Sociedade pós-moderna
a dualidade
de
ser
líder
NA SOCIEDADE PÓS-MODERNA
“Aos que se mantêm à parte, os celulares
permitem permanecer em contato. Aos
que permanecem em contato, os celulares permitem manter-se à parte.....”
ZYGMUNT BAUMAN
INTRODUÇÃO
A
“A dificuldade é contraprodutiva num
regime flexível. Por um terrível paradoxo, quando diminuímos a dificuldade
e a resistência, criamos as condições
mesmas para a atividade acrítica e indiferente por parte dos usuários.”
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RICHARD SENNETT
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A frenética cidade de São Paulo onde vivo, encontro
diariamente vários executivos, homens e mulheres
das mais variadas idades, líderes em empresas nacionais, globalizadas, de pequeno, médio e grande
portes. Converso rapidamente com muitos deles e,
com outros, tenho conversas longas, durante coachings, workshops, aulas e contatos profissionais
dos mais diversos. Seria quase impossível imaginar
que exista alguma coisa em comum entre esses diferentes profissionais, no entanto algo os une – uma
certa angústia demonstrada por seus risos irônicos,
gestos nervosos, reclamações em relação ao tempo,
ao cansaço e um sentimento de culpa pela falta que
sentem e fazem na família. Essa angústia também
se apresenta numa autocondenação silenciosa de
nunca ser bom o bastante, nunca conseguir agradar
a todos, sempre estar devendo para a empresa, para
a família, para si próprio, enfim, um sentimento que
2008
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reflexão a seguir tem como origem a Visão Gestadora,
desenvolvida por Ramy Arany e Ramy Shanaytá, no
Instituto KVT, do qual faço parte.
Ilustração
Fátima Motta
A liderança abre espaços dentro
de si para essa dualidade não
questionada, ou melhor, às vezes
nem pensada, ou, se pensada,
omissa.
conforto e segurança na relação entre empresa e empregados. A durabilidade dos produtos e das relações
era maior, bem como a oferta por
novidades menor. Por outro lado,
imagino como era difícil viver sem
estar “plugado” com o mundo, com
milhares de amigos desconhecidos,
com informações saltando aos olhos
de segundo a segundo, com a possibilidade de falar em real time com
qualquer país de qualquer continente e fazer compras a um simples
toque de dedos em um teclado.
Vivemos, então, um momento
em que a tecnologia une pessoas
distantes, agiliza o acesso a informações, a produtos, resumindo,
torna tudo mais fácil e rápido. Toda
essa facilidade deveria ter trazido
mais paz, harmonia e tranqüilidade
às pessoas e, às empresas, maior
clareza e abertura nas relações. No
entanto, nada disso ainda pode ser
visto pela maioria das pessoas. Pelo
contrário, os problemas de comuni- Ð
incomoda, mas também propicia
uma reflexão.
Penso, então, como era mais calma
a vida de nossos antepassados,
sem celular, sem computador,
sem internet, sem e-mails. Com
certeza conversavam longamente
com vizinhos, visitavam e eram
visitados por amigos e principalmente as mulheres dedicavam-se
à formação dos filhos, errando
e/ou acertando, mas seguramente
estando mais presentes. Claro
que as dificuldades existiam,
mas o tempo parecia ser mais
longo. As empresas e as pessoas
tinham outro ritmo e havia maior
fidelidade, bem como um certo
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Penso, então, como era mais calma
a vida de nossos antepassados, sem
celular, sem computador, sem internet, sem e-mails.
Toda essa facilidade deveria ter trazido mais
paz, harmonia e tranqüilidade às pessoas e
às empresas, maior clareza e abertura nas
relações. No entanto, nada disso ainda pode
ser visto pela maioria das pessoas.
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Sociedade pós-moderna
Também é pedido que se cuide das pessoas, mas se os resultados não vierem...
Nesse sentido, a liderança, por vezes pressionada, pressiona na mesma medida, é
caça e caçador e, como conseqüência, o
foco em resultados se sobrepõe ao foco
nas pessoas.
cação se avolumam, a falta de clareza em relação aos diversos papéis
também permeia a dinâmica empresarial, com um cansaço que parece
ser eterno, além de relações bastante
tumultuadas, sejam pessoais, sejam profissionais, num mundo em
que o consumo se potencializa,
independentemente da real necessidade. Assim, os produtos, tanto
como as relações pessoais tornam-se
descartáveis, substituíveis, voláteis,
sem que se desenvolva o sentido da
responsabilidade humana perante as
conseqüências desse consumo, seja
de produtos, seja de relações.
