GERN - NOVA GUINÉ – IDA E VOLTA Dr. Albert Hahl Juiz e Governador de sua Majestade e Imperador (da Alemanha) 1896 – 1914 Compilado por Gerdi Kempfler Tradução para o português em junho de 2012 por Werner Joachim Dietz e Osmar Falk 2 Dr. Albert Hahl Juiz e Governador Imperial na Nova Guiné Alemã de 1896 a 1914 compilação de Gerdi Kempfler Prefácio Muito do que foi escrito sobre as possessões ultramarinas da Alemanha, está envenenado pela propaganda. As dificuldades que obstruem o caminho para determinar o que realmente aconteceu entre 1883 e 1914 nas colônias alemãs são um desafio para o historiador. É importante que seja separado o joio do trigo para transparecer a verdade. W. O. Henderson Dentro do espírito das palavras de W. O. Henderson quero oferecer um relatório sobre a vida e obra do Dr. Albert Hahl como Juiz e Governador Imperial de Papua-Nova Guiné nos anos de 1986 a 1914. Ele, com apenas 28 anos, foi enviado pelo Imperador alemão para o Pacífico Sul para lá assumir a responsabilidade por uma terra do tamanho aproximado do Império Alemão, sem lei e sem ordem, com um povo que em parte ainda vivia na idade da pedra. Gern, no ano de 2002. A autora Nota do Tradutor Osmar Falk: O Dr. Albert Hahl entra na nossa "Arvore Genealógica" como sobrinho de nossa bisavó Johanna Friederike Hahl 3 A ALEMANHA E AS ILHAS AO SUL DO OCEANO PACÍFICO (N.T.: Matéria publicada no “Deutsche Pressekorrespondenz” nr. 66 – Segunda-feira, 15 de Agosto – 1932) Durante o século 19 a Inglaterra e a França estavam numa competição feroz pela ocupação e dominação política dos grupos principais das ilhas do Pacífico Sul. A França era extremamente ativa e, às vezes, parecia superar a Inglaterra. A preocupação com sua política continental, no entanto, inibia e causava retrocessos, fazendo com que a Inglaterra levasse a parte do leão. Enquanto as duas nações lutavam pela supremacia política, sucedeu que a casa de Johann Cesar Godefroy & Filhos, domiciliada em Hamburgo, conseguiu tornar-se uma potência econômica naquele arquipélago. Inicialmente programada para comércio com países da América do Sul, banhados pelo Pacífico, no início dos anos 50 as primeiras explorações e viagens comerciais partiram de Valparaiso, sede sul-americana da empresa, e se estenderam até o arquipélago Tuamotu e Taiti, onde o conflito de muitos anos entre a Inglaterra e a França pela posse das ilhas, há pouco tempo tinha sido decidido em favor da última. A partir das bases de apoio lá conquistadas, a empresa, sob a liderança direta de Hamburgo, rapidamente espalhou os seus escritórios nas ilhas de toda Polinésia, como as ilhas Cook, Penrhyn, Fiji, passando por Tonga e Samoa. Já em 1857 a feitoria de Apia foi reorganizada como centro de negócios nas ilhas. Depois da expansão na área leste iniciou a expansão do campo de atividade na área oeste da Micronésia. As ilhas Ellice, Gilbert, Marshall, Carolinas e Palau foram equipadas com escritórios comerciais permanentes. Esta época pioneira pode ser dada como concluída por volta de 1860. O comércio com a pátria na época era feito com 29 navios de grande porte e o tráfego entre as ilhas e as diversas fábricas era feito com umas 100 escunas menores. A área da Melanésia, ainda por desbravar devido à índole guerreira dos seus habitantes, foi alcançada lá por 1860 ou 70. Em Samoa também foi possível a aquisição de grandes extensões de terra. Através do cultivo de grandes áreas de plantações de coco a companhia passou para uma economia agrícola em grande escala. É óbvio que os grandes sucessos da casa de Hamburgo incitaram a concorrência. Então, Iniciou uma competição colonizadora entre empreendimentos alemães, ingleses e franceses, mas parece que a posição dominante foi a da firma alemã. As causas do seu declínio, em meados de1870, não foram originárias no próprio campo de atividades, mas em negócios infelizes na pátria. Pesadas perdas sofridas ali forçaram a dissolução da firma. Uma parte do campo de atividade ficou nas mãos da concorrência estrangeira. Para determinados grupos de ilhas formaram-se empresas alemãs, tais como a Sociedade Alemã para Comércio e Plantação para as ilhas do Pacífico Sul para Samoa e Tonga, e, a 4 Sociedade Jaluit para as ilhas Marshall e as Carolinas. Com a conquista das ilhas Fiji pela Inglaterra em 1874, a divisão política do mundo insular, até ao ponto que parecia valer a pena, estava passada a limpo. As grandes ilhas Melanésias, cuja dificuldade de acesso já foi mencionada, ainda estavam politicamente livres. Com a revitalização e fortalecimento do Império se desenvolveu um poder nacional para amparo das possessões coloniais. O movimento colonizador despertou. A partir dos esforços para salvar a casa Godefroy nasceram com Adolf von Hansemann, o chefe proprietário da Sociedade Comercial e Bancária, pensamentos e planos para uma expansão a noroeste do Oceano Pacífico, ou seja, para as ilhas da Melanésia. O preparo, por ele e seus amigos, de uma expedição do Professor Dr. Fisch colocou a base para uma tomada de posse. Nos anos de1884 até 1886 aconteceu o hasteamento da bandeira na Nova Guiné, no arquipélago Bismarck, nas ilhas Salomão, e nas ilhas Marshall. A disputa entre a Espanha e a Alemanha pela posse das Carolinas foi resolvida através de sentença do Papa a favor da Espanha. Fora isso, a delimitação das áreas era acordada por contratos de caso a caso com as potências coloniais. No ano de 1899 as ilhas da Micronésia passaram, por compra da Espanha, ao domínio da Alemanha, e em 1900 finalmente foi acertada a disputa entre os Estados Unidos da América, Inglaterra e Alemanha pela posse das Samoas. Upolu e Sawai ficaram sob domínio alemão. Com isso a divisão política das ilhas foi concluída no mesmo tempo da do continente africano. Preponderou o domínio anglo-australiano. A França, além da Nova Caledônia e o domínio compartilhado das Novas Hébridas, também dominava, a partir da metade do século 19, sobre os grupos insulares do extremo oriente, enquanto a Alemanha possuía as já mencionadas regiões no extremo ocidente, inclusive Samoa. A posse principal da Alemanha fazia limite com as Índias Holandesas e o espaço de posse e cultura asiática. Guam e as ilhas do Havaí, valiosas bases para a navegação entre a América e a Ásia, pertenciam aos Estados Unidos. A forma econômica predominante era o comércio. Os produtos procurados eram o óleo de copra, o miolo ressecado do coco, conchas e pérolas, trepang1 e madeira. Depois de Samoa haver experimentado, como já vimos, certo progresso pela introdução de plantações de palmeiras, difundiu-se em três áreas vastas plantações: Nas ilhas Fiji plantações de palmeiras, algodão, cana de açúcar e bananas; no Hawai cana de açúcar e abacaxi; e na Nova Guiné Alemã e o Arquipélago de Bismark palmeiras de coco, borracha e cacau. As Novas Hébridas, Papua e as Ilhas Salomão seguiram a mesma tendência, mesmo que em escalas menores. Com isso resultou para a administração da colônia a tarefa imperativa de pacificação das tribos aborígenes, sempre em pé de guerra, e a exploração, através de investigação e desenvolvimento, de novas áreas intransitáveis e montanhosas das grandes ilhas. Por ocasião da primeira incursão rio acima no Sepik (Rio Imperatriz Augusta), importante 1 Molusco dessecado (NT) 5 acesso para o interior da Terra Imperador Guilherme, em 1888, sob liderança do Dr. Schrader e do Dr. Hollrung, a equipe se compunha apenas de malaios especialmente recrutados. No grande empreendimento de pesquisa ao longo deste rio, em 1912-1914, apenas os filhos da terra prestaram todo tipo de auxílio aos poucos europeus. Já nesta comparação isolada se mostra como houve, em pouco tempo, um grande progresso. O valor do capital investido em plantações e comércio pelas maiores companhias colonizadoras alemães até 1913, pouco antes da eclosão da guerra, pode ser avaliado em torno de 100 milhões de marcos. O trabalho econômico e cultural alemão fez-se presente nos centros das duas colônias. O comerciante alemão não faltava em nenhum dos outros grupos de ilhas importantes. O legado da casa Godefroy tinha sido bem administrado. Uma navegação marítima de grande escala significava um apoio importante do comércio. Este desenvolvimento florescente da participação alemã na competição pacífica entre os povos foi anulado e destruído pelo sequestro da propriedade privada e da expulsão de todos os alemães, em decorrência do Tratado de Versailles2. A bandeira alemã não tremula mais no Oceano Pacífico... O GOVERNADOR EMÉRITO DR. ALBERT HAHL Albert Hahl nasceu a 20.09.1868 na aldeia de Gern, na baixa Baviera. Os seus pais Jakob Hahl e Berta Hahl3 eram procedentes de Münchingen4. Os mais velhos dos sete filhos nasceram5 em St. Veit, os demais em Gern. 2 Reparações da Alemanha aos vencedores da 1ª guerra mundial. (NT) Julia Berta, n. Hübschmann (N. de Osmar Falk) 4 Também na Baviera 5 Aldeia de São Vito, Baviera. 