Grupalidade - caminho para a construção de uma
nova clínica antimanicomial. um estudo de caso.
Autor: Celso Peito Macedo Filho (Instituto Municipal Philippe
Pinel); [email protected]
Resumo: O presente trabalho pretende pensar a construção de uma nova clínica
antimanicomial através do belo dispositivo que podemos construir utilizando a
grupalidade. Para isso se recorre a um caso clínica de uma Instituição Pública
da cidade do Rio de Janeiro, onde a utilização da potência grupal pode permitir
a contenção das crises psicóticas.
Grupalidade; Psicose.
“Bloqueado na sua potencialidade instituinte, o psicótico se vê
vítima da eclosão de um contingente de antiprodução, e ele, que
trazia consigo a possibilidade de uma nova vida, singular, ainda
não vista, passa a viver o quadro patológico que, através do nãoagenciamento da sua potência produtiva, o transforma num agente
sintomático da morte que permeia as contradições sociais
expressas por ele, seu porta-voz”.
(Jorge Bichuetti)
Introdução: A mãe de R. relata que aos 13 anos, ele apresentou
“uma crise epilética, começou a se debater e a virar os olhos, não
babava” sendo socorrido no Hospital Souza Aguiar e medicado com
fenobarbital. Foi encaminhado ao Posto de Saúde e posteriormente
para a Praça da Bandeira. Tomou vários remédios (pimozida,
prometazina e outros), fez eletroencefalograma (não sabe informar
o resultado). Aos 22 anos de idade, em 1991, Robson começou a ter
alterações do comportamento. Passou a freqüentar muito a Igreja e
vestia-se só com roupas brancas, pois pensava que era anjo. Dizia
ser Jesus e que o Espírito Santo estava com ele. Ficava insone, fugia
de casa, ficando desaparecido por até 10 dias e colocando-se em
risco. Numa de suas andanças, foi atropelado. Recusou-se a comer
durante quase um mês, “estava alimentado pelo Espírito Santo”,
sendo internado na Casa de Saúde Dr. Eiras por cerca de um mês.
Ouvindo conselho de uma enfermeira que aí trabalhava, ela retirou
R. a termo, pois “ele tava correndo risco de vida. Estava
machucado, os outros pacientes batiam nele. Ficava gente agressiva
com gente mais calma”. Retornou ao acompanhamento
ambulatorial na Praça da Bandeira onde comparecia regularmente.
Em abril de 1994, R. necessita de nova internação, quando,
D., foi orientada por vizinhos a procurar o IMPP por morar em
Santa Tereza. O primeiro atendimento no IMPP ocorreu, então, em
22/4/1994, quando sua mãe o levou ao PS, solicitando internação.
Segundo relatos de prontuário, R. apresentava-se com alucinações
auditivas e visuais, ideação delirante de grandiosidade e
perseguição, insônia e comportamentos inadequados, colocando-se
em risco. Fugia de casa, recusava-se a tomar banho, alimentar-se ou
tomar a medicação. Dizia ver um homem que tinha virado sapo e
chupava o seu sangue. Este sapo queria dominá-lo “ele enfia a
língua numa orelha e ela sai pela outra, passa de um lado para o
outro”. Dizia ouvir um dragão que gritava “diabo, diabo”. Estava
bastante assustado.
Foi internado e medicado com haloperidol 15 mg/dia,
prometazina 75 mg/dia e clorpromazina 100mg/dia. Durante a
internação, fugiu, mas sua família o levou de volta ao hospital.
Recusava a medicação oral, então foi feito haloperidol decanoato 2
ampolas IM/mês. Recebeu alta em 2/5/1994, com encaminhamento
para o ambulatório.
Fez acompanhamento em grupo no ambulatório durante
muitos anos (de julho/1995 a agosto/2003). No início, tinha boa
interação com os membros do grupo. Ao longo dos anos, sua
participação foi piorando, ele passou a faltar muito e acabou sendo
referido para tratamento individual.
Durante o período de acompanhamento, Robson manteve-se
sempre com sintomatologia produtiva: alucinações auditivas,
visuais, e cenestésicas, ideação delirante de grandiosidade, mística e
persecutória, delírios de influência, neologismos e risos imotivados.
Seu comportamento muitas vezes era estranho e de risco.