Tudo acontece e gira em torno do resultado,
que precisa ser alcançado custe o que custar.
Caso o resultado não aconteça, começa a
caça aos culpados, as demissões e os descartes de pessoas.
Essa dualidade marca a atuação
da liderança que se vê o tempo
todo frente a desafios, às vezes
impossíveis de serem alcançados,
de demandas incompatíveis, mas,
como seu lugar é objeto de desejo
de várias outras pessoas, talvez
mais jovens e mais capazes, abre
espaços dentro de si para essa
dualidade não questionada, ou
melhor, às vezes nem pensada ou,
se pensada, omissa.
Reprodução: Os Simpsons
A DUALIDADE
NA LIDERANÇA
Como se pode buscar metas de longo prazo
numa economia dedicada ao curto prazo?
Como se pode manter lealdades e compromissos mútuos em instituições que vivem
se desfazendo ou sendo continuamente
reprojetadas?
De Santis
Por outro lado, sabemos
que a globalização trouxe
uma grande necessidade de
centralização e uniformização de procedimentos, mas
ao mesmo tempo pede-se
flexibilidade e criatividade
aos líderes e liderados.
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Nas empresas, então, foco no resultado é a palavra de ordem de toda
liderança. Tudo acontece e gira em
torno do resultado, que precisa ser
alcançado, custe o que custar. Caso
o resultado não aconteça, começa
Fátima Motta
Por outro lado, sabemos que a globalização trouxe uma grande necessidade
de centralização e uniformização de
procedimentos, mas ao mesmo tempo
pede-se flexibilidade e criatividade aos
líderes e liderados. Essa briga se instala
no interior de cada líder. Os riscos as-
sumidos serão compensados? Quais
os caminhos a seguir? Será, então, que
a flexibilidade requerida serve para
seguirmos novos controles que chegam
sem muita clareza? A impossibilidade
de questionar esses controles vai trazendo uma fala engolida por parte dos
profissionais que, pressionados pelo
resultado, partem para a execução
desenfreada, sem questionar, sem se
posicionar, atuando por vezes de forma
automática, fragmentada e alienada.
FOCO NAS PESSOAS,
UM DESAFIO
Também é pedido que se cuide das
pessoas, mas se os resultados não
vierem... Nesse sentido, a liderança,
por vezes pressionada, pressiona na
mesma medida, é caça e caçador
e, como conseqüência, o foco em
resultados se sobrepõe ao foco nas
pessoas. No entanto, do mesmo
modo em que o líder é cobrado por
Vivemos, então, um momento onde a tecnologia une pessoas distantes,
agiliza o acesso a informações, a produtos, resumindo, torna tudo
mais fácil e rápido.
resultados, é cobrado também por
gerir pessoas e o gap apresentado
se torna uma carência de desenvolvimento. E é assim que alguns
líderes chegam aos programas de
liderança – sentindo-se incapazes
de entender as pessoas, às vezes
com dificuldades em reconhecer
suas competências profi ssionais,
com a auto-estima baixa e sem
consciência clara do seu papel.
Não percebem, com clareza, a
dualidade em que se encontram
envolvidos e se esmeram para
desenvolver técnicas em gestão
de pessoas e em liderança, sem se
dar conta que a mensagem que a
empresa passa também é dual e não
equilibrada, quando reforça com
vigor que o foco está nos resultados, nos números que precisam ser
alcançados.
Para conseguir esse foco, não dá
tempo para olhar as pessoas, não Ð
Nas empresas, então, foco no resultado
é a palavra de ordem de toda liderança.
Fotos: AT&T
a caça aos culpados, as demissões
e os descartes de pessoas. Em nome
do resultado perde-se a visão da
realidade maior, seja da empresa,
seja das pessoas, seja do ambiente e,
por vezes, os estragos causados são
bastante significativos. Basta lembrar
do lixo que produzimos, responsável
pela poluição dos ares e dos mares
do planeta Terra, fruto, com certeza,
da busca por muitos resultados. No
entanto, ao líder é pedido que pense
de forma estratégica e sistêmica, mas
que não perca o foco nos resultados.
