ÁGUA, ENERGIA E VIDA Antônio Álvares da Silva Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG O homem tem diferenças marcantes dos outros animais. Uma destas é a relação com a natureza. Os demais seres vivos vivem em correlação com o meio ambiente. Um pássaro não destrói, nem tem meios para isto, a árvore que lhe dá o alimento do fruto. Os peixes vivem em águas puras. Jamais a poluem, e assim vai. Já com o homem é diferente. A relação com a natureza é de dominação. Para construir sua casa tem que derrubar árvores para obter a madeira. É preciso captar a água que corre livre, para dela servir-se. Toda matéria transformada gera dejetos que precisam ser eliminados. É mais fácil jogá-los nas águas correntes em vez de reciclá-los e transformando-os novamente em matéria útil. Esta intervenção do homem na natureza pode ser fatal. Para a satisfação de nossos desejos agredimos o que está ao redor de nós mesmos. À medida que o homem evolui e a ciência cresce, esta intervenção torna-se sofisticada e letal. Tudo é aniquilado num processo destruidor e maléfico: terra, mares e ar. Se a ciência se desenvolve por um lado, devasta por outro se não for usada com limites. Ainda não obtivemos o equilíbrio. A natureza está morrendo em nossas mãos: eis o preço que pagamos pelo "progresso" que hoje sabemos ser o caminho de nossa ruína. A falta de água para o consumo humano e para a geração de energia entrou em colapso. O mundo tem água em excesso, mas concentra-se nos oceanos. A água doce é de apenas 3%, localizada em lençóis freáticos subterrâneos ou nas geleiras polares. A massa de água corrente, em rios e riachos, de fácil utilização, está poluída para uso e tornou-se escassa para produzir energia. Eis aqui o nó do grande problema. E agora? O único caminho é uma profunda mudança de comportamento a nível mundial. A produção industrial e prestação de serviços terão que diminuir a concorrência e o lucro, voltando-se para as necessidades do consumo com um mínimo de poluição para facilitar o reúso. A globalização não há de ser apenas econômica, mas também cultural e ecológica. Os problemas da humanidade devem ser resolvidos por ela e não apenas isoladamente pelas nações. Somos organismos macrocelulares cuja essência provém de estruturas capazes da mágica de refletir sobre o que somos, como diz Marcelo Gleiser. Portanto temos que nos conscientizar de que, se não preservamos a natureza, ela nos destruirá. Morreremos de sede ou viveremos no escuro. Nossas indústrias paralisarão. A produção de bens e serviços cessará. O homem regredirá à idade da pedra. Voltaremos às lamparinas para aluminar as cidades. A humanidade só é capaz de decisões profundas quando se coloca à frente de abismos. Temos que esperar a cruel opção do tudo ou nada, quando poderíamos ter escolhido antes com bomsenso, equilíbrio e serenidade a melhor solução. A riqueza sem natureza limpa não é nada. Os chineses estão andando com máscaras antipoluição em Pequim e Shangai. Vale a pena ser a segunda potência do mundo? Teremos que jogar de volta nos rios a riqueza que conseguimos à custa de sua degradação. A pena de morte da humanidade foi decretada pela natureza. Não há caminhos de volta se não agirmos agora. A execução já começou com sede e escuridão. Resta agora o último golpe como fim de tudo.