COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS
XXV SEMINÁRIO NACIONAL DE GRANDES BARRAGENS
SALVADOR, 12 A 15 DE OUTUBRO DE 2003
T92-A32
EXECUÇÃO DO VERTEDOURO COMPLEMENTAR DA UHE MARECHAL
MASCARENHAS DE MORAES
Erton Carvalho
Flavio Paulo Tosta Filhote
Letícia Costa Manna Leite
José Reginaldo de Castro Domingos
Julio César Ribeiro D’Armada
Artur Freire Júnior
FURNAS CENTRAIS ELÉTRICAS S.A.
Eleuberto Antonio Martorelli
Leonardo Lago de Souza
Fernando Chein Muniz
Sérgio Eduardo Scarpim
CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT S.A.
José Manuel Iañez
INTERTECHNE CONSULTORES ASSOCIADOS LTDA.
RESUMO
Em função das alterações das características do projeto original, e por ter sido
construída anteriormente às usinas do atual Sistema FURNAS, a UHE
Marechal Mascarenhas de Moraes funcionava como um elemento restritivo à
melhor operacionalidade deste trecho do rio Grande, causando
estrangulamento da cascata.
Objetivando eliminar as restrições operacionais e adequar a segurança da
barragem para a ocorrência da PMF – “Probable Maximum Flood”, foi
construído um vertedouro complementar no maciço rochoso da ombreira
esquerda, com um canal de aproximação, conforme apresentado na Figura 1 a
seguir.
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ABSTRACT
Because of the change performed on the original project, and because it was
built before the other power plants of the Furnas system, the Mal. Mascarenhas
de Moraes hydroelectric power plant worked like a restrictive element to the
operation of this stretch of the Grande river, causing the strangling of the fall.
Seeking to eliminate the operational restrictions and to adapt the security of the
dam to the occurrence of the PMF – “Probable Maximum Flood”, an auxiliar
spillway was built in the left shoulder rock formation, with an approximation
channel, like shown on Figure 1.
FIGURA 1 - Vista Parcial da UHE Mal. Mascarenhas de Moraes - Margem
Esquerda.
1 – INTRODUÇÃO
A UHE Marechal Mascarenhas de Moraes, outrora denominada Peixoto, foi
construída pela CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz), tendo sido
adquirida por FURNAS em agosto de 1973 e encontra-se em operação
comercial desde 1957. Possui capacidade instalada de 476 MW, distribuída em
10 unidades geradoras acionadas por turbinas tipo Francis de eixo vertical.
Localiza-se no rio Grande, município de Ibiraci, estado de Minas Gerais, e está
situada entre dois complexos energéticos de porte: a Usina Hidrelétrica de
Furnas, a montante, com capacidade instalada de 1.216 MW e a Usina
Hidrelétrica Luiz Carlos Barreto de Carvalho, antiga Estreito, a jusante, com
capacidade instalada de 1.050 MW.
Durante a fase de construção da Usina, nos idos da década de 50, foi
constatada a existência de uma falha geológica que coincidia com o eixo da
barragem. Tal fato impôs significativas modificações no arranjo geral,
inicialmente elaborado, determinando um arqueamento para montante em seu
eixo a partir da inclusão de dois segmentos retos e um arco central.
Esta disposição final das estruturas prejudica as condições do escoamento
efluente. As vazões vertidas impõem um barramento hidráulico no leito do rio,
gerando grandes oscilações e correntes regressivas em direção à Casa de
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Força. Estes fenômenos, agravados para vazões acima de 4.400m3/s,
provocam grande elevação do nível d´água no Canal de Fuga, causando,
assim, a redução da capacidade de geração e riscos de inundação da Casa de
Força.
Além disto, o órgão extravasor desta Usina foi dimensionado a partir de
critérios hidrológicos normalmente utilizados na época de sua construção,
tendo sido definido o valor de 10.400 m3/s para a vazão de projeto desta
estrutura.
Estudos hidrológicos realizados em 1997, utilizando como critério a
metodologia da PMF – “Probable Maximum Flood”, determinaram como vazão
máxima afluente ao reservatório da UHE Furnas o valor de 18.802 m3/s,
defluindo pelo seu vertedouro a vazão máxima de 12.297 m3/s. A vazão
máxima afluente calculada para o reservatório da UHE Marechal Mascarenhas
de Moraes foi de 16.107 m3/s. Cabe ressaltar que caso não existisse o
reservatório da UHE Furnas, a vazão máxima afluente em Mascarenhas de
Moraes, correspondente à ocorrência da PMF em condições naturais, seria de
19.508 m3/s.
Nas simulações realizadas para verificar a segurança do empreendimento
constatou-se que o nível d’água no reservatório ultrapassaria em 0,63m a
elevação da crista da barragem, uma vez que o vertedouro, com capacidade
máxima de 10.400 m3/s, não seria suficiente para defluir a nova cheia de
projeto.
Para atender as novas condições hidrológicas e garantir a segurança da
barragem, foi projetado e construído o vertedouro complementar, com
capacidade máxima de defluir a vazão de 3.100 m3/s, considerando o
reservatório em seu nível d´água máximo normal (El.666,12m), totalizando,
assim, um valor de 13.500 m3/s.
