Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O SEMÂNTICA NOMINAL E TIPO DE PREPOSIÇÃO: RELEVÂNCIA PARA O USO DO LOCATIVO À ESQUERDA DO SINTAGMA PREPOSICIONAL LOCATIVO Elaine Marques Thomé Viegas (UFRJ)1 [email protected] RESUMO: Análise de construções locativas do tipo locativo + sintagma preposicional locativo em amostras de fala culta da cidade do Rio de Janeiro, em um estudo de tendência. Inicialmente, a pesquisa verifica variáveis tanto estruturais quanto sociais. Os resultados apontam que apenas as variáveis estruturais são relevantes, sendo que duas delas, nas quais este trabalho se detém, são pertinentes nas duas décadas estudadas: caracterização do nome contido no SPLOC e tipo de preposição introdutora do SPLOC. Destacam-se, respectivamente em cada tipo de variável,o fator topônimo, na década de 70, e o espaço fechado 1, na década de 90, e a preposição em, nos dois momentos estudados. Outros resultados apontam que, na década de 90, todas as ocorrências de SPLOC com o termo casa e locativo à esquerda não possuem marca morfológica. Na mesma década, atua um número maior de condicionamentos, o que indicaria que, de uma década para a outra, houve uma ampliação no uso do locativo à esquerda. Os locativos aqui e lá, respectivamente representantes dos dois extremos em relação à proximidade ou ao distanciamento do locutor, mostram maior frequência. Esse resultado parece dever-se uma maior precisão e imprecisão semânticas das duas formas. PALAVRAS-CHAVE: locativo; sintagma preposicional locativo; semântica nominal; preposição; fala culta. ABSTRACT: This trend study analysed locative constructions of the type locative + locative prepositional syntagm (SPLOC) in samples of standard Portuguese spoken in Rio de Janeiro City. The study began by examining both structural and social variables. The results indicated that only the structural variables were significant and that two of them were relevant in both decades studied. These, which were considered in depth, are the characterisation of the name contained in the SPLOC and the type of preposition introducing the SPLOC. Notable, in relation to each variable type, were, respectively, the toponym factor, in the 1970s, and the closed space 1, in the 1990s, and the preposition em [in] in both periods studied. Other results indicated that, in the 1990s, no occurrences of SPLOC with the term casa and locative to the left had morphological markers. In the same decade, a greater number of conditioning factors were acting, which would indicate, from one decade to the other, a broadening in use of the locative to the left. The locatives aqui [here] and lá [there] – representing, respectively, the two extremes of proximity to, or distance from, the speaker – appear more frequently. This finding seems to stem from the two terms’ respective greater and lesser semantic precision. KEYWORDS: locative; locative prepositional syntagm; nominal semantics; preposition; standard speech. Introdução 1 Bolsista de Pós-Doutorado do CNPq. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 471 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Este trabalho trata do uso do locativo à esquerda do sintagma preposicional locativo, doravante SPLOC, em construções como em (1), na fala culta do Rio de Janeiro, em um estudo em tempo real de curta duração. Para tal, reúnem-se duas teorias linguísticas, uma de estudo da mudança linguística (Weinreich, Labov e Herzog, 1968) e outra de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1995, 2000 e 2001). Como corpora, são utilizadas entrevistas com locutores de nível universitário do Projeto Norma Linguística Urbana Culta (NURC-RJ), disponíveis em www.letras.ufrj.br/nurc-rj. (1) DOC. e o que... o que você tem no café da manhã? LOC. café da manhã tem... eh... presunto... queijo... eh... suco de laranja...só isso... DOC. almoço... LOC. no almoço? bem... AQUI [na Faculdade de Letras] é uma variação tremenda... hoje... por exemplo... foi... filé de frango... com maionese...arroz... feijão e salada... [Inquérito 014-Amostra Complementar-Faixa 2-Masculino] Em um primeiro momento, apresentam-se as duas teorias utilizadas na pesquisa. Em seguida, apresentam-se os corpora, a metodologia de análise e as variáveis, estruturais e sociais verificadas. Na terceira seção, são apresentados, primeiramente, os resultados gerais e, em seguida, é feito um recorte, apresentando-se, em subseções, somente as variáveis selecionadas como relevantes: caracterização do nome contido no SPLOC e tipo de preposição introdutora do SPLOC. Finalmente, as conclusões. 