3 6 A permanência lá não foi duradoura. A grande família logo migrou para Traustadt, onde o pai Jakob Hahl faleceu em 1898. Inicialmente Albert Hahl queria ser funcionário do governo do Estado da Baviera. Ele estudou na Universidade de Würzburg e doutorou-se em Direito, vindo a ser assessor do governo da Francônia Superior em Bayreuth. Poucos meses depois, no entanto, ele se candidatou para o Serviço Colonial Imperial, foi aceito e imediatamente convocado para o Departamento Exterior das Colônias. Naquele tempo ele, como tenente, tinha participado de um programa militar e certa ocasião – assim ele contava – se apresentou de capacete, cinturão e espada ao seu Governador que lhe teria dito: “Lembre-se, Senhor Assistente, que o governo de sua Majestade não é nenhum pombal!” Ele só tomou conhecimento. Sua atividade em Berlim serviu para os preparativos do seu serviço na África Oriental. Só que em vez de seguir para lá, desembarcou na Nova Guiné. O seu antecessor não suportara o clima e teve que voltar para casa. Por isso o Chanceler Imperial o encarregou para o cargo vago. Com isso, o tempo de preparação para a atividade colonial foi bastante reduzido. Foi assim que ele, aos 28 anos, no amanhecer do dia do ano novo de 1896, desembarcou, como Juiz Imperial, do vapor ‘Stettin’ no porto Frederico- Guilherme. Albert Hahl: “Uma recepção calorosa, combinada com uma breve instrução sobre a situação do momento e das tarefas da minha jurisdição, transcorreu rapidamente. Na manhã seguinte minha viagem continuou com o vapor. A viagem seguiu ao longo da costa da Nova Guiné e em Simbang o navio tomou rumo norte até as ilhas do arquipélago Bismark. No dia 14 7 de janeiro alcançamos o estaleiro de Herbertshöhe, sede principal da empresa colonizadora Nova Guiné no arquipélago de Bismark, que foi o meu destino depois de uma viagem de oito semanas desde o embarque em Genova”. A ADMINISTRAÇÃO DO IMPÉRIO6 1899-1914 Albert Hahl veio para uma terra, na qual, os nativos ainda viviam na idade da pedra, em parte, ainda sendo canibais. Uma terra sem lei e sem ordem, do tamanho do antigo Império Alemão, com uma extensão de muitos milhares de quilômetros de hidrovias marítimas, onde piratas inquietavam a navegação e o litoral. O “Juiz Imperial” tinha a seu dispor um grupo de subtenentes e soldados, um único escrivão, uma enfermeira e, mais tarde, um médico. Isto para atender uma área de aproximadamente 242.600 Km², a qual, abrangia ainda milhares de ilhas do Pacífico Sul, o Arquipélago de Bismarck, Nova Mecklenburgo e Nova Pomerânia, e, as ilhas Salomão com uma extensão de mar de milhares de quilômetros. Albert Hahl: “Ainda no dia da chegada assumi os negócios das mãos do gerente da empresa colonizadora. Depois de descarregar, o „Stettin“ seguiu viagem para o porto de Matupi. Eu me dirigi para lá no dia seguinte em um barco a remo, tripulado por cinco melanésios. Era a minha primeira viagem de bote e transcorreu de maneira agradável. O mar estava calmo e um toldo me deu alguma sombra. Em Matupi novamente subi a bordo e naveguei até o porto de Mioko, no grupo de ilhas de Nova Lauenburgo, situadas defronte à 6 Alemão 8 península das Gazelas. De lá o navio voltou até Herbertshöhe para apanhar a correspondência, dirigindo, então, sua quilha para Singapura. Com isso os moradores das ilhas ficariam com as comunicações cortadas para as próximas oito semanas e entregues à própria sorte. 9 10 meses mais tarde... Com os nativos eu passei a ter contato frequente. O encontro com os Paleavas me fez conhecer, pela primeira vez na vida, pessoas que não possuíam nenhuma ferramenta de ferro ou outros equipamentos de trabalho. Por isso, as facas e machadinhas que lhes foram oferecidas logo foram examinadas e testadas no tocante a sua dureza e afiação, após o que os nativos logo retribuíram com os seus presentes em forma de abundantes frutos das suas culturas. Com o tempo, no entanto, as diferenças se exacerbaram devido à entrada de produtos europeus; as regras e o sistema de trabalho estabelecidos pela tribo foram mudados. Os “novos tempos” desagradaram aos velhos. Certa vez, um líder tribal me disse numa conversa: „As tuas palavras podem servir para os brancos – a mim não me interessa. Nós, porém, queremos abater o inimigo e comê-lo; este é o nosso jeito de proceder e com este eu fico.“ Estas palavras guardei muito bem na memória como um lembrete de cautela. As praias das ilhas não eram hospitaleiras. O costume da vingança de sangue como uma tradição obrigatória, forçosamente, tinha que culminar numa crueldade sem precedentes no trato com estranhos, já que faltava às tribos qualquer disciplina política. Isso explica porque, sempre de novo, aconteciam assaltos a estabelecimentos comerciais isolados ou a pequenas embarcações. Meus primeiros conhecimentos sobre as diferenças entre os membros da população eu colhi numa viagem para o sul no barco Zerelde. Pouco tempo antes, eu tinha ouvido falar que os moradores da terra de Cavit foram atraídos para a praia com promessas pacíficas de trocas comerciais, mas então foram assaltados, vergonhosamente, sendo que uns 30 deles foram comidos e outro tanto dos sobreviventes foi vendido como escravo nas aldeias do Weberhafen7, no litoral norte a na ilha de Watom. 7 Porto dos Tecelões 10 Em um escritório de Vunamarita, defronte a Ilha de Massawa, conheci o padre Mathäus Rascher com quem eu, por ser meu patrício, tinha uma relação mais próxima. As caminhadas que, seguidamente, fiz na companhia do padre, através das montanhas intransitáveis, fazem parte das minhas melhores lembranças dos meus primeiros anos de atividade colonial. Ouvi que os nativos da tribo de Livuan, constantemente, sequestravam pessoas nas montanhas de Baining, pois, para eles a venda dos prisioneiros para a escravidão se constituía em um negócio rentável. Com isso, apresentou-se para mim uma nova tarefa. Em todos os dias de júri eu anunciava que o tráfico humano era proibido e que os homens de Baining deveriam ser entregues a mim para serem devolvidos à sua casa. Ninguém voluntariamente trazia os escravos. Por isso, eu mesmo passei a buscá-los e comecei na ilha de Watom. Em poucos traços conto aqui que numa ilha montanhosa tomei de um cacique seis moços, um dos quais já conhecia a língua Liviana. Ele me contou que os escravos nas plantações só podiam viver em cabanas, sob trabalho pesado, e que os mais fortes, para não fugirem, tinham quebradas as canelas para impedir a fuga. Por ocasião das grandes festas, os mais bem nutridos eram escolhidos, mortos e comidos. A exatidão destes relatos mais tarde me foi confirmada por outros escravos já libertos.” O Dr. Hahl teve que se ocupar também com a construção da estrada que se estendia através do bispado de Tacabur, a poucos quilômetros de distância. A construção desta estrada foi estendida durante o verão de 1897 até o sopé dos picos íngremes do altiplano de Paparatave. “Através da intervenção do cacique Tokitang de Paparatave mandei uma intimação a Towakira para que concluísse, com o seu pessoal, a estrada, enterrando para isso antigos ódios e se enquadrando na ordem pacífica que se estava estabelecendo em todos os lugares. 11 Alguns dias mais tarde uma mulher me trouxe um bonito cordão trançado que continha nove nós. Ela explicou que o cordão vinha de Towakira e significava que em nove dias ele queria me comer. Eu lhe mandei dizer que me faria presente na ocasião combinada. À tarde me preparei e caminhei a noite toda, assim que na manhã seguinte meu pessoal e eu estávamos no pátio da sua propriedade, mas aquela raposa astuta tinha recebido a notícia e em tempo se retirou da toca. Mais difícil ainda que o estabelecimento da ordem exterior era conquistar os próprios nativos, especialmente, os chefes. Eles deveriam ser motivados a escolher um homem como um tipo de sub-prefeito, o qual, por determinado tempo deveria servir nas aldeias vizinhas. Este homem, denominado na linguagem deles de “Luluai”, seria incumbido dos serviços de administração local e, concomitantemente, seria uma espécie de juiz de paz. Não houve falta de disputa, mas os chefes em parte fracassaram, seja porque não eram capazes de encontrar e determinar a justiça ou, o que era pior, se aproveitavam da sua posição para enriquecer no exercício do cargo. Esta tarefa exigiu esforços infindáveis e necessitou de uma grande paciência para se alcançar o objetivo com estas pessoas de uma outra cultura. Os nativos, naturalmente, conheciam a convocação de reuniões para aconselhamento e deliberação – mas que um estrangeiro os estava convidando para tal, isso era uma novidade. Por isso, a princípio não ligaram para meus pedidos de participação nas reuniões de julgamento, de forma que primeiro tive que conquistar com dificuldade os cabeças e o povo. 12 Um melhor resultado do que a busca compulsória dos convidados era a imposição aos faltosos de uma multa em forma de dinheiro de conchas. Não demorou para conseguir reunir pontualmente as partes; finalmente até os chefes regionais condescendiam na visita, porque descobriram que através desta participação na jurisprudência crescia o seu próprio prestígio”. OS PRIMEIROS DOS 23 ‘LULUAI’ INDICADOS POR HAHL NOME DO LULUAI RESPECTIVAS ÁREAS Towrube Rebar, Takubar Tobobo Wunabalbal Tomateria Kikirre, Wunamamie Tobirau Guwanur Toimira Wunadidir Fero Tokinkin Raluana, Barawon, Ratawul Towungie Dawara Eisea Kurawia Paula Tawaua Kapinias Walaur Toporaporo Malaguna Tonponpe Rawal Tomeibil Matupi-Kikili Liwai Matupi-Kurapau Alik Towangurin Talwat, Beridni, Bai Lambet Nodup Elimo Rau Jawuringe Taui Tomari Tonor, Wlawolo Towarkore Ratawul Towarkarat Kerebinu Masiu Kabakada 13 Tom rewe Rakunai, Ratangor, Wunagamata, Wunawolila (De ‘Albert Hahl, índice das áreas e caciques no norte da Península das Gazelas’) “Herbertshöhe8, 11.11.1898. Este sistema judicial de Luluai, ao qual, mais tarde foram acrescentados como vogais nativos com experiência particular no contato com os alemães e com conhecimento da língua franca emergente na colônia, o Tok Pisin (Tultul) foi estendido, passo a passo, por Hahl