Este vertedouro, situado na margem esquerda, do tipo superfície livre
associado a uma calha vertente e salto de esqui, foi posicionado de forma que
as vazões efluentes sejam lançadas bem a jusante do canal de fuga e
direcionadas para o leito principal do rio, minimizando os efeitos de oscilação
junto a casa de força.
Face à complexidade do arranjo existente, o projeto do vertedouro
complementar foi subsidiado por estudos hidráulicos em modelo reduzido,
visando definir a melhor geometria de tal estrutura, bem como as proteções
necessárias à Casa de Força e Subestação.
Em resumo, a construção do vertedouro complementar aumenta a capacidade
atual de vertimento do empreendimento, garante uma operação mais adequada
e eficiente da Usina e, em conseqüência de toda a cascata, minimizando os
riscos e proporcionando segurança em relação às passagens de cheias
excepcionais.
2 – CARACTERÍSTICAS DAS ESTRUTURAS
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O sistema extravasor complementar é constituído de um vertedouro de
superfície livre, tipo perfil Creager, com calha vertente associada a um salto de
esqui, projetado e executado para descarregar a vazão de 3.100 m³/s, com
nível máximo do reservatório, na El. 666,12 m, conforme apresentado na
Figura 2.
OGIVA
CANAL DE
APROXIMAÇÃO
SISTEMA VIÁRIO
CALHA DO VERTEDOURO
PROTEÇÃO CASA DE
FORÇA
NOVA GALERIA DECABOS
SALTO DE ESQUI
DIQUE
FIGURA 2: Vertedouro Complementar – Arranjo Geral
A estrutura do vertedouro é constituída de um único bloco, dotado de ogiva,
galerias de injeção e drenagem e três pilares, sendo dois externos e um
intermediário.
Este vertedouro situa-se na ombreira esquerda do barramento, tendo a tomada
d’água a sua direita. Durante a fase executiva das estruturas, a escavação do
canal de aproximação foi realizada de forma a manter um septo rochoso a
montante (Figura 3), desmontado posteriormente com derrocagem
subaquática, de forma a permitir todas as atividades civis e de montagem
eletromecânica.
A escavação do septo de montante, apresentada na Figura 4, foi realizada sob
rigoroso controle de vibrações e pressão hidrodinâmica e totalizou o desmonte
de 58.432 m³, sem prejudicar o fornecimento de energia gerada por
Mascarenhas, sendo:
•
Escavação mecanizada, acima do NA
6.624 m³
•
•
Escavação mecanizada, abaixo do NA
Escavação em rocha, abaixo do NA
26.960 m³
24.848 m³
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FIGURA 3: Septo de montante para construção do Vertedouro Complementar.
FIGURA 4: Trabalhos finais de remoção do Septo e limpeza do canal de
aproximação.
Na ombreira direita deste vertedouro, imediatamente a montante do canal de
aproximação, foi executada uma estrutura direcionadora de fluxo (muro-guia),
visando disciplinar o escoamento efluente, tendo em vista a esconcidade do
mesmo em relação à estrutura. Este muro-guia, apresentado na Figura 5,
possui uma configuração em curva, com 20,85 m de extensão, desenvolvida, e
7,50 m de altura máxima. A seção transversal apresenta larguras máximas de
4 m na sua elevação mais baixa e 3,5 m na crista.
Sua construção foi realizada em duas etapas, sendo que a primeira totalizou
226,50 m³ de concreto com fck de 40 MPa, subaquático, bombeado e
autoadensável, com aditivo aglutinante e antidispersante.
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FIGURA 5: Detalhe do Muro-Guia do canal de aproximação.
Para o controle das vazões vertentes foram instaladas duas comportas
segmento, cada qual com 12,00 m de largura por 18,60 m de altura, acionadas
por uma única central oleodinânica, localizada no pilar intermediário.
Para os serviços de inspeção e manutenção destas comportas foi utilizado um
conjunto de comporta ensecadeira, do tipo deslizante, manobrado por um
pórtico rolante com capacidade de 200 kN. Este conjunto é armazenado em
poço de estocagem na ombreira esquerda do vertedouro.
A sala de quadros de comando dos sistemas elétricos está localizada no pilar
esquerdo do vertedouro.
Concordando com a ogiva tem-se uma calha vertente inclinada (1V:23,4194H),
com 337,85 m de extensão e 28,5 m de largura. O desenvolvimento, em planta,
da calha apresenta uma pequena curvatura para direita em seu trecho final,
definida a partir de cálculos teóricos. Essa característica impõe um escoamento
estável, em regime supercrítico, com velocidades médias máximas inferiores a
22 m/s e um direcionamento do fluxo efluente para o leio do rio, evitando que o
mesmo incida diretamente no dique de proteção da subestação, localizada a
jusante da estrutura. O eficiente comportamento hidráulico foi comprovado em
ensaios no modelo reduzido na escala 1:100, do Laboratório de Hidráulica
Experimental (LAHE) de Furnas.