Então, se o pensar mais amplo coloca
em risco planos que levem a resultados imediatos, é melhor não pensar
ou ,se pensar, omitir-se.
Sociedade pós-moderna
imediatismo passa a fazer parte
integrante da relação entre líder e
liderados. Richard Sennett, em seu
livro A Corrosão do Caráter, ajudanos com algumas perguntas:
O ambiente, por sua vez, compõe-se de
instituições com laços fracos, seja porque as
pessoas são descartadas pelas empresas, seja
porque as descartam, de tal forma, que, os
vínculos mais duradouros são mais difíceis
de serem constituídos.
“Como decidimos o que tem valor
duradouro em nós numa sociedade impaciente, que se concentra no momento imediato? Como
Mas, como, então, criar laços duradouros com a equipe, se
tudo precisa ser resolvido de forma rápida e imediata? Por outro
lado, os líderes são clamados para que retenham talentos, que
formem sucessores, convivendo por vezes com a geração Y, que
apresenta, nitidamente, uma tendência à não-valorização de
vínculos, profissionais que viram seus pais serem descartados
depois de vários anos em uma mesma empresa.
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dá tempo para observar suas dificuldades, nem parar para dar um
feedback. No máximo, críticas,
para que logo o desempenho seja
corrigido e o resultado alcançado.
Nesse cenário, as pessoas olham
para seus computadores e para seus
celulares em tempo integral. Deixaram de olhar para olhos humanos
e de enxergar as cores da vida. O
Dominik Gwarek
se pode buscar metas de longo
prazo numa economia dedicada
ao curto prazo? Como se pode
manter lealdades e compromissos
mútuos em instituições que vivem
se desfazendo ou sendo continuamente reprojetadas?”1
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Mas, como, então, criar laços duradouros com a equipe, se tudo precisa ser resolvido de forma rápida e
imediata? Por outro lado, os líderes
são clamados para que retenham
talentos, que formem sucessores,
convivendo por vezes com a geração Y, que apresenta, nitidamente,
uma tendência à não-valorização de
vínculos, profissionais que viram seus
pais serem descartados depois de
vários anos em uma mesma empresa,
talvez por incompetência, talvez pela
idade, e que aprenderam que carreira
é o caminho que se faz sozinho, de
forma independente e individual.
Assim, a liderança tem, por um lado,
um foco volátil e, por outro, liderados
Fátima Motta
voltados a seus interesses individuais.
O ambiente, por sua vez, compõe-se
de instituições com laços fracos, seja
porque as pessoas são descartadas
pelas empresas, seja porque as descartam, de tal forma, que os vínculos
mais duradouros são mais difíceis de
serem constituídos.
TRABALHO EM EQUIPE...
E A COMPETIÇÃO?
Essa tormenta piora quando o líder
é cada vez mais conscientizado
sobre a necessidade do trabalho em
equipe. É imperiosa, uma vez que,
face ao volume de informações,
à competitividade, ao excesso de
problemas a serem resolvidos, à necessidade de novas soluções, sabese que só com uma força coletiva
consegue-se sobreviver a todos esses
desafios. Na nossa sociedade, o
isolamento conduz ao insucesso. No
entanto, mais uma vez a contradição
é denunciada nas empresas quando
a maior parte dos prêmios, bônus
etc. são dados aos indivíduos, por
seus feitos isolados e competitivos
e não à equipe.
O trabalho em equipe, por sua vez,
pressupõe abertura e confiança.
Como confiar em quem é estimulado
a competir? Como cooperar sem foco
e sem comunicação direta? Como
colaborar se não é claro o benefício?
Qual a vantagem? Essas perguntas
ficam por vezes sem resposta e a
solidão vai tomando conta das relações nas empresas e na sociedade,
que se distrai nos chats e nas diversas
telas que enquadram nossa sociedade
pós-moderna, num falso sentimento
de proximidade.
E assim, como diz Bauman2,
“Quando a qualidade o decepciona,
você procura a salvação na
quantidade. Quando a duração não
está disponível, é a rapidez da
mudança que pode redimi-lo.”