da Península das Gazelas até as ilhas do Arquipélago de Bismark, e, finalmente, até a Terra do Imperador Guilherme9. É evidente que tiveram de ser feitas concessões, tanto para as condições locais como para o passado ‘não europeu’ dos candidatos. Mesmo assim a solução pacífica de disputas melanésias pelo Luluai fez aumentar a paz sempre mais. Sempre que possível Hahl tentou nomear pessoas capazes de ler e escrever. Com eles também foi possível estabelecer um correspondência oficial na língua nativa. No arquipélago de Bismark isso foi possível devido à obra de missionários metodistas australianos e pelo fato da língua Kuana já estar relativamente bem disseminada. Tokinkin de Raluana e também Towungie de Dawara se tornaram os mais importantes conselheiros nativos de Hahl. Como meta a longo prazo o governador planejava eleger os administradores locais por livre escolha dos líderes nativos. Albert Hahl: “O dinheiro dos nativos, em forma de conchas, supria todas as necessidades de pagamento e fixação de preço dentro dos nossos conceitos financeiros. Nos negócios diários, porém, predominava o pagamento na base da troca. O dinheiro de conchas servia, principalmente, para fins sagrados, mas também para a compra de uma noiva e, especialmente, para distribuição no caso de morte. Por ocasião da morte de um ente querido era obrigação dos familiares ‘quebrar’ ou distribuir o dinheiro de conchas (biu ou timbe) entre os parentes. A distribuição era feita aos participantes do cortejo fúnebre. Quem fosse enterrado sem a distribuição do dinheiro de conchas não acharia descanso; a sua alma (tamberan) ficaria vagando por aí. Minha pequena moradia estava construída num elevado em Vunatali e se compunha de dois quartos modestos e uma varanda em volta de três lados da casa. Ela estava apoiada sobre estacas de madeira no declive do barranco. As estacas já estavam podres e eu temia que pudesse cair pelo barranco a cada um dos numerosos terremotos. 8 Capital da Nova Guiné no inicio do domínio alemão, depois mudada para Rabaul. O nome provém de Herbert Von Bismark, filho do chanceler alemão Otto Von Bismark. 9 Kaiser Wilhelmsland 14 O pessoal me socorreu na minha necessidade e construiu, durante uma das minhas ausências, uma casa bonita e espaçosa de Atap, as folhas secas da palmeira Nippa. Para a conclusão do ‘Gunan’ faltava apenas a cerca, mas em poucos dias também esta foi levantada e amarrada a ‘liplip’. A conclusão da casa merecia uma comemoração, razão pela qual a inauguração do ‘Gunan’ aconteceu com uma festa e dança às minhas custas. No sul de Nova Mecklenburgo, como em toda península da Gazela, costuma-se isolar temporariamente as mocinhas, antes do seu casamento, em uma cabana bem fechada. Os pais as alimentam, fartamente, e à noite as conduzem ao ar livre para fazer suas necessidades. De acordo com os nativos, esta clausura é de 12 a 20 meses (segundo Fellmann oito semanas). Durante esta longa temporada a jovem fica rechonchuda e a pele desbota bastante, de formas que, depois de um banho completo, ela se assemelha a uma mulher, levemente, bronzeada de Samoa. Tanto a informidade corporal quanto a pele desbotada são vistas como características especiais de beleza. Tal beleza cevada vi só uma única vez; ela tinha sido liberada dois dias antes e submetida a um banho completo, necessário depois do período de clausura, em que pouco ligavam para a higiene. Aparentemente ela estava sendo objeto de uma exposição pública, porque muitas pessoas se sentaram em sua volta e também eu fui, especialmente, chamado para expressar minha admiração. Neste caso a ceva tinha alcançado os seus objetivos. Na verdade a pequena, de uns catorze anos, estava ‘gorda como um porco’ e as mulheres sentadas em sua volta acariciavam com admiração os seus grossos braços e pernas ou afagavam carinhosamente as gorduchas bochechas”. 15 Como particularidade do distrito administrativo de Hahl também faziam parte frequentes viagens ao mar como marinheiro, para o que era preciso coragem e pioneirismo. Por ocasião da perseguição de um baleeiro americano com uma chalupa, o único barco do governo alemão, Albert Hahl correu perigo de naufragar. Sobre o episódio ele fez o seguinte relatório: “Numa grande tempestade que, de repente, se abateu a partir das montanhas, o barco virou. Toda a tripulação se viu na água. Dois dos melanésios nadavam do meu lado. Eu apontei para o barco que estava afundando e os fiz entender por sinais, já que as ondas bravias impediam um diálogo, que tentassem mergulhar através da escotilha aberta e puxassem uma parte do lastro. As duas bravas criaturas obedeceram sem hesitação. O barco mais uma vez se aprumou e continuou a navegar. Na minha proximidade nadava também o meu cozinheiro chinês que eu tinha levado comigo. Como as forças o abandonavam, enrolei a sua longa trança em volta do meu braço esquerdo e me deixei levar pelas ondas. A uns 2 km à nossa frente, no cinturão de recifes, cercado de fortes ondas, surgiu um banco de areia. Foi para lá que felizmente nos levou a correnteza da água e a força do vento. A única coisa que me preocupava era nos deparar com tubarões que se interessassem por nós. Tivemos sorte e alcançamos o banco de areia; mas a arrebentação era tão forte que não conseguimos ancorar o barco. Os melanésios, no entanto, experimentados no mar, mergulharam por baixo dele e alcançaram o recife firme. Eles me deram a entender que deixasse afogar o chinês e tentasse salvar a mim mesmo. No momento da maior necessidade, de repente, surgiu uma canoa com nativos que estavam pescando atrás dos recifes e nos tinham visto. O chinês e eu, então, fomos levados à terra firme na canoa, bem como o capitão Martens e os demais companheiros de viagem. Finalmente também o barco veio boiando. Todos nós voltamos ao mar para recolhê-lo, puxando e arrastando-o, para contornar o banco de areia, até um outro recife de águas mais profundas. Lá conseguimos aprumá-lo e pô-lo em condições de navegação. No ano de 1898 os veleiros das empresas estavam tão ocupados com o atendimento dos pontos de comércio exterior, de formas que eu não conseguia nenhum para os meus propósitos. Por isso, fiquei na Península da Gazela e no grupo de ilhas de Neu Lauenburg, limitado aos meus afazeres. Esta situação, porém, trouxe a vantagem de eu poder começar a melhorar os caminhos para as montarias e a jurisdição, como também expandir e reforçar a administração nativa sobre a parte oriental norte da península de Gazela até alcançar o Warangol. Em dezembro de 1898 recebi a triste notícia do falecimento de meu pai. Algo me impelia para casa, depois de três anos de trabalho árduo, mas maravilhoso para mim. A 5 de fevereiro retornei são e salvo para os meus na minha pacata aldeia na pátria. O descanso na casa paterna foi só de alguns dias. Recebi uma convocação para Berlim e lá entrei para o serviço do Departamento Colonial do Ministério do Exterior. Minhas tarefas mais específicas eram decorrentes da compra da Espanha das Ilhas Carolinas, 16 Palau e Ilhas Marianas, e do acordo entre o governo alemão e a Companhia da Nova Guiné devido à transferência da soberania ao Império. Para a Nova Guiné Alemã foi designado governador Rudolf von Bennigsen e para vicegovernador eu fui o escolhido. Nós então selecionamos uma equipe modesta de funcionários e em junho viajamos de Gênova para Singapura. Lá foi fretado o vapor „Kudat“ para a longa viagem. A comprade mantimentos e utensílios domésticos completou o modesto equipamento trazido da Alemanha, de forma que em agosto o barco pode, então, zarpar totalmente carregado. Em princípios de setembro chegamos à Herbertshöhe. Os, aproximadamente, 200 moradores do assentamento falavam dezessete línguas diferentes. Isso gerou muita confusão até que foi possível alcançar um entendimento através da adoção da língua Ponape. Depois de uns oito dias do meu novo retorno cheguei a Mejenieng e fiquei sabendo que neste meio tempo já circularam os rumores mais dramáticos e se acreditava que não mais me veriam com vida. Minhas visitas me deram a impressão de que não haveria razão para novas lutas nas diversas áreas. O próprio povo certamente estava cansado das eternas lutas e ansiava pela paz. Vi como sendo minha tarefa especial, para os próximos meses, manter esta situação no trato com os chefes tribais. 17 Aproveitei a amizade que fiz com o pessoal dos Peleker para, com crescente aprendizado da língua, me inteirar da organização familiar e das relações jurídicas. No final das contas a confiança foi tão longe que eles, numa conversa sobre a sua religião, me confessarem que tinham o padre em alta estima e aos domingos visitavam os seus cultos, mas interiormente continuavam firmes na crença dos seus antepassados. Numa noite de lua cheia até me deixaram tomar parte num dos seus cultos sagrados. Depois de algumas orações solenes do Jaumaro, o grande sacerdote, aos grandes deuses, sua atenção voltou-se para uma velha sentada numa elevação e que zelosamente mastigava raízes cruas de Kawa. A principio ela murmurava palavras incoerentes, mas logo respondeu as perguntas do Jaumaro e do Lap que, fascinados, ouviam o seu discurso. Eu não entendi nada daquela conversa. Por fim, a velha fez uma predição do meu futuro, mas posso assegurar que nenhuma delas se confirmou. Por volta de 1900 chegou a Papua Nova Guiné Robert Koch10. Ele estava fazendo viagens de pesquisa para a Índia, África e os mares do Pacifico Sul como membro efetivo do Serviço de Saúde Imperial de Berlim, diretor do Instituto de Higiene da Universidade e do Instituto para Doenças Infecciosas. Na Papua Nova Guiné se interessou, principalmente, por doenças da pele, malária, e framboesia, uma doença tropical muito dolorosa.Com sua mulher Hedwig viveu em Ruluana com o missionário Fellmann. Albert Hahl: “Em fevereiro o vapor ‘Oceana’ me trouxe a notícia que Rudolf von Bennigsen11 sairia de férias no verão, pois não se sentia mais capaz de suportar os rigores do clima. Comunicava-me que, possivelmente, eu teria que assumir a sua substituição. Isso foi confirmado por uma carta entregue pelo correio seguinte com o respectivo decreto de Berlim, o qual, também continha a ordem de eu viajar em maio a Jap com destino a Herbertshöhe. 