Folha de S.Paulo - Luiza Nagib Eluf: Por uma Justiça atenta<br> - 13/08/2010
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São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2010
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TENDÊNCIAS/DEBATES
Por uma Justiça atenta
LUIZA NAGIB ELUF
Expedir um mandado de prisão e
não acompanhar de maneira atenta
e sistemática o seu cumprimento
acaba por tornar a Justiça inócua
Nosso sistema jurisdicional estabelece a passividade dos
juízes. Isso significa que os magistrados somente se
manifestam quando provocados por petição da parte
interessada. Tal não impede, porém, que, uma vez
provocada a dizer quem tem razão na solução de um conflito
de interesses, a Justiça se esmere em apurar os fatos e
acompanhe com atenção as determinações que ela mesma
vier a fazer.
A prestação jurisdicional é um direito da cidadania. Dessa
forma, expedir um mandado de prisão e não acompanhar de
maneira atenta e sistemática o cumprimento desse mesmo
mandado, ainda que isso dependa da ação da polícia, torna a
Justiça inócua.
Outro exemplo: recentemente, soubemos pela imprensa que
uma menina de cinco anos, disputada pelos pais separados,
foi entregue ao genitor pelo prazo de 90 dias, a fim de evitar
a alienação parental. A mãe, que ficou proibida de ver a
criança pelo período mencionado, protestou e avisou que o
sujeito era perigoso, mas a Justiça determinou a proibição
de visitas da mãe.
Após algum tempo de convivência com o pai, a criança
chegou ao pronto-socorro com lesões corporais e em coma.
Houve notícia de jornal segundo a qual a criança também
apresentava fissura anal.
Não há informações sobre a responsabilidade do pai pelo
ocorrido, não se pode prejulgar ninguém, mas já se sabe que
algo de muito grave aconteceu. No mínimo, houve
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negligência.
É certo que o pai precisa participar da criação dos filhos,
mas quando houver dúvidas, devem-se decretar medidas
preventivas de acompanhamento diário da situação da
criança no novo lar, por profissionais nomeados pelo juízo.
Outro episódio que chocou a todos foi o desaparecimento e
provável assassinato de Eliza Samudio. A moça havia
procurado a vara de violência doméstica para pedir ajuda,
pois estava sendo ameaçada de morte pelo goleiro Bruno,
suposto pai de seu filho.
A juíza que analisou o caso entendeu que não era
competente para julgá-lo porque Eliza não teria um
relacionamento estável com o jogador de futebol.
Assim, não poderia contar com as medidas protetivas da Lei
Maria da Penha e deveria procurar uma vara criminal
comum. Apreensiva, gravou depoimento em vídeo dizendo
que, se algum mal lhe acontecesse, o culpado seria Bruno.
É óbvio que, quando alguém está em perigo iminente, a
Justiça precisa agir independentemente da competência em
razão da matéria ou do lugar. Pessoas ameaçadas não podem
esperar.
Entendo que Eliza deveria receber a proteção que pediu
com base na Lei Maria da Penha, pois era vítima de
violência de gênero.
É difícil dizer se o resultado da morosidade jurisdicional foi
o sequestro e o desaparecimento da moça, mas uma Justiça
atenta e preocupada com o bem-estar das pessoas que a
procuram poderia, sim, ter ajudado.
Mesmo entendendo não ser competência do juizado de
violência doméstica, deveria ter sido providenciada proteção
à vítima. Uma Justiça atenta age primeiro e depois discute a
questão burocrática.
LUIZA NAGIB ELUF é procuradora de Justiça do Ministério Público do
Estado de São Paulo e autora de "A Paixão no Banco dos Réus", entre
outros livros. Foi secretária nacional dos Direitos da Cidadania do
Ministério da Justiça (governo Fernando Henrique Cardoso).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal.
Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas
brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento
contemporâneo. [email protected]
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