Quanto mais gente, melhor. Network
é o que garante o pertencer, mas o
pertencer superficial e descartável. A
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O trabalho em equipe, por sua vez, pressupõe
abertura e confiança. Como confiar em quem é
estimulado a competir? Como cooperar sem foco
e sem comunicação direta? Como colaborar se
não é claro o benefício? Qual a vantagem?
busca frenética pela mensagem, pelo
toque do celular, garantindo a possibilidade da não-resposta, mas com uma
sensação permanente de conexão, sem
importar com a qualidade da conexão,
mas sim com a quantidade. Portanto,
os laços dos relacionamentos podem
ser frágeis e superficiais, facilmente
desconectáveis, mas também múltiplos
e passíveis de mudanças rápidas, desde
que não satisfaçam o prazer imediato.
O ISOLAMENTO
DA CONEXÃO
Esse mundo de tecnologia avançada
traz outro dilema aos líderes, nas empresas IX: verdadeiros malabarismos
precisam ser feitos para que, em vão,
as pessoas fiquem focadas unicamente
no trabalho. Isso já é absolutamente
impossível, seja em função de toda
gama de programas que conectam
tudo a todos, seja os celulares com
toda sorte de conexões. Ou seja, é
uma conexão com tudo e com nada
ao mesmo tempo. É o tudo superficial
e o nada profundo, com conseqüente
queda na qualidade do aqui e agora.
É estar em uma reunião pensando no
toque não atendido do celular, talvez
o cliente − aquele de quem dependem os resultados, − a mensagem de
algum conhecido chamando para um
programa ou para uma balada, ou para
um simples café, mas que não pode
ficar sem resposta. Por outro lado,
é o e-mail enviado para você, mas
com cópia para dezenas de pessoas
cujo assunto não interessa, mas
interessa sua imagem denegrida,
no conflito velado. A conexão é
de dia e de noite. Não há mais o
tempo de descanso, uma vez que
esses aparelhos ficam grudados aos
cintos, bolsas e pastas e exigem Ð
Sociedade pós-moderna
A conexão com tantas coisas faz com
que, o foco se perca e essa dispersão se
evidencia na atuação dos profissionais,
que, por vezes, não ouvem e não se
ouvem, vivendo em mundos isolados
conectados. Conecta-se fora e não se
conecta com o interno, seja esse interno
as pessoas que fazem parte da mesma
equipe, seja com o próprio interior de
cada um, com suas forças e fraquezas,
possibilidades, disponibilidades, vontade e escolha. Sendo assim, as pessoas
acabam não se olhando e, portanto, não
olhando as outras e as qualidades de
Com a falta de um olhar interno,
as pessoas acabam por não se
reconhecerem, a ficarem na dependência do olhar do outro que
nunca vem e que, quando vem,
traz a necessidade da competência
externa e não um reconhecimento
da real competência do ser. Assim,
trazendo para a realidade prática, os
líderes apresentam, por vezes, grandes
dificuldades de se reconhecerem como
líderes, preferindo suas atribuições operacionais, mais fáceis, mais confortáveis. Por
Desenvolver essas atitudes e comportamentos nos atuais líderes não é
nada fácil, dado o foco no resultado
e as inúmeras competências que são
necessárias para a multifuncionalidade. exigida nos nossos dias.
Orlandeli
Sendo assim, as pessoas acabam não
se olhando e, portanto, não olhando as
outras e as qualidades de caráter que
ligam os seres humanos acabam sendo
corrompidas, uma a uma, gerando um
imenso vazio e, não raramente, chegando a doenças físicas e emocionais.
caráter que ligam os seres humanos
acabam sendo corrompidas, uma a
uma, gerando um imenso vazio
e, não raramente, chegando a
doenças físicas e emocionais.
Entendo que caráter, como
define Sennet3, são “os traços
pessoais que damos valor em
nós mesmos, e pelos quais
buscamos que os outros nos
valorizem”.
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uma resposta imediata e os olhos,
de alguma forma viciados, não perdem
nunca a possibilidade desse contato.
outro lado, sentem imensa dificuldade em
olhar para seus liderados, acompanhá-los
e, sobretudo, dar feedback.