1.Fundamentação teórica-metodológica 1.1.A teoria de estudo da mudança linguística Em meados do século XX, Weinreich, Labov e Herzog, no texto Empirical Foundations for a Theory of Language Change (1968), estabelecem as bases empíricas da teoria da mudança e apontam as possibilidades de observar a variação e a mudança linguística em curso e de determinar suas possíveis motivações externas e internas. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 472 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O A presença de variabilidade e heterogeneidade seriam aspectos necessários para que a mudança ocorresse, embora a observação dos dois aspectos não implique, necessariamente, mudança. Há variação quando formas variantes - formas linguísticas alternativas de dizer uma mesma coisa - competem em um mesmo contexto. Essas formas podem competir durante um curto período de tempo ou até por séculos. A mudança linguística só ocorre quando há o desaparecimento ou a substituição de uma dessas variantes. Segundo os autores, os problemas a serem investigados em um processo variável são os da: (i) restrição; (ii) transição; (iii) encaixamento; (iv) implementação e (v) avaliação. O primeiro, diz respeito às condições que restringem uma determinada mudança linguística; o segundo trata do percurso entre dois estágios de uma língua; o terceiro entende que as mudanças linguísticas devem ser observadas dentro do sistema linguístico e social; o quarto, refere-se à compreensão de como a implementação da mudança ocorre em determinada língua, em tempo e lugar específicos; e o último, corresponde à análise que o falante faz acerca de uma determinada variante. Labov (1972) estabelece dois tipos de mudança: (i) a mudança aparente, quando se observa a mudança através da distribuição de uso de um determinado fenômeno por faixas etárias, ainda que dentro de um mesmo período de tempo e (2) a mudança em tempo real, quando se observa a comunidade de fala através do tempo, não só no tempo. Correlações constantes e significativas entre a variável idade e alguma variável linguística impõem ao pesquisador duas possibilidades: ou ele está diante de uma mudança em progresso na língua, ou de uma variação estável, em que os indivíduos mudam seu comportamento linguístico de acordo com sua faixa etária. Por esse motivo, embora uma análise dinâmica de uma sincronia aponte movimentos no sistema, não pode ser tomada, sozinha, como uma análise conclusiva. Distinguir entre distribuições etárias indicativas de mudança ou de gradação etária constitui um problema cuja solução requer a associação de evidências fornecidas por estudos em tempo real. Esse tipo de estudo, complementa o de tempo aparente e permite distinguir aspectos que perpassam a trajetória linguística da comunidade e do indivíduo. Para a realização do estudo em tempo real de curta duração, Labov considera conveniente comparar o comportamento do indivíduo e da comunidade em um espaço de tempo de mais ou menos vinte anos, o que equivaleria à distância de uma geração. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 473 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Em 1994, o mesmo autor diferencia o (i) estudo de painel (panelstudy), em que se compara a fala dos mesmos indivíduos em dois ou mais momentos discretos de tempo, do (ii) estudo de tendência (trendstudy), em que se comparam comunidades de fala, em dois ou mais momentos discretos de tempo. O primeiro tipo de estudo permite observar se e como o indivíduo muda seu comportamento no decorrer do tempo e o segundo permite observar se e o que muda na comunidade no período de tempo observado. A associação do que é observado em diferentes pontos do tempo em relação ao indivíduo e em relação à comunidade possibilitaria quatro padrões distintos, conforme Tabela 1. Padrões Indivíduo Comunidade Estabilidade Estável Estável Gradação etária Instável Estável Mudança geracional Estável Instável Mudança na comunidade Instável Instável Tabela 1. Padrões de mudança no indivíduo e na comunidade. (Fonte: Labov, 1984: 83) 1.2.A teoria linguística Em trabalho desenvolvido por Thomé Viegas (2008), com base em Avelar (2006), cujo objetivo era o de comprovar o esvaziamento semântico