Freqüentava cemitérios por acreditar que podia ressuscitar os
mortos. Ouvia o demônio lhe dizendo para pegar uma faca e enfiála na barriga. Comia batatas cruas, dúzias de ovos crus e bebia
muitos litros de água por dia. Andava no parapeito de um viaduto e
acreditava que não se machucaria se ficasse em pé numa das pistas
de saída do túnel Santa Bárbara, “os carros não me pegam porque
os espíritos desviam”. Acreditava que só morreria se levasse uma
facada no coração dada por um cavalo (entidade da macumba).
Procurava os bandidos do morro onde morava para “desmaldar
eles”. Chegou a pular da laje de sua casa “eu queria ver se meus
ossos iam quebrar e o mundo ia acabar”.
Durante esses atendimentos, colocava um saco plástico na
cabeça “assim eu pareço com Jesus e vejo o mundo vermelho”.
Olhava fundo nos olhos das pessoas, dizia que estava vendo suas
almas e fazia comentários sobre elas “sua alma está gorda”, “nossas
almas estão morrendo”. Dizia que seus olhos (que são castanhos
escuros) estavam ficando azuis porque Deus está “angiando ele”
(transformando em anjo).
Esteve sempre em uso de neurolépticos, às vezes oral, às
vezes injetável. Fez uso de haloperidol oral até 20mg/dia,
haloperidol decanoato até 2 ampolas/mês, trifluoperazina até 25
mg/dia, flufenazina até 15 mg/dia, olanzapina 20 mg/dia e
clorpromazina até 300 mg/dia (sempre associada a outro
neuroléptico). Muitas vezes tentou não tomar a medicação, segundo
a mãe, “cismava que não ia tomar a medicação. Falava, ”não sou
maluco” e jogava a medicação fora, muitas vezes no terreiro da
vizinha. Muita internação dele foi por causa disso. Eu colocava os
remédios no suco, no café com leite, na comida. Aí ele desconfiava
e não comia e bebia mais nada”.
Após a primeira internação no IMPP, seguiram-se mais sete
internações, em geral por agressividade e/ou comportamento de
risco. Em 1997, Robson fugiu de uma internação e abandonou a
outra após licença. As que foram a cabo, duraram, em geral, um
mês (4/10/95 a 1/11/95; 8/2/96 a 13/2/96; 3/6/02 a 5/6/02; 18/5/04 a
18/6/04; 27/7/04 a 26/8/04). Em duas ocasiões, Robson pediu para
passar a noite no IMPP, por estar muito assustado (19/12/95 e
15/1/96).
Em 31/8/04, Robson jogou-se da linha do Metrô “eu queria
mostrar coragem, para todos saberem que eu sou normal. O homem
da capa preta me segurou quando eu caí nos trilhos”. Por sorte, não
sofreu nenhum traumatismo grave, apenas ferimentos profundos em
tecidos moles, precisando levar vários pontos.
Em 16/4/05, Robson é novamente internado com discurso
desconexo e delirante. Diz que seu sobrinho está “implicado
comigo, sem motivo”. Frases suas nesta internação, “a rã do
apocalipse entrou na minha casa, com o Conde Drácula e com a
serpente”, “a serpente com malícia me ganha, faço tudo o que ela
quer”, “meu rosto vira de costas para a noite, vejo minhas costas no
meu peito”. Sobre a internação diz “estava ficando muito doido em
casa..., agressivo, batendo nas coisas e gritando Jesus no meio dos
carros”. Comenta uma dança com outra paciente “minha cabeça
começou a crescer, meu corpo começou a encolher e ficar
vermelho”. Teve alta em 1/6/05, mas dizia “estou me sentindo
muito bem, mas quero ficar aqui mais um mês”. Foi medicado com
haloperidol 15 mg/dia, prometazina 75 mg/dia, clopromazina 100
mg/dia e carbamazepina 600 mg/dia.
Robson continuou o acompanhamento ambulatorial, sempre
delirante aos encontros, ficou internado por 45 dias no final de 2005
na Clínica Dr. Francisco Spíndola. Sua internação foi motivada pela
troca do comando do tráfico de drogas da sua comunidade, pois
estes não o conheciam, estando em risco por seu comportamento
agitado.
