UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR PROGRAMA DE PÓS - GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MARINHAS TROPICAIS EDIRSANA MARIA RIBEIRO DE CARVALHO DETECÇÃO DE INTEGRONS E GENES CASSETES RELACIONADOS COM A RESISTÊNCIA A ANTIMICROBIANOS EM Vibrio spp. ISOLADOS DE HEMOLINFA DE CAMARÕES Litopenaeus vannamei (BONNE, 1931). FORTALEZA 2013 EDIRSANA MARIA RIBEIRO DE CARVALHO DETECÇÃO DE INTEGRONS E GENES CASSETES RELACIONADOS COM A RESISTÊNCIA A ANTIMICROBIANOS EM Vibrio spp. ISOLADOS DE HEMOLINFA DE CAMARÕES Litopenaeus vannamei (BONNE, 1931). Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências Marinhas Tropicais da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Ciências Marinhas Tropicais. Área de concentração: Utilização e manejo de ecossistemas marinhos e estuarinos Orientadora: Profa. Dra. Regine Helena Silva dos Fernandes Vieira Co-orientadora: Profa. Dra. Oscarina Viana de Sousa FORTALEZA 2013 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará Biblioteca Rui Simões de Menezes C322d Carvalho, Edirsana Maria Ribeiro de. Detecção de integrons e genes cassetes relacionados com a resistência a antimicrobianos em Vibrio spp. isolados de hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei (BONNE, 1931) / Edirsana Maria Ribeiro de Carvalho. – 2013. 136 f.: il. color., enc. ; 30 cm. Tese (doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Instituto de Ciências do Mar, Programa de Pós-Graduação em Ciências Marinhas Tropicais, Fortaleza, 2013. Área de Concentração: Utilização e Manejo de Ecossistemas Marinhos e Estuarinos. Orientação: Profª. Drª. Regine Helena Silva dos Fernandes Vieira. Co-Orientação: Profª. Drª Oscarina Viana de Sousa 1. Antibiograma. 2. Camarão - Cultivo. I. Título. CDD 639.68 EDIRSANA MARIA RIBEIRO DE CARVALHO DETECÇÃO DE INTEGRONS E GENES CASSETES RELACIONADOS COM A RESISTÊNCIA A ANTIMICROBIANOS EM Vibrio spp. ISOLADOS DE HEMOLINFA DE CAMARÕES Litopenaeus vannamei (BONNE, 1931). Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências Marinhas Tropicais, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do Título de Doutor em Ciências Marinhas Tropicais. Área de concentração: Utilização e manejo de ecossistemas marinhos e estuarinos Aprovada em: ___/___/______. BANCA EXAMINADORA _______________________________________ Profa. Dra. Regine Helena Silva dos Fernandes Vieira (Orientadora) Universidade Federal do Ceará (UFC) ______________________________________ Profa. Dra. Silvana Saker Sampaio Universidade Federal do Ceará (UFC) _____________________________________ Profa. Dra. Claudia Miranda Martins Universidade Federal do Ceará (UFC) ________________________________________ Prof. Dr. Pedro Carlos Cunha Martins Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) ____________________________________ Prof. Dr. Ernesto Hofer Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) A Deus. Aos meus pais, Edson e Ana, e ao meu esposo Adriano, meus maiores incentivadores, que acreditaram no meu potencial, e me apoiaram nos momentos em que mais precisei para concluir esse trabalho. Às minhas irmãs, Ana Cláudia e Andrea, pelo carinho, apoio, motivação e cumplicidade. Eu amo vocês!!! AGRADECIMENTOS A tese que agora apresento resultou de longa caminhada percorrida ao longo desses quatro anos que se passaram tão rapidamente. Ela nasce de significativas contribuições que recolhi durante minha trajetória acadêmica e profissional. Apesar de ser um trabalho individual, gostaria de agradecer a todos que contribuíram para a sua finalização. A Deus, pelas bênçãos derramadas nos momentos bons e principalmente no conforto nas horas mais difíceis da caminhada. A Santa Terezinha que sempre esteve me iluminando em todos os momentos desta caminhada. Meu maior agradecimento é dirigido aos meus pais (Edson e Ana) que de uma forma carinhosa e compreensiva me suportaram nos momentos de estresse ao longo deste trabalho e pelos ensinamentos que importantes (sempre) irei carregar pelo resto da minha vida. Paizinho e mãezinha amo vocês! Às minhas irmãs, Ana Cláudia e Andrea, e meu cunhados, Erlano e Emílio que sempre acreditaram no meu potencial. Ao meu sobrinho Paulo Guilherme, que apesar de ter 2 aninhos, seu sorriso contagiante ajudou a titia no término deste trabalho. Ao meu esposo Adriano Cecatto pela compreensão, paciência, amor, companheirismo, apoio e incentivo em todos os momentos desta caminhada. Te amo! Aos meus tios, Lúcia, Marlene e Neto, que sempre me apoiaram nos momentos em que mais precisei. Aos meus avós e tios (in memoriam), mesmo não estando fisicamente presentes sei que olharam por mim. Ao Daniel Rodrigues, pela sua dedicação, compreensão, paciência, amizade e ajuda nas coletas e na Biologia Molecular. À minha amiga Cristiane Teles, que desde a graduação me acompanhou. Sempre com sua paciência e dedicação, me ensinou a amar a Microbiologia. Esse trabalho é seu também, pois muito do que sei devo a você. Obrigada pelos conselhos, momentos de descontração e pela amizade. À minha amiga Renata Costa (Elite), uma pessoa ímpar que tenho como exemplo de profissional. Obrigada pelo carinho, compreensão e amizade. À minha amiga Gleire Rodrigues, pela dedicação na Biologia Molecular e nas coletas de campo. Obrigada por sua amizade. À Marina Torres e Karla Catter, pelo incentivo, paciência e amizade. À minha amiga Rachel Sabry, exemplo de pessoa e profissional. Sempre me incentivou e acreditou no meu potencial. Obrigada pelo carinho e amizade. Aos meus colegas de laboratório: Adalva Machado, Alberto Gomes, Beatrice Veras, Camila Magalhães, Cecília Pinho, Denise Monteiro, Giselle Silva, Jackson Peixoto, Lana Leite, Rafael Rocha, Rayza Araújo e Thalita Oliveira, por toda colaboração ao longo desta pesquisa. Aos professores do IFCE/Sobral: Anna Kelly, Cristiane Sabóia, Daniele Martinelle, Danilo Rocha, Aline Carvalho, Germário Araújo, Josenir Barreto, Kleber Ribeiro, Marcos Erick, Michael Viana, Sarah Moreira e Socorro Hortegal, que durante seis meses, compartilharam comigo os momentos finais deste trabalho. Obrigado pela compreensão e amizade. Ao alunos do IFCE/ Sobral dos cursos Técnico do Meio Ambiente e Saneamento Ambiental. Em especial a turma do Sr. Jacques, que sempre me apoiaram nos momentos finais da tese. As minhas amigas Cecília e Letícia, que mesmo distantes sempre torceram por mim. Aos amigos Diego e Francisco Alex que muito gentilmente colaboraram com aquisição dos camarões utilizados no trabalho. À Liana e Lidiane, por toda ajuda na Biologia Molecular e pela amizade. Ao Gleidson da Costa Gastão pela confecção do mapa. Obrigada pela atenção e amizade. À Profa. Kamila Vieira pela ajuda nos testes estatísticos. Obrigada pelo carinho, paciência e amizade. Ao Prof. Rodrigo Maggioni, pela ajuda na Biologia Molecular. Ao Prof. Pedro Carlos Cunha Martins, pela indicação das fazendas utilizadas no trabalho. À Cândida Vila-Nova, João Mafaldo e Rubens Feijó, por toda ajuda na Biologia Molecular. Dedico também um agradecimento à banca examinadora desta Tese (Dr. Ernesto Hofer, Dra. Silvana Saker Sampaio, Dra. Claudia Miranda Martins e Dr. Pedro Carlos Cunha Martins). Os membros compreendidos serão sempre meus eternos professores e amigos. Eu devo considerável parte de minha qualificação a essas pessoas tão especiais. Às secretárias Rosangela, Gorete Nunes e Isabella Abreu, pela paciência e compreensão. À bibliotecária Nadsa Araújo pela ajuda na formatção do trabalho, carinho e amizade. À Funcap e à Capes, pelo apoio financeiro com a manutenção da bolsa de auxílio. Ao Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR) pelo uso de suas instalações A todos que de alguma forma contribuíram para a finalização desse trabalho AGRADECIMENTOS ESPECIAIS À minha orientadora Profa. Dra. Regine Helena Silva dos Fernades Vieira, que é símbolo profissional para muitos dos seus orientandos. Nesses oito anos em que estive no laboratório sempre me mostrou compreensão, paciência e dedicação. Foram tantos os momentos, que irei guardar para sempre no meu coração. A profissional que sou hoje é fruto de todos os ensinamentos que foram passados com muito carinho. Isso eu devo à senhora. Eu só tenho que agradecer por tudo! Muito obrigada! À minha co-orientadora Profa. Dra. Oscarina Viana de Sousa (Osquinha) exemplo de profissional. A você só tenho que agradecer por ter acreditado em mim, pelo carinho, paciência, amizade, pelos conselhos sempre dados na hora certa. Obrigada por sua ajuda durante a minha tese de Doutorado. Ao Prof. Dr. Ernesto Hofer a quem dedico também essa pesquisa. Uma pessoa acessível sempre disposto a contribuir de maneira simples, amiga e competente. Obrigada por socializar e compartilhar seus ensinamentos. “O cientista não estuda a natureza porque ela é útil; ele a estuda porque se deleita nela, e se deleita nela porque é bela. Se a natureza não fosse bela, não valeria a pena ser conhecida, e se não valesse a pena ser conhecida, a vida não valeria a pena ser vivida.” Henry Poincaré RESUMO O objetivo da pesquisa foi estabelecer perfis de resistência a diferentes antimicrobianos e detectar integrons e genes cassetes em Vibrio spp. da hemolinfa de camarões. Foram realizadas duas coletas em quatro fazendas, localizadas nos municipios de Acaraú (A e B) e Aracati (C e D). Em cada coleta foram utilizados 10 exemplares, totalizando 80 camarões. Nas amostras de hemolinfa dos camarões originários de Acaraú, as contagens de Vibrio spp. variaram de <10 a 3,4 x 106 UFC/mL , em B foram de <10 a 3,5 x 10³ UFC/mL. Em Aracati, as contagens foram < 10 a 8,5 x 10³ UFC/mL (fazenda C) e de <10 a 1,6 x 10³ UFC/mL (fazenda D). As 82 estirpes isoladas das amostras originadas das fazendas A e B foram identificadas até espécie, sendo as mais frequentes: V. alginolyticus; V. coralliilyticus; V. harveyi; V. parahaemolyticus e V. mimicus. A partir das amostras das fazendas C e D, 41isolados foram identificados, sendo que as espécies de maior frequência foram: V. coralliilyticus; V. cholerae, V. mimicus; V. parahaemolyticus. Vinte e oito por cento dos isolados apresentaram resistência a pelo menos um dos antimicrobianos testados. Os fármacos para os quais os micro-organismos apresentaram resistência foram: AMP, CFL, ERI, TET e OTC. Os antimicrobianos GEN, NAL, NIT, SUT, CIP, CLO e FLF foram eficazes contra as estirpes testadas. Observou-se que 87,9% das estirpes foram resistentes intermediárias e constatou-se multirresistência em 41,6%. O índice MRA entre as resistentes, variou de 0,2 a 0,26. Os valores de CIM para os isolados foram: para AMP de 80 a 160 µg/L; para CFL de 64 a 512 µg/L; para ERI de 64 a 256 µg/L e para OTC, de 128 µg/L. Entre os isolados que não apresentaram alteração na resistência após a “cura” foram de 52%, porém, 48% passaram a ser intermediárias. As 25 estirpes de Vibrio com resistência múltipla foram selecionadas para testes de biologia molecular, sendo que 32% delas apresentaram o gene intI1. Nos plasmídios, esse percentual foi de 100%, com presença de genes cassetes blaP1 e ereA2. Conclui-se pela presença de estirpes resistentes a fármacos clínicos (AMP e CFL), que resíduos dessas drogas podem estar no ambiente. O alto percentual de intermediários pode estar relacionado a alguma mutação que os isolados estejam sofrendo para sobreviver no ambiente. A origem genética da resistência pode estar relacionada ao cromossomo ou a elementos móveis estáveis. Os integrons detectados no cromossomo e em plasmídios no genoma dos víbrios é uma variável importante para o entendimento da dinâmica de transferência de resistência no ambiente aquático. Palavras-chave: quantificação, micro-organismo, antibiograma, integrons de classe 1 ABSTRACT The objective of this study was to evaluate the resistance profile and the presence of resistance gene cassettes in vibrios isolated from shrimp hemolymph. Shrimp (n=80) were collected from four farms in Acaraú (A and B) and Aracati (C and D), Northeastern Brazil. The hemolymph was evaluated quantitatively for vibrios by spread plating. In the samples from Farms A and B, vibrio counts ranged from <10 to 3.4 x 106 CFU/mL and from <10 to 3.5 x 10³ CFU/mL, respectively. The corresponding figures for Farms C and D were <10 to 8.5 x 10³ CFU/mL and <10 to 1.6 x 10³ CFU/mL. All but one of the isolates from Acaraú (81/82) were identified down to the species: V. alginolyticus, V. coralliilyticus, V. harveyi, V. parahaemolyticus and V. mimicus. In the samples from Aracati, 41 isolates were identified, predominantly V. coralliilyticus, V. cholerae, V. mimicus and V. parahaemolyticus. Approximately 28% of the strains were resistant to at least one of the antibiotics tested. The antibiotics GEN, NAL, NIT, SUT, CIP, CLO and FLF were efficient. The drugs to which resistance was observed included AMP, CFL, ERI, TET and OTC. A considerable number of strains (87.9%) displayed intermediate levels of resistance while multiresistance was observed for 52 strains (41.6%). The MAR index of strains resistant to two or more antibiotics ranged from 0.2 to 0.26. The minimum inhibitory concentration of the isolates was 80-160 µg/L (AMP), 32-512 µg/L (CFL), 64-512 µg/L, 64-256 µg/L (ERI) and 128 µg/L (OTC). Following plasmidial curing, 52% (n=13) of the isolates displayed unchanged resistance profiles, while 48% changed to intermediate levels. In 32%, the gene intI1 was detected, while the gene was present in 100% of the plasmids, along with the cassettes blaP1 and ereA2. The finding of resistance to clinical antibiotics (AMP and CFL) suggests such drugs may have been released into the environment. The high level of intermediate resistance may be the result of survival-driven mutagenic processes. The observed resistance was of chromosomal origin or related to stable mobile elements. The presence of class 1 integrons in the chromosome and plasmids of vibrios isolated from shrimp hemolymph may pose a threat to the aquatic environment since integrons can be transferred between microorganisms. Key words: quantification; Vibrio; antibiogram; integrons; class 1 integrons. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Representação esquemática da estrutura do integron e da aquisição de genes cassetes de resistência. ..................................................................................... 37 Figura 2 – Localização das fazendas situadas no estuário do Rio Acaraú e no estuário do Rio Jaguaribe............................................................................................... 40 Figura 3 – Fluxograma de contagem, isolamento e identificação de Vibrio a partir de amostras de hemolinfa...................................................................................... 43 Figura 4 – Fluxograma do teste de antibiograma, a partir das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei........................................... 48 Figura 5 – Fluxograma do procedimento de Concentração Inibitória Mínima (CIM) a partir das estirpes de Vibrio isolados da hemolinfa de camarões..................... 50 Figura 6 – Fluxograma da técnica de “cura” plasmidial, a partir das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarão................................................................. 51 Figura 7 – Esquema da estrutura de integrons de classe 1 com os respectivos genes cassetes detectados no cromossomo de Vibrio spp. isolados da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei...................................................................... 92 Figura 8 – Esquema da estrutura de integrons de classe 1 nos plasmídios com os respectivos genes cassetes em Vibrio spp. isolados da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei...................................................................... 98 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Espécies de Vibrio identificadas dentre as 81 estirpes isoladas das amostras de hemolinfa dos camarões capturados nas fazendas A e B.............................................................................................................. Gráfico 2 – 70 Espécies de Vibrio identificadas dentre as 41 estirpes isoladas das amostras de hemolinfa dos camarões capturados nas fazendas C e D.................................................................................................................... Gráfico 3 – 70 Percentuais de susceptibilidade antimicrobiana das 124 estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei cultivado nas A e B (Acaraú) e C e D (Aracati)........................................................... 75 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Iniciadores e condições de termociclagem utilizados na investigação molecular das estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei...................................................................................... Tabela 2 – 54 Iniciador e condição de termociclagem utilizado na investigação molecular da resistência a eritromicina nas estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei......................................... Tabela 3 – 54 Composição e concentrações empregadas nas reações de investigação molecular para detectar integrons de classe 1 e gene cassete blaP1 no cromossomo das estirpes de Vibrio............................................................... Tabela 4 – 55 Composição e concentrações empregadas nas reações de investigação molecular para detectar integrons de classe 1 e genes cassetes blaP1 e ereA2 no plasmidio das estirpes de Vibrio spp............................................. Tabela 5 – Parâmetros ambientais da água do viveiro das quatro fazendas localizadas no Nordeste do Brasil.................................................................................... Tabela 6 – 56 57 Percentis dos intervalos do tempo de coagulação da hemolinfa dos espécimes de Litopenaeus vannamei coletados nas fazendas localizadas no Nordeste do Brasil.................................................................................... Tabela 7 – 61 Contagem Padrão em Placas (CPP) de Vibrio total; SAC+ e SAC-por mililitro de hemolinfa obtidas das amostras de camarão L. vannamei, cultivado nas fazendas A e B, localizadas no município de Acaraú-CE....... Tabela 8 – 63 Contagem Padrão em Placas (CPP) de Vibrio total; SAC+ e SAC- por mililitro de hemolinfa obtidas das amostras de camarão Litopenaeus vannamei, cultivado nas fazendas C e D, localizadas no município de Aracati-CE..................................................................................................... Tabela 9 – 65 Distribuição da susceptibilidade antimicrobiana das 124 estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei por classificação química dos fármacos.............................................................. Tabela 10 – 76 Perfis de multirresistência das estirpes de Vibrio isolados de hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei cultivado em quatro fazendas no Estado do Ceará............................................................................................................... 81 Tabela 11 – Concentração inibitória mínima (CIM) das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarão cultivado, Litopenaeus vannamei, para os fármacos: ampicilina, cefalotina, eritromicina e oxitetraciclina................... Tabela 12 – Resultado do teste de “cura” de plasmídio em estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei........................... Tabela 13 – 83 87 Perfil de resistência a antimicrobianos e detecção de genes de integrons de classe 1 e cassetes no cromossomo de estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarões marinhos Litopenaeus vannamei............................. Tabela 14 – 91 Perfil de resistência a antimicrobianos e detecção de genes de integrons de classe 1 e cassetes em plasmídios de estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarões marinhos Litopenaeus vannamei............................. 96 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AMP Ampicilina ATM Aztreonam CEP Cefalotina CPP Contagem padrão em palcas CLO. Cloranfenicol CIM Concentração mínima inibitória CIP Ciprofloxacina CIs Integrons cromossômicos CTX Cefotaxima CLSI Clinical and Laboratory Standard Institute ERI Eritromicina EST Estreptomocina FAO Food and Agriculture Organization FLF Florfenicol GCs Guanina-citosina GEN Gentamicina I Intermediário IR Integrons de resistência IRA Índice de resistência a antimicrobianos LB Luria-Bertani MIs Integrons móveis MRA Múltipla resistência a antimicrobianos MRIs Integrons de multirresistência NaCl Cloreto de sódio NAL Ácido nalidíxico NIT Nitrofurantoina OIE World Organisation for Animal Health ONPG o-nitrofenil β-D-galactopiranosídeo OTC Oxitetracilina PCR Reação em cadeia de polimerase R Resistente S Susceptível SAC Sacarose SUT Sulfazotrim UFC Unidade Formadoras de Colônias TCBS Ágar Tiossulfato, citrato, bile, sacarose TSA Ágar triptona soja WHO World Health Organization LISTA DE SÍMBOLOS Kb Kilo pares de bases mL Mililitro mg Miligrama mM Milimolar µM Micromolar nm Nanômetro µL Microlitro ρM Picomol pb Pares de bases t Toneladas U Unidade SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 21 2 REVISÃO DE LITERATURA............................................................................. 24 2.1 Litopenaeus vannamei (Boone, 1931) e seus sistemas de cultivo ....................... 24 2.2 Sistema imunológico do camarão x patógenos ................................................... 25 2.3 Vibrio em camarão................................................................................................. 29 2.4 Resistência antimicrobiana................................................................................... 31 2.5 Efeito da resistência antimicrobiana no ecossistema aquático.......................... 34 2.6 Integrons e a problemática da resistência........................................................... 36 3 MATERIAL E MÉTODOS.................................................................................. 40 3.1 Locais de coleta e Características das fazendas.................................................. 40 3.2 Parâmetros ambientais da água do viveiro......................................................... 41 3.3 Coleta dos camarões.............................................................................................. 41 3.4 Teste de coagulação da hemolinfa........................................................................ 41 3.5 Extração da hemolinfa........................................................................................... 41 3.6 Contagem e Isolamento de Vibrio spp.................................................................. 42 3.7 Identificação morfológica e bioquímica das espécies de Vibrio......................... 44 3.7.1 Prova de produção de citocromo-oxidase.............................................................. 44 3.7.2 Produção de indol.................................................................................................. 44 3.7.3 Hidrólise da arginina e descarboxilação de lisina e ornitina ............................. 44 3.7.4 Fermentação de carboidratos ................................................................................ 45 3.7.5 Prova do ONPG (o-nitrofenil β-D-galactopiranosídeo)........................................ 45 3.7.6 Tolerância ao cloreto de sódio................................................................................ 45 3.7.7 Prova do Voges-Proskauer .................................................................................... 46 3.7.8 Teste da liquefação da gelatina.............................................................................. 46 3.7.9 Crescimento a 4ºC, 35°C e 40°C............................................................................. 46 3.7.10 Resistência ao O/129 10µg.................................................................................... 47 3.8 Teste de susceptibilidade aos antimicrobianos.................................................... 47 3.9 Cálculo do índice de resistência (IRA) e Determinação do índice de múltipla resistência a antimicrobianos (MRA).................................................................. 49 3.10 Determinação da concentração inibitória mínima (CIM)................................. 49 3.11 Técnica de “cura” de plasmídio............................................................................ 51 3.12 Análise estatística................................................................................................... 52 3.13 Reação em cadeia de polimerase (PCR).............................................................. 52 3.13.1 Extração de DNA cromossômico das cepas de Vibrio.......................................... 52 3.13.2 Extração do DNA plasmidial das cepas de Vibrio................................................. 53 3.13.3 Genes utilizados para detecção de integrons de classe 1 e gene cassete de resistência blaP1 no DNA cromossômico e plasmidial das estirpes de Vibrio....................................................................................................................... 