10 11 Descobridor do bacilo de Koch, da tuberculose O governador 18 Lá cheguei no dia 26 de junho e me hospedei na residência do governador na colina de Vunakut (domicílio nas nuvens), um prédio novo magnífico, que tinha sido levantado desde minha última estadia. Os festejos se sucediam, despedida do governador e recepção dos navios com sua tripulação. Só que com a sua partida começou o rigor do trabalho diário. Muito trabalho logo me colocou em contato com o pessoal. Os recursos do posto de governo infelizmente eram parcos, já que também o pequeno vapor ‘Stephan’ fora recolhido pouco antes da minha chegada, por incapacidade de navegação. Com isso recomeçaram os antigos embaraços de mobilidade marítima. Uma feliz coincidência me ajudou. Certa manhã uma pequena escuna de bandeira japonesa se baloiçava, para o porto de Herbertshöhe. O comandante Isokide Komine me comunicou que em sua viagem pelo estreito de Torres, onde esteve empenhado na pesca de pérolas, lhe acabaram água e mantimentos, que não possuía dinheiro para se reequipar e pedia emprego. A visita ao barco mostrou sua utilidade para a minha necessidade; por isso o contratei. Em princípios de março parti com a escuna até Nova Mecklenburgo e me dediquei, inicialmente, à pesquisa de uma jazida de carvão. Depois de uma penosa marcha montanha acima também encontrei algumas bolsas de linhita12. À noite no acampamento fui acometido por uma grande febre. No dia seguinte naveguei com a escuna em direção sul até Kabanut para também lá subir as montanhas, mas fiquei na estrada porque, apesar da grande quantidade de quinino, a febre voltara com força. Mandei a equipe, sob as ordens de um suboficial de cor, continuar a exploração e à noite retornei ao litoral na companhia de Komine. Em Kabanut me hospedei na cabana de Rupeni, auxiliar da Missão de Fiji. Depois que me recuperei um pouco passei para Herbertshöhe no dia 17 de março. Lá tinha aportado o novo assessor. A sua introdução no seu campo de trabalho requereu extensas cavalgadas e caminhadas. Devido minha ausência, por causa das muitas viagens, tinha-se acumulado no escritório muita papelada, a qual, tentei vencer através de árduo trabalho. Novos ataques de febre perturbavam a rotina. Em fins de março me visitou o Bispo Couppé no meu escritório e exclamou: Meu Deus que aparência! Um novo ataque de febre biliosa13 me fez cair de cama sem consciência. É possível que tenham desistido de qualquer esperança por mim, porque no vapor pronto a deixar o porto em direção a Sidney contavam que eu me tinha passado. De Sidney a notícia foi transmitida por telégrafo, de forma que certa manhã a minha mãe, na hora do café, viu no jornal a notícia que o filho dela morrera de febre malária. Mas eu continuava vivo e me recuperava, lentamente, sob os cuidados especializados da irmã Auguste. Depois de novos surtos de febre biliosa, uma temporada com o padre Rascher em São Paulo resultou em certa melhora. Mas depois do retorno para Herberthöhe os ataques de malária recomeçaram. Desta forma resolvi fazer uso da licença que já me tinham 12 13 Minério de carvão Schwarzwasserfieber, agravamento da malária 19 concedido por telégrafo para achar recursos na pátria. Entreguei os negócios ao assessor Wolff e viajei, em companhia da Irmã Auguste H. para Sidney, onde aportei a 2 de junho, o mesmo dia em que caiu a tão esperada chuva, depois de sete anos de seca. Em fins de julho estava eu novamente em casa de meus queridos. Durante a viagem me recuperei de tal forma que nutri a esperança de poder continuar os afazeres que comecei a amar e ficar fiel ao mundo das ilhas. Depois de dois meses de descanso encontrei-me em Berlim, onde a 20 de novembro fui designado Governador do Protetorado como sucessor do Senhor von Bennigsen. Cópia alemã dos carateres góticos para latinos e tradução para o português do documento de nomeação do vicegovernador para governador: “Wir, Wilhelm von Gottes Gnaden Deutscher Kaiser, König von Preussen, etc. etc. etc.: Thun Kund und fügen hiermit zu wissen, dass wir allergütigst geruht haben, den Vize-Gouverneur für die Karolinen, Palau und Marianen Dr. Albert Hahl zum Gouverneur von Deutsch Neu Guinea zu ernennen. ES ist dies in dem Vertrauen geschehen, dass der Gouverneur Hahl uns und unserem königlichen Hause in unverbrüchlicher Treue ergeben bleiben und seine Amtspflichten mit stets regem Eifer zu erfüllen fortfahren werde, wogegen derselbe sich unseres Schutzes bei den mit seinem gegenwärtigen Charakter verbundenen Rechten zu erfreuen haben soll. Urkundlich haben Wir diese Bestallung allerhöchst selbst vollzogen und mit Unserem Kaiserlichen Insiegel versehen lassen. Gegeben Vandringham (? NT), den 10-ten November 1902. (Unterschriften) Wilhelm (Kaiser) Bernhard von Bühlow (z. Zt. Staatssekretär des Äusseren) Bestallung als Gouverneur von Deutsch-Neu-Guinea für den Kaiserlichen Vice-Gouverneur für die Karolinen, für Palau und Marianen, Dr. Albert Hahl” “Nós, Guilherme, Imperador Alemão pela Graça de Deus, Rei da Prússia, etc. etc. etc.: Declaramos e fazemos saber que com extrema bondade descansamos em nomear ao vice- governador das Carolinas, Palau e as Marianas, Dr. Albert Hahl governador de Nova Guiné Alemã. Aconteceu isto na confiança de que o Governador Hahl continue a estar submisso em fidelidade inabalável à nossa casa real e continuar a cumprir as suas funções com zelo sempre animado, enquanto que o mesmo desfrutará da nossa proteção dos direitos inerentes ao seu atual caráter. -- Dado em Vandringham (?NT), no décimo de novembro de 1902. (Ass.) Wilhelm [o Imperador], (ass.) Bernhard von Bühlow [à época Secretário do Exterior] - Nomeação como Governador da Nova Guiné Alemã para o Vice-Governador Imperial para as Carolinas, para Palau e as Marianas Dr. Albert Hahl 20 No Natal noivei com Luise Freiin von Seckendorff-Aberdar. As mães já se conheciam. Eu, porém, só vim a conhecer minha futura esposa neste período de férias. A 8 de janeiro fui recebido por Sua Majestade o Imperador14 para relatório. Das palavras do Imperador, imediatamente, ficou clara a sua posição sobre o desenvolvimento colonial. A Alemanha só entrara no último momento, talvez até tarde demais, no desenvolvimento de sua economia além mar. Recomendava-se uma colonização rápida e eficiente. Eu objetei, dizendo que o desenvolvimento da Nova Guiné ocorreria bem mais lentamente. Isso me pareceu tê-lo desgostado. Ele se virou e eu pensei que a conversa acabara com a sua discordância. Eu estava pronto a me retirar em direção à porta, quando Sua Majestade se aproximou de mim em passos largos e pediu que eu justificasse a minha opinião. Agora eu tinha a oportunidade de relatar livremente sobre as dificuldades do trabalho pioneiro e da desordem do vasto território, bem como do atraso cultural e econômico dos aborígenes, e também aparentemente encontrei grande compreensão. Eu pretendia voltar para casa a fim de me casar, mas me retardaram no ministério até final de janeiro, enquanto a partida do navio de Gênova já estava fixada para o dia 4 de fevereiro. Assim não foi mais possível fixar uma data para o casamento na pátria. O desgosto das mães foi grande. Nós não poderíamos viajar apenas como noivos até o fim de mundo da Nova Guiné. Quando por carta me queixei ao cônsul Irmer em Gênova, a resposta foi o convite de celebrarmos o casamento em sua casa. Depois do retorno de Berlim permaneci ainda um dia na casa paterna. No dia seguinte, 30 de janeiro, me despedi comovido e na aldeia vizinha recebi minha noiva dos braços da sua mãe. Em Luzerna15 a minha irmã e seu marido se juntaram a nós. No dia 1º de fevereiro conduziram-nos, juntamente, com o Sr. e a Sra. Irmer ao altar. Luise von Seckendorff, agora Luise Hahl, que em agosto completaria 28 anos resolve acompanhar um homem que, até então, lhe era um desconhecido, desde a pequena Wonfurt na Francônia para uma terra estranha. Este é o homem que em suas anotações registra: ‘Nossas mães se conheciam’ – de forma que devem ter sido elas mesmas que arranjaram este casamento.” 14 É importante distinguir corretamente entre “Rei da Prússia” e “Imperador do Império Alemão”. O império alemão era composto por uns 30 pequenos reinados, entre cujos reis periodicamente era escolhido o Imperador, que então acumulava os dois títulos. Como a Prússia era o estado alemão com maiores dimensões históricas, territoriais e econômicas, acabou tendo a maior influência e papel. O estado da Baviera, embora também de expressivas dimensões, não gostava da hegemonia da Prússia; até hoje existe animosidade entre estes entes, que só adormece enquanto 15 Suiça. 