades indígenas Tikuna e Sateré-Mawé os significados culturais dos jogos e brincadeiras, mostrando a sociedade envolvente novas formas de aplicabilidade pedagógica nas aulas dos centros culturais indígenas (podendo ser utilizadas nas aulas ditas regulares do ensino básico), fortalecendo assim, os saberes milenares próprios das suas culturas corporais, além de contribuir para a criação de políticas públicas de diversos seguimentos (educacional, saúde, cultural e outros) para a valorização do Patrimônio Material e Imaterial das nações indígenas brasileiras. REFERÊNCIAS ALVES, Edmar César. São Gabriel da Cachoeira – Sua saga, sua história. Goiânia, Kelps, 2007. BRASIL./MEC. Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas. Brasília: MEC/SEF, 2005. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia - Saberes Necessários à Prática Educativa. Coleção Saberes. 36ª Edição. São Paulo. Ed.: Paz e Terra.1996. KISHIMOTO, Tizuko Mochida. Jogos Infantis. Petrópolis. Rj: Vozes, 1993. MELIÀ, Bartomeu. Educação Indígena e Alfabetização. São Paulo. Ed.: Loyola. 1979. PEREIRA, Jhones Rodrigues. Educação Física Escolar Indígena: O Programa Segundo Tempo e sua Importância na Revitalização dos Jogos Tradicionais das Crianças do Povo Baré na Escola Municipal de Terra Preta – Rio Negro – Manaus/ Amazonas (Especialização).Universidade de Brasília, 2006. ROJAS, Juciara. Artigo: O lúdico na construção interdisciplinar da aprendizagem: uma pedagogia do afeto e da criatividade na escola. UFMS: Mato Grosso do Sul, 2001. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002728 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 12 WILCOX, J. Etnografia como uma metodologia y su aplicacion al estúdio de la escuela, Madrid: Trota, 1993. ANEXO 1 – CAPA DO LIVRO TIKUNA ANEXO 2 – CAPA DO LIVRO SATERÉ-MAWÉ Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.002729