53 3.13.4 Detecção do gene cassete EreA2 - resistência a eritromicina............................. 54 3.13.5 Amplificação por Reação em Cadeia Polimerase (PCR) para detecção de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no cromossomo das estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei................................................................................................................. 3.13.6 55 Amplificação por Reação em Cadeia Polimerase (PCR) para detecção de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no plasmídio das estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei................................................................................................................. 56 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO……….............................................................. 57 5 CONCLUSÕES..................................................................................................... 101 REFERÊNCIAS.................................................................................................... 102 ANEXO A............................................................................................................... 131 ANEXO B............................................................................................................... 132 21 1 INTRODUÇÃO A carcinicultura brasileira atingiu nível comercial na década de 1980 (MOLES; BUNGE, 2002) e seu desenvolvimento se baseou em tecnologias importadas dos países asiáticos, que contribuíram para um pacote tecnológico próprio e adequado a realidade nacional (NATORI et al., 2011). Esta atividade econômica caracterizou-se pelos avanços nas seguintes áreas: genética, alimentação, reprodução, doenças, e no aprimoramento do sistema de manejo operacional (BOYD, 1999; ROCHA, 2010). O cultivo do Litopenaeus vannamei, no Brasil, fez com que o país tivesse uma trajetória ascendente entre 1999 e 2003. Após esse período, a produção sofreu queda até 2005 (MADRID; WURMANN-G, 2011). A crise marcada entre os anos 2003 e 2005, devido ao surgimento de enfermidades e a ação anti-dumping imposta pelos Estados Unidos, fez com que ocorressem mudanças no modelo de produção, atualmente utilizado pelos carcinicultores brasileiros (ABCC, 2005; ROCHA; ROCHA, 2007). O novo manejo empregado baseia-se na diminuição de riscos, com utilização de baixas densidades populacionais, entre 10 e 30 camarões/m², sendo então colocados no mercado com pesos que variam de 6 a 30 g (GUERRELHAS et al., 2011). Essa estratégia fez com que a produção tornasse a crescer, alcançando em 2010, oitenta mil toneladas (XIMENES; VIDAL; FEITOSA, 2011). No Brasil, o Estado do Ceará é o maior produtor de camarão. Em 2011 foram produzidos 32 mil toneladas do crustáceo, distribuídos em 5.760 hectares. No ano de 2012 ocorreu aumento da produção de 9,5%, em relação ao ano de 2011, estimada em 35 mil toneladas. As regiões sul e sudeste do Brasil são as maiores consumidoras do produto, com a maior parte do camarão distribuído entre bares, restaurantes e hotéis (FIGUEREIDOJUNIOR, 2006; VALLE, 2012). Com a expansão da carcinicultura, a atividade tem se tornado cada vez mais vulnerável às enfermidades causadas por agentes patogênicos, tais como: bactérias, protozoários, fungos e vírus, transmitidos nos próprios locais de cultivo (BOAVENTURA; CANUTO; FERREIRA, 2006). Os principais agentes etiológicos envolvidos em epizootias nos cultivos de camarão são vírus e algumas espécies bacterianas pertencentes ao gênero Vibrio (BACHÈRE, 2000). Estes últimos, apesar de fazerem parte da microbiota do ambiente marinho e estuarino, podem agir como patógenos oportunistas e/ou secundários, causando doenças em organismos cultivados (GUZMÁN; VALLE, 2000). Além disso, são responsáveis pela mortalidade de até 100% nos cultivos; sendo as principais espécies causadoras de vibriose: Vibrio harveyi, V. vulnificus, V. parahaemolyticus, V. alginolyticus, V. damsela, V. 22 penaeicida e V. fluvialis (RAMIREZ-TORÔ, 2005). Assim, a presença desse gênero bacteriano na hemolinfa de camarões pode estar relacionada com um diagnóstico sugestivo de bacteriose (GOMEZ-GIL et al., 1998). Para o controle das enfermidades nos cultivos, especialmente aquelas causadas por bactérias do gênero Vibrio, os produtores fazem uso de vários agentes antimicrobianos (MORIARTY, 1997). Porém, a permanência desses agentes no viveiro gera alterações no ecossistema, levando à deterioração das condições ambientais e principalmente a seleção de bactérias resistentes (ZANETTI et al., 2001). Além disso, a presença desses compostos no ambiente pode afetar negativamente organismos aquáticos e terrestres (KEMPER, 2008). Assim, o uso indiscriminado de drogas antimicrobianas resulta na seleção de bactérias, que podem, não somente predominar em uma população, como também transferir material genético para bactérias susceptíveis. A resistência a drogas antibacterianas pode ser codificada por plasmídios, transposons ou integrons que facilita a difusão desses genes (VAZ, 2009). Os integrons contêm coleções de genes (genes cassetes) que geralmente são classificados de acordo com a sequência da proteína (integrase) reponsável por transmitir a recombinação e função de resistência (MAZEL, 2006). A presença de integrons nos microorganismos reduz as opções terapêuticas tanto para o uso humano como para a prática veterinária devido ao aumento da prevalência de patógenos zoonóticos resistentes (HOPKINS; DAVIES; THRELFALL, 2005). Contudo, os efeitos da resistência antimicrobiana para o ecossistema aquático permanecem desconhecidos, mas a implicação da resistência generalizada para a saúde humana é preocupante (CRANE; WATTS; BOUCARD, 2006). Além disso, deve ficar claro que o antimicrobiano não induz a resistência, e sim, atua como um selecionador dos indivíduos mais resistentes no meio de uma população (TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). Considerando as informações supracitadas, o presente estudo teve como objetivo principal estabelecer os perfis de resistência (plasmidial ou cromossômica) a diferentes antimicrobianos e identificar integrons e genes cassetes em Vibrio spp., isolados de hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei. Como objetivos específicos, citam-se: (1) verificar o tempo de coagulação da hemolinfa; (2) relacionar o tempo de coagulação da hemolinfa com a carga microbiana de víbrios; (3) correlacionar as variáveis ambientais com a quantidade de víbrios na hemolinfa dos camarões; (4) quantificar as unidades formadoras de colônia (UFC) de víbrios nas amostras de hemolinfa de camarão; (5) isolar e identificar estirpes de Vibrio nas amostras de hemolinfa de camarões; (6) avaliar a susceptibilidade antimicrobiana de víbrios isolados da hemolinfa dos camarões; (7) pesquisar os perfis de multirresistência das estirpes 23 de Vibrio isoladas da hemolinfa dos camarões; (8) determinar o índice de resistência (IRA) e o índice de múltipla resistência a antimicrobianos (MRA) das estirpes de Vibrio isoladas das amostras de hemolinfa dos camarões; (9) determinar a concentração mínima inibitória (CIM) dos antimicrobianos para os quais as estirpes isoladas apresentarem perfil de resistência; (10) determinar a presença de plasmídios nas estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa dos camarões relacionados à multirresistência; (11) pesquisar a presença de integrons e de genes cassetes utilizando iniciadores genéticos nas estirpes de Vibrio resistentes, isoladas das amostras de hemolinfa de camarões. 24 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Litopenaeus vannamei (Boone, 1931) e seus sistemas de cultivo O camarão L. vannamei é exótico em águas brasileiras, pois é proveniente do Pacífico Oriental, do México ao Peru, ocorrendo desde águas rasas até 72 m de profundidade. Quando adultos, são encontrados em ambiente marinho e na fase juvenil em ambiente estuarino (HOLTHUIS, 1980). Essa espécie possui comprimento máximo de 23 cm e pertence à família Penaeidae, estando associado às águas costeiras rasas e estuarinas. Os camarões marinhos se reproduzem normalmente em alto-mar, e durante a fase reprodutiva as fêmeas desovam sucessivamente, produzindo de cem mil a quinhetos mil por desova, dependendo da espécie e do comprimento da fêmea (FAO, 2006). Em cativeiro, a reprodução da espécie é realizada em laboratório a partir do cruzamento entre matrizes e reprodutores e a posterior liberação dos óvulos. Essa é a primeira etapa do processo de cultivo de camarão. Os ovos fecundados são recolhidos e colocados em grandes tanques, que evoluem até a condição de náuplios, em cerca de dois dias. Entre cinco e sete dias, aproximadamente, alcançam o estágio de mysis, permanecendo três a quatro dias até se transformarem em pós-larvas. Logo após, as pós-larvas estão prontas para serem comercializadas. A segunda etapa do processo produtivo é a engorda, que consiste na adaptação das pós-larvas em tanques berçários por um período de 20 dias, antes de estocar os viveiros. Um ciclo de engorda dura aproximadamente 90 a 150 dias, dependendo das condições de cultivo e do peso que se deseja alcançar (FAO, 2006; ORMOND et al., 2004). Os aspectos que determinão o tipo de sistema operacional utilizado nas fazendas constituem densidade populacional introduzida no viveiro e tipo de alimento fornecido. O cultivo de camarões marinhos pode ser classificado em três sistemas principais: extensivo, semi-intensivo e intensivo. O primeiro utiliza densidades variando de 1 a 4 camarões/m², com alimento natural; o segundo, entre 5 e 30 camarões/m², com a dieta de alimento natural e suplementar; e o terceiro, de 30 a 120 camarões/m² com alimentação constituída exclusivamente de ração (FAO, 2006). Nos últimos anos, um novo modelo de cultivo que vem sendo utilizado pelos carcinicultores é o sistema de bioflocos bacterianos. Essa técnica de produção surgiu como alternativa para aumentar a produtividade, reduzindo os custos com captação e renovação de água (LARA et al., 2012). Consiste na manipulação de bactérias heterotróficas que são nativas dos ambientes aquáticos, sendo capazes de assimilar compostos nitrogenados, 25 transformando-os em proteína com adição de fontes de carbono (TANCREDO et al., 2011). Segundo Schryver et al. (2008), os bioflocos são geralmente compostos por bactérias, protozoários, microalgas, metazoários, exoesqueletos, fezes, restos de organismos mortos, predominando uma biota aeróbica e heterotrófica. O sistema opera sob condições superintensivas, sendo os viveiros revestidos com manta de polietileno, com elevadas densidades populacionais (300 a 500 camarões/m²) (BOYD; CLAY, 2002). Utiliza troca d’água reduzida, combinada com o tratamento de água e reciclagem de alimento artificial não consumido, estimulando a formação da microbiota aeróbica e heterotrófica a partir da fertilização com fontes ricas em carbono orgânico e aeração constante (AVNIMELECH, 2006; EMERENCIANO et al., 2007; WASIELESKY et al., 2006). Além disso, observa-se aumento na conversão alimentar e redução de epizootias no cultivo (STOKSTAD, 2010). Devido à redução de água utilizada, que, consequentemente, influencia na emissão de efluentes para o ambiente circundante, a aplicação desse sistema de cultivo atende os conceitos de uma aquicultura responsável e ambientalmente correta (EMERENCIANO et al., 2007). O sucesso do L. vannamei nos cultivos se deve à sua boa adaptação, rusticidade e rápido crescimento em todas as fases do processo produtivo. As pós-larvas dessa espécie são produzidas em larga escala no Brasil e, durante a engorda aceitam facilmente rações peletizadas, tolerando uma ampla variação na salinidade da água, de 0,5 até 65. Em função de sua coloração típica, esse peneídeo é aceito nos mercados nacionais e internacionais (NUNES, 2004). 2.2 Sistema imunológico do camarão x patógenos O sistema imune é responsável por todos os mecanismos pelos quais os organismos se defendem de invasores. Ele também remove células mortas, renova determinadas estruturas e, no caso dos mamíferos, tem memória. É ativo contra células alteradas que surgem como resultado de mitoses anormais e atua em uma rede de cooperação, envolvendo a participação de muitos componentes estruturais, celulares e moleculares (MACHADO et al., 2004). Nos invertebrados, a primeira linha de defesa contra invasores do sistema imunológico consiste em barreiras físicas (carapaça externa rígida ou exoesqueleto e o epitélio) somadas com as defesas celulares. O trato digestivo desses animais é a principal via de entrada de micro-organismos que apontam em um ambiente ácido repleto de enzimas, 26 capaz de inativar e digerir a maioria dos patógenos que não pertencem a sua microbiota natural. Quando essas barreiras são transpostas, não sendo suficientes para impedir a invasão de patógenos (vírus e bactérias), ocorre no hospedeiro uma série de reações imunológicas complexas com objetivo de neutralizar e eliminar os agentes invasores (BARRACCO; PERAZZOLO; ROSA; 2007). Nos crustáceos, o sistema imune envolve respostas humorais e celulares (MANINGAS; KONDO; HIRONO, 2013). Por ser um sistema inato, é isento de imunoglobulinas, de receptores de células T e de moléculas de alta restringência, ou seja, não é capaz de produzir anticorpos imunes adaptativos (WU et al., 2002). É caracterizado pela ausência de memória imunológica, mas bastante eficiente para protegê-los e preservá-los da invasão de patógenos (JOHANSSON; SÖDERHÄLL, 1989). De forma geral, as defesas naturais dos camarões peneídeos ficam a cargo dos hemócitos (BOAVENTURA; CANUTO; FERREIRA, 2006). Estes são divididos em três tipos usualmente reconhecidos e descritos como: hialinos, semigranulares ou com grânulos pequenos e hemócitos granulares ou com grânulos grandes (RODRIGUEZ et al., 1995). O primeiro está relacionado com a coagulação, enquanto os outros dois são responsáveis pela fagocitose (GARGIONI; BARRACCO, 1998). Os hemócitos estão envolvidos em todos os principais processos imunológicos, tais como o sistema profenoloxidase (ProPO), coagulação da hemolinfa, ação antimicrobiana, fagocitose, aglutinação de células e nodulação/encapsulamento de material estranho. Destes processos, a ativação do sistema proPO e o mecanismo de coagulação são os mais estudados em crustáceos decápodes (CERENIUS; LEE; SÖDERHÄLL, 2008, JIRAVANICHPAISAL; LEE; SÖDERHÖLL, 2006). O sistema proPO é um dos principais componentes da resposta imunitária humoral em crustáceos (CERENIUS; LEE; SÖDERHÄLL, 2008; SÖDERHÄLL; CERENIUS, 1998). Ele é composto por vários zimógenos de proteases, pela prófenoloxidase, além das proteínas de reconhecimento de padrões (PRPs) (LEE; SÖDERHÄLL, 2002). A ativação do sistema proPO é realizada por proteínas padrões específicas (PRPs) através do reconhecimento de micro-organismos presentes no hemocelo. Em seguida, desencadeia-se uma cascata de serino-proteases, levando eventualmente à clivagem da proPO (forma inativa) para PO (enzima ativa) que tem como função produzir melanina e reativos tóxicos intermediários TASSANAKAJON, 2013). contra patógenos (AMPARYUP; CHAROENSAPSRI; 27 Em artrópodes, a síntese de melanina está envolvida no processo de cicatrização de feridas e esclerotização da cutícula, bem como na formação de reações de defesa (nódulos e /ou encapsulados) contra micro-organismos invasores (SÖDERHÄLL, 1982; SUGUMARAN, 1996). O processo de melanização é realizado pela PO, controlado pela cascata de ativação proPO, que desempenha um papel importante no sistema imune de invertebrados, pois permite uma resposta rápida à infecção patogênica (AMPARYUP; CHAROENSAPSRI; TASSANAKAJON, 2013). Contudo, vale ressaltar que a melanina não é a molécula imunoefetora mais importante produzida durante a ativação do sistema proPO, sendo os compostos citotóxicos intermediários os mais efetivos (NAPPI; VASS, 1993). Assim, a melanização representa, mais especificamente, o final de um potente processo imunoefetor (BARRACCO; PERAZZOLO; ROSA, 2007). Por fim, a reação de melanização é, sem dúvida, uma reação de defesa importante, podendo determinar se uma infecção resultará na morte ou resistência do hospedeiro (CERENIUS; LEE; SÖDERHÄLL, 2008). O sistema de coagulação da hemolinfa se destaca por ser um mecanismo imunológico essencial para a sobrevivência de animais invertebrados, pois evita a perda de fluido corpóreo durante uma lesão (BARRACCO; PERAZZOLO; ROSA, 2007; MANINGAS; KONDO; HIRONO, 2013). A hemolinfa preenche todo o interior (hemocelo) do corpo do animal. Contém hemocianina (à base de cobre) que se transforma na cor azul quando oxigenada (FREDRICK; RAVICHANDRAN, 2012). Outros componentes do sistema imunológico estão contidos na hemolinfa, isso se deve ao fato de ser fluida e também por ser capaz de atingir todos os tecidos dos crustáceos. Estes incluem lectinas, inibidores de protease, peptídeos antimicrobianos e receptores Toll, que compõem o sistema imune inato, protegem os crustáceos contra patógenos (IWANAGA; LEE, 2005). A rápida e eficaz coagulação da hemolinfa aumenta as chances de sobrevivência dos camarões (FAGUTAO et al., 2012). Os crustáceos parecem utilizar o mecanismo mais simples de coagulação (MANINGAS; KONDO; HIRONO, 2013). Nesse processo, um componente principal na gelificação do plasma é a proteína de coagulação (CP), que forma coágulos estáveis. Esse mecanismo envolve uma reação de ligação cruzada entre suas moléculas, mediada pela transglutaminase (TGase), que é uma enzima Ca2+ dependente, liberada a partir dos hemócitos em resposta ao dano no tecido ou por invasão de patógenos (HALL et al., 1999; LORAND et al., 1979). De acordo com Fagutao et al. (2012) a TGase está envolvida na proliferação de circulação dos hemócitos. Dessa forma, a ausência dessa enzima pode levar à diminuição de hemócitos na hemolinfa, comprometendo o sistema imunológico de camarões peneídeos. 28 De acordo com a descrição clássica de Tait (1911), a coagulação da hemolinfa pode ser dividida em três tipos: A, B e C. O tipo A se distingue pela formação de uma densa rede de hemócitos que veda o ferimento, e a coagulação do plasma não é visível, isso é observado no caranguejo Loxorhyn chusgrandis. O tipo B está relacionado com a agregação hemocitária seguida por coagulação do plasma, ocorrendo na Lagosta do Maine (Homarus americunus). No tipo C, ocorre a lise dos glóbulos, provocando a coagulação do plasma com a agregação de poucas células, podendo ser observada em lagostas e camarões. Estes três tipos de mecanismo envolvem agregação de hemócitos e coagulação das proteínas da hemolinfa (CHIDALIA et al., 1981; DURLIAT, 1985). Portanto, o mecanismo de coagulação da hemolinfa é essencial para a resposta imune dos camarões, pois é indicativo da presença ou não de patógeno no corpo do animal. Outro componente que merece destaque em relação ao sistema imunológico dos crustáceos são as proteínas e/ou peptídeos antimicrobianos (AMPs), que juntamente com o sistema de coagulação são os principais mecanismos da imunidade inata dos crustáceos (MANINGAS; KONDO; HIRONO, 2013). São moléculas relativamente pequenas, contendo de 150-200 resíduos de aminoácidos. Além disso, são conhecidas por serem antimicrobianos naturais com efeito rápido contra patógenos (BULET; STÖCKLIN; MENIN, 2004). Apresentam atividade detergente, que através da interação eletrostática com os fosfolipídeos aniônicos da membrana, leva ao desequilíbrio das funções do patógeno. Podem até atuar na bicamada lipídica, originando grandes poros que provocam o influxo descontrolado de solutos e extravasamento dos conteúdos citoplasmáticos, causando a morte do micro-organismo (BARRACCO; PERAZZOLO; ROSA, 2007). Dentro do sistema imunológico de camarões peneídeos, especificamente nos hemócitos, existem outras moléculas que têm função microbicida. Dentre estas, destaca-se a lisozima, que representa aproximadamente 4% das proteínas totais dos hemócitos (SOTELOMUNDO et al., 2003). Devido à habilidade de clivar peptidoglicanos das paredes bacterianas, essa enzima é tida como possuidora de atividade lítica eficaz contra um vasto espectro de bactérias Gram-positivas e negativas, incluindo os víbrios (DE-LA-RE-VEGA et al., 2006; HIKIMA et al., 2003). De acordo com a literatura consultada, há um grande interesse no conhecimento dos mecanismos de defesa dos crustáceos devido à necessidade de se reduzir o efeito do patógeno ao hospedeiro, para assim se obter o controle e a prevenção de doenças (LIGHTNER, 1992). 29 2.3 Vibrio em camarão As epizootias geram grandes prejuízos para o cultivo intensivo de camarões marinhos, afetando economicamente a atividade e prejudicando a produção. As práticas de manejo e as condições ambientais são fatores que podem contribuir para o surgimento de enfermidades (VERSCHUERE et al., 2000). Assim, os produtores vêm buscando outras formas de manejo com a finalidade de minimizar os efeitos provocados por patógenos (COCK et al., 2009). Dentre as doenças que acometem camarões cultivados, as de origem bacteriana são as mais comuns. Um grupo bacteriano que causa enfermidades nos cultivos de camarões marinhos consiste no gênero Vibrio (LIGHTNER, 1993). Os víbrios são bastonetes Gramnegativos, geralmente móveis, mesófilos e anaeróbicos facultativos. Em geral, suas células podem atingir 1,0 µm de largura e entre 2,0 e 3,0 µm de comprimento; quando móveis, possuem no mínimo um flagelo polar. Em sua maioria são oxidase-positivos (FARMER; HICKMAN-BRENNER, 1992). São capazes de realizar metabolismo tanto oxidativo quanto fermentativo e são produtores de citocromo oxidase (KONEMAN et al., 2001). Os representantes desse gênero pertencem à microbiota autóctone do ecossistema marinho e estuarino, sendo encontrados em altas densidades nos organismos marinhos, incluindo corais, peixes, moluscos, algas, esponjas, camarões e zooplâncton (GOPAL et al., 2005; LEYTON; RIQUELME, 2008). Quando presentes no ambiente, os víbrios podem ser fonte de possíveis infecções para o camarão (COSTA et al., 2009). A vibriose é a epizootia causada por esse microorganismo. A enfermidade é classificada como infecção secundária e oportunista, atacando todos os estágios de vida do camarão (larval, pós-larval, juvenil e adulta) (NUNES; MARTINS, 2002). A patogenicidade dos víbrios nos cultivos está relacionada com o desenvolvimento fisiológico do camarão, o estresse ambiental, a estirpe, a dose infectante e a via de infecção (KARUNASAGAR; KARUNASAGAR; UMESHA, 2005). No camarão, a doença pode ser transmitida através de diferentes vias, tais como: lesão na carapaça, alimentação, brânquias e boca, quando as bactérias atravessam o epitélio desses animais, para então, colonizarem os tecidos do hospedeiro (MARTIN; RUBIN; SWANSON, 2004). O controle sanitário na área de cultivo se faz necessário para o conhecimento prévio do estado de saúde dos animais, baseado em inspeções e padronização de procedimentos de amostragem, seguidas de diagnóstico laboratorial, de acordo com as normas internacionais (MACIEL et al., 2003). No caso da vibriose, as análises bacteriológicas são 30 utilizadas para estimar o tamanho da população de víbrios presentes em tecidos específicos dos camarões. Utiliza-se a técnica de contagem padrão em placas (CPP), com a finalidade de quantificar as unidades formadoras de colônia (UFC) de víbrios no hepatopâncreas e na hemolinfa (MORALES-COVARRUBIAS, 2008). A análise nestes tecidos é de extrema importância, pois o hepatopâncreas tem a mesma função do fígado e do pâncreas nos vertebrados e quando o camarão sofre uma infecção por víbrios, pode ter dificuldade de crescimento e uma baixa conversão alimentar (CHAYABURAKUL et al., 2004). Porém, na hemolinfa dos crustáceos, a presença de víbrios é um fator preocupante, pois a doença pode estar generalizada, uma vez que ela deve ser, se não estéril, pelo menos pouco contaminada (LIGHTNER, 1977). De acordo com Gomez-Gil et al. (1998), a hemolinfa de camarões saudáveis pode conter bactérias. Costa et al. (1998) afirmam que, no fluido corpóreo de camarões saudáveis, 30% da microbiota são compostas por Vibrio, e em camarões doentes esse percentual chega a 100%. Uma explicação plausível para essa ocorrência é que a presença desse micro-organismo na hemolinfa dos animais pode estar relacionada com ambiente externo, através da água ou através da ingestão de alimentos (ADAMS; ANGELOVIC, 1970; LEANO; LAVILLA-PITOGO; PANER, 1998). Bactérias patogênicas podem crescer em condições ambientais anormais levando à morte dos camarões cultivados. Mudança no pH pode desencadear surtos de doenças através da redução dos mecanismos de defesa imune do hospedeiro (LI; CHEN, 2008). No cultivo de camarões marinhos, os patógenos podem atingir níveis elevados, colocando em risco a sobrevivência de toda a população cultivada. Os organismos terão maiores ou menores chances de contrair uma doença infecciosa (ou não infecciosa) se tiverem alguma alteração ou deficiência genética, fisiológica, imunológica ou adaptativa, isto é, de base ecológica (VINATEA, 2004). Portanto, a enfermidade é resultante de uma resposta pouco eficiente do sistema imunológico do animal aos agentes patogênicos. Segundo Jones, Hunt e King (2000), a maioria das respostas consiste em mecanismos de defesa visando neutralizar ou eliminar o agente lesivo. Se a resposta não for bem sucedida, a doença se instala. Para controlar as enfermidades nos cultivos, muitos produtores utilizam substâncias antimicrobianas (DEFOIRDT et al., 2007). Esses agentes são geralmente usados em todo o ciclo de produção (SANTIAGO; ESPINOSA; BERMÚDEZ, 2009). No entanto, o uso de antimicrobianos na aquicultura tem afetado a saúde humana e o ambiente. Os problemas gerados pela utilização dessas drogas vão desde a persistência do fármaco no ambiente aquático até alterações na biogeoquímica dos sedimentos (MA et al., 2006). 