21 Relato de Luise Hahl: “O nosso primeiro destino foi Java, onde o meu marido teve que atender a questões oficiais. Após uma curta estadia na cidade portuária de Bativa viajamos a Buitenzerg, residência do Governador Geral, o qual nos acolheu com a maior hospitalidade. Infelizmente os belos dias transcorreram rapidamente, sendo que em Bativa nos aguardava um vapor do Lloyd16 para nos levar, em nova viagem de três semanas, até a nossa nova pátria. Subi temerosa a bordo do pequeno e modesto meio de transporte e o que eu temia, em boa parte, também acabou acontecendo. Cheguei a conhecer demais os sofrimentos do enjoo de uma viagem marítima. Numa bela manhã o navio ancorou diante da pequena ilha de Soloo, na qual funcionava um posto comercial da Companhia da Nova Guiné. O país se erguia, abruptamente, em forma de montanhas irregulares a partir do mar. Até onde o olho alcançava nada mais do que a mais fechada e impenetrável mata virgem. A vista era escura e imensa, sem sinal de vida humana. Mas o que então vi – me deixou assustada. Em numerosa canoas muitos nativos se aproximavam do navio; mas que gente! Ocupando os minúsculos barquinhos indivíduos morenos e nus com o cabelo sujo e despenteado caindo pela testa 16 Maior companhia de navegação alemã na época, com sede em Bremen 22 em melenas espessas e nodosas, fazendo a sua aparência parecer ainda mais ameaçadora. Os corpos estavam lambusados com fuligem ou argila amarelada, os lábios vermelhos do sumo de nogueira e os dentes enegrecidos. O grupo humano veio a bordo, sendo conduzido também ao convés, e, finalmente, este primeiro encontro com os nativos acabou com o cacique, uma celebridade entre seus pares como guerreiro e canibal, me estendendo a mão que apanhei relutante. Em rápida sucessão o navio ainda aportou nos lugares de assentamentos europeus, o porto Friedrich-Wilhelm e Finschhafen, até que no dia 18 de abril, com a nossa chegada em Herbertshöhe, a sede do governo, a nossa viagem de lua de mel de dois meses e meio de duração chegou ao seu final. Depois de uma recepção festiva pelos funcionários, comerciantes, fazendeiros, vizinhos de longe e de perto e dos alunos da missão católica de Vunapope, tendo à frente o Bispo Couppè, fomos até a nossa morada situada no topo de um dos elevados próximos ao litoral. Era uma bonita construção de madeira, rodeada de uma varanda, e com cômodos altos e frescos. As tarefas do meu marido eram, em poucas palavras: conquistar a confiança da população, melhorar os relacionamentos entre os colonos e os nativos, entender-se com os chefes tribais com o objetivo de uma posterior administração própria, promover tribunais e modernizar a economia dos nativos, introduzir máquinas e com elas também promover o melhoramento das estradas. Enquanto isso, a mim cabiam as tarefas de nos instalar e cuidar da economia doméstica. De Singapura trouxemos dois chineses como cozinheiro e serviçal. Além deles duas moças, dois empregados e dois tratadores de cavalos dentre o povo local. Nos fundos a nossa casa estava cercada por uma extensa plantação de coqueiros, entre os quais, à tarde, fazíamos os nossos passeios, quando a brisa do campo trazia o frescor depois do calor opressivo do dia. O termômetro já de manhã às 8 horas mostrava 28 graus Celsius à sombra e a temperatura ao meio dia, entra ano sai ano, nunca ficava abaixo dos 33 graus. No início sofri muito com este calor e o sofrimento foi logo agravado pela ocorrência da malária. Até o nascimento da minha primeira filhinha, em meados de Dezembro de 1903, tive que suportar 14 graves crises agudas de malaria, de sorte que na época do Natal minhas forças estavam esgotadas. Recusei a proposta do médico que sugeriu um tempo de recuperação na Austrália e, em vez disso, acompanhei o meu marido, no ano de 1904, numa viagem a serviço a bordo do vapor do governo ‘Seestern’ para Nova Mecklenburgo. No retorno para Herbertshöhe eu já me sentia recuperada a ponto de poder acompanhar o meu marido a cavalo ou de carruagem em suas viagens oficiais para o interior. Com isso aprendi a conhecer mais de perto os nativos, seus costumes e suas tradições. 23 O casamento entre os nativos se consuma como um ato de compra e venda. Os pais e parentes, de ambos os lados, já cedo acertam o casamento entre os filhos e, muitas vezes, a noiva acaba sendo educada na cabana dos futuros sogros. Uma simpatia posterior por outra pessoa destrói estes acertos precoces, assim que muitas brigas de sangue tinham a sua origem em tal noivado rompido. A parte mais difícil do casamento era o valor fixado pelos familiares da noiva, o qual, tinha que ser pago pelos familiares do noivo em forma de dinheiro de conchas. Aqui normalmente se desencadeava um longo processo de pechincha, até que se estabelecesse um consenso. Não raro os dois partidos em disputa compareciam diante do funcionário administrativo alemão para que este determinasse o valor da menina. A sorte das mulheres não é das melhores. Sobre elas repousam os encargos e cuidados da casa, elas cuidam da plantação, carregam os produtos do campo até o fogão doméstico e levam ao mercado, a cada terceiro dia, pesadas cargas de alimentos, como taro17, jam18, batata doce, bananas e abacaxis para vender ou trocar com outros produtos, especialmente, peixes. O marido derruba a mata virgem e constrói uma casinha simples, sendo que pesca e caça também são os seus afazeres. Antes de se estabelecer a paz geral, os jovens ficavam permanentemente de guarda na divisa do seu território, pois, nunca se estava seguro que o máu vizinho executasse um assalto para buscar uma presa em forma de carne humana. O canibalismo fez numerosas vítimas entre a população. A coisa ia até o extremo de se alimentar bem os prisioneiros raptados, tanto homens como mulheres, engordando-os para serem sacrificados e comidos em alguma ocasião festiva. Lembro-me que ainda no ano de 1908 na ilha Nissan, uma ilha pouco distante ao norte das ilhas Salomão, o governo libertou mulheres nestas condições. A minha área de relações sociais, nos primeiros anos de minha estadia, se restringia à ilha de Matupi e à vila de Herbertshöhe. A pequena ilha Matupi, densamente povoada por nativos, está situada ao pé da cratera ‘Kaia’, e completa o porto de Simpson contra a enseada exterior de Branch, e cada mês é abalada por terríveis terremotos. Quando em 1906 eu estive na ilhota fomos acordados à noite por um crescente abalo. Nós já estávamos acostumados com isso, mas os tremores, acompanhados de um terrível retumbar e trovejar, eram tão fortes, que assustados corremos para o ar livre. Na escuridão da noite, em que nada se podia distinguir, ouvia-se vindo do mar um forte rugir de ondas que mais e mais se aproximava. Das cabanas dos nativos ouviam-se horríveis gritos de choro e desespero. Eu estava esperando o pior e vivi momentos dolorosos até que o estrondo das águas diminuiu e o terremoto passou. Após os navios do correio terem zarpado, os quais, naquele tempo apareciam a cada seis semanas, também os navios de guerra deixavam a proteção do porto; então,geralmente, 17 18 Um tubérculo Idem 24 também o vapor a serviço do governo partia para suas missões, nas quais eu, frequentemente, participava e assim aprendi a conhecer aquela vasta área do protetorado em todas as suas partes. Minha primeira viagem me levou a São Matias, um grupo de ilhas a norte de Nova Hannover. Aqui em 1900 uma expedição científica foi atacada durante o desembarque e, além de alguns soldados nativos, também foram mortos dois europeus. Na punição mais tarde foram feitos prisioneiros algumas mulheres e crianças e levados para Herbertshöhe. Depois de receberem alguns conhecimentos linguísticos e se acostumarem ao modo de vida dos europeus, deveria ser feita a tentativa de travar por intermédio delas contato com os membros da sua tribo até então totalmente inacessíveis. Certa manhã ancoramos num porto espaçoso, formado de recifes rasos e pequenas ilhas de corais.Meu marido embarcou com os prisioneiros na primeira canoa e remaram para a ilha. As embarcações pararam nos recifes, os passageiros entraram na água e pela água rasa chegaram à terra firme. Lá nos arbustos exuberantes da praia viam-se os corpos nus de criaturas escuras. Podia-se perceber com facilidade que estes homens, aparentemente desarmados, estavam arrastando lanças entre os dedos do pés. Depois de longos momentos de suspense as mulheres e as crianças passaram para o lado dos seus patrícios e desapareceram no escuro da mata. As mulheres tinham recebido instrução de tentar influenciar seus compatriotas de tal forma, que estes, desarmados, voltassem na manhã seguinte em suas canoas até perto do navio. O plano deu certo. Primeiro uma única canoa com dois ocupantes arriscou se aproximar. Um presente, em forma de contas de vidro e panos vermelhos, aumentou a confiança dos dois homens. E logo pudemos contar umas 60 embarcações lotadas em volta do vapor. Na verdade os nativos eram barulhentos e gritavam, mas os tesouros oferecidos pelos Europeus, tal como facas, machadinhas, espelhos, pérolas e echarpes os atraíam, de forma que logo se estabeleceu uma relação amistosa com eles, a qual, se manteria doravante.” Estes relatos foram tirados de uma palestra que a Sra. Hahl proferiu, diante de um auditório feminino, alguns anos mais tarde, sobre o seu tempo em Nova Guiné. O final seguirá mais tarde... Mas voltemos ao Dr. Hahl e seus anos de governo: “Em meados de abril tivemos uma recepção solene e calorosa em Herbertshöhe. Rapidamente, mais uma vez, eu me vi no meio dos afazeres nos quais fui introduzido pelo meu substituto. 