Esta calha foi construída em laje de concreto armado nervurada em vigas de
0,80 m de largura e 1,55 m de altura. Devido a uma falha geológica local esta
estrutura apóia-se, parcialmente, em 64 tubulões de 1,30 m de diâmetro, base
trapezoidal com lados de 2,00 m e profundidade variável de 0,60 m a 13,73 m,
totalizando 481,39 m.
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Essa condição impõe a Usina de Mascarenhas de Moraes o “status” de ser a
única hidrelétrica brasileira com calha vertente apoiada sobre tubulões.
FIGURA 6: Calha Vertente - Fase Construtiva.
No final da calha vertente tem-se a estrutura do salto de esqui, com extensão
de 15,15 m e bordo de lançamento na El.630,00 m e ângulo de 380. Estas
características foram definidas após alguns estudos em modelo reduzido, que
proporcionaram minimizar os efeitos de represamento do córrego do Tocaia,
localizado imediatamente a jusante, e os volumes de concreto para a sua
construção. Além disto, os afloramentos rochosos localizados no leito do rio, a
jusante do salto de esqui, foram derrocados até a El. 618,00 m, visando
melhorar as condições dos escoamentos efluentes do vertedouro e da casa de
força, totalizando um volume escavado de 18.320,00 m³.
Tendo em vista o posicionamento do vertedouro complementar, foi construída
uma nova galeria de cabos, com extensão de 570 m, para abrigar os novos
cabos de interligação entre a casa de força e a subestação, em substituição
aos antigos. Foram substituídos 250 mil metros de cabos de força e de
comando/controle. Para a realização deste serviço, foram necessárias 5.200
manobras entre desligamentos e religações, sem prejudicar o fornecimento de
energia gerada pela Usina.
A UHE Marechal Mascarenhas de Moraes foi a primeira obra civil no Brasil a
utilizar o Método GIN (grau de intensidade de injeção), de injeção de calda de
cimento para consolidar e impermeabilizar maciços rochosos. Diferentemente
do método tradicional, o GIN permite calcular eletronicamente a quantidade
exata da calda de cimento a ser introduzida nas fissuras da rocha, com
economia significativa dos recursos empregados.
Esta metodologia consiste em definir o nível de intensidade de injeção, através
do desenvolvimento da curva hiperbólica do produto da pressão final de injeção
X volume injetado, que parametrizará todo o processo de injeção e seu
controle.
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Com o objetivo de proteger a casa de força das inundações com TR=1.000
anos, foi projetado e executado um muro de concreto a jusante (Figura 7), com
altura média de 4,0m e cota de coroamento na El.634,75 m.
FIGURA 7: Construção do Muro de Proteção da Casa Força.
Esta estrutura é composta por elementos metálicos, concreto pré-moldado e
convencional, dotada de passagens estrategicamente dispostas de modo a
permitir a movimentação das comportas ensecadeiras do tubo de sucção
(comporta modulada em dois elementos) e uma passagem destinada ao
tráfego de equipamentos de grande porte para jusante, na direção do salto de
esqui. A vedação desta passagem é feita através de uma comporta metálica de
2700 kg, articulada verticalmente e operada manualmente (portão naval),
conforme pode se observar na Figura 8 a seguir.
FIGURA 8 : Passagem a Jusante – Portão Naval
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Para proteger à área da subestação de cheias com período de recorrência de
até 300 anos, foi construído ao longo da margem esquerda do rio Grande um
dique de enrocamento e núcleo impermeável, Figura 9, com coroamento na
El.635,00m e extensão de 350 metros.
FIGURA 9: Dique de Proteção da Subestação.
3 - CONCLUSÃO
A construção do vertedouro complementar, com capacidade de 3.100 m3/s,
permitiu a UHE Marechal Mascarenhas de Moraes defluir cheias excepcionais
(PMF) com segurança.
Esta
estrutura, pelo seu posicionamento, direciona a vazão defluente
diretamente para o leito principal do rio, bem a jusante do canal de fuga,
minimizando os efeitos de oscilações e correntes de retorno junto da Casa de
Força, possibilitando, assim, um escoamento mais disciplinado. Estes motivos
irão corroborar para a utilização desta estrutura complementar como o
vertedouro de serviço.
Devido ao espraiamento do fluxo defluente do vertedouro complementar,
verificado durante os ensaios em Modelo Reduzido, foi necessária a
construção de um dique, constituído de enrocamento com núcleo impermeável,
visando proteger a área da Subestação da Usina.
Foi construído, também, um muro de proteção de concreto junto ao canal de
fuga, com a finalidade de evitar riscos de inundação da Casa de Força, para
uma vazão com tempo de recorrência inferior ou igual a 1.000 anos.
Face ao exposto, pode-se concluir que a construção do vertedouro
complementar tornou-se necessária e imprescindível, uma vez que garantiu a
segurança do empreendimento em relação à passagem de cheias
excepcionais, além de proporcionar uma maior flexibilidade operacional da
cascata do rio Grande.
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EXECUÇÃO DO VERTEDOURO COMPLEMENTAR DA UHE