31 2.4 Resistência antimicrobiana A descoberta de várias classes de antimicrobianos nas décadas de 1950 a 1970 revolucionou a terapêutica médica. Essa "idade de ouro" dos agentes antimicrobianos gerou otimismo sobre o tratamento das infecções bacterianas, pois se pensava que com esses fármacos elas seriam, rapidamente, eliminadas (GALE et al., 1981; MCDEVITT; ROSENBERG, 2001). Os antimicrobianos são destinados a matar ou inibir o crescimento bacteriano, e os mecanismos de ação destes agentes têm alvos específicos, tais como: replicação do DNA, síntese de proteínas, parede celular e membrana plasmática (SÁNCHEZ, 2006). Apesar dessa ação sobre os micro-organismos, a utilização indevida dos agentes antimicrobianos lamentavelmente contribuiu para o surgimento de estirpes bacterianas resistentes (SILVEIRA et al., 2006). O termo resistência está relacionado aos micro-organismos que não são afetados pelas concentrações antibióticas habitualmente administradas, pois apresentam mecanismos de resistência específicos para o fármaco, de modo que não são obtidas respostas satisfatórias para o tratamento infeccioso (RODRIGUEZ et al., 2000). O surgimento da resistência está relacionado com a dinâmica do genoma bacteriano. De modo geral, as funções essenciais de uma bactéria estão inseridas em um só cromossomo, e as não-essenciais, tendo como exemplo a defesa contra drogas e a transferência gênica que levam à recombinação, são codificadas por elementos móveis, tais como: plasmídios, transposons e integrons (SOUZA, 1998). As populações bacterianas sensíveis podem se tornar resistentes através de mutação ou pela aquisição de genes de outras bactérias que codificam a resistência (TENOVER, 2006). A origem dessa resistência pode ser: natural ou adquirida. A primeira também é conhecida como resistência intrínseca e caracteriza-se por ter um caráter hereditário. Ela é transferida verticalmente para células-filhas comandada por genes cromossômicos que determinam, na célula, a ausência de receptores para a ação dos antibióticos, ou se deve à existência de estruturas de mecanismos que impedem a ação da droga. A segunda resulta na modificação da estrutura do funcionamento da célula bacteriana, decorrente de fatores genéticos adquiridos por mecanismos que alteram os cromossomos bacterianos ou afetam elementos extracromossômicos formados por segmentos de DNA, denominados plasmídios (TRABULSI; ALTERTHUM, 2008). As bactérias podem transferir genes de resistência por conjugação, transdução e transformação. A conjugação envolve o contato físico entre células, realizado por uma 32 organela denominada de fímbria ou píli sexual. Essa estrutura é formada pela bactéria doadora que possui plasmídio conjugativo. Após a formação da fímbria, ocorre a passagem do DNA da célula doadora para célula receptora. Esse tipo de transferência é comum em microorganismos Gram-negativos. Já a transdução consiste na transferência do material genético de uma bactéria para outra através de bacteriófagos. Os fagos virais utilizam o DNA bacteriano para sua multiplicação. Ao infectarem uma nova bactéria, os bacteriófagos podem, então, introduzir a característica de resistência da célula, que lhes serviu de hospedeira, para outra. No processo de transformação, as células bacterianas captam parte do DNA cromossômico ou plasmidial liberado de uma bactéria que tenha sofrido lise celular (SCHOLER; POLAK, 1984; TAVARES, 2007). As elevadas atividades metabólicas e reprodutiva dos microorganismos associadas aos mecanismos de troca de material genético podem favorecer a disseminação da resistência (CLOETE, 2003). Essa transferência é realizada horizontalmente, podendo ocorrer em bactérias filogeneticamente distantes (DALE; PARK, 2004). Essa habilidade possibilita às células bacterianas sobreviverem em ambientes hostis (CHINEDUM, 2005). No processo da transferência gênica, os elementos móveis são classificados como genes que podem se mover de uma célula bacteriana para outra, o que, em termos de resistência a antimicrobianos, inclui os plasmídios e os transposons (BENNETT, 2008). Com relação aos plasmídios, são moléculas de DNA circulares, de dupla fita, separadas do DNA cromossômico. Possuem uma sequência de DNA que serve como origem de replicação ou ori (ponto de início da replicação), e que torna a duplicação do plasmídio independente da replicação do DNA cromossômico. Seu tamanho varia de 1 a 400 kbs (SCHAEFER, 2006). São conhecidos como veículos importantes na transferência horizontal de genes de resistência e são responsáveis pela disseminação da resistência a antimicrobianos (ANDREOTTI; NICODEMO, 2004). Já os transposons são segmentos de DNA que variam de 65 a 150 kbs, sendo responsáveis pela incorporação de um gene de resistência dentro de outro elemento móvel (NIKOLICH et al., 1994). Eles possuem diversas formas, distinguem-se pelo parentesco, estrutura genética e mecanismo de transposição e podem transportar uma variedade de genes de resistência (BENNETT, 2005). Os mecanismos de autodefesa dos micro-organismos frente às drogas antimicrobianas são diversos, dentre os quais estão: inativação da droga por enzimas, alteração da permeabilidade bacteriana; alteração no sistema de transporte na célula, bombas de efluxo, alteração do receptor da droga e modificação do sistema metabólico da droga (TAVARES, 2007). Esses mecanismos estão relacionados com características inatas das 33 bactérias (CAUMO et al., 2010). Pode-se dizer que, atualmente, os mecanismos genéticos de aquisição e transferência de resistência antimicrobiana são bem conhecidos. O uso de agentes antimicrobianos na medicina humana e veterinária favoreceu o aumento da resistência a antimicrobianos (GONZÁLEZ-ZORN; ESCUDERO, 2012). Diante desse fato, torna-se necessário a obtenção de novos fármacos para tratamento das infecções por bactérias resistentes (DAMASCENO, 2010). Pensava-se que a problemática da resistência teria sido resolvida com a introdução de novos fármacos, tais como os aminoglicosídeos, macrolídeos, glicopeptídeos ou ainda com as modificações estruturais nos compostos existentes, que, poderiam contribuir para a inibição das populações resistentes (GOLD; MOELLERING,1996). Desta forma, os agentes antimicrobianos não são substâncias mutagênicas, na verdade esses fármacos exercem pressão seletiva na população bacteriana (DEL FIO; MATTOS FILHO; GROPPO, 2008). 34 2.5 Efeito da resistência antimicrobiana no ecossistema aquático A resistência aos antimicrobianos nas enterobactérias não é um fato que possa ser identificado como de ocorrência nos meados finais do último século ou que tenha tido uma relação de causa no universo dos países mais evoluídos economicamente. Na verdade, essa situação retrata um fenômeno ecológico antigo originado principalmente da competição natural dos micro-organismos patológicos e na biocenose por elementos nutricionais. A produção de compostos capazes de matar ou inibir competidores é uma longa história de evolução da vida, exemplificando-se a produção de antimicrobianos por Streptomyces, responsáveis na natureza pela produção de uma gama de produtos com atividade antibiótica. Nas investigações de Datta e Hughes (1983) e Levy (1983), que analisaram enterobactérias de isolados de 1920 e de animais selvagens africanos, que nunca receberam antibióticos, observaram uma influência da pressão seletiva antropogênica, o que evidenciaram uma baixa resistência aos antimicrobianos; porém detectaram a presença de plasmídios transmissíveis de fatores de resistência. Os antimicrobianos foram desenvolvidos com o intuito de melhorar a saúde humana. Além dessa aplicação fundamental, podem também ser utilizados na agropecuária, e na aquicultura (SINGER et al., 2003). Os fármacos utilizados no cultivo de organismos aquáticos são liberados diretamente nas águas superficiais, com elevada carga de resíduos que pode se acumular no sedimento e, consequentemente, alterar o ecossistema aquático (ALEXY et al., 2004). Essas substâncias atingem os corpos d’água através da lixiviação do solo, escoamento superficial e erosão (HIRSCH et al., 1999). Na maioria das vezes, a amplitude que a resistência bacteriana consegue alcançar e o impacto que ela pode ter no ambiente hospitalar e na natureza são, simplesmente, ignorados (OPLUSTIL, 2012). Portanto, pouco se sabe sobre os efeitos globais dessas drogas sobre os ambientes terrestres e aquáticos (BILA; DEZOTTI, 2003). Segundo Cardonha et al. (2005), o número de cepas bacterianas resistentes à antimicrobianos no ambiente aquático tem aumentado desde a década de 1970. Isso é resultado de seu uso inadequado na profilaxia ou terapêutica humana e animal. Vale ressaltar que alguns micro-organismos pertencentes aos ambientes aquáticos são filogeneticamente relacionados com patógenos humanos, aumentando dessa forma, a probabilidade de propagação da resistência. Esse aumento está relacionado com plasmídios que possuem genes de resistência (SØRUM, 2006). Assim, tanto bactérias ambientais como clínicas podem compartilhar os mesmos genes de resistência (FURUSHITA et al., 2003). 35 De acordo com Wise (2002), cerca de 200.000 t de agentes antimicrobianos por ano são destinados à produção de animal. Nos países da União Europeia a utilização de fármacos veterinários foi estimada em 60.000 toneladas (KOOLS; MOLTMANN; KNACKER, 2008). Estes são usados como promotores do crescimento e no tratamento de enfermidades. Porém, somente 10% a 20% desses fármacos são metabolizados pelo organismo, sendo o restante excretado através da urina e fezes na forma do composto original (BOXALL; 2006; KIM et al., 2011; SARMAH; MEYER; BOXALL, 2006). Portanto, a utilização de excretas de animais para adubação consiste em uma das principais vias de propagação de agentes antimicrobianos para o ambiente (CHRISTIAN et al., 2003). No que diz respeito à aquicultura, as bactérias do gênero Vibrio são descritas como uma das responsáveis por prejuízos para a atividade aquícola (LIGHTNER, 1999). A forma mais comum para resolver os surtos de vibriose nos cultivos é através da utilização de agentes antimicrobianos na ração (ROQUE et al., 2001), os quais são incorporados no momento da fabricação ou adicionados à ração na própria fazenda. No Brasil, a maioria das rações comerciais é peletizada. O processo de fabricação da ração envolve elevadas temperaturas e variação de pressão, e devido a isso, os antimicrobianos não podem ser misturados na fase inicial da fabricação, pois a substância pode sofrer inativação. Porém, existe uma maneira prática e viável para realizar a mistura. Logo após o processo de extrusão, os peletes são pulverizados com antimicrobianos e depois secados, fazendo com que a substância se incorpore à ração sem que a droga sofra alteração. A quantidade de fármaco utilizada dependerá do tipo de substância e do seu grau de pureza (FIGUEIREDO; GODOY; LEAL, 2008). De acordo com Gräslund, Holmström e Wahlström (2003), os produtores de camarão tailandeses usam drogas antimicrobianas na ração, e os compostos mais utilizados são: as fluoroquinolonas, as tetraciclinas e as sulfonamidas. De acordo com Serrano (2005), a Tailândia e o Japão são os países que mais utilizam agentes antimicrobianos na aquicultura, cerca de 13 substâncias. Nas Filipinas e no Vietnam são utilizados 10 e 9 fármacos nos cultivos, respectivamente. Essas quantidades de medicamentos utilizados contribuem para a seleção dos micro-organismos resistentes, autóctones (SAPKOTA et al., 2008). De acordo com Carvalho et al. (2009), o uso de antimicrobianos na ração pode contribuir para o surgimento da resistência em bactérias ambientais. No Brasil, fala-se sobre o uso dos antimicrobianos: tetraciclina, eritromicina e a oxitetraciclina na piscicultura. Esse último é empregado em cultivos de peixes através da ração para tratamento de furunculose e da eritrodermatite em carpa. Em camarões, esse 36 fármaco é utilizado como medida profilática contra necrose hepatopancreática (BRASIL, 1999). Diante dessa problemática, os agentes antimicrobianos não devem ser utilizados como medida profilática. A aplicação desses fármacos deve ser feita com o conhecimento prévio da epizootia e da utilização de protocolos estabelecidos (CHÁVEZ-SÁNCHEZ; RODRÍGUEZ, 2004). No entanto, as boas práticas de manejo são questões prioritárias no cultivo, podendo possibilitar a diminuição das enfermidades e, consequentemente, reduzir a utilização de agentes antimicrobianos. 2.6 Integrons e a problemática da resistência A resistência às drogas é um grande problema no tratamento de doenças infecciosas, e muitos estudos estão focados na elucidação de mecanismos de resistência e disseminação da resistência. Na década de 1970, a multirresistência foi, em muitos casos, associada a plasmídios transmissíveis e/ou a transposons (COPPO et al., 1995; LIEBERT; HALL; SUMMERS, 1999). A análise comparativa da sequência desses elementos levou à descoberta dos integrons (HALL; COLLIS, 1995). Desde o início de sua descrição, ainda busca-se entender o comportamento molecular e evolutivo dos integrons, que foram rapidamente associados com recrutamento e perda de genes. Estes são elementos genéticos raros, pois segundo Boucher et al. (2007) depois de analisarem mais de 600 genomas bacterianos e sequenciados em parte ou totalmente, constataram que somente 9% deles possuíam integrons. Os integrons são elementos genéticos capazes de integrar genes que expressam resistência aos antimicrobianos, sendo identificados em plasmídios e transposons (STOKES; HALL, 1989). Desempenham um papel importante na disseminação da resistência em bactérias Gram-negativas, devido a sua capacidade de capturar genes do ambiente e incorporá-los ao DNA através de uma recombinação sítio-específica (WHITE; MACIVER; RAWLINSON, 2001). Sua capacidade de reconhecer uma ampla variedade de sequências de recombinação permite às bactérias uma rápida adaptação às mudanças ecológicas, cujo exemplo corresponde, sem dúvida, a adaptação à era moderna da quimioterapia (GONZÁLEZ et al., 2004). Os integrons são compostos por três unidades: um local de fixação onde a sequência adquirida horizontalmente é integrada (anelamento), um gene que codifica um sítio-específico de recombinação (integrase) e um promotor que dirige a expressão da 37 sequência incorporada (HALL, COLLIS, 1995). A estrutura básica do integron (Figura 1) consiste em uma região 5´conservada (CS) que contém o gene da integrase de classe 1 (intI1), que catalisa as reações de recombinação sítio-específico. Possui um sítio de recombinação (attI1, attC e sítios secundários), que está localizado na região variável do integron, onde cassetes são inseridos, na região promotora (Pant ou Pc), que são responsáveis pela expressão dos cassetes gênicos inseridos e uma região 3´conservada, que abriga os genes qacEΔ1 e sulI que estão relacionados com a resistência a compostos quaternários e sulfonamidas, respectivamente (FLUIT; SCHMITZ, 2004; HALL; COLLIS, 1995; MAZEL et al., 1998; RECCHIA; HALL, 1995; ROWE-MAGNUS et al., 2002; STOKES; HALL, 1989). Figura 1 - Representação esquemática da estrutura do integron e da aquisição de genes cassetes de resistência Fonte: González et al. (2004). Legenda: intI1: gene que codifica a integrase de classe 1; attI: sitio de recombinação do integron onde os genes cassetes são integrados; P I: promotor que transcreve a integrasse; PC: promotor que dirige a transcrição dos cassetes integrados; attC: sítio de recombinação do gene cassete. De acordo com Cambray, Guerout e Maze (2010), dois grupos de integrons foram descritos: integrons cromossômicos (CIs), e integrons móveis (MIs). Os CIs estão localizados no cromossomo de centenas de espécies bacterianas, e através da análise in silico, ficou evidenciado que 17% dos genomas bacterianos sequenciados exibiram esses arranjos genéticos. Podem ser encontrados em bactérias marinhas ou terrestres, tais como Vibrio spp. e Xanthomonas spp. Os CIs são denominados super-integrons (SI), podendo transportar até 200 genes cassetes, que codificam proteínas com funções desconhecidas. Já os MIs não são 38 elementos auto-transponíveis e estão localizados em elementos genéticos móveis, tais como: transposons e plasmídios. Nesse grupo de integron, existe um conjunto de aproximadamente 130 diferentes cassetes. Estes são portadores de vários genes de resistência para diferentes grupos de agentes antimicrobinanos, incluindo β-lactâmicos, aminoglicosídeos, cloranfenicol, trimetoprim, estreptomicina, rifampicina, eritromicina, lincomicina, fosfomicina, quinolonas, e antis-sépticos da família de amônio quaternário (FLUIT; SCHMITZ, 2004; MAZEL; 2006; PARTRIDGE et al., 2009). Podem possuir um número limitado de ligações de guanina e citosina (GCs) (menos de 10 GCs); (NAAS et al., 2001; GenBank DQ112222). Os GCs até agora descritos nos MIs, em geral, codificam resistência antimicrobianas. MIs são também conhecidos como integrons de resistência (IR) ou integrons de multirresistência (MRIs) (STALDER et al., 2012). Outra característica nos integrons é o sistema de classes. Eles podem ser agrupados em dez classes diferentes, mas apenas cinco estão associadas a genes de resistência aos antimicrobianos (CORREIA et al., 2003). O sistema de classe tem sido utilizado como um regime de fluxo taxonômico, representando e mostrando diferenças substanciais nas sequencias dos genes intI. Os integrons pertencentes às classes 1, 2 e 3 não são parentes evolutivamente próximos, mas compartilham várias características importantes. Estas são encontradas em transposons e plasmídios que podem conter pequenas matrizes de até seis ou mais genes cassetes. Como também podem partilhar um pool de genes cassetes, conhecidos por serem pequenos em termos relativos (contêm pouco mais de 100 genes distintos), constituídos de genes de resistência a antimicrobianos (BOUCHER et al., 2007; DI CONZA; GUTIKIND, 2010). A integrase pertence à família da tirosina-recombinase, que catalisa a recombinação entre as sequências específicas (BOUCHER et al., 2007; HOLMES et al., 2003). Com base em sua natureza, três classes de integrons com relevância clínica e epidemiológica foram descritas. As sequências de aminoácidos na integrase (intI) têm sido utilizadas como base para a divisão de integrons em classes: intI1 definido como classe 1, intI2 como classe 2 e intI3 como classe 3. Os intI1, intI2 intI3 foram inicialmente identificados em associação com elementos genéticos móveis (GILLINGS et al., 2008). Os integrons e os genes cassetes vêm contribuindo para a rápida disseminação dos genes de resistência aos antibióticos em ambientes clínicos (RECCHIA; HALL, 1995). Os genes cassetes são elementos não-replicantes e incluem um gene que pode codificar resistência aos antimicrobianos e um sítio de recombinação integrase-específico, membro da família de sítios conhecida como elementos de 59 bases (59-be). Genes cassetes podem existir 39 em duas formas: circulares livres ou podem estar integrados a um sítio attI. Somente quando integrados, os genes cassetes são considerados, formalmente, parte de um integron (PARTRIDGE et al., 2000). Segundo Summers (2006) os genes cassetes estão associados com resistência a antimicrobianos e representam apenas uma pequena fração do âmbito de aplicação do sistema integron/genes cassete. A associação dos integrons com outros elementos móveis tem levado à rápida dispersão da resistência em bactérias patogênicas. De acordo com Boucher et al. (2007), uma estirpe bacteriana pode capturar e abrigar integrons encontrados em seu habitat. Para Hall (2012), a disseminação de integrons entre as bactérias pertencentes a diferentes filos enfatiza a capacidade desse elemento genético facilitar o compartilhamento de informações entre os micro-organismos. As bactérias do gênero Vibrio se tornaram rapidamente um modelo de estudo sobre o sistema integrons/ genes cassetes cromossômicos (ROWE-MAGNUS et al., 2003). em função do gênero conter quase todos os elementos genéticos móveis, tornando-se modelo atraente para o estudo do seu genoma (THOMPSON; KLOSE; VICENTE, 2006). De acordo com Dalsgaard et al. (2000) o mapeamento de integrons por PCR e o sequenciamento do seu conteúdo genético (DNA) são importantes ferramentas epidemiológicas para estudar a evolução e a disseminação de resistência aos antimicrobianos em V.cholerae. Para Taviani et al. (2008), os integrons contribuem para a expressão da resistência às drogas antimicrobianas. Nesse contexto, a detecção e a caracterização de integrons contendo genes de resistência são fundamentais na avaliação de um determinado ambiente, pois podem representar um reservatório de resistência (HENRIQUES et al., 2006). 40 3 MATERIAL E MÉTODOS 3.1 Locais de coleta e Características das fazendas As fazendas de carcinicultura monitoradas apresentavam diferentes condições de estocagem nos viveiros e estão localizadas nos estuários dos rios Jaguaribe e Acaraú. As fazendas A e B situadas no litoral oeste (Rio Acaraú / Rio Aracatiaçu) apresentaram densidade de estocagem média de 45 camarões/m² e 35 camarões/m², respectivamente; e as fazendas C e D (litoral leste - Rio Jaguaribe) apresentavam densidades de 23 camarões/m² e 21 camarões/m², respectivamente (Figura 2). Figura 2 - Localização das fazendas situadas no estuário do Rio Acaraú e no estuário do Rio Jaguaribe Fonte: Francisco Gleidson da Costa Gastão – imagens de satélites. 41 3.2 Parâmetros ambientais da água do viveiro Em cada coleta foi verificada a temperatura da água in loco com uso do termômetro de mercúrio (INCOTERM). Outros parâmetros ambientais como salinidade, pH e oxigênio dissolvido foram obtidos junto aos técnicos nas fazendas. 3.3 Coleta dos camarões Foram realizadas quatro coletas distribuídas entre os meses de agosto de 2011 e fevereiro de 2012, sendo duas em cada estuário. Nas fazendas, de cada viveiro escolhido foram analisados 10 exemplares de camarão com peso médio variando entre 12 e 18 g, perfazendo um total de 80 camarões amostrados. Os animais foram capturados com o auxílio de redes e insensibilizados em banho de gelo antes da retirada da hemolinfa. 3.4 Teste de coagulação da hemolinfa Em cada coleta, no momento da captura, os camarões recebiam um código numérico (1 a 10). A parte dorsal dos camarões foi desinfectada com álcool 70% para o procedimento de perfuração. Logo após, os animais foram inclinados sobre a superfície da lâmina para a obtenção da hemolinfa. Em seguida, fazia-se um esfregaço desse material com auxílio de uma agulha, até que ocorresse a coagulação. O tempo de coagulação foi determinado com ajuda de um cronômetro (PEREIRA; SANTOS, 2003). 3.5 Extração da hemolinfa Os animais foram mantidos em gelo a fim de minimizar o estresse dos espécimes, deixando-os letárgicos, facilitando a coleta da hemolinfa. A coleta foi realizada na fazenda, através de uma punção ventral direta entre o último esternito cefalotorácico e o primeiro abdominal, utilizando-se uma seringa com agulha hipodérmica de 1 mL, contendo uma solução citrato de sódio a 10%, como anticoagulante, na proporção de 1:1 (anticoagulante/hemolinfa), conforme descrito por Lightner (1996). Cada amostra de hemolinfa, correspondente a um indivíduo, foi armazenada em microtubos (Eppendorf) 42 contendo água peptonada a 1% de cloreto de sódio (0,6 mL) e mantida em gelo até a chegada ao laboratório para as análises microbiológicas. 3.6 Contagem e isolamento de Vibrio spp. A partir das amostras de hemolinfa foram realizadas diluições seriadas em água alcalina pepetonada (APA) a 1% de NaCl (10 a 10-3). De cada diluição foram retiradas alíquotas de 0,1 mL que foram semeadas pela técnica de spread plate, em duplicata, sobre superfície do meio ágar tiossulfato-citrato-bile-sacarose (TCBS) com o auxílio de uma alça de Drigalski. As placas foram incubadas em estufa a 35ºC por 18 horas (ELLIOT et al., 1995). As contagens das colônias de Vibrio spp., Sacarose+ e Sacarose -, foram realizadas utilizando o contador de colônias (Phoenix modelo EC 550), observando-se o intervalo de 25 a 250 colônias em cada placa (DOWNES; ITO, 2001). Para as contagens de colônias fora desse intervalo, os resultados foram expressos como valor estimado (UFC/mL/ estimado)(Figura 3). Das placas de contagem foram isoladas colônias em ágar triptona de soja (TSA) para futura identificação. 