E AINDA... FEEDBACK E
QUALIDADE DE VIDA
Vale a pena, nesse momento, relembrar um dos exercícios de feedback
que aplico quando ministro programas de liderança. Nesse exercício os
participantes ficam frente a frente para
dar e receber feedback e a dificuldade
se inicia pelo olhar para o outro. É
uma situação desconfortável para a
maioria dos participantes, e acredito
que para cada um de nós também
seria, porque não é usual olharmos
para outro ser humano e de fato enxergarmos um outro ser que, tal como
nós, tem dúvidas e medos, ansiedades
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Na prática, a qualidade de vida
é invertida pelo trabalho que se
estende por horas e horas a fio
após o fim do expediente, sábados
e domingos, celulares e lap-tops
conectados em tempo integral.
Fica a pergunta: onde vamos parar?
O que fazer diante disso? Respostas
certas e definitivas, acredito que
ninguém as tenha, mas podemos
tecer algumas considerações.
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e talentos, ou seja, ver a humanidade
no outro talvez seja ainda um grande
desafio. Depois desse desafio ainda
tem o de lembrar dos aspectos positivos e oportunidades de melhoria, que
dependem fundamentalmente de uma
observação acurada e acolhedora do
outro, com uma intenção verdadeira
de ajudar para que esse profissional
seja ainda melhor do que é. Por fim, a
coragem de falar de forma clara e amorosa o que foi observado. Desenvolver
essas atitudes e comportamentos nos
atuais líderes não é nada fácil, dado o
foco no resultado e as inúmeras competências que são necessárias para a
multifuncionalidade exigida nos nossos dias. Por outro lado, quem ouve o
feedback, por vezes, tem sua atenção
dispersa pelo volume de estímulos
conscientes e inconscientes que o
fazem compreensível em dimensões
diferentes das esperadas e, como o
vínculo não é dos melhores, a aten-
lares e lap-tops conectados em tempo
integral. Como conseqüência, percebemos um aumento significativo de
afastamentos, seja por doenças físicas
e/ou emocionais. E mais uma vez o líder,
então, é cobrado por não oferecer condições saudáveis de trabalho, apontadas
de forma bastante clara nas pesquisas de
clima. No entanto ele também se sente
pressionado e doente.
E AGORA? O QUE FAZER?
Após estas poucas reflexões, constatamos
que este quadro já é bastante familiar e
talvez fique a pergunta: onde vamos
parar? O que fazer diante disso? Respostas certas e definitivas, acredito que
ninguém as tenha, mas podemos tecer
algumas considerações. Será que é um
ser abstrato que nos joga nessa fogueira
diária? Será que a culpa é das empresas?
Será que a culpa é da tecnologia?
ção ao ouvir, assim como a devida
disposição para mudar, nem sempre se
apresentam de acordo com a expectativa
da liderança, que acaba tendo ainda
mais motivos para desacreditar dessa
técnica, em vez de entendê-la como vital
para o desenvolvimento dos verdadeiros
talentos, tão desejados nas empresas.
Arrisco supor que, lendo a este texto,
stress e uma pequena taquicardia já
podem ser sentidas, mas, além de viver
tudo isso, os líderes recebem outra
pressão: precisam ter e propiciar qualidade de vida e equilíbrio emocional.
Na prática, a qualidade de vida é
invertida pelo trabalho que se estende
por horas e horas a fio após o fim do
expediente, sábados e domingos, celu-
Seria muito mais fácil atribuir a culpa a
algo externo e ficarmos isentos da responsabilidade. Isso nos tornaria também
impotentes em relação à realidade que
nos cerca. No entanto, talvez essa não
seja uma boa alternativa para nenhum
de nós, seres atuantes e conscientes.
Cabe, então, à liderança se apropriar
dessa dualidade em que vive e fazer
escolhas verdadeiras, considerar os reais
valores que pautam a relação entre as
pessoas, restabelecendo sua própria
dignidade e caráter.