25 Nos primeiros anos a vida da minha mulher não foi fácil. Ela sofria muito com a malária. Minhas caminhadas, marchas e viagens, frequentemente, a deixavam por longo tempo sozinha nos altos abandonados de Vuna-Bakut. Em 15 de dezembro de 1903 nasceu-nos uma filha. A Sra. Parkinson e a Irmã Augusta cuidaram, fielmente, da minha mulher e da pequena Berta. A minha sugestão de procurar recuperação na Austrália sofreu brava resistência. A participação de uma viagem no ‘Seestern’ trouxe, após um agora possível e rigoroso tratamento de quinino, uma total recuperação da saúde e das forças. Durante anos minha mulher ficaria poupada da malária. Só então ela conseguiu conhecer e aproveitar as belezas desta terra bem como também se dedicar às obrigações sociais. De meados de maio até fins de setembro eu estava em constantes viagens. Uma pesquisa no porto de Peter evidenciou que naquele grupo de ilhas os nativos mantinham a paz. As vinganças de sangue tinham acabado, o que era o melhor testemunho para o sucesso do árduo trabalho de educação. Também em termos econômicos havia progresso. A plantação de Finschhafen, adquirida e expandida pela Companhia da Nova Guiné, começou a produzir, também a pecuária se desenvolveu bem a partir de começos humildes e no altiplano do Sattelberg19 se trabalhava com o arado. O tráfego dali até o litoral se realizava com carros de boi nas estradas abertas pela missão. No porto de Hanam, na parte oriental da península de Willaumez ainda não era possível estabelecer contato com os nativos; eles se esquivavam de qualquer aproximação e só mais tarde seriam ganhos para o comércio. Foi lá que visitei o grande campo de gêiseres não longe do porto, um local maravilhoso de forças da natureza. A impressão era reforçada pela observação, não muito distante, dos grandes vulcões Naulavun, Bamus, Zweispitzenberg em plena atividade. Fumaça, fogo, erupção de cinzas e rios de lava que corriam até o litoral davam testemunho da violência das forças subterrâneas. 19 Morro da Sela 26 No ano de 1904, em inícios de agosto, o vapor do correio trouxe a notícia que os nativos das ilhas de Siar e Rageta tinham planejado um assalto ao porto de Friedrich Wilhelm e a morte de todos os europeus. No último momento, quando os nativos já se aproximavam em suas canoas, os planos foram denunciados. Seis líderes puderam ser presos e a autoridade distrital conseguiu assenhorear-se da situação. Naquela ocasião eu me encontrava em Ponape, sobre a qual tinha se abatido um pesado tufão. No retorno passei por Namanula e fiquei sabendo que em 13 de agosto os nativos de Baining tinham matado o Padre Rascher, o Padre Rütten bem como outros três irmãos e cinco irmãs. Esta notícia muito me abateu pessoalmente. Algumas semanas antes eu ainda visitara a colônia. Por alguns alunos o Padre Rascher tinha sido informado que os Baining das colinas de Kara queriam a sua vida. Só que ele, quando eu o adverti do perigo, alegou que estas notícias eram contraditórias, que ele estava vivendo no meio de uma população cuja língua conhecia e que tinha recebido por parte da sua Missão somente benefícios. O maioral dos bandidos foi um homem comprado pela missão da escravidão dos Livianes e educado em Vunapope, depois do que foi morar em São Paulo. Ele estava tendo um caso com Sawunut, mulher de outro morador da aldeia. O Padre, cônscio da sua autoridade, interferiu e mandou a mulher embora. Tomaria, então, se vingou e matou o padre com o rifle de caça recebido, e, depois, matou os demais membros da missão com a ajuda dos seus familiares da Serra de Kara. Os agressores fugiram, mas alguns dos assassinos foram presos e, depois do seu julgamento pela justiça do lugar, fuzilados. O trabalho promissor da Missão em Baining foi interrompido até que se restaurou a paz entre a população de novo. Finalmente em meados de setembro eu cheguei ao Porto de Friedrich Wilhelm. Os nativos não ousaram tramar uma nova resistência, porém, a atitude abertamente hostil contra o elemento europeu continuou agora a se alastrar por toda a costa até a fronteira com a Papua Holandesa.” 27 Luise Hahl: Em 1905 as Carolinas do Leste e Central foram devastadas por um terrível tufão. O vapor governamental foi carregado de mantimentos e carvão e foi ao mar. As devastações causadas pelo tufão eram horríveis. Centenas de pessoas foram mortas e os sobreviventes tinham uma vida miserável. Os mantimentos foram distribuídos e mais de 600 pessoas foram recebidas a bordo e levadas para outras ilhas. Na volta de Ponape ainda aportamos em Kaiwieng e Namatanai, ambas da administração de Nova Mecklenburgo. Aqui havia paz e ordem, embora numa localidade recém-aberta na mata meu marido temia a resistência por parte dos nativos. Depois de ausentes por mais de cinco semanas e de termos percorrido 35.000 milhas náuticas, o que é mais do que a distância entre Hamburgo e Nova York, retornamos bem guardados a Herberstshöhe. Por aí se pode aquilatar a grande distância daquelas ilhas dispersas pelo oceano.” Albert Hahl: “A forma costumeira de administração dos europeus conhecia apenas o latifúndio. No entanto, era possível que pessoas com menos posses, mas com conhecimento agrícola, também se estabelecessem na terra. Os ganhos do comércio voltavam para o solo e beneficiavam a colônia. A experiência mostrava que todos aqueles que eram agricultores natos também tinham êxito nos seus emprendimentos. Os nativos tinham apenas o cachorro e o porco como animais domésticos, ambos de raças caipiras. De Queensland eu trouxe bons porcos de raça e os confiei àquelas pessoas. A criação deu bom resultado e no decorrer dos anos o seu número chegou às centenas. No Estreito de Buka eu até recebi uma homenagem: Exibiram-me um macho bem desenvolvido e me informaram que como sinal de gratidão lhe deram o meu nome... Na primavera de 1906 fiz uma viagem de férias com minha mulher e filha até a pátria. Não encontrei mais a minha querida mãe que havia falecido. Aconteceu comigo o que ocorre com tantos alemães que se vão além-mar. No retorno a gente encontra as lacunas dos que partiram, assim que os primeiros dias de permanência são ocupados com lembranças dolorosas. Logo que cheguei me dirigi a Berlim, onde estavam ocupados em transformar o Departamento de Colonização do Ministério do Exterior em um Ministério de Colonização. 28 Entre outros foram destinados recursos para a instalação em Rabaul de uma escola para filhos de europeus e nativos. Em março de 1907 retornei com as minhas queridas ao Protetorado encorajado para o trabalho. Na segunda metade do ano fermentava a desordem na parte Leste do Kaiser Wilhelms Land, na área da missão de Neuendettelsau. A população à beira mar era amiga da missão e a queria bem. Mas agora os Lae Womba do médio e alto Markharn avançaram sobre a costa para saquear bens e carne humana. Certa ocasião assaltaram a aldeia Lakamo enquanto os moradores estavam reunidos na igreja para o culto matinal; os homens foram mortos e as mulheres e crianças sequestradas. As operações contra os bandidos não tiveram êxito, pois, eles se retiraram para as montanhas íngremes e nunca foram encontrados. Para a instalação mesmo que fosse de apenas um único posto policial faltavam os meios. Em início de setembro recebemos a notícia que as ilhas Mortlock, nas Carolinas Centrais, tinham sido devastadas por um tufão. Temia-se por um tempo de fome entre os nativos. O ‘Seestern’ foi logo carregado de gêneros alimentícios e dirigiu-se a todo vapor para o norte. Já na entrada da laguna vieram ao encontro do navio dois barcos de guiga20, ocupados por gente emagrecida, cujo primeiro grito foi um pedido por comida. A devastação tinha sido terrível. Algumas das ilhas planas foram lavadas pelas ondas de tal modo a aparecerem apenas as rochas de corais. Os nativos sobreviventes reuniram-se na ilha principal e sobreviveram com a pesca. À tarde o ‘Seestern’ lançou âncora e fez descarregar arroz, carne, chá, pão tostado e alguns panelões. Durante toda a noite as labaredas do fogo brilhavam na praia e incansavelmente cozinhavam e se regalavam. Deixamos na ilha os homens mais fortes, abastecidos com alimentos e ferramentas para a reconstrução do lugar. Recebi a bordo 627 nativos e os levei até Truck e Ponape. De Ponape continuei minha viagem até as ilhas Marshall. O outono de 1909 transcorreu sem notícias perturbadoras das áreas distantes, de forma que me pude dedicar a tarefas urgentes, entre elas a transferência do governo de Herbertshöhe para Rabaul. Fizemos a mudança no início de 1910. 