43 Figura 3- Fluxograma de contagem, isolamento e identificação de Vibrio a partir de amostras de hemolinfa Citrato 10% + hemolinfa (1:1) (0,3 mL) (0,3 mL) 10-¹ 10-² 0,6 mL de APA 1% de NaCl 10 -³ APA 1% NaCl (9 mL) 0,1 mL Ágar TCBS 35°C/24 h PROVAS BIOQUÍMICAS Contador de colônias Ágar TSA+1% de NaCl Fonte: Autoria própria 44 3.7 Identificação morfológica e bioquímica das espécies de Vibrio spp. A partir das placas com colônias crescidas com características de Vibrio (SAC+ e/ou SAC-) no ágar tiossulfato,citrato,bile,sacarose (TCBS) foram isoladas de duas a três colônias e semeadas em ágar triptona soja (TSA) contendo 1% de NaCl, com incubação em estufa a 35ºC por 24 horas. As colônias puras foram submetidas à coloração de Gram (SOARES; CASIMIRO; ALBUQUERQUE, 1991). Após esse procedimento, procedeu-se a identificação das estirpes de Vibrio através da chave dicotômica constituída de provas bioquímicas baseadas no protocolo estabelecido por Noguerola e Blanch (2008). 3.7.1 Prova de produção de citocromo-oxidase Do crescimento das estirpes no meio ágar triptona soja (TSA) inclinado contendo 1% de NaCl foi retirada uma alíquota com emprego de palitos de madeira esterilizados. Foram feitos esfregaços em discos de papel previamente embebidos com solução aquosa de cloridrato de tetrametil-p-fenilenodiamina a 1% (recém-preparada). O teste foi considerado positivo quando do aparecimento de uma coloração azul arroxeada em 10 segundos. Essa prova é considerada positiva para os todos os membros da família Vibrionaceae, com exceção do V. metschnikovii. 3.7.2 Produção de indol Do crescimento das estirpes no meio ágar triptona soja (TSA) contendo 1% de NaCl foi retirada uma alíquota com agulha de níquel-cromo e semeada em ágar SIM com 1% de NaCl. Procedeu-se a incubação em estufa a 35°C por 48 horas. Transcorrido o período de incubação, foi adicionado à cultura 1mL de reativo de Kovacs (p-dimetilaminobenzaldeído). A prova foi considerada positiva quando do aparecimento de um anel vermelho no meio de cultura, indicando a produção de indol a partir da degradação do aminoácido triptofano pela enzima bacteriana triptofanase. 3.7.3 Hidrólise da arginina e descarboxilação de lisina e ornitina Com o auxílio de uma alça de níquel-cromo foi feita a inoculação de cada estirpe em três tubos contendo o meio basal com 1% de NaCl, sendo adicionada separadamente, a quantidade de 5 mL para arginina, lisina e ornitina. Paralelamente, cada cultura foi inoculada em um tubo contendo o mesmo meio basal, porém sem qualquer aminoácido (controle). Após 45 a inoculação em cada tubo foi adicionado 1 cm de óleo mineral esterilizado procedendo-se a seguir a incubação dos tubos a 35ºC por até 4 dias. O meio inoculado torna-se amarelo como resultado da produção de ácido oriundo da glicose existente no meio basal. Quando a reação positiva ocorre, o meio torna-se alcalino, de cor púrpura, e o tubo controle permanece ácido, de cor amarela. 3.7.4 Fermentação de carboidratos Com o auxílio de uma alça de níquel-cromo procedeu-se a inoculação de cada estirpe nos tubos contendo caldo púrpura de bromocresol (meio basal) com 1% de NaCl e nos carboidratos a serem testados, com incubação a 35ºC por 5 dias. Foram preparadas cinco baterias de tubos. A primeira com 0,5% de lactose, a segunda com 0,5% de sacarose, a terceira com 0,5% de manose, a quarta com 0,5% de arabinose e a quinta com 0,5% de glicose. Aos tubos contendo o meio basal e 0,5% de glicose foram acrescidos tubos de Durhram invertidos, a fim de se determinar a produção de gás. Foram realizadas observações diárias para verificação da mudança de coloração do meio de púrpura para amarelo, o que indica prova positiva. 3.7.5 Prova do ONPG (o-nitrofenil β-D-galactopiranosídeo) Do crescimento em ágar triptona soja (TSA) inclinado contendo 1% de NaCl, foi retirada uma alíquota com agulha de níquel-cromo e semeada em tubos contendo 0,25 mL de solução salina fisiológica estéril. Foi adicionada uma gota de tolueno em cada tubo com posterior agitação. Os tubos ficaram em repouso por cinco minutos à temperatura de 35°C a 37°C. Em seguida, foi adicionada uma solução tamponada de ONPG 13,3 mM na quantidade de 0,25mL. Os tubos foram incubados em banho-maria a 37ºC. Foram realizadas observações após 30 minutos, 1 hora e 24 horas de incubação. A positividade da prova foi dada pela mudança de coloração do meio, de incolor para amarelo, indicando a hidrólise do ONPG pela enzima β-D-galactosidase. 3.7.6 Tolerância ao cloreto de sódio A partir do crescimento em água peptonada alcalina (APA) contendo 1% de NaCl, foram retiradas alíquotas com alça de níquel-cromo e semeadas em tubos contendo APA a 1% com cinco concentrações diferentes de NaCl. A primeira bateria foi a 0% de NaCl, a segunda a 3% de NaCl, a terceira a 6% NaCl, a quarta a 8% NaCl e a quinta a 10% de NaCl. Os tubos 46 foram incubados a 35°C por 24 horas e observados após o período de incubação. Os resultados foram considerados positivos quando constatou-se crescimento da cultura (turvação do meio). 3.7.7 Prova do Voges-Proskauer Do crescimento em ágar triptona soja (TSA) contendo 1% de NaCl foram retiradas alíquotas com alça de níquel-cromo e semeadas em caldo MRVP, com incubação a 35°C por 96 horas. Após o período de incubação, foram adicionados para cada mililitro de cultura 0,6 mL de Barrit I (solução de alfa-naftol a 5%) e 0,2 mL de Barrit II (hidróxido de potássio a 40%). A prova foi considerada positiva quando do aparecimento de anel vermelho no meio de cultura, indicando a presença do acetil-metil-carbinol (acetoína), que na presença do hidróxido de potássio e do oxigênio atmosférico é convertida em diacetila, sendo convertida em complexo vermelho sob a ação catalítica do alfa-naftol. 3.7.8 Teste da liquefação da gelatina Do crescimento em ágar triptona soja (TSA) contendo 1% de NaCl foram retirados inóculos e semeados com uma alça de níquel-cromo no meio ágar gelatina, acrescido de 1% de NaCl, com incubação a 35°C por 1-5 dias alternado entre esturfa e geladeira. Após o período de incubação foi realizada a leitura dos tubos, sendo considerados positivos aqueles que apresentaram crescimento causando turvação e liquefação do meio. 3.7.9 Crescimento a 4ºC, 35°C e 40°C A partir do crescimento em água peptonada alcalina (APA) contendo 1% de NaCl, foram retiradas alíquotas com alça de níquel-cromo e semeadas em tubos contendo APA a 1% de NaCl . Os tubos foram incubados a 4ºC, 35°C e 40ºC por 24 horas e observados após o período de incubação. Os resultados foram considerados positivos quando houve crescimento observado pela turvação do meio. 47 3.7.10 Resistência ao O129 /10 µg As estirpes características de Vibrio e isoladas em ágar triptona soja (TSA) contendo 1% de NaCl foram inoculadas em tubos contendo solução salina a 1% de modo a se obter uma turvação equivalente à turbidez do tubo 0,5 na escala de McFarland. A absorbância foi aferida em espectrofotômetro Micronal (modelo B542), variando entre 0,08 e 0,10, no comprimento de onda de 625 nm. Das soluções ajustadas, foram retirados inóculos com emprego de “swab” e semeados em placas contendo meio de Mueller-Hinton com 1% de NaCl. Em seguida colocou-se o disco do agente vibriostático O129/10 μg e incubou-se a 35ºC por 24 h. A positividade do teste foi observada através da presença de uma zona de inibição ao redor do disco. 3.8 Teste de susceptibilidade aos antimicrobianos O antibiograma das estirpes de Vibrio isoladas e identificadas foi realizado através do método de difusão em placas seguindo a metodologia proposta por Kirby–Bauer (BAUER; KIRBY; SHERRIN, 1966). Para a realização do teste foram utilizados discos antimicrobianos da marca LABCLIN (Paraná, Brasil) pertecentes a diferentes famílias: β-lactâmicosAmpicilina-AMP (10 μg), Aztreonam-ATM (30 μg); Cefalotina-CEP(30 μg), CefotaximaCTX (30 μg); Aminoglicosídeos- Estreptomicina-EST (30 μg); Gentamicina-GEN (10 μg), Cloranfenicol- Cloranfenicol-CHO (30 μg), Florfenicol-FLF (30 μg); (5 μg); Macrolídeos– Eritromicina - ERI (15 μg) Nitrofurano- Nitrofurantoina-NIT (300 μg); SulfonamidasSulfazotrim -SUT (30 μg); Quilononas- Ácido Nalidíxico-NAL (30 μg), Ciprofloxacina-CIP; Tetraciclina - Tetraciclina-TET(30 μg), Oxitetraciclina-OTC (30 μg). Este último foi preparado em laboratório utilizando discos em branco fornecidos pela (LABCLIN) impregnado com a solução antibiótica, seguindo a orientação técnica ditada pelo Clinical and Laboratory Standard Institute (CLSI, 2010a). O resultado foi visualizado após 24 h de incubação a 35ºC inóculo inicial foi padronizado em espectrofotômetro Micronal (modelo B542) com leitura no comprimento de onda de 625 nm e então inserido sobre o Agar MuellerHinton com um auxílio de um “swab”. Logo após, foram colocados os discos de antibióticos que, e depois, foram incubados à temperatura de 35°C/24 h. Decorrido este tempo, procedeuse a medição dos halos de inibição com o auxílio de um paquímetro. Os resultados foram comparados com os da tabela fornecida pelo laboratório fabricante dos discos. Cepas padrões de Vibrio parahaemolyticos ATCC17802 e de Vibrio mimicus ATCC 33653 foram utilizadas como controle (Figura 4). 48 Figura 4 - Fluxograma do teste de antibiograma, a partir das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei Fonte: Rafael Rocha 49 3.9 Cálculo do índice de resistência (IRA) e Determinação do índice de múltipla resistência a antimicrobianos (MRA) Os resultados do antibiograma foram utilizados para obtenção dos índices de resistência das cepas aos antimicrobianos testados (IRA) (JONES et al., 1986) (1) e o de múltipla resistência (MRA) (KRUMPERMAN, 1983) (2). y IRA = ------- (1) onde: n∙x y = Total do número de resistentes n = número de isolados x = número de antimicrobianos testados na pesquisa ........ a MAR = ----b (2) onde: a = número de antimicrobianos aos quais o isolado foi resistente. b = número de antimicrobianos aos quais os isolados foram expostos. 3.10 Determinação da concentração inibitória mínima (CIM) As estirpes que apresentaram resistência aos antimicrobianos no teste de discodifusão tiveram sua concentração inibitória mínima (CIM) determinada. Foram selecionadas 25 estirpes para o teste. Essa escolha obedeceu aos seguintes quesitos: espécie, localidade do cultivo e frequência dos perfis. Foi utilizada a técnica de Diluição em Caldo (Macrodiluição), usando o caldo Mueller-Hinton acrescido de 1% de NaCl de acordo com as recomendações do CLSI (2010b). O inóculo padrão foi obtido a partir da suspensão de colônias em tubos contendo solução salina 1% NaCl até se obter turbidez semelhante à solução padrão de McFarland de 0,5. Para obtenção da concentração final de bactérias do teste, que deve ser aproximadamente 5 x 108, o inóculo foi diluído 1:10, o que corresponde a uma concentração bacteriana da ordem de 107 UFC/mL (CLSI, 2010b). Uma alíquota de 100 µL do inóculo foi acrescentada a tubos contendo diferentes concentrações dos antimicrobianos. Os tubos inoculados foram incubados em estufa a 30ºC durante 16-24 h. Após o período de incubação, o resultado foi indicado pela turvação nos tubos. A determinação do CIM foi estabelecida quando a menor concentração de agente 50 antimicrobiano inibia completamente o crescimento do micro-organismo no tubo detectado a olho nu (CLSI, 2010b). Foram avaliadas concentrações de 20 a 512 µg (Figura 5). Figura 5- Fluxograma do procedimento de concentração inibitória mínima (CIM) a partir das estirpes de Vibrio isolados da hemolinfa de camarões Fonte: Autoria própria 51 3.11 Técnica de “cura” de plasmídio As estirpes que apresentaram multirresistência a diferentes famílias de antimicrobiano foram submetidas à técnica de “cura” de plasmídio de acordo com Molina-Aja et al. (2002), utilizando o caldo LB (Luria-Bertani–Difco) suplementado com 1% de NaCl e tendo como agente de cura o corante “acridine orange” na concentração de 100 μg/mL. As estirpes crescidas nesse meio durante 24 h a 35ºC, sob agitação constante, foram novamente submetidas ao teste de antibiograma frente aos antimicrobianos aos quais se mostraram resistentes (Figura 6). Foram selecionadas 25 estirpes para o teste. Essa escolha obedeceu aos seguintes quesitos: espécie, localidade do cultivo e a frequência dos perfis. Figura 6- Fluxograma da técnica de “cura” plasmidial, a partir das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarão Fonte: Autoria própria 52 3.12 Análise estatística A partir dos dados das variáveis ambientais com a quantidade víbrios na hemolinfa dos camarões e do tempo de coagulação da hemolinfa com a carga microbiana de víbrios e foram utilizados para o teste de coeficiente de correlação de Pearson para estabelecer o nível de significância (valor -p < 0,05) entre as variáveis citadas utilizando o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS; versão 17.0 para Windows). A partir dos tempos de coagulação da hemolinfa dos camarões foi calculado os percentis P10 a P90 e o intervalo interquartis (P75-P25), utilizando o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS; versão 17.0 para Windows). 3.13 Reação em cadeia de polimerase (PCR) 3.13.1 Extração de DNA cromossômico das cepas de Vibrio Para a extração do DNA total foram selecionadas 25 estirpes de Vibrio. Essa escolha obedeceu aos seguintes quesitos: espécie, origem do isolado e a frequência dos perfis. As estirpes foram inoculadas em caldo triptona soja caldo (caldo TSB-Difco) acrescido de 1% de NaCl e incubadas em estufa a 35°C por 24 h. Após o crescimento em TSB 1% foram retiradas alíquotas de 1 mL para iniciar o processo de extração do DNA usando-se o kit comercial DNeasyTissue (Qiagen). As amostras contendo o DNA extraído foram analisadas em gel de agarose 1% (Pronadisa; CONDA). A corrida foi realizada em uma cuba horizontal de eletroforese (DIGEL; DGH12/DGH14) a 120 V/300 mA com duração de 1 h e 30 mim em solução tampão TBE 1 X. O gel de agarose foi corado com o “RedGel" (concentração recomendada pelo fabricante) para possibilitar a visualização dos produtos amplificados no transluminador (Espectroline-UV) com luz ultravioleta. O gel foi documentado em sistema de fotodocumentação digital Kodac EDAS290. Um marcador de tamanho molecular de 1 kb (Sigma) foi usado como padrão para o tamanho dos fragmentos de DNA amplificados. 53 3.13.2 Extração do DNA plasmidial das cepas de Vibrio A partir do resultado do teste de cura plasmidial, 9 estirpes de Vibrio resistentes à eritromicina foram subtmetidas a extração plasmidial segundo o protocolo estabelecido por Trevors (1984) com modificações. A escolha dessas espirpes se baseou na alteração da resposta ao antimicrobiano após exposição ao agente curagênico passando de resistente a intermediário. As estirpes foram inoculadas em caldo triptona soja caldo (caldo TSB-Difco) acrescido de 1% de NaCl e incubadas em estufa a 35°C por 24 h. Após o crescimento em TSB 1% foram retiradas alíquotas de 1mL para iniciar o processo de extração do DNA plasmidial. As amostras contendo o DNA plasmidial foram analisadas em gel de agarose 1% (Pronadisa; CONDA). A corrida foi realizada em uma cuba horizontal de eletroforese (DIGEL; DGH12/DGH14) a 150 V/300 mA com duração de 1 h em solução tampão TBE 1 X. O gel de agarose foi corado com o “RedGel" (concentração recomendada pelo fabricante) para possibilitar a visualização dos produtos amplificados no transluminador (Espectroline-UV) com luz ultravioleta. O gel foi documentado em sistema de fotodocumentação digital Kodac EDAS290. Um marcador de tamanho molecular de 10 kb (Sigma) foi usado como padrão para o tamanho dos fragmentos de DNA amplificados. 3.13.3 Genes utilizados para detecção de integrons de classe 1 e gene cassete de resistência blaP1 no DNA cromossômico e plasmidial das estirpes de Vibrio Para a detecção de integrons de classe 1 e genes cassete no DNA cromossômico das estirpes de Vibrio foram utilizados os seguintes iniciadores: in (região conservada e variável do integron), int1 (integrons de classe 1 de integrons), 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio) e o gene cassete blaP1 (resistência para β-lacatâmico). As condições de termociclagem seguiram as recomendações de Aarestrup et al. (1996) com modificações. Os iniciadores foram sintetizados pela Applied Biosystem- USA (Tabela 1). 54 Tabela 1–Iniciadores e condições de termociclagem utilizados na investigação molecular das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei Técnica Inic. In Int1 PCR Sequência Ciclos Condições da Amplicon termociclagem (bp)* F: 5´- ggcatccaagcagcaagc-3’ B: 5´- tag tccagttcagacgaa -3’ COLLIS; 33813415 HALL, (1992) F: 5´- aaaaccgcc act gcgccg tta-3’ B: 5´- gaagacggctgc act gaa cg-3’ qacE∆1 F: 5´- atcgca ata gttggcgaa gt-3’ Fonte 35 94°C/4min 94°C/ 1min 58°C/ 1min 72°C/ 45 seg 72°C/ 10 min 11631200 FALBO et al.,(1999) STOKES; HALL (1989) e SUNDSTRÖM sul1 B: 5´- ccgcgcccaaaggcgga acg-3’ et al.,(1988) ZUHLSDORF; F: 5´- cgcttcccgtta aca agt ac-3’ blaP1 381419 WIEDEMANN B: 5´- gc gat agactttacttg gtc-3’ (1992) Iniciad. – iniciadores;*par de base; C- ciclos; F: seqüência de nucleotídeos forward; B: seqüência de nucleotídeos backward 1111 1149 3.13.4 Detecção do gene cassete ereA2 - resistência a eritromicina Para a detecção do gene cassete de resistência no DNA plasmidial nas 9 estirpes de Vibrio foi utilizado o iniciador ereA2 (resistência a eritromicina, somente estirpes que apresentaram perfil de resistência plasmidial para esse fármaco). As condições de termociclagem foram de acordo com o protocolo estabelecido por Szczepanowski et al. (2009). O iniciador foi sintetizado pela Applied Biosystem– USA (Tabela 2) Tabela 2 – Iniciador e condição de termociclagem utilizado na investigação molecular da resistência a eritromicina nas estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei Condições da Amplicon Fonte termociclagem (bp)* 94°C/4min THUNGAPATHRA et 94°C/ 1min F:5-cagcctcaaaagctggagtt-3’ al. (2002). Ref. ereA2 30 58°C/ 1min 2038 B:5-acattccaaaccaatcgcat-3’ GENBANK 72°C/ 1 min AF512546 72°C/ 10 min Técnica Inic. PCR Sequência C Inic. – iniciadores; C- Ciclos*par de base; F: seqüência de nucleotídeos forward; B: seqüência de nucleotídeos backward 55 3.13.5 Amplificação por Reação em Cadeia Polimerase (PCR) para detecção de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no cromossomo das estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei Em todas as amplificações foi utilizado um controle negativo (branco). O DNA total extraído foi amplificado por PCR em termociclador – Techne utilizando iniciadores in (região conservada e variável do integron), int1 (integrons de classe 1 de integrons), 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio) e o gene cassete blaP1 (resistência para β-lacatâmico) e componentes da reação nas concentrações apresentadas abaixo (Tabela 3) Tabela 3 - Composição e concentrações empregadas nas reações de investigação molecular para detectar integrons de classe 1 e gene cassete blaP1 no cromossomo das estirpes de Vibrio spp. Reagentes da Reação1 Tampão 10 x dNTP’s (2,5 mM) Iniciador F (10.000 ρM) Iniciador B (10.000 ρM) MgCl2 (50 mM) Taq polimerase (500 U) Volume da reação (μL) in 1x 0,25 μM 200 ρM 200 ρM 1,5 μM 5U 25 int1 1x 0,25 μM 200 ρM 200 ρM 1,5 μM 5U 25 PCR Iniciadores sul1/ qacE∆1 1x 0,25 μM 200 ρM 200 ρM 1,5 μM 5U 25 blaP1 1x 0,25 μM 200 ρM 200 ρM 1,5 μM 5U 25 As amostras contendo o DNA cromossômico amplificado foram analisadas em gel de agarose 1% (Pronadisa; CONDA). A corrida foi realizada em uma cuba horizontal de eletroforese (DIGEL; DGH12/DGH14) a 120 V/500 mA com duração de 1 hora em solução tampão TBE 1 X. O gel de agarose foi corado com o “Gel Red" (concentração recomendada pelo fabricante) para possibilitar a visualização dos produtos amplificados no transluminador (Espectroline-UV) com luz ultravioleta. Os géis foram documentados em sistema de fotodocumentação digital Kodac EDAS290. Um marcador de tamanho molecular de 1 kb (Sigma) foi usado como padrão para comparação do tamanho dos fragmentos de DNA amplificados. 56 3.13.6 Amplificação por Reação em Cadeia Polimerase (PCR) para detecção de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no plasmídio das estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei Em todas as amplificações foi utilizado um controle negativo (branco). O DNA plasmidial extraído foi amplificado pela técnica de PCR em termociclador – Techne, utilizando iniciadores in (região conservada e variável do integron), int1 (integrons de classe 1 de integrons), 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio), o gene cassete blaP1 (resistência para β-lacatâmico) e o ereA2 (resistência a eritromicina) e os componentes da reação nas concentrações apresentadas abaixo (Tabela 4) Tabela 4 - Composição e concentrações empregadas nas reações de investigação molecular para detectar integrons de classe 1 e genes cassetes blaP1 e ereA2 no plasmidio das estirpes de Vibrio spp Reagentes da Reação1 PCR Genes in int1 sul1/ qacE∆1 blaP1 ereA2 Tampão 10x 1x 1x 1x 1x 1x dNTP’s (2,5 mM) 0,25 μM 0,25 μM 0,25 μM 0,25 μM 0,25 μM Iniciador F (10.000 ρM) 200 ρM 200 ρM 200 ρM 200 ρM 200 ρM Iniciador B (10.000 ρM) 200 ρM 200 ρM 200 ρM 200 ρM 200 ρM MgCl2 (50 mM) 1,5 μM 1,5 μM 1,5 μM 1,5 μM 1,5 μM Taq polimerase (500 U) 5U 5U 5U 5U 5U Vol. da reação 25 μL 25 μL 25 μL 25 μL 25 μL As amostras contendo o DNA plasmidial amplificado foram analisadas em gel de agarose 1% (Pronadisa; CONDA). A corrida foi realizada em uma cuba horizontal de eletroforese (DIGEL;DGH12/DGH14) a 120 V/500 mA com duração de 1 hora em solução tampão TBE 1 X. O gel de agarose foi corado com o “Gel Red" (concentração recomendada pelo fabricante) para possibilitar a visualização dos produtos amplificados no transluminador (Espectroline-UV) com luz ultravioleta. Os géis foram documentados em sistema de fotodocumentação digital Kodac EDAS290. Um marcador de tamanho molecular de 1 kb (Sigma) foi usado como padrão para comparação o amplificados. tamanho dos fragmentos de DNA 57 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com Martins (2006), os principais parâmetros ambientais que devem ser medidos nos cultivos, são: temperatura, pH, salinidade, oxigênio dissolvido, transparência e amônia. O monitoramento dessas variáveis ambientais permite acompanhar o manejo dos animais, sendo possível adoção de medidas para evitar que condições favoráveis às epizootias se instalem (SOULAP, 1999). O resultado da análise dos parâmetros ambientais está disposto na Tabela 5. Tabela 5- Parâmetros ambientais da água do viveiro das quatro fazendas localizadas no Nordeste do Brasil 1 Região Acaraú Aracati Fazendas A B C D 2 T(°C) 26,5 27,7 27,7 28,0 30,6 29,4 28,9 29,1 Coletas 1 2 Salinidade 25,0 47,0 5,0 30,0 0,5 2,0 2,0 1,0 1 2 Oxi.dissolvido (mg/L) 8,6 7,7 6,8 4,8 7,0 9,4 8,4 9,0 T – temperatura; 1 – primeira coleta; 2 – segunda coleta. A temperatura da água dos viveiros, nas regiões estudadas, manteve-se favorável para o desenvolvimento de bactérias do gênero Vibrio. De acordo com Hervio-Heath et al. (2002), a temperatura ideal para o desenvolvimento desse micro-organismo está entre 20°C e 30°C. Esse fato ocorreu na pesquisa de Vieira et al. (2010b), cujos valores de temperatura na água dos viveiros ficou entre 25°C a 30°C em quatro fazendas de camarão no Estado do Ceará. Costa et al. (2009) encontraram temperaturas de 28,1°C e 30, 9ºC em amostras de água de viveiros em dois ciclos de cultivo do camarão L. vannamei em uma fazenda localizada no estuário do rio Coreaú. Para Vieira et al. (2009b), a oscilação na temperatura pode favorecer a multiplicação de micro-organismos mesófilos, entre os quais encontram-se os víbrios. Assim, a temperatura da água é provavelmente a variável ambiental mais relevante no cultivo de camarões, pois afeta diretamente o metabolismo, consumo de oxigênio, o crescimento, a muda e a sobrevivência dos animais. Ao analisar a correlação entre as variáveis temperatura e carga microbiana de víbrios na hemolinfa dos camarões provenientes das duas regiões analisadas, verificou-se que as amostras originárias de Acaraú a correlação foi negativamente significativa (-0,84), enquanto que as amostras vindas de Aracati a correlação foi negativa não significativa (-0,20), ao nível de 5% (Anexo A). Em contrapartida, Cavallo e Stabili (2004) encontraram uma 58 correlação positiva e significativa da temperatura com a presença de víbrios na água. Para os autores, a recuperação de algumas espécies de Vibrio está correlacionada com a temperatura. De acordo com Thompson et al. (2004), a temperatura da água pode ser um bom indicador para a ocorrência de víbrios. Corroborando com a pesquisa, Vieira et al. (2010b) observaram correlação negativa entre a temperatura e a carga microbiana de Vibrio na água de quatro fazendas de camarão, no Estado do Ceará. Para os autores, as oscilações de temperatura, associada à privação de nutrientes podem contribuir para a redução de populações bacterianas. Além disso, as baixas contagens na maior parte das coletas poderiam ter influenciado nos resultados dos testes estatísticos. Em relação à salinidade, os valores encontrados na água dos viveiros analisados variaram de 0,5 a 47 (Tabela 5). Na pesquisa de Menezes (2011), a salinidade da água dos estuários localizados próximos às fazendas de camarão variou de 2 a 48. Como as fazendas captam água desses ambientes para o cultivo de camarão, poderia ter influenciado na salinidade dos viveiros