da preposição de, em relações de adjunção adnominal, a autora registrou ocorrência de locativos antepostos ao SPLOC, como no exemplo (2): (2) meu marido gostou mais de chácara... você acorda a hora que quer... você fica mais... mais... liberto de horário né... já quando a gente fica LÁ [na cidade] onde eles... têm a casa deles... tem a padaria... fazem muito zoeira... e... tem que acordar de madrugada pra fazer pão... aquela coisa... então... agen/geralmente você não tem... um sossego mas... LÁ [na chácara]... você não escuta nem... só escuta um passarinho cantando... eh... eh... acordando com o galo... [Inquérito 020-Amostra Complementar-Faixa etária 2-Feminino] Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 474 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O A partir de generalizações intuitivas, levanta-se a hipótese da presença daquele locativo estar relacionado à existência de elemento morfológico [+definido] no sintagma preposicional. Os exemplos de (3) indicam que a agramaticalidade das sentenças em (b) não se deve à presença ou ausência do locativo à esquerda do SPLOC, mas à ausência de um determinante no sintagma preposicional. (3) a. Pedro está Ø/AQUI [no/neste/num parque]. Eu botei a televisão Ø/AÍ [no/nesse/num quarto]. O síndico colocou câmera Ø/LÁ [no/naquele/num prédio]. b. *Pedro está Ø/AQUI [em parque]. *Eu botei a televisão Ø/AÍ [em quarto]. *O síndico colocou câmera Ø/LÁ [em prédio]. A análise de SPLOCs sem determinantes e com determinantes definidos dá indícios de uma possível relação entre a anteposição dos locativos e a definitude. Nos exemplos em (4), observa-se que as construções ou são agramaticais (*) ou são de gramaticalidade duvidosa ((*)). Nos exemplos em (5), a anteposição do locativo ao SPLOC não modifica tal condição. Já nos exemplos em (6), o acréscimo de artigo definido ou de pronome demonstrativo à preposição em nos exemplos de (4) e (5) torna, indiscutivelmente, todos os exemplos gramaticais. A gramaticalidade permanece independentemente da presença de locativo, quando respeitadas as correspondências entre este e o demonstrativo. (4) a. *Ø [Em colégio] aqueles alunos lideram a confusão. *Os papéis Ø [em pasta] precisam de carimbo. b.(*)O Pedro se machucou Ø [em parquinho]. ( ) * O maquinista fica Ø [em trem]. (5) a. *AQUI/AÍ/ALI/LÁ [em colégio] aqueles alunos lideram a confusão. *Os papéis AQUI/AÍ/ALI/LÁ [em pasta] precisam de carimbo. b.(*)O Pedro se machucou AQUI/AÍ/ALI/LÁ [em parquinho]. ( ) * O maquinista fica AQUI/AÍ/ALI/LÁ [em trem]. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 475 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O (6) a. (×AQUI/AÍ/ALI/LÁ) [No/Neste/Nesse/Naquele colégio] aqueles alunos lideram a confusão. Os papéis (×AQUI/AÍ/ALI/LÁ) [na/nesta/nessa/naquela pasta] precisam de carimbo. b. O Pedro se machucou (×AQUI/AÍ/ALI/LÁ) [no/neste/nesse/naquele parquinho]. O maquinista fica (×AQUI/AÍ/ALI/LÁ) [no/neste/nesse/naquele trem]. Quanto à questão gramaticalidade/agramaticalidade nos casos de preposições locativas diferentes de em, parece haver uma incompatibilidade entre algumas delas e os advérbios locativos, independente do determinante, conforme exemplos de (7) e (8). Nos casos de anteposição do advérbio locativo e posposição dos determinantes em relação às preposições locativas, as únicas construções cuja gramaticalidade não é discutível parecem ser as estabelecidas com o auxílio das preposições de, em e para (pra), como se observa em (a) de (7), ao contrário do observado em (b) de (7), com a preposição a. O comportamento da preposição de observado nos exemplos (a) de (8), em que as preposições intermedeiam determinante e locativo, não é semelhante aos casos das preposições em, para (pra) e a em (b), em que as construções são agramaticais. (7) a. aqui do/no/pro, aí do/no/pro, lá do/no/pro, aqui deste/neste/pra este, aí desse/nesse/aí pra esse, lá daquele/naquele/praquele b.