Passou o ano de 2006 vindo regularmente aos encontros, até
5/10/06, quando vem a consulta, com relato de sua mãe que ele tem
ficado agressivo, não aceita medicação, sobe o morro dizendo ser
assassino e ameaça traficantes. Fala sobre espíritos, que vê, ouve e
que o comanda. Sendo definido sua internação.
Contexto: Robson é o primeiro filho de uma prole de cinco
(Reginaldo, de 37 anos, Rogério, assassinado pelo tráfico, Rosane,
de 35 anos, Renato de 32 anos). Durante a infância foi um menino
muito calado, “nunca deu trabalho”. Aos oito anos começou “a ter
medo de gente”. Tinha dificuldades de relacionamento na escola,
repetiu a primeira série 4 vezes, cursou até a 7ª série. Aos 10 anos,
no Natal, seu pai, que era trocador de ônibus, foi assassinado por
um traficante da comunidade após discussão, ele foi o único que
não “chorou”.
Começou a trabalhar aos 14 anos de idade, como arquivista
do Banerj. Ficou nesse emprego até os 18 anos, quando foi, então,
trabalhar na Automodelo, onde permaneceu por 4 anos. Não faltava
ao trabalho, sendo premiado como funcionário padrão. Na época foi
promovido à arquivista, mas Robson não conseguiu se adaptar ao
cargo, retornando ao quadro de auxiliar de serviços gerais. Após
entrar na Igreja Assembléia de Deus, Robson começou a ter visões
e a pregar, “ficou fanático”, segundo relato da mãe, acreditava ser
Jesus Cristo. Ficou semanas sem alimentar-se, sendo internado com
desnutrição. Foi aos 23 anos afastado do trabalho e posteriormente
aposentado.
Robson teve uma namorada, pertencente a sua igreja, aos 16
anos. O namoro durou poucos meses. Não tinha amigos próximos,
não gostava de sair de casa.
Robson reside com a mãe, Damiana, seu padrasto, Valteci,
seu tio Jerônimo, e suas sobrinhas Tainá e Gabriele em imóvel
amplo. Sua mãe tem um pequeno comércio no bairro. Administra
ele mesmo sua pensão, ajuda nas despesas de casa e contribui para
pagar o plano de saúde da mãe.
Evolução:
- O quadro psiquiátrico permanece sem alterações
importantes. Em meus encontros com Robson, este está na
maior parte do tempo alegre, fala “estou bem com o Sol,
bem com as flores, bem com as árvores”, cantarola músicas
de conteúdo místico. Chama as pessoas por diamante, e
apresenta idéias persecutórias, diz “tinha aqueles dois
traficantes que queriam me matar, mas não tem problema
não, Deus me protege, não tenho medo”. Comenta, “fico
aqui mais um mês e aí o senhor me dá alta”, diz, ainda “aqui
posso cantar, jogar xadrez, lá em casa minha mãe não
deixa”. Sua família vem visitá-lo com regularidade, conta,
“ontem, meu irmão me visitou, trouxe roupa, mas eu não
quis, quero a daqui”. No começo de novembro, em virtude
da paralisação dos residentes, interrompe-se meu
acompanhamento.
- Robson é acompanhado pela Dr. Silvana e por Cláudio. Nos
relatos, observa-se a persistência do quadro delirantealucinatório. Ao contar que seu padrasto o “cagoetou” aos
traficantes, diz “ele tem o V no nome, Valteci, consegue ver
as coisas, pintou a casa toda de verde”. Comenta “eu estava
na Quinta da Boa Vista e eles no morro... o traficante falou
que anotou meu nome no caderninho”. Sua situação familiar
é delicada, neste momento, a mãe de seu padrasto, de 85
anos, está internada por grave problema clínico. A
medicação é aumentada para 6 mg/dia de risperidona e 75
mg/dia de prometazina. No início de dezembro, após duas
licenças e com meu retorno, tentamos sua alta hospitalar,
mas, Damiana tem uma crise nervosa, fala “dá alta então,
mas vocês vão me matar, eu não agüento mais, eu não
agüento...” Robson ouve sua mãe atentamente e diz “eu
queria ficar aqui mais um mês, mas vocês não deixaram.
Agora eu quero ir embora”. Após controlarmos tal situação,
Robson fica internado até 11/12/06.