analisados. Vieira et al. (2010b), ao analisarem os parâmetros físicoquímicos da água dos viveiros de quatro fazendas de carcinicultura no Estado do Ceará, verificaram valores de salinidade variando entre 4 e 51. Os valores desse parâmetro descritos nos trabalhos supracitados estão de acordo com os da pesquisa. Vale ressaltar que o camarão L. vannamei tolera uma variação de salinidade entre 0,05 e 50 (PILLAY, 1990). Dessa forma, os valores de salinidade encontrados na pesquisa mostraram-se adequados para a atividade; no entanto, a variação de salinidade observada na pesquisa, tanto pode favorecer o desenvolvimento de bactérias do gênero Vibrio, uma vez que, esses micro-organismos são halofílicos, como também o desenvolvimento de algumas espécies pertencentes ao mesmo gênero (BERTILSSON, 2006; CONSTANTIN et al., 2009; EILER; JOHANSSON; KASPAR; TAMPLIN, 1993). A correlação entre a salinidade e a carga de Vibrio presente na hemolinfa foi negativa e não significativa (-0,28) ao nível de 5% para a região do Acaraú. Para a região de Aracati a correlação foi positiva e significativa (0,16) (Anexo A). Vieira et al. (2010b) verificaram uma correlação negativa e significativa, ao nível de 5%, quando comparada a carga de Vibrio e a salinidade nas fazendas localizadas em Aracaú e Aracati. Apesar do trabalho supracitado concordar em parte com a pesquisa, vale ressaltar que a região de Aracati apresentou uma correlação positiva, mostrando que a salinidade pode ter influência sobre a população de víbrios na hemolinfa. Resultados semelhantes foram observados nas pesquisas de Fries, Characklis e Noble (2008) e Hsieh, Fries e Noble (2008). De acordo com autores, a salinidade é uma variável ambiental que possui grande influência na distribuição da 59 população de víbrios no ambiente, discordando, portanto, da pesquisa de Wetz et al. (2008) os quais afirmaram que essa correlação não existia, ao nível de 5%. Apesar dos trabalhos supracitados serem de amostras ambientais (água e sedimento), vale salientar que a presença de víbrios na hemolinfa de camarões cultivados está relacionada com o ambiente de cultivo, influenciando assim a microbiota nos fluidos corporais desses animais (GOMEZ-GIL et al., 1998). O oxigênio dissolvido é um parâmetro importante para a qualidade dos ecossistemas aquáticos, tendo como principais fontes a atmosfera e a fotossíntese (ESTEVES; FURTADO, 2011). No caso da carcinicultura, o oxigênio é a variável mais crítica para a qualidade da água. Baixas concentrações de oxigênio na água têm sido responsáveis por grandes perdas no processo de criação (TAVARES, 1995). De acordo com Santos et al. (2005), quedas bruscas de oxigênio dissolvido durante a madrugada podem levar os camarões ao estresse, deixando-os susceptíveis a patógenos presentes na água e nos sedimentos dos viveiros. Segundo Boyd (2002), o Programa de Aquicultura Responsável da Global Aquaculture Alliance (GAA) estabelece concentração mínima de oxigênio nos efluentes da carcinicultura marinha de 3 mg/L-1, com meta de 4 mg/L-1. O Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA, 2002), através da Resolução Nº 312, prescreve que tais valores não podem ser inferiores a 5 mg/L-1. Na pesquisa, as concentrações de oxigênio dissolvido observados nas fazendas estavam dentro dos padrões recomendados pelo CONAMA,(2002). Ao relacionar estatisticamente o oxigênio dissolvido com as contagens de víbrios observados na hemolinfa dos camarões, verifica-se uma correlação positiva e significativa ao nível de 5% para ambas as regiões: Acaraú (0,51) e Aracati (0,37) (Anexo A). Corroborando com a pesquisa, Sharma e Chaturvedi (2007) encontraram correlação positiva significativa entre essas duas variáveis. De acordo com Nonwachai et al. (2011) o oxigênio dissolvido é um importante parâmetro ambiental. Oscilação desse parâmetro pode acarretar alterações no sistema inumológico de camarões P. monodon e P. stylirostris quando desafiados contra V. harveyi e V. algynolyticos respectivamente (DIREKBUSARAKOM; DANAYADOL, 1998; LE MOULLAC et al., 1998). Segundo Palaniappan (1982), em qualquer sistema aquático, os parâmetros ambientais tais como: temperatura, a salinidade, pH e oxigênio dissolvido desempenham um papel importante na distribuição dos micro-organismos não só no ambiente de cultivo como também na microbiota dos animais. De modo geral, mudanças abruptas de temperatura e salinidade, baixas concentrações de oxigênio dissolvido e presença de substâncias tóxicas são agentes estressantes, que estão associados ao desequilíbrio no ambiente e à baixa qualidade da água, 60 podendo ocasionar descontrole na biocenose e, consequentemente, o surgimento de epizootias causadas por Vibrio spp. (SMITH; BROWN; HAUTON, 2003; SOULAP, 1999). Os camarões peneídeos possuem células e sistemas envolvidos com o mecanismo de defesa destinados a evitar invasões por micro-organismos (VARGAS-ALBORES et al., 1998). Segundo Barracco, Pezzarollo e Rosa (2004), o monitoramento dos parâmetros imunológicos durante o cultivo de camarões pode servir como indicador de sanidade. Porém, esses parâmetros podem sofrer alterações quando as condições de cultivo encontram-se inadequadas, como por exemplo, a má qualidade da água ou manejo alimentar ineficiente. Essa deficiência debilita os organismos cultivados, comprometendo seu metabolismo, crescimento e processo de ecdise, e aumentando a susceptibilidade deles as doenças infecciosas (COSTA; MARTINS, 2009). O diagnóstico de doenças em camarões cultivados é feito com base nos resultados do tempo de coagulação da hemolinfa e de hemogramas (LIGHTNER, 1996). A coagulação (formação de coágulos) é uma barreira física que tem como finalidade evitar a perda de fluido corporal. Sua rapidez e eficiência são essenciais para a sobrevivência de invertebrados que depende exclusivamente do sistema inato (CHEN et al., 2005). Em camarões, a coagulação é iniciada pela ativação e lise de células hialinas (células de depósito), que liberam os hemócitos para reagir com fatores plasmáticos (OMORI; MARTIN; HOSE, 1989). O tempo de coagulação da hemolinfa é utilizado pelos carcinicultores brasileiros para avaliar a sanidade dos camarões cultivados, porém, não existe um valor referencial que possa ser determinado com segurança para essa avaliação (FRELIER; LOY; REDDINGTON; 2004). Os percentis dos intervalos do tempo de coagulação da hemolinfa nos espécimes dos espécimes pertencentes às fazendas localizadas nas regiões de Acaraú e de Aracati estão expostos na Tabela 6. 61 Tabela 6- Percentis dos intervalos do tempo de coagulação da hemolinfa dos espécimes de Litopenaeus vannamei coletados nas fazendas localizadas no Nordeste do Brasil Região F A B C Aracati D Acaraú N° de Indivíduos 20 20 20 20 Percentis dos intervalos do tempo de coagulação (s) 10 25 50 75 1C 2C 1C 2C 1C 2C 1C 2C 3,0 2,1 3 3,7 4,5 4,5 6,2 5,5 2,0 3,0 2,7 3,0 3,5 3,0 5,2 5,2 5,1 3,1 6,0 4,0 7,0 5,0 8,0 5,2 6,1 5 7,0 5,0 8,0 6,0 10 7,0 IQ 90 1C 2C 9,7 7,0 6,9 6,9 9,8 6,0 10 7,0 P75-P25 1C 2C 3,2 1,8 2,5 2,2 2,0 1,2 3,0 2,0 F-fazendas; C-coletas; IQ- Intervalo de interquatis; s-tempo em segundos Ao analisar os dados da Tabela 6 observa-se que de acordo com o P90 (Percentil 90) a maioria dos intervalos de tempo de coagulação da hemolinfa dos camarões analisados foram igual ou abaixo de 10 segundos. De acordo com os resultados do intervalo interquartil (P75-P25), não existem valores discrepantes nas coletas, o que nos leva a supor que o manejo empregado nas fazendas analisadas pode ter contribuído para dimunição do estresse do animal no viveiro e, consequentemente, para a redução de doenças. De acordo Guzmán e Valle (2000), modificações das condições naturais do meio, a densidade de estocagem, o aumento da matéria orgânica resultante de restos de alimentos, dejetos e animais mortos, podem desequilibrar a comunidade bacteriana, estimulando assim o crescimento de patógenos oportunistas nos ambientes de cultivo, comprometendo a saúde dos animais. No que diz respeito ao tempo de coagulação, Alday-Sanz (1994) relataram que a hemolinfa de camarões infectados por bactérias coagula lentamente, necessitando de mais de um minuto em temperatura de 20°C a 30ºC, enquanto que, a hemolinfa de um animal sadio coagula em menos de um minuto. Em relação ao valor aceitável do tempo de coagulação da hemolinfa em análises presuntivas, há discordâncias entre os autores em estabelecer um padrão. Segundo Peregrino (2005), 20 segundos é o tempo estabelecido como padrão, funcionando como o limite de tolerância para camarões sadios. Porém, Clifford e Cook (2002) sugerem que o tempo de coagulação de 10 segundos seja considerado normal, e que, acima desse valor a saúde dos peneídeos pode estar comprometida. Na pesquisa, adotou-se o tempo de coagulação de 10 segundos, pois esse valor é o mais utilizado pelos carcinicultores. Entre os espécimes analisados, os tempos máximos encontrados foram de 10 segundos; sendo um indivíduo nas fazendas A e C, e três na fazenda D. Evidenciando que os animais analisados na pesquisa encontravam-se, aparentemente, sadios. Carvalho (2009) analisando o tempo de coagulação da hemolinfa de camarões provenientes de quatro fazendas no Estado do Ceará encontrou valores variando de 6 a 42 s. 62 Além disso, Vieira et al. (2009a) encontraram intervalos de coagulação variando de 18 a 55 s. Os resultados encontrados nas pesquisas comentadas foram mais elevados em relação aos do presente estudo. Uma explicação plausível é que no ano de 2009 algumas fazendas não faziam o uso de probióticos e no decorrer dos últimos 5 anos anos passaram a utilizá-los, o que significa que todas as fazendas utilizadas na pesquisa faziam uso de probióticos o que poderia ter influenciado na melhoria do sistema inume dos animais tendo-se a redução do tempo de coagulação. De acordo com Vieira et al. (2010), camarões alimentados com dieta suplementada com probióticos e desafiados contra V. harveyi apresentaram números elevados de hemócitos circulantes o que ratifica os resultados encontrados. A sanidade dos camarões cultivados se torna importante não só do ponto de vista bioecológico, mas também na perspectiva econômico-financeira. Os principais indicadores de desempenho zootécnico (taxa de crescimento, taxa de mortalidade e conversão alimentar) podem ser alterados direta ou indiretamente pelas doenças bacterianas (MARTINS, 2006). Dessa forma, a estimativa do tamanho da população de víbrios no ambiente e nos animais cultivados poderá fornecer informações sobre a qualidade do ambiente do cultivo como também do estado de saúde de camarões, que pode ser útil para solucionar os problemas no manejo. Os resultados das contagens padrão em placas (CPP) das unidades formadoras de colônias (UFC) de Vibrio, nas amostras de hemolinfa dos camarões, das duas fazendas de Acaraú encontram-se dispostos na Tabela 7. Nas amostras da fazenda A, observou-se contagens de Vibrio total na hemolinfa de camarões variando de <10 a 3,4 x 106UFC/mL. Ao serem contadas, separadamente, as colônias SAC + e SAC -, os valores obtidos foram: <10 a 3,4 x 106 UFC/mL (SAC+) e <10 a 3,4 x 105 UFC/mL(SAC-). Na hemolinfa dos camarões da fazenda B a variação foi de <10 a 3, 5 x 10³ UFC/mL de Vibrio total; de <10 a 3,5 x 103 UFC/mL (SAC+) e de <10 a 2,9 x 10² UFC/mL (SAC-). Do número total de camarões analisados (40) nas fazendas de Acaraú, 32,5% (Fazenda A) e 37,5% (Fazenda B) apresentaram quantidades de víbrios acima de 10 UFC/mL em suas hemolinfas, limite mínimo considerado para as contagens, segundo a técnica de espalhamento (Tabela 7). 63 Tabela 7- Contagem Padrão em Placas (CPP) de Vibrio total; SAC+ e SAC-por mililitro de hemolinfa obtida das amostras de camarão Litopenaeus vannamei, cultivado nas fazendas A e B, localizadas no município de Acaraú-CE Fazenda A Camarão Contagem de bactérias (UFC/mL) Vibrio total 1ª coleta C1 C2 C3 C4 C5 C6 C7 C8 C9 C10 Fazenda B 2ª coleta 3,0 x 10 1,5 x 10* 1,7 x 10³ <10 6 1, 4 x 10 <10 4 1,6 x 10 <10 5 1,9 x 10 <10 6,4 x 10³ <10 5 1,4 x10 <10 6 1,3 x 10 5x 10* 6 3,4 x 10 1,5 x 10* 3,3 x 105 5x 10* 4 SAC+ SAC- 1ª coleta 2ª coleta 3,0 x 104 1,5 x 10* 1,6 x 10³ <10 6 1, 4 x 10 <10 4 1,3 x 10 <10 5 1,6 x 10 <10 6,4 x 10³ <10 5 1,4 x10 <10 5 9,8 x 10 5x 10* 6 3,4 x 10 1 x 10* 3,3 x 105 5x10* 1ª coleta 2ª coleta <10 <10 1, 2 x 10²* <10 <10 <10 2,6 x 10³ <10 4 2,9 x 10 <10 <10 <10 <10 <10 5 <10 3,4 x 10 <10 5x 10* <10 <10 Contagem de bactérias (UFC/mL) Vibrio total SAC+ 1ª coleta <10 <10 5,5 x 10² 4,0 x 10* 3, 5 x 10³ 1, 2 x 10³ <10 3 x 10² 4,5 x 10² 5,0 x 10* 2ª coleta <10 5x 10* <10 7 x 10* 4,5 x 10* 1,4 x 10²* 5 x 10* 4 x 10²* 4,5 x 10²* 1 x 10* 1ª coleta <10 <10 5,5 x 10² 4,0 x 10* 3, 5 x 10³ 9,4x 10² <10 2,8 x10² 4,5 x 10² 5 x 10* SAC- 2ª coleta 1ª coleta 2ª coleta <10 <10 <10 50 <10 <10 <10 <10 <10 4,0 x 10* <10 30 4,5 x 10* <10 <10 1,4 x 10²* 2,9 x 10² <10 5 x 10* <10 <10 4 x 10* 2,0 x 10* <10 4 x 10²* <10 50 1 x 10* <10 <10 C – camarão; SAC+ sacarose positiva; SAC- sacarose negativa* valor estimado; em negrito são os valores máximos e mínimos 64 Jayasree, Janakiram e Madahvi (2008) ao estudarem o isolamento e a caracterização de bactérias presentes em camarões doentes da espécie Penaeus monodon cultivados na costa Andha Prasdesh (Índia), encontraram valores de víbrios na hemolinfa variando de 0,7 x 10² a 2,1 x 105 UFC/mL. Os valores encontrados pelos autores assemelham-se aos dados observados na presente pesquisa. Em contrapartida, Gopal et al. (2005) encontraram valores médios de Vibrio em amostras de hemolinfa de peneídeos doentes cultivados na costa leste da Índia de 1,52 ± 0,83 x 10³ UFC/mL. Os valores das contagens foram diferentes dos obtidos neste estudo. Vale salientar que, apesar do reconhecimento dos víbrios como patógenos de invertebrados marinhos, é difícil relacionar clinicamente a presença dessas bactérias com a ocorrência de doenças no cultivo. Há trabalhos que relatam a presença de Vibrio na hemolinfa e hepatopâncreas de peneídeos sem sintomas de infecção (GOMEZ-GIL et al., 1998; MENDES et al., 2009; VIEIRA et al., 2009a). Analisando as contagens de víbrios das duas fazendas (A e B), percebe-se que as contagens da primeira coleta foram maiores do que as da segunda. Isso pode estar relacionado a reajustes no manejo, uma vez que os responsáveis técnicos das fazendas tiveram acesso às informações das contagens de Vibrio durante a realização da pesquisa. De acordo com Fonseca e Rocha (2004), a mitigação da entrada de patógenos no cultivo é realizada através da gestão de boas práticas de manejo a fim de se verificar a qualidade da água de abastecimento antes do bombeamento. As contagens padrão em placas (CPP) das unidades formadoras de colônias (UFC) de Vibrio nas amostras de hemolinfa dos camarões das duas fazendas localizadas na região de Aracati encontram-se na Tabela 8. As CPPs de Vibrio na região de Aracati da fazenda C variaram de < 10 a 8,5 x 10³ UFC/mL (Vibrio total); < 10 a 8,5 x 10³ UFC/mL (SAC+) e < 10 (SAC -). Na hemolinfa dos camarões da fazenda D a variação foi de<10 a 1,6x 10³ UFC/mL Vibrio total; de <10 a 1,55 x 103 UFC/mL (SAC+) e de <10 a 7,5 x 10² UFC/mL (SAC-) (Tabela 8). Do número total de camarões analisados (40) nas fazendas de Aracati, 10% (Fazenda C) e 17,5% (Fazenda D) apresentaram víbrios em suas hemolinfas, apesar dos camarões estarem, aparentemente, sadios. 65 Tabela 8- Contagem Padrão em Placas (CPP) de Vibrio total; SAC+ e SAC- por mililitro de hemolinfa obtidas das amostras de camarão Litopenaeus vannamei, cultivado nas fazendas C e D, localizadas no município de Aracati-CE Camarão C10 Fazenda D Contagem de bactérias (UFC/mL) Contagem de bactérias (UFC/mL) Vibrio total 1ª coleta C1 C2 C3 C4 C5 C6 C7 C8 C9 Fazenda C < 10 1,0 x 10² < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 2ª coleta <10 1,0 x 10³ <10 <10 <10 100 5,9 x 10³ <10 8,5 x 10³ <10 SAC+ 1ª coleta < 10 1,0 x 10² < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 2ª coleta <10 1,0 x 10³ <10 <10 <10 100 5,9 x 10³ <10 8,5 x 10³ <10 SAC1ª coleta < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 < 10 2ª coleta <10 <10 <10 <10 <10 <10 <10 <10 <10 <10 Vibrio total 1ª coleta <10 <10 <10 8,0 x 10² <10 <10 <10 <10 50 <10 2ª coleta <10 <10 <10 1,25 x 10² 1,0 x 10² 1,0 x 10² <10 1, 6 x 10³ 1,0 x 10² 1,5 x 10² SAC+ 1ª coleta <10 <10 <10 5 x 10* <10 <10 <10 <10 5 x 10* <10 C – camarão; SAC+ sacarose positiva; SAC- sacarose negativa; * valor estimado; em negrito são os valores máximos e mínimos 2ª coleta <10 <10 <10 8,5 x 10* 1,0 x 10² 1,0 x 10² <10 1,55 x 10³ 1,0 x 10² 1,5 x 10² SAC1ª coleta <10 <10 <10 7,5 x 10² <10 <10 <10 <10 <10 <10 2ª coleta <10 <10 <10 4 x 10* <10 <10 <10 5 x 10* <10 <10 66 As contagens de Vibrio na hemolinfa dos peneídeos na região de Aracati estão de acordo com os resultados de Mendes et al. (2009) em estudo sobre víbrios isolados de camarão e de ambiente de cultivo (água) de três fazendas localizadas em Pernambuco. Os autores encontraram contagens na hemolinfa de camarões aparentemente sadios variando de 1,1 x 10 a 1,2 x 10³ UFC/mL. Na pesquisa de Vieira et al. (2009a) foram encontrados valores entre 10 e 2,8 x104 UFC/mL, no fluido corpóreo de camarões (sadios) cultivados em três fazendas no Estado do Ceará. Apesar do trabalho dos autores ter sido realizado no mesmo Estado e na mesma região, as contagens foram diferentes das obtidas neste estudo. Avaliando os resultados da região de Aracati, observa-se que as maiores contagens de Vibrio foram observadas na fazenda D. Esse fato pode estar relacionado com o aporte de matéria orgânica que a fazenda recebe, uma vez que esta se encontra ao lado da fazenda C. De acordo com Noriega-Orozco et al. (2007) quando as espécies de Vibrio estão presentes no viveiro, é provável que também estejam presentes no camarão. Para Hernánez e Nunes (2001) os efeitos negativos de micro-organismos na carcinicultura culminam com o surgimento de enfermidades. Devido a isso, o controle das epizootias não se restringe ao patógeno, mas estende-se até ao manejo da operação de cultivo. Dessa forma, a carcinicultura pode ser considerada como uma cadeia de elos interligados: o camarão, o ambiente de cultivo e os patógenos. Portanto, o fortalecimento do sistema de produção depende de cada elo que compõe essa cadeia. Ao se comparar os valores das CPPs entre as duas regiões, nota-se que as fazendas A e B apresentaram as maiores cargas bacterianas em relação às fazendas C e D, apesar do período entre as coletas ter sido distante. Vale salientar que os anos de 2011 e 2012 foram caracterizados por fortes estiagens e isso poderia ter contribuído com o aumento da evaporação dos estuários nas regiões. Segundo Soto et al. (2009), os gradientes de temperatura e salinidade podem sofrer oscilações no ambiente, e suas variabilidades podem influenciar a população de Vibrio. Assim, essa diferença entre as coletas pode ter relação com a salinidade, uma vez que, os víbrios são bactérias halofílicas e podem suportar uma ampla variação de salinidade (KASPAR; TAMPLIN, 1993). Essa afirmativa é reforçada por Motes et al. (1998), que relataram que a salinidade é um fator influente para a população de Vibrio. A análise de correlação entre a carga de Vibrio (Vibrio total, SAC+ e SAC-) e o tempo de coagulação da hemolinfa não foi significativa ao nível de 5% nas amostras oriundas das quatro fazendas. Baseada neste resultado, a presente pesquisa não sustenta a assertiva de que o tempo de coagulação é alterado de acordo com a densidade de víbrios na hemolinfa. Segundo Vieira et al. (2009a), o tempo de coagulação não mostra relação direta com a 67 presença de víbrios na hemolinfa, uma vez que, nem sempre o indivíduo que apresenta maior tempo de coagulação possui maior carga de víbrios em sua hemolinfa. Portanto, o tempo de coagulação da hemolinfa torna-se insuficiente para o diagnóstico de sanidade dos animais cultivados (JUSSILA et al., 2001). De acordo com Gopal et al (2005), a quantidade de víbrios pode variar amplamente dentro dos viveiros. No estudo, a elevada contagem encontrada na hemolinfa pode ter sido influenciada pela má qualidade (matéria orgânica) da água e do sedimento, que poderia ter afetado a saúde dos camarões cultivados (aparentemente sadios). Ruangpan, Tabkaew e Sangrungruang (1994) afirmaram que em camarões aparentemente saudáveis é possível encontrar uma biomassa bacteriana na hemolinfa variando entre 10 e 100 UFC/mL. Tomando esse intervalo como padrão, na pesquisa, 45% dos espécimes analisados apresentaram valores de Vibrio elevados, porém, esses indivíduos mostravam-se aparentemente sadios, o que deixa em dúvida sobre a importância do número de víbrios na hemolinfa de peneídeos cultivados. A maioria dos carcinicultores reconhece a importância do gênero Vibrio no ambiente de cultivo, de modo que, a segurança dos níveis viáveis para bactérias heterotróficas cultiváveis e de víbrios são comumente utilizadas como indicadores de saúde ambiental. Contagens de rotina desses grupos na água, no hepatopâncreas e na hemolinfa dos camarões são comuns para o monitoramento da saúde dos animais (LÓPEZ-TORRES, 2002). Além disso, Kannapiran et al. (2009) relataram que a carga bacteriana dentro dos viveiros pode ser controlada através do monitoramento dos parâmetros físico-químicos da água e da aplicação de calcário sobre o sedimento do fundo. Ao analisar os resultados, foi visível a predominância dos víbrios SAC+ entre a população bacteriana presente na microbiota da hemolinfa, nas quatro fazendas. Fato que não foi observado na pesquisa de Rodriguez et al. (2010), pois as espécies de vibrios SAC- foram predominantes em camarões cultivados no México. Segundo esses autores, as condições climáticas do sistema de cultivo seriam determinantes nos grupos que colonizam o fluido corpóreo dos animais. Menezes (2005) ressaltou que é comum os carcinicultores correlacionarem e controlarem as quantidades de víbrios SAC+ e SAC- nos viveiros, a fim de evitar o aparecimento de infecções. Para Vieira et al. (2000) a patogenicidade das bactérias pertencentes ao gênero víbrio é muito variável. Portanto, não é possível afirmar qual espécie de Vibrio é mais ou menos nociva, desde que a habilidade em causar doenças varia dramaticamente dentre as espécies. Assim, vibrios SAC+ e SAC- apresentam o mesmo potencial para causar enfermidades em camarões cultivados. Durante o período da pesquisa não foram registradas elevadas mortalidades nas fazendas estudadas. De acordo com informações do sistema de controle das fazendas, as taxas 68 de sobrevivência no final do cultivo, foram: 82% para a fazenda A; 61% para a fazenda B e 53% para as fazendas C e D. Ao relacionar as contagens de Vibrio na hemolinfa dos camarões com os dados de sobrevivência, observa-se que a fazenda A apresentou a taxa de sobrevivência mais elevada, mesmo sendo a fazenda que apresentou as maiores CPP de Vibrio dentre as quatro estudadas. Para a fazenda B, as contagens de Vibrio apresentaram valores acima de 100 UFC/ mL (RUANGPAN; TABKAEW; SANGRUNGRUANG, 1994), esse fato poderia ter afetado a taxa de sobrevivência. Por outro lado, as fazendas C e D apresentaram as menores taxas de sobrevivência e as cargas bacterianas foram baixas. A observação dos valores das contagens de Vibrio nas fazendas com altos e baixos percentuais de sobrevivência permite que se levante a suposição de que a presença da microbiota desse gênero bacteriano não é único fator determinante para a sobrevivência de camarões cultivados. Outros indicadores de qualidade ambiental (concentração de nutrientes, pH, O2 dissolvido, temperatura e salinidade) podem também influenciar na sanidade animal (SMITH;BROWN; HAUTON, 2003; SOULAP, 1999). As bactérias podem constituir ameaças para os sistemas de larvicultura e engorda de camarões, e as espécies do gênero Vibrio são consideradas as principais responsáveis por um grande número de doenças (BROCK; LEAMASTER, 1992). Na pesquisa, foram isoladas 124 estirpes de Vibrio da hemolinfa dos camarões das duas regiões estudadas, que se mantiveram cultiváveis até o final de todo processo de identificação. Dessas, 82 foram isoladas das fazendas A e B e 42 de C e D. Sobre a identificação fenotípica dos isolados da hemolinfa do camarão, observa-se que 98,8% (81) das estirpes provenientes das fazendas A e B (Acaraú) foram identificadas até espécie. Na região Aracati (C e D) foram isoladas 42 estirpes, sendo que 97,6% (41) foram identificadas até espécie. A diferença entre a quantidade de isolados nas duas regiões (Acaraú e Aracati) pode ser devido à salinidade, como foi relatado anteriormente. Este mesmo comportamento também foi identificado na pesquisa de Lima (2007) e Vieira et al. (2009a), discordando do trabalho de Rocha (2008) que encontrou maior quantidade de Vibrio em amostras ambientais (água e sedimento) na região de Aracati. De acordo com Eiler, Johansson e Bertilsson (2006) e Thongchankaew et al. (2011), as mudanças de salinidade podem influenciar na diversidade de víbrios no ambiente. Este fato foi observado na pesquisa de Prasanthan, Sarathkunar e Ouseph (2011) que verificaram que a salinidade é um dos fatores ambientais que pode contribuir para a multiplicação de víbrios. Em sua pesquisa observaram que a salinidade tem uma correlação significativa negativa em relação ao V. cholerae, ao contrário do V. parahaemolyticus, pois este é um víbrio halofilico que necessita de níves 69 elevados de sal para se desenvolver. Dessa forma, as diferenças de salinidades observadas na água dos viveiros analisados poderiam ter favorecido o maior número de isolados nas fazendas A e B em relação aos de C e D. Análise da carga microbiana de amostras ambientais (água e sedimento) dos viveiros de camarão é importante para a qualidade do cultivo, pois minimiza o surgimento de doenças. Segundo Jayasree, Janakiram e Madhavi (2006), a gravidade da infecção em peneídeos depende da espécie de Vibrio envolvida, do estágio de desenvolvimento do camarão e das condições ambientais. Nas amostras de hemolinfa dos camarões das fazendas A e B foram isoladas 81 cepas e identificadas 16 espécies de víbrios. O maior número de isolados foi identificado como V.alginolyticus, seguido de V. coralliilyticus, V. harveyi, V. parahaemolyticus, V. mimicus, V. litoralis, V.agarivorans; V. navarrensis, V. vulnificus B1, V. ichthyoenteri, V. diazotrophicus, V. natriegens, V. ponticus, V. proteolyticus, V. rumioensis e V. orientalis (Gráfico1). E nas amostras das fazendas C e D foram identificadas seis espécies, com predominância a V. coralliilyticus, seguido de V. cholerae, V. mimicus, V. parahaemolyticus, V. harveyi e V. tasmaniensis (Gráfico 2). 