(*)aqui/aí/lá ao, *aqui a este; *aí a esse; *lá a aquele/àquele (8) a. o daqui, o daí, o de lá, este daqui, esse daí, aquele de lá b. *o naqui/naí/em lá, *o praqui/praí/pra lá, *o a aqui/a aí/ a lá, *este naqui/praqui/a aqui; *esse naí/praí/a aí; *aquele em lá/pra lá, a lá A gramaticalidade das construções em que há preposição de, como em (a) de (8) pode dever-se ao fato de ela possuir conteúdo semântico menos preciso, em relação à Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 476 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O em, para (pra) e a, exemplos de (8b), não alterando a relação dos elementos como se exemplifica em (9). (9) a. Este móvel aqui é de madeira. Este móvel daqui é de madeira. Este daqui é de madeira. b. Esse carro aí está com defeito. Esse carro daí está com defeito. Esse daí está com defeito. Assim,após a análise desenvolvida nesta seção, a hipótese que se estabelece é a de que o elemento definido com determinante no SPLOC favoreceria o uso do locativo. 2.Corpora, metodologia e variáveis Para a realização do estudo de tendência, são examinadas amostras de fala de 22 informantes, todos distribuídos em três faixas etárias, de 25 a 3 5 anos (faixa 1), de 36 a 55 anos (faixa 2) e de 56 anos em diante (faixa 3), pelos gêneros masculino e feminino e pelas décadas de 70 e de 90, esta também chamada de Amostra Complementar (AC). As amostras estão disponibilizadas em www.letras.ufrj.br/nurc-rj. Estudo de tendência Faixas Amostra 70 Amostra 90 Etárias Masculino Feminino Masculino Feminino 1 096 133 013 003 Entrevistas 164 011 023 012 2 052 002 014 020 233 140 017 019 3 071 373 018 027 347 028 Tabela 2. Identificação dos falantes do estudo de tendência Na análise, são considerados os SPLOCs realizados pelos locutores, independentemente da presença ou ausência do locativo. Em um trecho como o de (10), por exemplo, são analisados os quatro SPLOCs, destacados entre colchetes. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 477 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O (10) eu tinha horror àquele troço... sabe... negócio de ler diário oficial todo dia... e andar Ø [no fórum]... um calor danado AQUI [no Rio de Janeiro] e a gente de paletó e gravata... suando em bicas... deixando o sapato marcado Ø [no asfalto]... isso não... isso não... isso não é mentira não... às vezes fazia tanto calor que a gente ficava com o sapato marcado LÁ [no asfalto]... eh... então eu agüentei isso até mil novecentos e setenta e oito... [018-AC-FE3-M]2 Quanto à possibilidade de inserção do locativo à esquerda do SPLOC quando aquele não foi efetivamente realizado, observou-se que, na verdade, existe sempre a possibilidade, pelo menos, de o locativo lá poder ser inserido na maioria desses contextos, como é possível observar no exemplo (11), provavelmente devido a sua fluidez semântica, característica essa também compartilhada por ali: “... as duas formas convergem para a indicação de um ponto distanciado dos interlocutores do evento de fala, anulando-se a diferença entre elas” (PAIVA, 2003: 138). Assim, considerou-se que seria possível inserir um locativo à esquerda de todo SPLOC e o que poderia variar, seria o grau de (im)precisão semântica do locativo. (11) agora eu já vi no... já Ø (× LÁ) [no meu trabalho] eu me lembro eu tinha uma colega que... desde cedo ela ara obrigada a deixar o filho ou com babá... ou até o... quando... o filho um pouco mais crescido às vezes ele vinha Ø (× LÁ) [do colégio] ficava sozinho Ø (× LÁ) [no apartamento] era uma... era uma necessidade... eu acho que quando há essa necessidade não não vejo outra maneira de... de resolver o problema senão através de... de babá realmente... minha nora por exemplo essa Ø (× LÁ) [de São Paulo] tá ainda licenciada mas... vai ter que trabalhar na na outra... segunda-feira... da semana que vem... e vai ter que deixar o filho com a babá né? [071-70-FE 3-M] O fenômeno da variação linguística pressupõe a existência de formas linguísticas alternantes, as chamadas variantes, que poderiam estar correlacionadas ao fenômeno variável analisado, a denominada variável dependente. O emprego do termo 2 Em cada exemplo, seguem o número do inquérito, o tipo de amostra (Década de 70 (70) e Amostra Complementar (AC)), faixa etária (FE 1, FE 2 ou FE 3) e gênero (Feminino (F) ou Masculino (M)). Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 478 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O dependente deve-se ao fato de o uso das variantes não ser aleatório, mas induzido por grupos de fatores, ou variáveis independentes, de natureza estrutural ou social, que consistem nos parâmetros reguladores dos fenômenos variáveis, exercendo pressão positiva ou negativa sobre o emprego das formas variantes. A variável dependente é caracterização da margem esquerda do SPLOC e suas variantes são presença de locativo × ausência de locativo. São oito variáveis estruturais e seis sociais: 1. tipo de locativo presente à esquerda do SPLOC; 2. caracterização semântica do nome contido no SPLOC; 3. função sintática do SPLOC; 4. tipo de verbo; 5. (in)definitude morfológica do SPLOC; 6. (in)definitude morfológica do sintagma determinado pelo SPLOC; 7. preposição introdutora do SPLOC; 8. efeito de definitude e especificidade do termo contido no SPLOC; 9. tema do inquérito,10 e 11. gênero e faixa etária do locutor; 12. tipo de amostra;13 e 14. número e origem do inquérito. 