Uma escolha refere-se ao negócio e à
empresa onde é posta a sua energia, a
sua força de trabalho, suas emoções,
seus pensamentos. É importante prestar
atenção e observar se seus valores coincidem ou não com os valores da empre- Ð
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Sociedade pós-moderna
sa, mas não
os que estão
na parede e
sim os que
são praticados. Nesse
momento,
talvez seja de
fundamental
importância
identificar também a visão e
a missão, sua
e da empresa,
avaliando se são coerentes. Se os profissionais
fizessem escolhas mais
conscientes, pelos valores
e não pelo dinheiro, talvez
pudessem começar a atuar
no sentido de dar valor ao
que tem, de fato, valor e
com isso questionar a forma
como o resultado é perseguido, as decisões tomadas,
a finalidade pela qual os
times são formados, os reconhecimentos
efetuados e as relações estabelecidas.
Com essa reflexão não minimizo a
importância dos resultados, uma vez
que todas as empresas dependem
deles para sua continuidade, mas, sim,
enfatizo a importância de se reavaliar
a forma como vêm sendo perseguidos,
para que se perceba, analise e atue com
mais propriedade em todo, o processo
que envolve sua execução, a complexidade das relações, o ambiente em que
está inserido, bem como os impactos
gerados.
Outra escolha significativa é a de viver
de acordo com valores humanos, como
respeito, tolerância, lucidez, amor, acolhimento e paciência, valores esses que
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poderiam ajudar à real manutenção
de vínculos com os liderados. Dessa
forma, pode-se levar mais significado
ao trabalho, que é sagrado, no sentido
de possibilitar a realização das forças
e competências individuais e coletivas e, com isso, atuar diretamente na
auto-estima do líder e na dos liderados,
trazendo maior comprometimento por
sua contribuição para a humanidade.
O resultado é conseqüência de toda
essa postura e do trabalho que precisa
ser desenvolvido.
Assim, para que o líder consiga serenidade e lucidez, há necessidade de
maior tempo livre para que a mente
tenha tempo de se acalmar, olhar para
dentro, reavaliar escolhas, objetivos,
analisar os impactos de suas ações
sobre os liderados, sobre o ambiente,
sobre a sociedade em geral, possibilitando-lhe assumir seu papel de
mestre, de orientador, ajudando os
liderados a conhecer e reconhecer
suas competências e facilitando sua
expressão, para que os resultados pessoais e profissionais sejam alcançados
como conseqüência e não como fim.
Para isso, há de se resgatar a capacidade de direcionar o tempo para o
desenvolvimento de relacionamentos
com qualidade, vínculos produtivos e
verdadeiros que incluam o olhar para o
outro na intenção de reconhecimento
das diferenças como complementares,
potencializando o crescimento mútuo
e a parceria que se estabelece além do
resultado final a ser alcançado. Assim,
temos, aqui, a importância das equipes,
não só para fins imediatos e unilaterais,
mas principalmente como uma fonte
de crescimento e desenvolvimento do
ser humano, que aprende a compartilhar, a ceder, a ouvir e a ter um mesmo
objetivo.
Então, o papel de Ser líder significa
assumir e posicionar-se como tal, considerando pressões externas, sendo flexível
para entender o ambiente, mas mantendo-se fiel aos seus valores e às suas
escolhas. Enfim, deixar de ser guiado
pelo automático, pelo imediatismo e por
valores ilusórios, buscando o compromisso, a confiança e a lealdade a valores
que restabeleçam um sentido mais
humano e mais sagrado à missão que é
a própria vida.
Para isso, há de se ter coragem para
posicionamentos nem sempre usuais e
esperados. No entanto, fica para cada
um de nós uma pequena reflexão, talvez
uma provocação, no sentido de buscar o
verdadeiro significado em Ser líder. ESPM
NOTAS
1. Richard Sennett, A corrosão do
caráter, 2003 pg. 10.
2. Zygmunt Bauman, Amor Líquido,
2004, pg. 77.
3.Richard Sennett, A corrosão do
caráter, 1999, pg.10.
BIBLIOGRAFIA
ARANY, Ramy. Visão Gestadora
– A Visão em Teia, São Paulo, Ed.
KVT, 2008.
BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido,
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,
2004.
SENNET, Richard. A Corrosão do
Caráter, 7a. ed., Rio de Janeiro:
Record., 2003.
FÁTIMA MOTTA
Professora na Pós-Graduação
da ESPM das matérias: Fator
Humano, Gestão de Pessoas e
Gestão de Mudanças. Sócia-diretora da F&M Consultores
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A dualidade de ser líder na sociedade pós