70 Gráfico 1-Espécies de Vibrio identificadas dentre as 81 estirpes isoladas das amostras de hemolinfa dos camarões capturados nas fazendas A e B Gráfico 2- Espécies de Vibrio identificadas dentre as 41 estirpes isoladas das amostras de hemolinfa dos camarões capturados nas fazendas C e D 71 Gopal et al. (2005) analisando a diversidade encontrada em amostras ambientais na Índia isolaram as espécies: V. alginolyticus, V. parahaemolyticus, V. harveyi, V. mimicus, V. vulnificus, V. diazotrophicus, V. proteolyticus e V. orientalis. Os resultados obtidos pelos autores corroboram com a presente pesquisa. Srinivasan e Ramasamy (2009) encontraram as seguintes espécies em camarões doentes cultivados no sul da Índia: V. harveyi, V. parahaemolyticus, V. vulnificus, V. alginolyticus, V. mimicus e V. cholerae. Da mesma maneira, Costa et al. (2010) isolaram Vibrio sp., V. alginolyticus, V. cholerae, V. harveyi, V. mimicus, V. parahaemolyticus e V. vulnificus, em amostras de água do estuário do rio CoreaúCE. De acordo com os autores, o alto número de víbrios presente no estuário poderia ser atribuído à descarga de nutrientes das fazendas de camarão. O frequente isolamento e abundância de espécies de Vibrio nas amostras indicam risco potencial para a carcinicultura na região. Espécies que não estão associadas a eventos de vibrioses em camarões peneídeos foram isoladas na pesquisa, tais como: V. coralliilyticus, V. agarivorans, V. litoralis e V. tasmaniensis. Dentre estas se destaca: V. coralliilyticus, presente na hemolinfa dos camarões das quatro fazendas analisadas. Sua ação prejudicial está associada ao coral Pocillopora damicornis, mas no Brasil, uma estirpe desse vibrião foi isolada em larva do bivalve Nodipecten nodosus, causando patogenia (HAIM; KEREM; ROSENBERG, 2003) e em Artemia (HALDAR et al., 2011). Carvalho (2009) isolou essa espécie da hemolinfa de camarões cultivados em fazendas no Estado do Ceará. Da mesma forma, Menezes (2011) isolou V. coralliilyticus em amostras ambientais de estuários dos rios Pacoti, Choró, Pirangi e Jaguaribe. Não há relatos sobre sua patogenicidade para a Artemia e/ou para camarões cultivados, no entanto, essa espécie estava presente nas quatros fazendas analisadas. Nas fazendas A e B, V. alginolyticus, V. harveyi, V. parahaemolyticus e V. mimicus foram as espécies mais frequentes. E para as fazendas C e D, as espécies foram: V. cholerae, V. parahaemolyticus e V. mimicus (Gráficos 1 e 2). Algumas delas estão associadas a surtos de vibriose em camarões cultivados. V. alginolyticus, por exemplo, é uma espécie reconhecida por causar vibriose em camarões podendo acarretar altas mortalidades em todas as etapas do cultivo (WEI; WENDY, 2012). Essa espécie esteve presente nas amostras de hemolinfa dos camarões capturados nas fazendas A e B (Acaraú) representando 29% dos isolados. Resultados similares foram obtidos por Vieira et al. (2009). Os autores isolaram V. alginolyticus de amostras de hemolinfa de camarões cultivados em quatro fazendas no Estado do Ceará, sendo a estirpe bacteriana mais frequente (26%). Carvalho (2009) também isolou V. alginolyticus em amostras de hemolinfa 72 de camarões provenientes de cultivos nas regiões de Aracati e Acaraú, porém em quantidade bem inferior a encontrada na presente pesquisa. Alguns trabalhos ressaltam a importância de se estudar o comportamento imunológico de camarões peneídeos quando expostos à bactéria V. alginolyticus. Hsieh et al. (2008) verificaram que os parâmetros imunológicos (contagem total de hemócitos, atividade fenoloxidase e explosão respiratória) e parâmetros fisiológicos (glicose, lactato e lipídios) foram alterados após o desafio por V. alginolyticus em camarões Penaeus vannamei. Sarathi et al. (2007) também observaram alterações no tempo de coagulação da hemolinfa em camarões Fenneropenaeus indicus quando expostos ao V. alginolyticus. Li, Yeh e Chen (2010), relataram que camarões L. vannamei climatizados em baixas salinidades e desafiados com V. alginolyticus apresentaram diminuição nos parâmetros imunológicos. Para estes, o cultivo de camarões marinhos deve ser realizado em salinidade elevada e constante para que se possam evitar problemas imunológicos quando os animais forem infectados por algum patógeno, porque, a presença dessa estirpe bacteriana no fluido corpório dos camarões pode resultar na morte do animal. Segundo Austin e Zang (2006) a espécie Vibrio harveyi é um patógeno oportunista de peixes marinhos e invertebrados, especialmente de peneídeos. No camarão está associada com vibriose luminescente. Este vibrião representou 13% dos isolados cultivados da hemolinfa de camarões originários das fazendas A e B e 2% dos isolados das fazendas C e D. Corroborando com a pesquisa, Vieira et al. (2009a) isolaram V. harveyi (13,3%) em amostras de hemolinfa em camarões, aparentemente sadios, cultivados no Estado do Ceará. Diferentemente Jayasree, Janakiram e Madhavi (2008) encontraram V. harveyi (35,7%) em camarões Penaeus monodon doentes. Comparando os trabalhos citados anteriormente com a pesquisa, nota-se que apesar dos camarões analisados estarem aparentemente sadios, continham V. harveyi em suas hemolinfas, portanto, qualquer alteração na biocenose do viveiro poderia afetar o sistema imune desses animais, e assim, ocorrer doenças. De acordo com a pesquisa de Mohajeri et al. (2011), camarões Penaeus semisulcatus submetidos a uma carga microbiana de V. harveyi em 106 e 108 UFC/mL apresentaram alterações nas contagens de hemócitos totais e na concentração de proteína total. Além disso, os autores observaram alterações histopatológicas nas brânquias, necrose no hepatopâncreas e alterações no intestino. Outro fato que favorece o surgimento desta estirpe bacteriana dentro dos cultivos está relacionado com fatores ambientais. No trabalho de Kannapiran et al. (2009) foi ressaltado que as interações das condições físico-químicas do ambiente de cultivo com a densidade de V. harveyi e surtos virais podem afetar os animais cultivados. Segundo os autores, o monitoramento dos parâmetros físico-químicos e da população bacteriana, 73 especialmente V. harveyi, são cruciais para um sistema de aquicultura saudável. Em nossa pesquisa esses parâmetros estavam favoráveis ao cultivo de camarão, como também para o desenvolvimento de bactérias do gênero Vibrio. V. parahaemolyticus foi identificado na hemolinfa dos camarões nas duas regiões estudadas. Na pesquisa, a prevalência de V. parahaemolyticos na hemolinfa foi de 9% (A e B) e 17% (C e D). Aguirre-Guzman et al. (2010) isolaram V. parahaemolyticus em amostras de hepatopâncreas de camarões cultivados no México, mas observaram a ausência desse microorganismo na hemolinfa e no músculo, que pode estar relacionado com as barreiras de defesa do crustáceo. Jayasree, Janakiram e Madhavi (2008) isolaram V. parahaemolyticus (25,5%) em amostras de hemolinfa de camarões doentes Penaeus monodon. Porém, há trabalhos que relatam o isolamento desse vibrião na hemolinfa de camarões sem sintomas de infecção (MENDES et al., 2009; VIEIRA et al., 2009a). Estas pesquisas estão de acordo com o presente estudo, pois os camarões analisados estavam assintomáticos. Além de causar danos no cultivo de camarões marinhos, esse vibrião é um patógeno humano (SU; LIU, 2007). Alguns pesquisadores já relataram a presença dessa estirpe bacteriana em pescados crus. Luan et al. (2008) observaram que das 225 amostras de pescados adquiridos no mercado local de Qingdao (China), 165 foram positivas por estarem contaminadas por V. parahaemolyticus. Aliaga, Miranda e Zevallos (2010) isolaram V. parahaemolyticus sorotipo O3: K6 em amostras de pescados e moluscos bivalves comercializados no mercado de Lima (Peru). Das quinze cepas, três apresentaram fenômeno de Kanagawa positivo indicando a produção de hemolisina termoestável direta (tdh). Da mesma forma, Leal et al. (2008) ao analisarem 18 estirpes de V. parahaemolyticus provenientes de surtos de diarreia no Nordeste do Brasil verificaram que elas apresentavam a hemolisina termoestável direta (tdh). Para os autores, a detecção dessa estirpe com potencial de virulência aponta a necessidade da inclusão deste micro-organismo no monitoramento em laboratórios brasileiros de rotina para sua elucidação e etiologia. Assim, a presença de V. parahaemolyticus em pescados crus ou mal cozidos pode causar danos ao consumidor (SOLOMAKOS; PEXARA; GOVARIS, 2012). Outra espécie de víbrio que está associada à vibriose em camarões cultivados é V. mimicus. Esta espécie foi mais frequente na hemolinfa dos camarões capturados na região Aracati (16,7%) do que em Acaraú (6%). Essa diferença pode estar relacionada à salinidade, pois em provas fenotípicas esse vibrião cresce na ausência de NaCl (NOGUEROLA; BLANCH, 2008). Coadunando com esta pesquisa, Carvalho (2009) e Vieira et al. (2009a) isolaram V. mimicus em amostras de hemolinfa em camarões L. vannamei cultivados no Estado do Ceará. De acordo com Karunasagar, Otta, Karunasagar (1997), este micro- 74 organismo está relacionado com infecções secundárias em camarões Penaeus monodon. Fato observado na pesquisa de Srinivasan e Ramasamy (2009), os quais isolaram V. mimicus (5,78%) de peneídeos, na Índia. Além disso, Chowdhury et al. (1991) relataram que V. mimicus pode ser isolado em grande quantidade no ambiente, incluindo rios e águas salobras, ostras e camarões. Portanto, a presença desse vibrião na hemolinfa de camarões pode ter relação com o ambiente de cultivo. V. cholerae foi identificado somente nas amostras das fazendas C e D. A presença dessa espécie nas fazendas pode também estar relacionada com o ambiente de cultivo e a salinidade. Esse mesmo fato foi verificado na pesquisa de Gonçalves et al. (2004) que comentaram ser a salinidade e o pH favoráveis ao isolamento de V. cholerae em zooplânctons. Porém, outro fator que contribui para o isolamento dessa espécie de Vibrio em camarões está relacionado com a quitina. Segundo Pruzzo, Vezzulli e Colwell (2008), a quitina é um dos polímeros mais abundantes na terra e, possivelmente, o mais abundante no ambiente aquático. A associação da quitina com V. cholerae fornece a esse micro-organismo inúmeras vantagens, incluindo a disponibilidade de alimento, a adaptação em ambientes hostis, a tolerância ao estresse e a proteção contra predadores. Esta estratégia de sobrevivência permitiu a disseminação desse vibrião pelo mundo. Além disso, vale enfatizar que esse vibrião já foi isolado em amostras de hemolinfa de camarão (VIEIRA et al., 2009a; CARVALHO, 2009), como também em camarões cultivados no Sri Lanka (Índia) (JAYASINGHE; AHMED; KARIYAWASAM, 2008). Assim como V. parahaemolyticus, a presença de V. cholerae em camarões cultivados também pode gerar problemas de saúde para o consumidor se este ingerir o pescado cru ou mal cozido. V. parahaemolyticus, V. vulnificus e V. cholerae também foram isolados da hemolinfa dos camarões analisados na pesquisa. Esses micro-organismos são patogênicos ao homem estando associados a gastroenterites (COSTA et al., 2008). Estas estirpes bacterianas foram isoladas em hemolinfa de camarões cultivados, assim como em ambientes de cultivo nas pesquisas de Vieira et al. (2009a); Carvalho (2009) e Costa et al. (2010), respectivamente. Para Gopal et al. (2005) a qualidade bacteriológica do camarão cultivado em águas ricas em víbrios, principalmente V. parahaemolyticus, V. vulnificus e V. cholerae, pode comprometer a saúde humana, pois são reconhecidas por causarem surtos através do consumo de pescados crus. A presença dessas estirpes bacterianas nos cultivos pode também prejudicar a saúde dos arraçoadores, uma vez que eles entram em contato com os animais, água e sedimento do viveiro (MENDES et al., 2009). 75 O controle das enfermidades bacterianas, especialmente as causadas por bactérias do gênero Vibrio, é realizado com o uso de agentes antimicrobianos (SANTIAGO; ESPINOSA; BERMÚDEZ, 2009). Os antimicrobianos são empregados como agentes terapêuticos e profiláticos nos cultivos de camarão (VASEEHARAN; HUSSIAN; CHEN, 2008). Segundo WHO (2006), a resistência aos antimicrobianos induzida pelos cultivos de organismos marinhos não é apenas um problema no tratamento desses animais, mas também uma preocupação de saúde pública. O gráfico 3 e a Tabela 9 apresentam os percentuais de susceptibilidade antimicrobiana das estirpes de Vibrio sp. isoladas da hemolinfa de camarão, frente aos diferentes antimicrobianos testados. Gráfico 3- Percentuais de susceptibilidade antimicrobiana das 124 estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei cultivado nas fazendas A e B(Acaraú) e C e D (Aracati) AMP-Ampicilina; TET-Tetraciclina; OTC-Oxitetraciclina; ATM- Aztreonam; EST-Estreptomicina; ERIEritromicina; GEN-Gentamicina; NAL-Acido Nalidíxico; NIT-Nitrofurantoína;CFL-Cefalotina; CTXCefotaxima; SUT-Sulfazotrim; CIP-Ciprofloxacin; CLO-Cloranfenicol; FLF-Flofenicol. S- sensível, I – Intermediário, R – Resistente. 76 Tabela 9- Distribuição da susceptibilidade antimicrobiana das 124 estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei por classificação química dos fármacos Perfil Classificação química β-lactâmicos Aminoglicosídeos Cloranfenicol Antimicrobianos S I R Ampicilina (AMP) 40 (32,3%) 3 (2,4%) 81 (65,3%) Aztreonam (ATM) 91 (73,4%) 33 (26,6%) 0 67 (54%) 26 (21%) 31 (25%) Cefotaxima (CTX) 122 (98,4%) 2 (1,6%) 0 Estreptomicina (EST) 105 (84,7%) 19 (15,3%) 0 Gentamicina (GEN) 124 (100%) 0 0 Cloranfenicol (CLO) 124 (100%) 0 0 Flofenicol (FLF) 124 (100%) 0 0 11 (8,9%) 90 (72,6%) 23 (18,5%) Cefalotina (CFL) Macrolídeos Eritromicina (ERI) Nitrofurano Nitrofurantoina (NIT) 123 (99,2%) 1 (0,8%) 0 Sulfonamidas Sulfazotrim (SUT) 124 (100%) 0 0 Ácido Nalidíxico (NAL) 123 (99,2%) 1 (0,8%) 0 Ciprofloxacina (CIP) 123 (99,2%) 1 (0,8%) 0 Tetraciclina (TET) 120 (96,8%) 0 4 (3,2%) Oxitetraciclina (OTC) 108 (87,1%) 12 (9,7%) 4 (3,2%) Quinolonas Tetraciclina S-sensível; I- intermediário; R –resistente Das 124 estirpes de Vibrio spp., 35 (28,2%) apresentaram resistência a pelo menos a um dos antimicrobianos testados. Resultados semelhantes foram observados por Manjusha e Sarita (2011) que encontraram 22% de monorresistência em víbrios isolados de amostras ambientais (água) em cultivos de camarão localizados na zona costeira de Kerala, Índia. Outros estudos apresentam valores discordantes da nossa pesquisa. Rebouças et al. (2011) encontraram monorresistência em 61,3% de isolados de Vibrio provenientes de camarões marinhos e de ambiente de carcinicultura nas regiões de Aracati e Acaraú, Ceará. Apesar do trabalho supracitado ter sido realizado na mesma região da presente pesquisa, observa-se que o comportamento das estirpes isoladas foi diferente, pois estas apresentaram valores de monorresistência bem inferiores. Do mesmo modo, Lee et al. (2009) analisaram a diversidade bacteriana em amostras ambientais (água e sedimento de viveiros) e de pós-larvas de Macrobrachium rosenbergii e verificaram que 48,5% dos isolados de Vibrio foram monorresistentes. Kitiyodom et al. (2010) também encontraram resistência a pelo menos um antimicrobiano em 89% das estirpes de Vibrio isolados de camarões Penaeus monodon cultivados na Tailândia. Os resultados de resistência antimicrobiana dos trabalhos citados 77 anteriormente foram maiores quando ao compararmos aos obtidos no presente estudo. Assim, o monitoramento da resistência em estirpes oriundas de ambientes de aquicultura representa uma etapa preliminar na detecção de mudanças na susceptibilidade a antimicrobianos desses patógenos (LAGANÀ et al., 2011). Esse conhecimento é necessário para avaliar o uso correto de alguns antimicrobianos na prevenção da doença, evitando a seleção de micro-organismos resistentes. Para Sotomayor e Balcázar (2003) deve-se reduzir o uso de agentes antimicrobianos, pois além de causar sérios problemas para o ambiente, pode até afetar as importações de camarões devido à presença de resíduos. Os antimicrobianos GEN, NAL, NIT, SXT, CIP, CLO e FLF mostraram-se entre 98% e 100% eficazes contra as estirpes testadas (Gráfico 3 e Tabela 9). Corroborando com a pesquisa, Menezes (2011) ao estudar a resistência antimicrobiana em isolados de Vibrio provenientes de estuários do Estado do Ceará, observou sensibilidade de 100% para os fármacos citados anteriormente. Em contrapartida, Manjusha e Sarita (2011), ao pesquisarem a associação de plasmídios com a resistência antimicrobiana em víbrios provenientes de áreas próximas de carcinicultura na Índia, observaram resistência para os fármacos: GEN (29%), NAL (19%), SXT (29%), CIP (17%) e CLO (13%). Os percentuais de resistência encontrados pelos autores mostram que as estirpes tiveram comportamento diferente dos observados no estudo. Apesar desse perfil de sensibilidade apresentado pelas estirpes analisadas frente aos antimicrobianos NAL, NIT, CIP e CTX, vale ressaltar que estes fármacos mostraram efeito bactericida ou bacteriostático para a grande maioria dos isolados, porém, alguns destes tiveram perfis intermediários para esses agentes e isso pode prejudicar a profilaxia médica humana e veterinária (Gráfico 3, Tabela 9). Os antimicrobianos aos quais os micro-organismos apresentaram resistência foram: AMP, CFL, ERI, TET e OTC (65,3%, 25%, 18,5%, 3,2% e 3,2%, respectivamente) (Gráfico 3 e Tabela 9). Esses resultados estão de acordo com os dados mostrados por Vizcaino et al. (2010) ao testarem a susceptibilidade de estirpes de Vibrio spp. a 26 antimicrobianos e encontrarem resistência aos fármacos: AMP, CFL, ERI, TET e OTC. Igualmente Akinbowale, Peng e Barton (2006) observaram resistência em estirpes de Vibrio spp. frente aos mesmos antimicrobianos utilizados na presente pesquisa. Para Ok et al. (2011), a ocorrência de resíduos de fármacos em ambientes aquáticos e terrestres deve ser vista com bastante atenção, uma vez que esses resíduos são excretados pelos animais. Pouco se sabe sobre o destino e o comportamento desses dejetos no ambiente aquático, assim como não está claro quais organismos são afetados e em que grau esses resíduos podem afetá-los (JORGENSEN; HALLING-SORENSEN, 2000). 78 Ampicilina foi o antimicrobiano ao qual as estirpes apresentaram maior percentual de resistência (65,3%). Costa et al. (2008) encontraram resistência a AMP (50% a 75%) em estirpes de Vibrio isoladas do ambiente e de camarões cultivados no Estado do Ceará. Da mesma forma, Banerjee et al. (2012) também observaram que as espécies de Vibrio isoladas de amostra ambiental (água) e de camarão L. vannamei cultivado na Malásia foram resistentes a AMP (95,2%). De acordo com os autores, este antimicrobiano não é comumente utilizado no cultivo de camarão. Portanto, a aquisição da resistência pelas estirpes pode estar relacionada com a presença de resíduos do fármaco no afluente que é captado para a fazenda. Dessa forma, ocorre uma seleção natural dos micro-organismos, ficando os mais resistentes. Este comportamento está relacionado com a resistência intrínseca. Segundo McDonnell e Russell (1999), esse tipo de resistência frente a agentes antimicrobianos pode ser fornecida por mecanismos que estão relacionados com a natureza e composição da parede celular bacteriana, que pode atuar como uma barreira de permeabilidade, reduzindo assim, a absorção do composto. Além disso, a produção de enzimas pelos micro-organismos pode causar a degradação de um determinado composto, inativando-o. Cefalotina foi o segundo antimicrobiano ao qual as estirpes apresentaram 25% de resistência. Víbrios resistentes a este fármaco foram encontrados nas pesquisas de Ottaviani et al. (2001), Wang et al. (2006) e Laganà et al. (2011). As estirpes de Vibrio isoladas na presente pesquisa foram resistentes a antimicrobianos utilizados na terapêutica médica. Resultado semelhante foi observado no trabalho de Vaseeharan et al. (2005) ao isolarem Vibrio spp. e Aeromonas spp. de camarão Penaeus monodon (pós-larva e juvenis), com resistência a antimicrobianos utilizados na medicina humana, e sensíveis aos fármacos empregados em cultivos de organismos marinhos. Esse comportamento também foi verificado na presente pesquisa, pois além do CFL, as estirpes foram resistentes a AMP e TET utilizados na medicina humana. Contudo, estas também foram resistentes a fármacos utilizados na veterinária, tais como OTC e ERI, drogas permitidas pela Instrução Normativa Nº 42 sendo recomendadas na piscicultura para tratamento de furunculose e da eritrodermatite da carpa. Já em camarões, esses fármacos são utilizados como medida profilática contra o agente da necrose hepatopancreática, bem como nas doenças determinadas por bactérias piscicrófilas na septicemia hemorrágica por Pseudomas, Edwardsiella e Aeromonas (BRASIL, 1999). Eritromicina foi o terceiro antimicrobiano ao qual as estirpes apresentaram resistência (18,5%). Mahbub, Paul e Ahmed (2011) observaram que a ERI foi eficaz (100%) contra as estirpes de Vibrio isoladas da água dos viveiros de camarão em Bangladesh- Índia. O resultado observado pelos autores difere dos achados nesta pesquisa. Valores semelhantes 79 aos encontrados foram obtidos por Wei e Wendy (2012), que observaram 20% de resistência para ERI em V. alginolyticus isolados de camarão (L. vannamei). Já Akinbowale, Peng e Barton (2006) ao testarem a susceptibilidade antimicrobiana de estirpes de Vibrio isoladas de animais de cultivo e do ambiente (água do viveiro) documentaram 34% das cepas resistentes para ERI. Em cultivos do camarão no Sri Lanka e nas Filipinas a ERI é amplamente utilizada (ALDAY et al., 2006). Estas pesquisas reforçam a ideia de Akinbowale, Peng e Barton (2006) de que a resistência de bactérias Gram-negativas a ERI é esperada, pois é de caráter intrínseco, isto é, faz parte da herança genética dos micro-organismos. Vale salientar que a ERI é um fármaco que pode ser utilizado em cultivos de organismos aquáticos no Brasil, de acordo com a Instrução Normativa Nº 42, sendo recomendada, específicamente, para piscicultura (Brasil, 1999). A legalidade dessa medidada pode ter contribuído para a resistência das estirpes a esse fármaco. As estirpes de Vibrio apresentaram o mesmo percentual de resistência para os antimicrobianos TET e OTC (3,2%). Resultados distintos foram relatados por Lee et al. (2009), que observaram resistência de 55,3% (TET) e de 87,2% (OTC) em víbrios isolados de pós-larvas doentes de L. vannamei cultivados na Malásia. Da mesma forma, Rebouças et al. (2011) obtiveram valores de resistência para a classe das tetraciclinas (TET e OTC) em 38,7% dos isolados de Vibrio provenientes de amostras ambientais e de hepatopâncreas de camarão. Os valores detectados nos trabalhos supracitados são elevados em comparação aos da pesquisa. Apesar do valor baixo (3,2%), as estirpes podem passar essa característica de resistência para outros micro-organismos sensíveis e assim torná-los resistentes. Ainda nesse contexto, devido ao seu amplo espectro antibacteriano e elevada potência, OTC é um antimicrobiano utilizado para combater infecções bacterianas na piscicultura, e para o tratamento de vibriose e da necrose hepatopancreática (NHP) na carcinicultura. OTC foi o primeiro fármaco aprovado pela FDA (Food and Drug Administration) para ser utilizado na piscicultura e, nos Estados Unidos, para utilização em lagostas (REED; SIEWICK; SHAH, 2004). No Brasil, de acordo com a Instrução Normativa nº 42, os fármacos TET e OTC são recomendados para camarões contra o agente da NHP (BRASIL, 1999). Ao observar os percentuais de resistência para os antimicrobianos OTC e ERI que são liberados para serem utilizados em cultivos de organismos marinhos, verifica-se que estes valores são baixos em relação a outras pesquisas citadas anteriormente. A utilização de probiótico pelos carcinicultores poderia ter contribuído para a redução