3.Análise do resultados Para a análise sociolinguística quantitativa laboviana, foi utilizada a ferramenta metodológica Goldvarb X (SANKOFF, TAGLIAMONTE e SMITH, 2005), que corresponde à versão para Windows do VARBRUL (PINTZUK, 1988). No estudo de tendência, verificou-se que o grupo referente ao Tema poderia ser retirado da análise, uma vez que há uma distribuição irregular e um mesmo tema pode corresponder a inquéritos de diferentes faixas etárias e gênero, vindo a causar sobreposições e comprometer o resultado. Não haveria condições de determinar inequivocamente se o que motiva o uso do locativo é realmente o tema ou se é uma característica do locutor do inquérito. Após a retirada de fatores categóricos e a realização de várias rodadas com o objetivo de refinar a análise dos dados, foram consideradas significativas as cinco variáveis expostas na Figura 1. Variáveis selecionadas no estudo de tendência Caracterização do nome contido no SPLOC Função sintática do SPLOC Tipo de verbo (In)definitude morfológica do SPLOC Preposição introdutora do SPLOC Figura 1. Variáveis selecionadas em rodada conjunta Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 479 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Em sequência à seleção das variáveis supracitadas, foram observadas, separadamente, as amostras de 70 e de 90 (AC) para verificar a atuação dos grupos de fatores em cada uma delas. Variáveis selecionadas na década de 70 Caracterização do nome contido no SPLOC (In)definitude morfológica do SPLOC Preposição introdutora do SPLOC Figura 2. Fatores relevantes na década de 70 Variáveis selecionadas na década de 90 Caracterização do nome contido no SPLOC Função sintática do SPLOC Tipo de verbo Preposição introdutora do SPLOC Efeito de definitude e de especificidade do termo contido no SPLOC Figura 3. Fatores relevantes na década de 90 A análise das Figuras de 1 a 3 mostra que somente as variáveis estruturais são relevantes para o uso do locativo à esquerda do SPLOC. A comparação das Figuras 2 e 3 mostra que as variáveis caracterização semântica do nome contido no SPLOC e preposição introdutora do SPLOC são selecionadas nas duas épocas, sendo que aquela é a primeira a ser escolhida em cada uma das épocas, o que evidencia a importância da mesma para o fenômeno. O maior número de condicionamentos selecionados em 90 parece indicar que nessa década houve uma ampliação do uso do locativo em relação à década de 70. A frequência geral de uso do locativo é de 10% (162/1669) e não é a mesma para todos os locativos. Pode-se dizer que, no período de 20 anos que separam as duas amostras, o percentual de uso do locativo quase dobrou, conforme Tabela 3. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 480 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Presença de Lá Aqui Ali Total % locativo Oco % Oco % Oco % Década de 70 18 32% 32 57% 6 11% 56/811 7% Década de 90 59 56% 41 39% 6 6% 106/858 12% Total 77 48% 73 45% 12 7% 162/1669 10% Tabela 3. Distribuição da frequência de locativo à esquerda, nas décadas de 70 e de 90 As formas que apresentam maior frequência são os que representam os dois extremos em relação ao locutor e à distância, aqui ([+locutor/-distante]) e lá ([locutor/+distante]), respectivamente em 70 e em 90, inclusive com valores percentuais aproximados. A frequência de aqui pode dever-se ao fato de terem sido registrados no falante e, portanto, de fazer referência a primeira pessoa do discurso, enquanto o lá permitiria sua inserção em variados contextos, devido a sua maior imprecisão semântica, em oposição aos outros locativos. (12) Bom, é um, um, um bairro onde você encontra de um tudo, com toda facilidade, muito comércio, o comércio me... melhor estar AQUI [em Copacabana], todas as casas da cidade, as grandes casas acabaram transferindo pra cá [140-70-FE 2-F] (13) se eu sair daqui em cinco minutinhos estourando uns dez minutos... eu estou na escola... se o trânsito estiver bom... e teve uma sexta-feira que eu saí daqui com qua/mais de... duas horas quase pra chegar LÁ [no Campinho]... foi o dia pior que houve muita... muita retenção em Cascadura... [020-AC-FE 2-F] Devido à relevância para o fenômeno estudado, serão analisadas detalhadamente, em seções distintas, apenas as variáveis caracterização semântica do nome contido no SPLOC e preposição introdutora do SPLOC. 