20 espécie de catamarã 29 Nos anos de 1905 e 1906 foi construída uma estrada larga ligando a planície materna do litoral com Namanula, a filha do norte. Naquele elevado arejado e saudável foram construídos o hospital para europeus, a residência do médico e a moradia do governador. Mais uma vez se aproximava para mim e os meus um tempo de férias na pátria. Em meados de abril entreguei os negócios e, com o vapor ‘Prinz Sigismund’, fomos rumo ao norte. Em Hong-kong tivemos tempo suficiente para um passeio a Cantão. No Japão ancoramos em Nara e Kioto, porque a arte das lindas cidades japonesas antigas nos interessavam muito mais do que o burburinho das cidades portuárias. A longa viagem de Vladivostok até Moscou, atravessando a Sibéria, levou 10 dias e a passagem na antiga cidade dos czares nos compensou ricamente por todas as dificuldades na longa viagem de trem. No início de junho chegamos a Berlim. No Secretário de Estado L. encontrei uma ajuda compreensiva para as necessidades urgentes do protetorado. Os acontecimentos dos últimos anos foram analisados, bem como a evolução da Colônia. Nas áreas dos postos administrativos a paz e segurança do tráfego tinham-se instalado; aumentara a contratação de trabalhadores e o cultivo próprio dos nativos tinha sido fomentado. O acordo alcançado em Berlim sobre as responsabilidades gerais da administração do Protetorado foi alimentado da esperança e expectativa de uma evolução segura nos anos seguintes. Todavia, antes do natal, veio uma má notícia. O clima em Ponape nos últimos anos sempre esteve tenso e agora, então, se desencadeou a briga entre caciques recalcitrantes, embora se tratasse apenas da abertura de estradas contra o que a população não se opunha de forma alguma. O gerente distrital B. foi com o seu secretário até o lugar onde os trabalhos tinham sido embargados. Ambos foram mortos a facadas, bem como 5 nativos da tripulação do barco. Após outros conflitos, os insurgentes punidos foram levados para Jap e, mais tarde, radicados nas ilhas Paula. Com o moral um pouco abatido preparei a viagem de volta em janeiro de 1911. Reassumi os negócios em Rabaul em 3 de março. No final do mês se reuniu o conselho 30 governamental para discutir as propostas de orçamento para o ano de 1912. A disposição da pátria para a abertura de novas frentes no Protetorado encontrou ouvintes satisfeitos. A três de abril embarquei para uma viagem à região das ilhas. Com o vapor do correio ‘Germânia’ da Companhia Jaluit cheguei à ilha de fosfato Nauru e às ilhas Marshall. Não mexemos na forma tradicional de administração nativa naquela área insular, porque ela há anos funcionava sem problemas. Em Kopra, na ilha Nauru, eu só mudei o sistema de pagamento em forma de produtos naturais para um imposto por pessoa, já que os nativos estavam tendo boas receitas em conexão com a mineradora do fosfato. As negociações mal estavam concluídas, quando se abateu sobre a atribulada ilhota um pesado tufão. A força da tempestade foi tão grande que fortes mangueiras e coqueiros não foram apenas derrubados, mas arrancados do solo e suas raízes voltadas ao céu. Especialmente o sul da ilha foi atingido, onde mais uma vez foi arrasada toda a plantação. Nesta viagem pisei pela primeira vez nas ilhas Marianas, chegando até Papan e Agrigan, no norte do grupo. Em todas as partes me deparei com trabalho caprichado e lucrativo. Foram implantadas boas estradas e se desenvolviam ricas plantações de palmeiras tanto dos nativos como do governo. As escolas públicas eram bem frequentadas e a juventude dominava a nossa língua. Lamentável era apenas a pequena densidade demográfica de umas 3.000 almas e o seu fraco crescimento. Doenças venéreas, doenças oculares e verminoses eram os males principais. Em Jap embarquei no vapor do correio e alcancei Rabaul a 4 de julho. Encontrei minha mulher prostrada em profundo luto; a última correspondência trouxera a notícia da morte da sua mãe. A vida social continuava intensa, tanto em Rabaul como nos arredores. A hospitalidade era praticada em grande medida. Costumes alemães caracterizavam as festas e reuniões. Na noite de Natal a árvore natalina ladeava a mesa dos presentes em todas as casas; a casuarina21 substituía o pinheirinho. Em princípios de dezembro de 1911 nasceu nossa segunda filha, Karola Namanula. A chegada desta criança natalina foi motivo de alegria especial na celebração do Natal em nossa casa. 21 Árvore característica do Pacífico Sul. 31 Baseado em Herbertshöhe e Rabaul, o serviço médico tornou-se uma benção. Um quinto do orçamento do Protetorado era gasto com a saúde, mas apesar disso a população não teve um aumento significativo. As tentativas de instalação do entreposto de Eitape com o objetivo de motivar malaios dalém fronteira holandesa a se radicarem ali, não vingaram. Eles vinham dispostos e habilidosos como caçadores ou comerciantes, mas logo retornavam quando tinham juntado algumas centenas de marcos22. Um assentamento local não teve sucesso. Para os trabalhos mais especializados como artesãos, cozinheiros, guardas, operadores de máquinas e comerciantes, há muitos anos, os chineses se prestavam e se tornaram indispensáveis. Pareceu-me imprescindivel segurá-los na nossa terra motivando-os a fixarem residência, a fim de incrementar a imigração, mas minha opinião neste sentido sempre encontrou resistência. Ninguém queria perder o chinês, mas, também ninguém o queria como morador da terra. Só mais tarde se reconheceu que a Nova Guiné, com sua população nativa a diminuir, a longo prazo não podia prescindir da imigração e assentamento de pessoas trabalhadoras resistentes aos trópicos, não importando a sua origem. O aumento da população européia, segundo o último censo 1600 pessoas, entre as quais 1005 alemães, aconteceu devido à imigração. Também mulheres tinham vindo em número crescente. Havia 135 casais europeus no lugar mas com pequena prole. As mulheres sofriam mais com o clima do que os homens. Pensar numa colonização em pequenos povoados na vasta planície, infestada de malária, nem se podia pensar e para uma colonização das montanhas faltavam as estradas.” 22 Marcos: veja moedas e selo 32 Luise Hahl: “Com o cancelamento de uma viagem de férias para a pátria em 1906, ficamos em Herbertshöhe até 1910. Foi quando aconteceu a transferência da sede de governo para ‘Rabaul’, a nova capital daquela terra. Rabaul, em poucos anos, cresceu e se tornou uma cidade, na qual, viviam uns 800 europeus e uns 3000 nativos e chineses.Por mais que eu gostasse de Herbertshöhe, creio que tive mais sorte com a troca. A nova casa se elevava uns 150m acima do nível do mar numa encosta e se compunha de duas construções unidas por um corredor. A primeira servia como parte social e na segunda estavam os cômodos privativos, sendo que a cozinha estava um pouco afastada com as áreas de serviço. O crescente desenvolvimento do país e o aumento do tráfego trouxe consigo uma porção de compromissos. Isso já se fazia notar pelo aumento do número de empregados que subiu para 16 pessoas, sendo que o cozinheiro não dava mais conta do seu trabalho. Não era a representação que consumia a minha força, mas a reunião e consolidação da Companhia Alemã. As mulheres, das quais, nos últimos tempos havia umas 120, congregaram-se sob minha presidência em um departamento filiado à Sociedade Colonial Alemã de Sociedades de Senhoras. Uma Sociedade Escolar motivou também a agregação dos outros sócios da colônia, tanto alemães como estranhos, em vista do empreendimento sem fins lucrativos. Nos anos de 1913 e 14 os mares do Pacifico Sul atraíram os artistas – um deles era Emil Nolde. Ele integrava uma expedição de pesquisa do Serviço Imperial de Colonização e estava em viagem de outubro de 1913 até setembro de 1914. Foi uma longa jornada que o levou através de Varsóvia, Moscou, a Manchúria, de Kobe até Nagasaki, atravessando o Mar Amarelo até a China, por uma breve estadia em Manila até o Oceano Pacífico.” Lá chegado, ele assevera: O convés se encheu de nativos morenos, quase nus. Como nos admiramos! Com a sua vasta cabeleira, suas jóias de conchas penduradas nas pernas, nos braços e pescoço ou nas orelhas; alguns tinham um ossinho branco atravessado pelo nariz. Estes homens eram canibais, um conceito sinistro para nós europeus, pelo que olhamos fascinados... 13 de dezembro chegada a Rabaul em Nova Pomerânia, então capital do Protetorado Nova Guiné Alemã. 24 de dezembro, véspera de natal, naquele calor. Era quase impossível sentir algum espírito do Natal. 33 Nolde23 pintava e desenhava de preferência os nativos como ele os via, na tentativa de assegurar algo do ‘espírito da terra virgem’. A tentativa não era isenta de perigo. Eu havia sido ingênuo; não conhecia os pensamentos secretos dos selvagens, seus costumes e tradições, nem suas crenças ou conceito de deus. Eu ainda não sabia que em todas as tribos havia a crença que a partir do momento em que alguém possui alguma coisa do outro, que seja apenas um cabelo ou, como neste caso, o seu retrato, podia fazer com este o que quisesse. A 28 de janeiro de 1914 Nolde adoeceu de uma disenteria amébica. Eu estava ardendo em sede, alimentado com água e vinho, anestesiado pela morfina; certamente todos contando com a minha morte. Mas eu não me entregava. Então me mandaram para Toma, onde os colonos exauridos procuravam tratamento. Uma vez restabelescido ele24 ainda encontrou oportunidade para pintar e desenhar até que, em 16 de maio de 1914, com o vapor ‘Manila’ e acompanhado da mulher Ada, deixou a Nova Guiné. Há um ano tínhamos deixado a nossa Ilha Alsen. Seis meses nós viajávamos e seis meses ficávamos na Nova Guiné. Aquele ano para nós foi extremamente importante, tão importante como se fossem dez anos.25 23 Importante pintor alemão. Nolde 25 O parágrado está sem nexo com a fala de Hahl. Possivelmente faz parte da fala de Nolde a seguir. (NT) 24 34 Anos mais tarde as suas obras foram destinadas à Secretaria Imperial de Colonização, em Berlim.26 Emil Nolde: “Quando as 50 pinturas foram selecionadas, estava presente também o Governador da Nova Guiné. Nós nos conhecemos lá longe e eu não lhe parecera muito simpático e ele não aprovava o meu trabalho. Por isso, fiquei tanto mais admirado quando ele, agora distante e afastado da realidade, revelou o seu interesse nos meus quadros. “Esse homem daí eu conheço – e aquele lá também – este aí vive naquela ilha, aquele faz parte daquela tribo – mas isso é ótimo!