do uso de agentes antimicrobianos nos cultivos. De acordo com Ravi et al. (2007), o uso de bactérias probióticas tem sido recomendado em substituição ao uso de antibióticos na aquicultura. Segundo Vieira 80 et al. (2000), as bactérias usadas como probióticos têm potencial para substituir os antimicrobianos, por não poluirem o ambiente, atuando como biocontrole para reduzir a carga de víbrios no hospedeiro e no ambiente de cultivo, possibilitando, assim, um melhor crescimento de pós-larvas de camarão. Essa afirmação foi observada na pesquisa de Rego et al. (2012) os quais ressaltaram que o emprego de probiótico nos cultivos tem grande potencial para substituir o fármaco ERI e outras substâncias químicas como a formalina, trazendo benefícios para a sanidade das pós-larvas, além de seguir princípios de aquicultura responsável. Nas quatro fazendas analisadas, utilizavam-se probióticos e isso poderia estar influenciando nos baixos valores de resistência para estes dois agentes antimicrobianos. Em relação à resistência intermediária, foi observado que 87,9% (109) possuíam esse perfil para os seguintes antimicrobianos: ERI (72,6%), ATM (26,6%), CFL (21%), EST (15,3%), OTC (9,7%), AMP (2,4%), CTX (1,6%), NAL (0,8%), NIT (0,8%) e CIP (0,8%) (Gráfico 3 e Tabela 9). Os dados deste trabalho corroboram com os encontrados por Devi, Surendran e Chakraborty (2009) que ao isolarem V. parahaemolyticus de fazendas de camarão no sudoeste da Índia encontraram resistência intermediária para os fármacos: OTC, CFL, NIT e EST. Por sua vez, Rebouças et al. (2011) verificaram que 47,05% das estirpes de Vibrio apresentaram resistência intermediária para os fármacos: AMP, AMT, CTX, GEN e OTC. Para Maia et al. (2009), os percentuais de resistência intermediária servem de sinais de alerta para uma melhor vigilância quanto ao surgimento de estirpes resistentes; uma vez que, esses antimicrobianos são utilizados tanto na prática humana como na veterinária. Portanto, micro-organismos com resistência intermediária a agentes antimicrobianos podem comprometer o tratamento devido ao fármaco não exercer o efeito satisfatório para o controle da doença (KREMPELS, 2006). A presença de bactérias ambientais com perfis de multirresistência é preocupante, uma vez que os plasmídios-R favorecem a transmissão e disseminação da resistência entre bactérias patogênicas (ZULKIFLI et al., 2009). Na pesquisa, os resultados demonstraram que 41,13% (51) das estirpes apresentaram multirresistência, com cinco perfis distintos (Tabela 10). Costa et al. (2008) encontraram resistência múltipla (41,5%) em V. cholerae isolado da água e do camarão L. vannamei cultivados no Estado do Ceará. O percentual encontrado pelos autores é semelhante aos obtidos na pesquisa. Já Rebouças et al. (2011) observaram multirresistência em 29% dos isolados de Vibrio spp. provenientes da água do viveiro e do hepatopâncreas do camarão apresentando oito marcos de resistência. O percentual encontrado na pesquisa difere dos nossos dados. Outros casos de multiressitencia associados a cultivo de camarões marinhos são relatados em países onde a atividade é bem desenvolvida, como na 81 Austrália (Akinbowale; Peng; Barton, 2006), na Índia (Manjusha; Sarita 2011) e em Bangladesh (Hossain et al., 2012). Segundo Rebouças et al. (2011) a vigilância da resistência e o monitoramento da utilização de fármacos na aquicultura deve ser incentivada a fim de melhorar a gestão dessas drogas para o benefício da saúde pública e da segurança dos alimentos associadas com a atividade. Os perfis das estirpes de Vibrio spp. frente aos 15 antimicrobianos testados e a respectiva frequência de ocorrência de resistência estão contidos na tabela 10. Tabela 10- Perfis de multirresistência das estirpes de Vibrio isolados de hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei cultivado em quatro fazendas no Estado do Ceará Estirpes V. alginolyticus V. corallilyticus V. harveyi V. litoralis V. mimicus V. natriengens V. orientalis V. parahaemolyticus V. proteolyticus V. rumoiensis V. vulnificus B1 Frequência (%) AMP, CFL 10 13 2 1 1 1 AMP, ERI PERFIS AMP, CFL, ERI AMP, OTC,TET, AMP, ERI ,OTC, TET 1 1 3 9 1 1 3 1 1 1 56,86 1 33,33 1,96 5,88 1,96 AMP-Ampicilina; CFL-Cefalotina, ERI - Eritromicina TET-Tetraciclina; OTC-Oxitetraciclina Os perfis de multirresistência dos isolados aos antimicrobianos testados foram diversificados, e os marcos de resistência mais frequentes foram: (AMP, CFL), seguido de (AMP, ERI), (AMP, TET, OTC), (AMP, ERI, TET, OTC) e (AMP, CFL, ERI) (Tabela 10). Marhual, Das e Samal (2012) encontraram oito perfis de multirresistência em cepas de V. alginolyticus e V. parahaemolyticus isolados de P. monodon, e os antimicrobianos mais frequentes nestes marcos de resistência foram: AMP (100% dos perfis); ERI (87,5%) e TET (1,25%). De acordo com os autores a resistência entre as duas espécies é comum. Esses mesmos fármacos estiveram presentes nos perfis encontrados na pesquisa. Rebouças et al. (2011) encontraram multirresistência em víbrios isolados de amostra ambiental (água) e de camarão (hepatopâncreas) em três fazendas localizadas no Estado do Ceará. Para os autores, mais pesquisas deverão ser feitas a fim de esclarecer como a presença de micro-organismos portadores de genes de resistência à droga afeta a incidência de infecção em animais aquáticos e como impacta a saúde humana e à terapêutica antimicrobiana. 82 As maiores frequências de multirresistência foram observadas para as espécies V. corallilyticus (29,41%), V. alginolyticus (25,49%), V. harveyi (21,57%), V. parahaemolyticus (7,84%), V. mimicus (3,92%) e 1,96% para as espécies V. litoralis, V. natriengens, V. orientalis, V. proteolyticus, V. rumoiensis e V.vulnificus B1. Ansari e Raissay (2010) observaram multirresistência para as estirpes: V. parahaemolyticus, V. harveyi, V. cholerae, V. vulnificus e V. orientalis isoladas de lagostas Panulirus homarus capturadas em Hendijan, na costa sul do Irã. Para os autores, a incidência de resistência encontrada em cepas bacterianas isoladas de lagosta pode estar relacionada à utilização excessiva desses fármacos como uso profilático em fazendas de camarão. Isso mostra que o uso dessas drogas nos cultivos pode afetar a microbiota de outros animais aquáticos, tornando-a resistente, uma vez que as fazendas lançam seus efluentes nos rios ou estuários adjacentes. Da mesma forma, Carneiro et al. (2007) ao pesquisarem o perfil de susceptibilidade de 115 isolados de Vibrio spp. provenientes de ambiente de cultivo de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus), observaram que 20 espécies de Vibrio (17,39%) apresentaram perfis de multirresistência. De acordo com os autores, o uso de um ou mais antimicrobianos em atividades aquícolas pode ser um veículo para o surgimento de estirpes ambientais multirresistentes. O índice de resistência (IRA) das amostras variou de 0,0005 (fazendas C e D) a 0,04 (fazendas A e B). Esses valores sugerem que os isolados bacterianos podem ser veículos de propagação de resistência em ambientes aquáticos. A variação de múltipla resistência (MRA) entre as estirpes foi 0,13 a 0,2. Esses valores levam a supor que a multirresistência entre micro-organismos ambientais está relacionada com elementos genéticos móveis. Melo et al. (2011) encontraram valores de MRA entre 0,14 e 0,29 em V. parahaemolyticus isolados de camarões L. vannamei cultivados e comercializados no Estado do Rio Grande do Norte. Segundo os autores, a presença da multirresistência pode ser um indicativo de risco de propagação dessa característica para toda a cadeia alimentar. Diferentemente, Zulkifli et al. (2009) ao isolarem V. parahaemolyticus de molusco da família Cardiidae encontraram valores de MRA entre 0,31 e 0,69, superiores aos observados na pesquisa. De acordo com Lee et al. (2009) MRA menor ou igual a 0,2 é indicativo de que os antimicrobianos raramente ou nunca foram utilizados para o tratamentos de animais, enquanto que, superior a 0,2 é considerado um sinal de que os animais tiveram contato com esses agentes antimicrobianos, sendo um risco para a saúde humana. A grande maioria dos isolados (98,4%) apresentou valor de MRA ≤0,2. Esse fato pode ser um indício de que esses fármacos não são administrados no tratamento dos animais, e que a resistência apresentada pelas estirpes, frente às drogas AMP e CFL, deve ser atribuída a outra fonte de contaminação. 83 Na carcinicultura, a via de administração de antimicrobianos é oral, utilizando a ração que é dada como alimento ao animal (SANTIAGO; ESPINOSA; BERMÚDEZ, 2009). A determinação da sensibilidade dos micro-organismos para os agentes antimicrobianos pode ser realizada de várias maneiras. Esse procedimento baseia-se na inoculação da bactéria em meio de cultura contendo um ou mais fármacos na concentração que impeça seu crescimento (MOTA, 1996). A unidade de medida utilizada para este fim é denominada de concentração inibitória mínima (CIM). Os valores de CIM dos isolados de Vibrio aos fármacos: AMP, CFL, ERI e OTC estão apresentados na tabela 11. A CIM para AMP variou de 80 a 160 µg/L; para CFL foi de 32 a 512 µg/L; para ERI de 64 a 256 µg/L e para OTC foi de 128 µg/L (Tabela 11). Tabela 11- Concentração inibitória mínima (CIM) das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarão cultivado, Litopenaeus vannamei, para os fármacos: ampicilina, cefalotina, eritromicina e oxitetraciclina Código V1 V2 V3 V4 V5 V6 V7 V8 V9 V10 V11 V12 V13 V14 V15 V16 V17 V18 V19 V20 V21 V22 V23 V24 V25 Origem Estirpe V. alginolyticus V. harveyi V. corallilyticus V. vulnificus B1 Acaraú (FA) V. rumioensis V. proteolyticus V. corallilyticus V. alginolyticus V. harveyi V. natriengens V. corallilyticus V. corallilyticus V. alginolyticus V. litoralis V.orientalis Acaraú (FB) V. alginolyticus V. corallilyticus V. harveyi V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. mimicus V. alginolyticus Aracati (FD) V. mimicus V. parahaemolyticus AMP 160 80 160 80 80 160 80 160 160 160 80 160 80 160 160 160 80 80 80 80 80 80 80 80 80 CIM (µg/mL) CFL ERI OTC 128 * * 64 * * 64 * * * 64 * * * 128 64 * * * 64 128 * 128 * * 256 * 128 * * * * 128 128 * * 64 * * 64 * * * * 128 * 64 * 512 * * * 64 * 32 64 * * 64 * * 256 * * 256 * 64 * * 64 * * 64 * * AMP – ampicilina; CFL – cefalotina; ERI – eritromicina; OTC – oxitetraciclina. * fármaco não foi testato porque o isolado não apresentou resistência. 84 Em relação a AMP, valores semelhantes foram apontados por Vaseeharan et al. (2005) que encontraram médias de CIM para AMP de 127,82 e 164,18 µg/mL em Vibrio e em Aeromonas isolados de P. monodon. Na pesquisa de Akinbowale, Peng e Barton (2006), ao isolarem bactérias Gram-negativas e positivas de várias espécies aquícolas e de amostras ambientais, o valor de CIM para AMP foi de ≥ 128 µg/mL. Zanetti et al. (2001) observaram CIM de AMP para V. algynolyticus, V. parahaemolyticus e V. vulnificus igual a 256 µg/mL. O valor observado pelos autores foi mais elevado do que os encontrados na pesquisa. No trabalho realizado por Zhang, Li e Sun (2011) foi comentado que a elevada resistência dos isolados para AMP foi devido ao uso desse fármaco nas fazendas de camarão no início da década de 1980 e em meados da década de 1990, em Donghai, China. Por essa observação feita pelos autores supõe-se que a resistência para esse fármaco possa estar relacionada com a presença de resíduos do antimicrobiano no ambiente. Fato que poderia ter relação com a alta resistência das estirpes isoladas na pesquisa frente a AMP, pois de alguma forma estas cepas poderiam ter entrado em contato com o fármaco no ambiente. Segundo Le, Munekage e Kato (2005), os resíduos de antimicrobianos na água e no sedimento podem favorecer o desenvolvimento de micro-organismos resistentes. Ainda neste contexto, concentrações de AMP compreendidas entre 20 e 80 µg/mL foram detectadas no efluente de um hospital alemão (KÜMMERER; HENNINGER, 2003). Essas concentrações foram detectadas em ambiente hospitalar e os valores foram inferiores aos da pesquisa. Durante o período do estudo, não foi pesquisada a presença de efluentes hospitalares nas águas das regiões analisadas, mas a ocorrência de estirpes de Vibrio com resistência a AMP poderia ter relação com a presença de resíduos desse fármaco no ambiente, o que favoreceria uma alteração no DNA desses micro-organismos tornando-os resistentes. Dessa forma, a resistência a agentes antimicrobianos é vista como um problema ecológico. Pouco se sabe sobre os efeitos das concentrações inibitórias de antimicrobiano sobre bactérias ambientais (KÜMMERER, 2004). Cefalotina é um antimicrobiano bastante utilizado na terapêutica humana (TAVARES, 2009). Segundo Petroni et al. (2002) CFL é empregado no tratamento do cólera na Argentina. Os autores testaram a eficiência desse fármaco em quatro isolados clínicos de V. cholerae O1 El Tor e obtiveram valores de CIM variando de 32 a 512 µg/mL. Apesar desses dados corresponderem às estirpes clínicas, os resultados foram semelhantes aos encontrados na pesquisa, levantando uma questão muito importante sobre a resistência em estirpes ambientais para fármacos utilizados na terapêutica médica. Dessa forma, estirpes ambientais com resistência para a CFL podem trazer prejuízos para a saúde pública. Fato verificado na pesquisa de Parry (2006), que ao isolar Aeromonas salmonicida no salmão do 85 Atlântico Salmo salar observou resistência para CFL com CIM superior a 16 µg/mL. Outrossim, Huang et al. (2012), ao estudarem a susceptibilidade antimicrobiana em bactérias heterotróficas cultiváveis isoladas de uma estação de tratamento de água na China, encontraram valor de CIM para CFL de 32µg/mL; enquanto, em cinco isolados identificados no trabalho (Aeromonas, Enterobacter, Escherichia (ou Shigella) e Klebsiella) esse valor variou de 2 a > 1024 µg/mL. Para os autores, a presença de bactérias resistentes nos efluentes de águas naturais pode representar um problema de poluição secundária. De acordo com Baquero, Martínez e Cantón (2008), a água não só constitui uma forma de difusão de microorganismos resistentes para a microbiota humana e animal, mas também é uma via pela qual os genes de resistência são introduzidos nos ecossistemas naturais. Dessa maneira, a água utilizada nos cultivos de organismos marinhos pode favorecer a disseminação da resistência nos micro-organismos presentes nesses locais. Em relação a ERI, esse fármaco é utilizado em cultivos de peixes de acordo com a legislação (BRASIL, 1999). Jatobá et al. (2012) ao isolarem V. cholerae das vísceras de acará disco (Symphysodon discus) e neon arco-íris (Melanotaenia praecox) encontraram valores de CIM para ERI variando de 7,81 a 125 µg/mL. No Vietnã foram detectados resíduos de ERI nos rios e canais urbanos e rurais em concentrações de 0,007 a 0,36 µg/mL (MANAGAKI et al., 2007). Os valores encontrados nas pesquisas mencionadas são inferiores aos do presente estudo. Por outro lado, resultados análogos aos nossos foram encontrados por Neela, Nonaka e Suzuk (2007) que verificaram resistênca cruzada em víbrios isolados de amostras ambientais (sedimento e águas) oriundas de áreas próximas de cultivo no Japão e constataram valores de CIM para ERI variando de 0,064 a >256 µg/mL. Dessa forma, as concentrações apresentadas pelas estirpes podem ser um sinal de que esse fármaco pode estar sendo utilizado no cultivo; ou a presença de resíduos no ambiente poderia ter favorecido a resistência dos isolados. De acordo com Thuy, Nga e Loan (2011), a presença de resíduos de ERI nos sistemas aquáticos pode contribuir para a disseminação da resistência. Segundo os autores, a ERI é classificada como poluente, trazendo impactos negativos para o ambiente. Além disso, a ERI é utilizada na ração de animais e por essa razão, pode acarretar o desenvolvimento de bactérias resistentes, capazes de transferir genes de resistência para patógenos humanos (KIM et al., 2004). Oxitetraciclina é muito utilizado contra infecções bacterianas em cultivos de camarão (REED; SIEWICK; SHAH, 2004). A utilização dessa droga foi vista na pesquisa de Roque et al. (2001) que, ao isolarem 144 víbrios provenientes de camarões doentes (juvenis e adultos) cultivados no México encontraram valor médio de CIM para OTC de 304 µg/mL, 86 com variação de 0,26 a 1064 µg/mL. Outrossim, Rebouças et al. (2011) detectaram concentração de até 400 µg/mL em víbrios isolados de amostras ambientais e de camarão (hepatopâncreas). Apesar de quatro estirpes isoladas no estudo apresentarem valores de CIM baixos em relação aos trabalhos anteriormente citados, isso mostra que resíduos desse fármaco podem estar no ambiente, ocorrendo assim a seleção de estirpes resistentes. Para Pereira Júnior et al. (2006) o uso contínuo de OTC pode selecionar micro-organismos, tornando-os resistentes e com isso, o tratamento terapêutico nos cultivos pode ficar prejudicado. Além disso, a utilização da OTC na ração pode comprometer a qualidade do produto e, consequentemente, a saúde do consumidor. Na pesquisa de Gómez-Jimenez et al. (2008) ao alimentarem camarões com ração contendo OTC por quatorze dias, seguido de alimentação sem o antimicrobiano por igual período, detectaram resíduos desse fármaco nos tecidos dos animais e na hemolinfa após o tempo sem o agente. As concentrações de OTC foram de: 33,54 ± 11,19 µg/g (músculo), 194,37 ± 16,11 µg/g (hepatopâncreas) e 18,79 ± 5,87 µg/mL (hemolinfa). Segundo os autores, OTC somente foi detectado no hepatopâncreas, dois dias após o início da administração, enquanto que no músculo e na hemolinfa esse tempo foi extendido para oito dias. Para Lavorante et al. (2009) o acúmulo de resíduos de OTC, quando administrado na ração, é maior na carapaça de camarões (de 10 a 13 dias) em relação ao músculo (5 dias). Brunton (2006) relata que a presença de OTC nos tecidos dos animais pode gerar efeitos tóxicos nos humanos, incluindo: irritações gastrintestinais, pancreatite, diarreia, alterações no fígado e rins, escurecimento dos dentes e deposição nos ossos, porém raramente há relatos de reação alérgica para esse fármaco. Vale ressaltar que os antimicrobianos, pertencentes a família das Tetraciclinas, em relação ao tempo de meia vida (t1/2) no organismo, podem ser divididas em: tetraciclinas de ação curta, média e longa. Assim, clortetraciclina, oxitetraciclina e tetraciclina são drogas de ação curta com um tempo de meia vida igual a 6, 8 e 9 h, respectivamente. A presença e resíduos desse fármaco nos tecidos de animais cultivados pode ter relação com a composição química dessas estruturas (PEREIRAMAIA et al., 2010). Portanto, o monitoramento dos resíduos de antimicrobianos no ambiente de cultivo e nos animais é de extrema importância para se estabelecer leis que limitem a concentração dessas drogas no ambiente e nos tecidos de animais destinados ao consumo humano. Na Tabela 12 estão apresentados os resultados obtidos pelo processo de “cura” plasmidial para os isolados de Vibrio provenientes da hemolinfa de camarão L. vannamei. 87 Tabela 12 – Resultado do teste de “cura” de plasmídio em estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarão Litopenaeus vannamei Código V1 V2 V3 V4 V5 V6 Origem Acaraú/FA Estirpes V. alginolyticus V. harveyi V. corallilyticus V. vulnificus B1 V.rumioensis V. proteolyticus V7 V. corallilyticus V8 V9 V10 V11 V12 V13 V14 V15 V16 V17 V18 V19 V20 V21 V22 V23 V24 V25 V. alginolyticus V. harveyi V. natriengens V. corallilyticus V. corallilyticus V. alginolyticus V. litoralis V.orientalis V. alginolyticus V. corallilyticus V. harveyi V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. mimicus V. alginolyticus V. mimicus V. parahaemolyticus Acaraú/FB Aracati/FD PERFIL Antes da “cura” Após a “cura” AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, ERI AMP, ERIi AMP, TET, OTC AMP, TET, OTC AMP, CFL AMP, CFL AMP, ERI, TET, AMP, ERIi TET, OTC OTC AMP, ERI AMP, ERIi AMP, ERI AMP, ERIi AMP, CFL AMP, CFL AMP, TET, OTC AMP, TET, OTC AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, TET, OTC AMP, TET, OTC AMP, ERI AMP, ERIi AMP, CFL AMP, CFL AMP, ERI AMP, ERIi AMP, CFL*, ERI AMP, ERIi AMP, CFL AMP, CFLi AMP, ERI AMP, ERIi AMP, ERI AMP, ERIi AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL* AMP AMP, CFL* AMP AMP – ampicilina; CFL – cefalotina; ERI – eritromicina; OTC – oxitetraciclina. i - intermediário *isolado perdeu a resistência para o fármaco. Analisando a Tabela 12, observa-se desigualdades entre os perfis dos isolados. Nota-se que a mesma estirpe oriunda da mesma localidade apresentou diferentes marcos de resistência. Essa afirmação é verificada nos isolados da fazenda A (V1, V3, V7 e V8) e na fazenda B (V11, V12, V13, V16, V19, V20 e V21). Comportamento semelhante foi verificado na pesquisa de Rebouças et al. (2011) que encontraram perfis distintos em víbrios oriundos da água do viveiro e do hepatopâncreas de camarões provenientes de três fazendas de cultivo, próximas aos rios Coreaú, Acaraú e Jaguaribe. Outras pesquisas relataram a diferença de perfis de resistência em isolados provenientes de atividades de carcinicultura. Vieira et al. (2010a) ao isolarem Escherichia coli de amostras ambientais (água e sedimento) e do músculo de camarão, observaram perfis distintos entre as estirpes. Da mesma forma, Carvalho et al. (2009) que verificaram diferença nos perfis de resistência em Salmonella isoladas de amostras ambientais e do músculo do camarão oriundas de três fazendas no 88 Estado do Ceará. Considerando o rápido crescimento e a importância da indústria de aquicultura em muitas regiões do mundo, o uso intensivo, e muitas vezes não regulamentado de agentes antimicrobianos na área de produção animal, resulta no aumento e na disseminação de resistência antimicrobiana nas áreas de cultivo. Então esforços são necessários no sentido de se adotar medidas mitigatórias de gestão e/ou o controle regulatório do uso de antimicrobianos. Além disso, a cooperação internacional (FAO, OIE e WHO) é necessária para apoiar e ajudar os países em desenvolvimento na capacitação e implementação de medidas preventivas (HEUER et al., 2009). No que concerne à “cura” de plasmídios, observa-se que em 52% (13) dos isolados não ocorreu alteração nos perfis de resistência após esse processo, sugerindo que a resistência apresentada pelas estirpes deva ser potencialmente cromossômica. Contraria a pesquisa de Molina-Aja et al. (2002) observaram que 80% da resistência nas estirpes de Vibrio estavam relacionadas com plasmídios. Entretanto, Mahbub, Paul e Ahmed (2011) isolaram 15 estirpes de víbrios de amostras ambientais de cultivos de camarão em Bangladesh e observaram que apenas três continham plasmídios de resistência, isto é, em 80% dos isolados a resistência foi potencialmente cromossômica, corroborando com a pesquisa, Manivasagan et al. (2010) verificaram resistência antimicrobiana e perfis plasmidiais em isolados de Vibrio, em áreas de mangue do sudeste da Índia e observaram que 77% das estirpes foram desprovidas de plasmídios, sendo resistentes a todos os antimicrobianos testados. De acordo com os autores, essa observação indica que a resistência a esses fármacos seja cromossômica. Após o tratamento de “cura”, observou-se que dez estirpes (V4, V7, V8, V9, V16, V18, V19, V20, V21 e V22) isoladas de amostras coletadas nas fazendas A e B apresentaram alterações nos perfis, passando de resistentes a intermediárias (Tabela 12). Esta mudança no perfil poderia ser decorrente de plasmídios que não foram eliminados após o tratamento. Ainda neste contexto, três estirpes (12%) (V19, V24 e V25) uma isolada da fazenda B e duas da fazenda D perderam a característica de resistência para o fármaco CFL. A característica de resistência para esse fármaco nas duas estirpes pode ser referente a plasmídio, pois após o tratamento de “cura” esse marco de resistência foi perdido (Tabela 12). Manivasagan et al. (2010) observaram a partir da extração plasmídial, que 13 dos isolados de Vibrio tiveram seus perfis de resistência relacionados com plasmídios. Molina-Aja et al. (2002) observaram que as estirpes de Vibrio isoladas de camarões paneideos tiveram seus perfis de resistência alterados após o tratamento de “cura” dos plasmídios. Na pesquisa de Hofer et al. (1999) foi comprovada que a resistência múltipla em V. cholerae estava relacionada com plasmidios. 