- Na sua alta, sugerimos seu ingresso no Hospital-Dia,
Robson fica reticente. Encontramo-nos mais duas vezes,
antes de minhas férias, na última em 12/1/07, ele continua
delirante. Pergunto sobre seus pensamentos, ele “O
pensamento é sobrenatural, aquele que mais encanta as
pessoas”. Continua “Jesus não fez Universidade, por isso
-
-
falava rudemente. O Superior dele é que tinha mais saber
que ele”. Convido-o então a participar de um grupo
terapêutico, ele diz “vou pensar, Celso. Vou pensar..." Está
em uso de 4 mg/dia de risperidona, 400 mg/dia de
carbamazepina, 2 mg/dia de clonazepam e 50 mg/dia de
prometazina.
Em 27/1/07, Robson é novamente internado. O relato é
incompreensível. Eu e Cláudio ficamos como técnicos de
referência. Em 1/2/07, nos encontramos, conta “eu fui pro
bar, aí meu padrasto não gostou, fez a cabeça de minha mãe
e me internaram”. Completa “Celso, Oxalá teve aqui e o
amigo dele também. A gata preta, mulher da lua, teve aqui,
ela tira a noção da gente, a noção dos oloduns”. Menciona
“oh, Celso, Deus é branco”. Dias depois, Robson fala
“Celso, a medicação tá deixando o pensamento mais limpo...
Lá em casa eu tinha idéias de quebrar as coisas. Aqui estou
mais calmo. É meu padrasto que briga comigo e convence
minha mãe a me internar... Quero ficar aqui mais umas
semanas. O tempo ainda não foi justo”. Em novo encontro,
Robson conta ”eu que arrumava o Centro de minha tia. O Zé
Pelintra falou comigo”. Fala “gosto de sua voz, ela é macia.
Meu pai era um homem bonito, assim como você.
Marquinho matou ele...” Sobre a morte de seu pai, diz “foi
uma tristeza. Eu ouvi os tiros. Tinha 12 anos. Foi lá no
Morro de São Carlos”. Pergunto se já namorou, diz
“namorei três messes, aí ela foi pra São João de Meriti. A
Adriana era da minha cor. Mulata. Minha avó era branca.
Meu pai era mulato... Robson diz” Celso, deus me falou que
vou virar uma mulher, uma mulher bem linda, com cabelos
compridos. Você acha que eu vou ser uma mulher bonita?...
Aí, Celso, eu ia querer um rapaz bonito e inteligente como
você...”. Após vários contatos conseguimos a presença de
Damiana e Valteci em 22/2/07, eles contam que Robson
estava se colocando em perigo ao cantarolar músicas e
discutir com os líderes do tráfico de sua comunidade, ele
então interrompe e diz” eles tão com G3 e já disseram que
vão me matar. Se eu voltar pra lá eu vou morrer “. Sua mãe
fica aflita com a fala de Robson, conta” eles não mexem
com ninguém, mas se o Robso perturbar, qualquer hora um
mete o tiro nele.”. Robson, continua “eu cantei e o Pesadão
(um dos chefes do tráfico) não gostou. Agora eles sabem
onde passo e estão me esperando pra matar”.
Após muita insistência com sua família e muito conversar
com Robson, ele vai de licença em 9/3/07 e logo após de
alta em 15/3/07, o esquema medicamentoso da alta é o
mesmo que Robson usava no ambulatório e foi o mesmo de
toda internação. Nesse período conseguimos vinculá-lo a um
grupo terapêutico do qual ele já fizera parte, tendo como
técnicos a mim, Marta e Eliene. Apesar de muito delirante,
ele é acolhido pelo grupo. Na alta, combinamos sua
continuidade. Desde então, Robson vem semanalmente e
desacompanhado ao grupo, no último encontro disse “eu tô
indo. Abrindo o livro de cada dia. Tô aqui pra sabe se eu
cumpri com minha missão. Eu tenho 38 anos e não sei se
tenho mais 38 anos, de missão”. Comenta “tinha umas
moças bonitas passando e minha cabeça foi crescendo,
crescendo... ficou redonda, grande...”. Comenta com todo o
grupo “se eu fosse mulher eu ia ser namorada do Celso”.