“ foram as suas palavras. Ele passou de folha em folha, distribuídas numa grande mesa, olhando, definindo, escolhendo...” Albert Hahl: Com a conclusão e discussão de todos os planos chegou a primavera de 1914. Para mim e para os meus chegara o tempo de nos dirigir mais uma vez em direção da pátria, dessa vez para sempre. Eu pensava em me dedicar futuramente à terra que nos dezoito anos de trabalho se me tornou preciosa, mas a partir da Alemanha. A despedida dos amigos e conhecidos, tanto os de cor como os brancos, foi comovente. Luise Hahl lembra isso assim: Os meses que ainda nos estavam reservados na colônia passaram rapidamente, assim que depois do Natal começaram os preparativos de viagem. Não foi nada fácil ordenar, classificar e empacotar as coisas coletadas e as lembranças que se acumularam com o passar dos anos. Posso assegurar que só a ideia da despedida da terra, que comecei a amar, me encheram de saudade. Mas para o meu marido era imprescindível voltar para casa, depois de mais de 18 anos de serviço nos trópicos. Nenhum dos bons amigos queria deixar de se despedir de maneira especial, de forma que se seguiram muitos dias árduos de visitas, até que pudemos embarcar no vapor do correio sob a escolta de toda colônia, para sermos conduzidos para casa. Com lágrimas nos olhos eu estive no convés e observei como, rapidamente, as altas montanhas da Península das Gazelas afundavam no mar junto com o sol poente. 26 No original alemão há cópias de algumas pinturas características da Nova Guiné de Nolde. (NT) 35 Albert Hahl ainda chegou a tempo com sua família para o início da guerra na Alemanha, onde logo se apresentou como Capitão do seu regimento. Logo, porém, o governo imperial se lembrou deste homem como pessoa altamente qualificada falando, fluentemente, diversas línguas, e o enviou para a Turquia aliada, onde trabalhou como Subsecretário de Estado no Ministério da Agricultura, a serviço do Sultão, até meados de 1918. Em agosto daquele ano ele se aposentou – dois meses antes da derrocada do Império Otomano - e aceitou o posto de Diretor Geral da Sociedade para a Nova Guiné. Esta ele dirigiu com sede em Berlim. Depois da morte da sua mulher, em 1935, mudou-se com tudo para Gern. Poucos meses depois de ter abandonado o bairro do Tiergarten onde vivera, este foi totalmente destruído.27 Em Gern, no abrigo da casa do seu irmão, sob os cuidados amáveis das suas filhas, ele sobreviveu a guerra e a rendição. Ele morreu no dia do natal de 1945. No cemitério São Sebastião de Gern uma simples lápide lembra o grande homem – uma praça de Gern leva o seu nome. Albert Hahl foi tio do meu marido que o admirava e venerava. Em um artigo, certa vez, ele assim se expressou: “Albert Hahl era o ídolo da nossa família, embora naquela época ainda não tivéssemos aquilatado a magnitude da sua personalidade, a extensão das suas realizações e a sua carreira extraordinária” Uma das suas netas, Karin MolckUde, nasc. Rühmann, vive junto ao lago de Starnberg. Ela me cedeu o livro do seu avô ‘Anos de Governo na Nova Guiné’, além de muito material iconográfico bem como informações, pelo que muito lhe agradeço. Também quero agradecer à minha nora Angela Kempfler pelo seu apoio no preparo e publicação desta biografia. 27 na 2ª Guerra Mundial, NT 36 Karin Molck-Ude viveu de 1939 a 1953 com os seus pais em Gern – seis anos na companhia do amado avô Albert Hahl. A memória daquele tempo ela guardou nas seguintes palavras: “O desejo do meu avô sempre foi o de terminar os seus dias em Gern, a aldeia bucólica na baixa Baviera, sua terra natal. Em sociedade com o seu irmão Emil, administrador rural, e sua cunhada Anna ele adquiriu fora do perímetro urbano da localidade, no Gaisberg, uma grande e linda propriedade. Construíram uma casa bonita e espaçosa. Infelizmente o irmão morreu antes de o avô poder se mudar para lá. Os meus pais (a segunda filha, Carola, com o marido) visitaram comigo o avô em Berlim por ocasião do seu aniversário que estava se aproximando. Vínhamos da Argentina para um assim chamado período de férias na pátria. A eclosão da guerra, em setembro de 1939, nos impediu de para lá retornarmos. Por essa razão, , resolvemos morar com o avô em Gern, no Gaisberg, ainda no outono daquele ano. Desta forma vivemos, em três gerações, debaixo de um mesmo teto, em união e harmonia e compartilhamos alegria e pesar. Depois da morte da amada esposa, após o luto e a solidão, o avô se sentia feliz em ter uma família à sua volta. Destarte passei os últimos seis anos de vida do meu avô na sua companhia, em casa, no jardim ou em passeios. Ele foi um homem amável, bondoso, caloroso, compassivo e humilde, sempre atencioso e prestativo. Ele sempre estava ocupado e ativo. Com tempo bom ele cuidava da horta, do pomar e da colheita. Desta forma passamos bem a guerra. Fomos capazes de nos sustentar a nós mesmos, para deleite da sua cunhada Anna, que processava a colheita na cozinha. Lá ela era uma excelente mestre na sua arte e cozinhava para toda a família. Diariamente e depois de cada refeição o avô lhe agradecia com as palavras: „Anna foi excelente!” Além disso ele sempre rachava a lenha, para termos um estoque para os fogões na casa. Ele também trabalhava bastante no escritório – ainda recebia pedidos por relatórios sobre a sua atividade no passado e preparava palestras. Ele mantinha uma volumosa correspondência, lia os jornais e se interessava por muitas coisas. 37 Nas longas noites de inverno, ele cortava com uma navalha o tabaco de colheita própria sobre uma tabuinha de madeira em tirinhas bem finas, o que dobrava o prazer pelo charuto. Uma das coisas mais prazerosas para mim eram as suas histórias. Noite após noite, sentado na beira da minha cama, ele contava de animais, de pessoas em terras longínquas, seus costumes e hábitos e das suas experiências. Memorável para mim! Devido as reviravoltas da guerra sempre mais membros da família vieram para Gern. Desta forma também a sua filha mais velha, a tia Berta com seu marido, o seu irmão mais novo com mulher e filhos, foram acomodados na escola. Como pessoa que prezava a família ele ficou muito feliz com isto. Por outro lado, estava aflito com o fato de não ter notícias do seu filho Albert. Só dois dias após a morte do vovô recebemos um cartão com um sinal de vida da distante Laponia. Teríamos gostado demais de lhe ter feito esta alegria em vida. Ereto, como durante toda a sua vida, vovô ficou até o último suspiro. O último dia da sua vida passou sentado na poltrona, com os pés frios apoiados sobre um tijolo aquecido e enrolado num cobertor. Todos os membros da família reunidos em sua volta, podiam falar com ele e lhe dar adeus, até que na noite do dia do Natal de 1945, calmamente, fechou os olhos para sempre.“ 38 39 EPILOGO Uma breve história da Nova Guiné De Mr. B. Biskup, da Universidade Nacional Australiana. Com base em anos de pesquisa, Biskup traça em seu livro um quadro objetivo das atividades deste Governador alemão – uma imagem cheia de admiração pelo ethos humano, habilidade e eficiência do pioneiro colonial Dr. Hahl. Com admiração é enfatizado o seu conhecimento das muitas línguas que ele dominava sem problemas: francês, inglês, latim, Pidgin, além de cinco dialetos nativos. O Pacífico Sul alemão de Joseph Hiery A administração colonial do Império está intimamente ligada à pessoa de Albert Hahl, cuja figura imprimiu profundamente a sua marca pessoal na Nova Guiné Alemã. Os curtos dois anos e meio de atividade do seu antecessor Rudolf von Bennigsen devem ser vistos apenas como uma espécie de interregno. A tarefa de Bennigsen consistiu, principalmente, em organizar a confusa e caótica situação que ele classificava de negligenciada. O filho do afamado político liberal nacional e presidente da Câmara dos Deputados da Prússia logo entrou em choque com seus superiores em Berlim. As suas idéias trazidas da África Oriental eram, assim julgava o Departamento Colonial, inapropriadas para a Nova Guiné. Alegando razões de saúde renunciou ao cargo. Com ele terminou, definitivamente, a influência da nobreza e da aristocracia na política da Companhia da Nova Guiné. Hahl era de uma postura e mentalidade diferentes. Criado no interior na baixa Baviera, como filho de classe média, era um jovem de mente aberta que se deixava entusiasmar. Tinha uma formação jurídica e sabia distinguir entre o conteúdo das leis da mera letra da lei. Hahl era paciente, sabia ouvir, externava certo bom humor, mas demonstrava uma forte ética de trabalho e um senso extraordinário de dever e responsabilidade diante de todos os habitantes da Colônia...“ 40 Uma viajante inglesa que se encontrou com Hahl em 1908 resumiu suas impressões com as palavras: „Eu logo gostei dele. Honrado, genial e de índole amigável ele começou a falar num inglês excelente. De estatura mediana, bem nutrido, mas extremamente ativo; em verdade ele parecia trazer consigo uma força particular.“ E, finalmente, manifestações de velhos nativos da tribo dos Tolais que ainda muitos anos mais tarde se lembravam de Hahl e o classificavam no seu inglês-pidgin como o seu ‘fiel e bom amigo’. A antiga colônia alemã, primeiramente28 foi administrada pela Austrália, a mando da Liga das Nações e em 1942 foi ocupada pelo Japão, mas em 1946 devolvida pela ONU à Austrália. Desde 1975 Papua-Nova Guiné é república e faz parte, como a sua última Protetora Austrália, do Commonwealth britânico. A rainha Elisabeth II é chefe de estado dos 3 milhões de habitantes. 28 NT: depois da derrota alemã na 1ª guerra 41