89 Segundo Hazen et al. (2007) os plasmídios são fundamentais para trocas genéticas entre diversas estirpes de Vibrio spp.. Zhang, Wang e Gu (2006) afirmaram que a frequência de plasmídios em víbrios representa uma forma de sobrevivência no meio ambiente, essa estratégia facilita a disseminação da resistência entre os micro-organismos. A resistência a AMP apresentada em todos os isolados não foi alterada após o tratamento de “cura”, levando a supor que essa característica pode estar inserida no cromossomo. Esse mesmo comportamento foi observado na pesquisa de Devi, Surendran e Chakraborty (2009), uma vez que, após a “cura” do plasmídio os isolados de V. parahaemolyticus não perderam a resistência para AMP. Para Molina-Aja et al. (2002) a resistência em β-lactâmicos está disseminada nos víbrios, independentemente da fonte de isolamento. Wang et al. (2006), relataram que há necessidade de um estudo mais aprofundado sobre o perfil de resistência e ecologia de plasmídios em víbrios ambientais para se entender as trocas genéticas entre bactérias Gram-negativas. Assim, a presença de elementos genéticos móveis é um pré-requisito para o desenvolvimento de projetos que busquem minimizar os impactos gerados por micro-organismos resistentes no ambiente (BENNETT, 2008). Em relação a ERI, observa-se que nove estirpes tiveram seus perfis alterados depois do tratamento de “cura” de plasmídios, ficando intermerdiários (Tabela 12). Prabhu, Pandian e Vasan (2007) observaram que estirpes de V. cholerae provenientes de amostras clínicas e ambientais perderam a resistência à ERI após o tratamento, tornando-as sensíveis. Para Tavares (2009) a resistência adquirida para ERI pode ser resultado de mutações cromossômicas ou da aquisição de plasmídios, pois o principal mecanismo bioquímico para esta resistência consiste em modificações na unidade 50S do ribossomo bacteriano, de tal forma que o fármaco não é capaz de se ligar ao seu receptor e alterar a síntese proteica. Essa afirmação nos sugere que a resistência para ERI pode estar relacionada à aquisição de plasmídios-R. De acordo com Manjusha e Sarita (2011), os plasmídios são facilmente transferíveis de bactéria para bactéria, porém as cepas ambientais podem sofrer alterações bruscas nos plasmídios mudando assim o seu padrão de resistência. Outro elemento genético que vem contribuindo para a disseminação da resistência são os integrons. Sua presença, principalmente os pertencentes a classe 1, em bactérias ambientais tem chamado atenção da comunidade científica. Esta classe é a mais estudada em relação às outras já descritas (COLLIS et al., 2001; COLLIS et al., 2002). De acordo com Gillings et al. (2008), os integrons da classe 1 são vetores importantes na propagação da resistência a antimicrobianos. Sua presença em diferentes nichos ecológicos pode contribuir para a transferência de resistência antimicrobiana entre 90 estirpes ambientais. Geralmente, estes elementos estão organizados em dois tipos: o primeiro está relacionado ao cromossomo bacteriano e se limita a linhagens de bactérias específicas; o segundo tipo está associado aos elementos genéticos móveis (plasmídios), podendo ser encontrado em diversos micro-organismos. Integrons de classe 1 é um dos principais contribuintes para o problema da resistência em micro-organismos ambientais, e por conseguinte, um grande problema ecológico (STOKES et al., 2006). Na Tabela 13 estão apresentados os resultados da presença de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no cromossomo bacteriano das estirpes de Vibrio isoladas da hemolinfa de camarões L. vannamei. A Figura 7 mostra a composição e a organização dos integrons de classe 1 no cromossomo bacteriano. 91 Tabela 13 - Perfil de resistência a antimicrobianos e detecção de genes de integrons de classe 1 e cassetes no cromossomo de estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarões marinhos Litopenaeus vannamei Código V1 V2 V3 V4 V5 V6 V7 V8 V9 V10 V11 V12 V13 V14 V15 V16 V17 V18 V19 V20 V21 V22 V23 V24 V25 Origem Acaraú/ FA Acaraú/ FB Aracati/ FD Espécie V. alginolyticus V. harveyi V. corallilyticus V. vulnificus B1 V. rumioensis V. proteolyticus V. corallilyticus V. alginolyticus V. harveyi V. natriengens V. corallilyticus V. corallilyticus V. alginolyticus V. litoralis V. orientalis V. alginolyticus V.corallilyticus V. harveyi V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. parahaemolyticus V. mimicus V. alginolyticus V. mimicus V. parahaemolyticus Perfil AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, ERI AMP, TET, OTC AMP, CFL AMP, ERI, TET, OTC AMP, ERI AMP, ERI AMP, CFL AMP, TET, OTC AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL AMP, TET, OTC AMP, ERI AMP, CFL AMP, ERI AMP, CFL, ERI AMP, CFL AMP, ERI AMP, ERI AMP, CFL AMP, CFL AMP, CFL № de cópias do gene intI1 3 2 6 2 1 2 6 6 Tamanho (bp) do produtos do PCR amplicons in-F e in-B 1650, 1000, 400, 300 3000, 2500, 1200, 650, 400 1200, 500 2000, 1200, 750, 400 2000, 750, 300 2500 - №de cópias da região 3’CS Presença do gene cassete blaP1 2 2 1 + + 2 1 + AMP – ampicilina; CFL – cefalotina; ERI – eritromicina; intI1: gene que codifica a integrase de classe 1; 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio); blaP1 (resistência para β-lactâmico) 92 Figura 7 – Esquema da estrutura de integrons de classe 1 com os respectivos genes cassetes detectados no cromossomo de Vibrio spp. isolados da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei. Legenda: intI1: gene que codifica a integrase de classe 1; 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio); blaP1 (resistência para βlactâmico). Fonte: Autoria própria A partir da extração do DNA total das 25 estirpes de Vibrio com perfil de resistência múltipla, 32% (8) dos isolados apresentaram a enzima integrase pertencente a integrons de classe 1 (Tabela 13). Vale salientar que as estirpes que apresentaram essa classe mostraram marcos de resistência semelhantes. Os isolados V6, V10, V12, V13 e V17 mantiveram os marcos de resistência após o tratamento de “cura” do plasmídio, indicando que essa resistência pode estar potencialmente relacionada ao cromossomo. As estirpes V19, V24 e V25 mantiveram a resistência a AMP após o tratamento de cura, mas perderam a resistência frente a CFL devido a ação do agente mutagênico. Segundo Fluit e Schmitz (2004), os integrons podem ser encontrados no cromossomo, mas também são encontrados em plasmídios e transposons. Dalsgaard et al. (2001) identificaram integrons pertencentes à classe 1 em V. cholerae isolados de casos clínicos da África do Sul e Moçambique tanto no cromossomo como em plasmídios, respectivamente. De acordo com Labbate et al. (2007), estirpes de V. cholerae podem conter integrons localizados no cromossomo, com a função de integrar genes cassetes por recombinação sítio-específica. Outras bactérias entéricas também podem carrear integrons no cromossomo. Khan et al. (2009) identificaram integrons de classe 1 em Salmonella isoladas de pescados. Da mesma forma, Wen et al. (2012) detectaram esses integrons em Shigella flexneri isolados de pacientes do hospital Jinan (China). De acordo com Wu et al. (2012), a ampla distribuição de integrons em bactérias Gram-negativas pode representar uma ameaça para as terapias antimicrobianas. Além disso, estudar integrons e seus genes cassetes associados à classe 1 pode fornecer informações sobre as mudanças evolutivas desses genes o que poderia auxiliar na orientação do tratamento terapêutico. 93 Em relação ao percentual de estirpes que apresentaram integrons de classe 1 (gene intI1), Sá et al. (2010) observaram que 5,5% dos V. cholerae não tipados provenientes de amostras de água do rio Amazonas apresentaram o gene intI1. Porém, nesta mesma pesquisa, os autores encontraram essa estrutura em 33,3% (V. cholerae) dos isolados clínicos. Apesar do trabalho supracitado está relacionado com uma espécie de Vibrio, vale ressaltar que o percentual de integrons de classe 1 encontrado pelos autores está condizente aos valores obtidos para as espécies isoladas do presente estudo. De acordo com Martinez-Freijo et al. (1998), integrons pertencentes à classe 1 estão, frequentemente, associados com bactérias clínicas. Essa afirmação contradiz os dados obtidos neste estudo, pois os víbrios isolados da hemolinfa de camarões cultivados apresentaram integrons de classe 1. Outros trabalhos relatam a presença de integrons de classe 1 em isolados ambientais. Mukherjee e Chakraborty (2006) relacionaram a múltipla resistência com a presença de integrons de classe 1 em bactérias Gram-negativas isoladas da água do rio Torsa, na Índia. Da mesma forma, Kitiyodom et al. (2010), ao isolarem 83 estirpes de Vibrio de camarões Penaeus monodon, encontraram integrons de classe 1 em 9,6 % das estirpes. Para os autores, a presença de estirpes ambientais multirresistentes abrigando elementos genéticos transferíveis pode promover a disseminação da resistência entre as estirpes de Vibrio spp. e para outros microorganismos aquáticos. As estirpes que apresentaram a enzima integrase pertencente à integrons de classe 1 localizados no cromossomo foram: V6 (FA), V10, V12, V13, V17 (FC) e V24, V25 (FD) (Tabela 13). Ceccarelli et al. (2006) relataram a presença de integrons de resistência localizados no cromossomo em cepas patogênicas de V. cholerae O1 multirresistentes. Para os autores, a presença desse elemento genético é uma característica comum entre os isolados de V. cholerae. Apesar deste fato observado pelos autores acontecer entre estirpes clínicas, nossos resultados mostraram que isolados ambientais também podem conter integrons no cromossomo bacteriano. Outro fato verificado na presente pesquisa é a diversidade de espécies que carreiam a enzima integrase de classe 1. Essa característica foi verificada em diversas estirpes ambientais de diferentes fontes, tais como: V. parahaemolyticus isolados de água de diversas regiões no Chile (DAUROS et al., 2011), V. cholerae e V. fluvialis provenientes de camarões P. monodon (KITIYODOM et al., 2010), Vibrio spp. associados a corais (KOENIG et al., 2011), Vibrio spp. isolados de águas residuais, água doce, água do mar, esgoto e de área de pesca (TAVIANI et al., 2008). Portanto, a presença de estirpes ambientais contendo integrons de classe 1 pode gerar problemas na terapêutica veterinária, 94 pois estas não serão inibidas pelo agente antimicrobiano, já que essa classe é conhecida por carrear uma infinidade de genes de resistência a fármacos. As estirpes V1 a V6 apresentaram amplicons referentes aos genes da região inF/in-B com tamanhos variando de 300 a 3.000 pares de bases (pb) (Tabela 13). Shi et al. (2006) observaram que a região variável em isolados de V. cholerae foi entre 700 a 1.250 pb. Dalsgaard et al. (2000) obtiveram produtos de PCR referentes a amplificação dos genes inF/in-B da região variável com tamanhos de 739 a 1.237 pb em isolados clínicos e ambientais de V. cholerae provenientes da Tailândia. Como também Rajpara et al. (2009) observaram que estirpes de V. fluvialis apresentaram tamanho dos amplicons referentes aos iniciadores inF/in-B variando de 400 a 4.000 pb. Ao analisar os resultados obtidos nas pesquisas citadas anteriormente, verifica-se que estão de acordo com os dados obtidos no estudo. Segundo Bennett (2008), o tamanho dos amplicons da zona conservada está relacionado com o número de genes cassetes que contém o integron. Portanto, a detecção dessa zona em microorganismos utilizando iniciadores específicos, mostra onde os genes de resistência a antibióticos estariam localizados (SHI et al., 2006). Na pesquisa foi verificada a presença da zona variável sem os genes que compõem a estrutura do integron nas estirpes V1, V3 e V4 (Tabela 13). Esse mesmo comportamento foi verificado na pesquisa de Lévesque et al. (1995), em Pseudomonas fluorescens, P. aeruginosa e Escherichia coli orindos de amostras clínicas. Rosser e Young (1999) ao caracterizarem integrons pertencentes à classe 1 em bactérias Gram-negativas isoladas de amostras de água do estuário do rio Tay (Escócia), observaram ausência de genes cassetes integrados na região variável. De acordo com Di Conza e Gutkind (2010), alguns integrons não estão só envolvidos na aquisição ou expulsão de genes cassetes, e sua expressão têm sido também associadas com outros elementos envolvidos no recrutamento (e, por vezes, na expressão) de genes de resistência que não estão sob a forma de cassetes. A presença de integrons de classe 1 sem genes cassetes foi verificada nas estirpes V6 (FA) e V12 (FB) (estrutura A, Figura 7). Sá et al. (2010) encontraram integrons de classe 1 vazios em V. cholerae provenientes de amostras clínicas e ambientais da região Amazônica. Fato semelhante também foi verificado no estudo de Kitiyodom et al. (2010) que observaram que as estirpes V. cholerae e V. fluvalis provenientes de camarões P. monodon apresentaram integrons de classe 1 sem genes cassetes. De acordo com a literatura, essa estrutura é comum em estirpes ambientais, porém estirpes que carreiam integrons vazios podem capturar genes cassetes e assim expressar a resistência a um determinado agente antimicrobiano (ROSSER; YOUNG, 1999; SCHMIDT et al., 2001). As estirpes V. corallilyticus (V10) e V. 95 parahaemolyticus (V25) apresentaram a estrutura de integron de classe 1 com a presença do gene cassete blaP1(estrutura B, Figura 7). Essa mesma estrutura foi verificada nas pesquisas de Dalsgaard et al. (2000) em V. cholerae isolados clínicos e ambientais provenientes da Tailândia e de Shi et al. (2006) que observaram esse gene em isolados de V. cholerae oriundos de pacientes com diarreia entre os anos de 1992 a 2000 em Calcutá, Índia. Ainda neste contexto, a presença do gene cassete blaP1 também foi verificada em V. natriengens (V11) (Tabela 13). A presença do gene β-lactamase em víbrios isolados da hemolinfa de caramões é preocupante, uma vez que tende a limitar as opções de tratamento de infecções causadas por este micro-organismo. Segundo Igbinosa e Okoh (2012), os antimicrobianos β-lactâmicos são os fármacos mais utilizados para o tratamento de infecções bacterianas, no entanto a sua eficácia vem decrescendo devido à produção de β-lactamases por estirpes bacterianas resistentes, compromentendo assim, a terapeudica médica. Como relatado anteriormente, os plasmídios podem carregar integrons. Este elemento genético desempenha um papel fundamental na captura de um gene e sua posterior expressão. Assim, agem como suporte em matrizes genéticas de resistência a antimicrobianos, e nos mecanismos de recombinação sítio específica (BENNETT, 2008). A Tabela 14 apresenta os resultados da presença de integrons de classe 1 e genes cassetes de resistência no DNA plasmidial em estirpes de Vibrio isolados da hemolinfa de camarões L. vannamei. 96 Tabela 14 - Perfil de resistência a antimicrobianos e detecção de genes de integrons de classe 1 e cassetes em plasmídios de estirpes de Vibrio spp. isoladas da hemolinfa de camarões marinhos Litopenaeus vannamei . №de cópias № de cópias Tamanhos (bp) do de Presença do Presença do Código Origem Espécie Perfil do gene produto PCR in-F e resistência gene cassete gene cassete IntI1 in-B 3’CS (sul1 e blaP1 ereA2 qacE∆1) V4 V. vulnificus B1 AMP, ERI 850, 700, 400 4 + 5 Acaraú/ V. coralliilyticus V7 AMP, ERI, TET, OTC 7 2000 7 + FA V8 V. alginolyticus AMP, ERI 7 600,500, 7 + V9 V. harveyi AMP, ERI 7 1000,600, 500, 4 + + V16 V. alginolyticus AMP, ERI 6 600,500, 6 + + V18 V. harveyi AMP, ERI 7 6 + V19 Acaraú/ V. parahaemolyticus AMP, CFL, ERI 4 6 + V21 FB V. parahaemolyticus AMP, ERI 7 2000,850, 300 4 + + V22 V. mimicus AMP, ERI 7 300 4 + + AMP – ampicilina; CFL – cefalotina; ERI – eritromicina; intI1: gene que codifica a integrase de classe 1; 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio); blaP1 (resistência para β-lactâmico); ereA2(resistência a eritromicina) 97 Das nove estirpes que tiveram seus perfis de resistência alterados no teste de “cura” de plasmídios, principalmente relacionados ao fármaco eritromicina apresentaram integrons de classe 1. Coadunando com a pesquisa, Sharma et al. (2009) observaram classe 1 de integrons (intI1) em 100% dos isolados de V. vulnificus, V. fischeri, V. proteolyticus, V. mimicus, V. cholerae e V. parahaemolyticus de amostra ambientais (água) do rio Narmada (Índia). Vale ressaltar que as estirpes que apresentaram a classe 1 de integrons no trabalho supracitado são semelhantes aos isolados do presente estudo. Já Rosser e Young (1999) relataram presença de integrons de classe 1 em 3,6% dos micro-organismos Pseudomonas spp. e Vibrio spp. isolados de amostras ambientais (água) do estuário do rio Tay (Escócia). Sharma e Bora (2011) detectaram integrons pertencentes a classe 1 em plasmídios de Vibrio spp. provenientes da água do rio Narmada (Índia) em 12,5% isolados. Os trabalhos citados mostram percentuais baixos de detecção de integrons de classe 1, fato que difere da incidência encontrada no presente estudo (100%). O elevado percentual de integrons encontrado pode ter relação com a pressão seletiva que as estirpes tenham sofrido no seu habitat, pois de acordo com Ghauri et al. (2006), os integrons parecem onipresentes na natureza, podendo ser recuperados em ambientes clínicos e naturais, principalmente quando estão sujeitos a pressões seletivas extremas. Para Sharma e Bora (2011) a transferência horizontal de genes por elementos genéticos móveis, como plasmídios e fagos pode acelerar a diversificação genômica das espécies de Vibrio e assim influenciar sua fisiologia, patogenicidade e caracteres ecológicos. Além disso, o papel de elementos genéticos móveis no genoma desse micro-organismo pode favorecer a disseminação de genes resistentes a antimicrobianos. O tamanho dos amplicons em pares de bases (pb) relacionado ao par de iniciadores in-F e in-B nos plasmídios foi de 300 a 2000 pb (Tabela 14). Resultados similares foram observados por Lukkana, Wongtavatchai e Chuanchuen (2012) que ao isolarem Aeromonas hydrophila em tilápia (Oreochromis niloticus) cultivadas na Tailândia, observaram que o tamanho dos amplicons da zona variável de 150 pb a 2.000 pb. Segundo os autores, os integrons podem ser transferidos entre os micro-organismos da mesma ou de espécies diferentes, conduzindo assim à resistência em estirpes bacterianas que eram previamente susceptíveis. Em contrapartida, Mukherjee e Chakraborty (2007) observaram o tamanho dos amplicons referentes aos iniciadores in-F e in-B entre 718 a 3.200 pb em bactérias Gram-negativas isoladas do rio Torsa na Índia. Para os autores a diferença entre o tamanho da região conservada (CS) vai depender dos genes cassetes inseridos. Tal fato foi observado nos trabalhos mostrados anteriormente, percebendo-se a variação na amplicação desse gene. Esta região pode conter um conjunto de dois ou mais genes de resistência que fica 98 inserido nas regiões conservadas 5’ e 3’ com tamanhos de aproximadamente 1.400 pb e 2.000 pb, respectivamente (BENNETT, 1999; HALL, BROOKES, STOKES, 1991). A Figura 8 mostra a composição e a organização de integrons de classe 1 no DNA plasmidial. Figura 8 - Esquema da estrutura de integrons de classe 1 nos plasmídios com os respectivos genes cassetes em Vibrio spp. isolados da hemolinfa de camarões Litopenaeus vannamei Legenda: intI1: gene que codifica a integrase de classe ;, 3’ CS de integron de classe 1 composta pelos genes sul1 (resistência sulfazotrim) e qacE∆1( resistência a quartenário de amônio); blaP1 (resistência para βlactâmico) e ereA2 (resistência a eritromicina). Fonte: Autoria própria Observa-se que as estirpes, V9 (FA) e V16, V21, V22 (FB) apresentraram a estrutra de integrons A (Tabela 14 e Figura 8). Apesar das estirpes serem de fazendas diferentes tiveram a mesma estutura, com a presença do gene cassete referente a resistência a β-lactâmicos (blaP1). Essa mesma estrutura foi observada na pesquisa de Taviani et al. (2008) com a presença do gene blaP1 em V. cholerae isolados de águas residuais, água doce e água do mar provenientes da Baía de Maputo (Moçambique). Já Nishibori et al. (2011) não detectaram a presença do gene cassete blaP1 em integrons de classe 1 em V. cholerae O1 isolados de pacientes com diarreia na Indonésia. Da mesma forma que o trabalho citado anteriormente, a ausência desse gene foi observada nas estirpes V4, V7, V8 (FA) e V18, V19 (FB) (Tabela 15). Assim, a perda ou aquisição de genes cassetes está relacionada com os movimentos destes dentro e fora dos integrons. Aliás, esse é um processo aleatório, como a maioria dos outros rearranjos genéticos em micro-organismos. A perda de genes é uma questão de seleção natural, e se a combinação de resistência transportada por um integron é 99 vantajosa para a bactéria, ela o abriga e expressa, conferindo assim a sua sobrevivência em um determinado ambiente (BENNETT, 1999). Os isolados V4, V7, V8, V18 e V19 apresentaram a estrutura de integrons de classe 1 com o gene cassete ereA2 que confere a resistência à eritromicina (estrutura B, Figura 8). Essa composição foi observada na pesquisa de Thungapathra et al. (2002) em estirpes de V. cholerae não O1 e não O139 clínicas e ambientais de Calcutá, na Índia. Outras pesquisas relatam a presença do gene cassete ereA2 localizado em integrons de classe 1 de diversas fontes. Ahmed e Shimamoto (2011) detectaram integrons pertencente a classe 1 com a presença do gene cassete ereA2 em bactérias Gram-negativas isoladas de vacas com mastite bovina, no Egito. Povilonis et al. (2010), ao isolarem Escherichia coli e Salmonella enterica de origem humana e animal, na Lituânia, encontraram integrons de classe 1 carreando o gene cassete ereA2. Apesar dos supracitados serem de outras fontes, é evidente que esse gene circula facilmente em qualquer situação, tanto nos micro-organismos humanos, animais e ambiental. A frequência desse gene está relacionada, principalmente, com a utilização de fármacos na produção de animais (KIM; CERNIGLIA, 2005). Além disso, de acordo com Matsuoka; Sasaki (2004), há evidências indicando que o gene ereA2 pode ser transferido facilmente entre os micro-organismos. As estirpes V9, V16, V21 e V22 apresentraram a estrutura de integrons C, que é composto por dois genes cassetes blaP1 e ereA2, conferindo a resistência a β-lactâmico e eritromicina, respectivamente (Tabela 14, Figura 8). Segundo Carattoli (2001), a evolução da resistência a múltiplas drogas parece avançar inexoravelmente através da aquisição e agrupamento de genes de resistência dispersos por integrons. Controlar este processo em bactérias representa um desafio significativo para a saúde pública. Na literatura é observada a presença de multirresistência relacionada a integrons associados com genes cassetes de resistência. Ceccarelli et al. (2006) ao analisarem integrons de classe 1 em plasmídios de V.cholerae e de V. parahaemolyticus encontraram genes cassetes relacionados a resistência a estreptomicina, trimetropim e β-lactâmicos. Do mesmo modo, Khan et al. (2009) ao identificarem genes cassetes em integrons de classe 1 em plasmídios de isolado Salmonella oriundos de pescado importado para os Estados Unidos, observaram que estavam relacionados aos fármacos sulfametoxazol-trimetoprim e estreptomicina. Segundo os autores, o uso de agentes antimicrobianos em cultivos de organismos marinhos deve ser feito de maneira racional, para evitar o surgimento de patógenos resistentes e diminuir o risco de transmissão desses agentes para humanos. Além disso, os tipos, as combinações e a freqüência de genes cassetes incorporados em integrons podem ser resultados de pressões 100 seletivas nos isolados bacterianos. Assim a detecção de integrons e genes cassetes de resistência pode fornecer dados úteis para a vigilância do uso de antimicrobianos (CHANG et al., 2000) Por fim, a resistência em bactérias provenientes de cultivos de animais marinhos deve ser vista com atenção, pois micro-organismos resistentes presentes na água e no sedimento podem transferir essa característica para bactérias pertencentes à microbiota do camarão. Dessa forma, é necessária uma avaliação criteriosa dos efeitos dos agentes antimicrobianos no meio aquático, uma vez que o impacto gerado por essas substâncias ainda permanece desconhecido (BILA; DEZOTTI, 2003). 101 5 CONCLUSÕES Houve predominância de víbrios sacarose positiva em todas as fazendas analisadas. A quantidade de víbrios encontrada na hemolinfa não interferiu no tempo de coagulação, assim como não influenciou na taxa de sobrevivência dos animais. A detecção de V. parahaemolyticus e V. vulnificus carreando perfis de multerresistência antimicrobiana, como também outros fatores genéticos, devem ser encarados como um problema de saúde pública. Os isolados foram resistentes a antimicrobianos utilizados na terapêutica humana (AMP e CFL). O alto índice de resistência intermediária observado nos isolados deve ser visto com atenção, pois estes micro-organismos podem estar sofrendo algum processo mutagênico para sobreviver no ambiente. As origens genéticas da resistência dos isolados se mostraram, em sua grande maioria, relacionada ao cromossomo ou a elementos móveis estáveis, que após o processo de “cura” plasmidial, não foi afetado pelo agente mutagênico (acridine orange). A presença de integrons pertencentes à classe 1 no cromossomo e em plasmídios nos víbrios isolados da hemolinfa de camarões pode se constituir um problema para o ambiente aquático, considerando a possibilidade de propagação para outros microorganismos. A presença de genes cassetes de resistência nos isolados mostra que estes circulam livremente pelo ambiente e podem ser incorporados no DNA cromossômico e plasmidial através dos integrons. 102 REFERÊNCIAS AARESTRUP, F. M.; AHRENS, P.; MADSEN, M.; PALLESEN, L. V.; POULSEN, R. L.; WESTH, H. Glycopeptide susceptibility among Danish Enterococcus faecium and Enterococcus faecalis isolates of animal and human origin and PCR identification of genes within the VanA cluster. Antimicrob. 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