Discussão:
- Algumas questões que tal caso nos traz:
- Qual a melhor forma de evitarmos as internações freqüentes
a que submetemos Robson nos últimos anos? Seria inserí-lo
em um grupo terapêutico? No período em que estava em
grupo, de julho/1995 a agosto/2003, Robson teve
pouquíssimas internações. Como observa Regina Benevides
“Se tomarmos o grupo como dispositivo, acionamos nele
sua capacidade de se transformar, se desterritorializar,
irromper em devires que nos descoloquem do lugar intimista
e privatista em que fomos colocados como indivíduos. O
contato com a multiplicidade pode então fazer emergir um
território existencial não mais da ordem do individual (seja
aqui de um indivíduo, ou de um grupo), mas da ordem do
coletivo”.
- Na sua inserção no ambulatório, em consultas individuas
instituídas, não poderíamos produzir o mesmo efeito
cronificador e deteriorante, das longas internações? Lendo
Bichuetti, assinalamos “a loucura de asilo é a cristalização
de alguém que se emergiu esquizo numa crise, mas que
todavia dela não agenciou um novo modo de estar na vida.
Estagnou-se, mobilizado ou acorrentado pelas pressões da
ordem social, pelas intervenções clínicas acomodativas, pela
erupção (interna e externa) de mecanismos da antiprodução
(destrutividade e morte). O ambulatório, poderia ter esse
papel cristalizador do sofrimento?
- A estratégia do Hospital-Dia ou mesmo de um CAPS seria
interessante para Robson ou incorreríamos no risco de
institucionalizá-lo como bem observa René Angelergues
“quanto mais se proclama à destruição do hospital
psiquiátrico, mais parece que não conseguimos passar sem
ele, vendo sua substância reproduzida na multiplicação das
instituições satélites?” O Programa de Saúde da Família e
Saúde Mental articulado com o CAPS, não seria, então, a
melhor forma de acolhê-lo?
- Como compreendê-lo em seu sofrimento, “com o olhar
médico que não encontra o doente, mas a doença, e em seu
corpo não lê uma biografia, mas uma patologia na qual a
subjetividade do paciente desaparece atrás da objetividade
dos sinais sintomáticos que não remetem a um ambiente ou
a um modo de viver ou a uma série de hábitos adquiridos,
mas remetem a um quadro clínico onde as diferenças
individuais que afetam a evolução da doença desaparecem
naquela gramática de sintomas, com a qual o médico
classifica a entidade mórbida como o botânico classifica as
plantas, ou seria com as teorias psicodinâmicas, que embora
tenham tentado encontrar o sentido do sintoma no
inconsciente, mantiveram o caráter de objeto do paciente,
mesmo se através de um tipo diferente de objetivação: isto é,
objetivando-o, não mais como corpo, mas como pessoa?”
(Franco Rotelli).
- E a medicação? O seu papel é a “restituição” da normalidade
de Robson ou nas palavras de Baremblitt, “a contenção dos
fenômenos da antiprodução, aliviando a dor diante do caos e
facilitando os agenciamentos necessários que visem extrair
da crise uma mais complexa compreensão e uma maior
capacidade da produção desejante de arregimentar modos de
se expressar e se realizar”?
- Como acolher a família e ajudá-los a compreender essa nova
subjetivação em construção, num ambiente tão duro,
marcado pela violência, miséria e completo desamparo do
Estado? Deleuze nos dá um caminho “... Acreditar no
mundo é o que mais nos falta; perdemos o mundo; ele nos
foi tomado. Acreditar no mundo é também suscitar
acontecimentos, mesmo que pequenos, que escapem do
controle, ou então fazer nascer novos espaço-tempos,
mesmo de superfície e volume reduzidos... É no nível de
cada tentativa que são julgadas a capacidade de resistência
ou, ao contrário, a submissão a um controle. São
necessários, ao mesmo tempo, criação e povo”.
- Sendo assim acredito que tenhamos contribuído para pensar
nessa nova clínica antimanicomial. Saindo com mais
dúvidas, talvez que entramos, mas com a possibilidade de se
pensar nesse novo dispositivo que se propõe a ser a
grupalidade. Finalizo com essa bela reflexão:
O que é o homem? A resposta de Monsenhor Juvenal
Arduini clareia... “O homem é capaz de partir e chegar. Mas o que o
define mesmo é a estrada. Mais do que ser de chegada e de partida,
o homem é um ser de estrada. É o eterno caminhante. É um
peregrino obstinado. É um estradeiro infatigável”. Louvemos, nele e
com ele, os que ousam caminhar...
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