3.1.A caracterização semântica do nome contido no SPLOC A hipótese para o estabelecimento da variável caracterização semântica do nome contido no SPLOC é a de que termos locativos topônimos favoreceriam o uso do locativo à esquerda do SPLOC pelo fato de serem entendidos como nomes únicos (Lyons, 1999) e poderem, eventualmente, receber artigo definido. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 481 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Para a análise, é estabelecida uma escala que varia do termo locativo stricto sensu, representado pelos topônimos, ao locativo abstrato, termo originalmente não locativo, mas que, no contexto, adquire nuance locativa. A classificação distingue-se em: a) Topônimos (Top.). Nomes próprios de lugares. Aqui se incluem nomes de ruas, de pontos turísticos e de estabelecimentos comerciais. b) Partes do corpo. Termos que denominam partes do corpo humano, como perna, boca, pé. Referem-se a um local específico em relação a uma área maior. c) Espaço fechado 1 (E. F. 1). Termos que se referem à local de moradia como casa, apartamento, edifício, sobrado, dentre outros, ou de permanência, como hotel. d) Espaço fechado 2 (E. F. 2). Termos que se referem a locais fechados como cinema, teatro, loja, açougue, hospital, padaria, supermercado, igreja, dentre outros. e) Espaço de outra natureza (Outra nat.). Termos menos específicos como rua (sem determinação do nome da mesma), chão, lugar, quarteirão, vila, bairro, país, praia, mundo, cidade, campo, parque, quintal, entre outros. f) Lugar/meio. Termos em que se confundem as noções de espaço e de meio, como avião, trem, carro, navio, ônibus, dentre outros. g) Lugar/matéria. Termos em que se confundem as noções de espaço e de matéria, como pasta, travessa, jornal, mesa, dentre outros. h) Locativo abstrato. Termos preposicionados que adquirem nuance locativa no contexto em que estão inseridos. Seguem as Tabelas 4 e 5 com os resultados, tanto da década de 70, quanto da de 90. Caracterização do nome Década de 70 contido no SPLOC Oco/Total % PR Top. 39/326 12% .66 E. F. 1 8/117 7% .52 E. F. 2 4/124 3% .30 Outra nat. 5/149 3% .30 Total 56/716 8% Tabela 4. O locativo e a caracterização no nome contido no SPLOC, na década de 70 Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 482 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Caracterização do nome Década de 90 contido no SPLOC Oco/Total % PR Top. 54/368 15% .59 E. F. 1 32/93 34% .74 E. F. 2 2/111 2% .15 Outra nat. 18/203 9% .44 Total 106/775 14% Tabela 5. O locativo e a caracterização no nome contido no SPLOC, na década de 90 Na Figura 4, é possível visualizar melhor a distribuição do percentual de uso, em relação a cada um dos fatores nas duas décadas. Ela evidencia um aumento significativo de uso do locativo à esquerda no intervalo de 20 anos, no que diz respeito ao denominado espaço fechado 1. Figura 4. Distribuição do percentual de uso do locativo, de acordo com o tipo de termo locativo contido no SPLOC, de uma década para a outra Nos SPLOCs analisados nas duas amostras, não houve ocorrências de locativo à esquerda de preposição quando o termo é partes do corpo, lugar/meio, lugar/matéria e locativo abstrato, o que resultou, consequentemente, na retirada desses fatores para a obtenção do peso relativo -- valor indicativo de maior ou menor peso com relação à aplicação da regra. Os fatores topônimo e espaço fechado 1 são os que apresentam o peso relativo maior, nas duas décadas, o que confirma a importância dos dois contextos para o uso do locativo. O resultado da década de 70 validaria a hipótese de que os topônimos, por serem entendidos como nomes únicos e receberem artigo definido, Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 483 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O contribuiriam para a presença de um localizador à esquerda do SP em que estão inseridos. Na década de 90, todas as 32ocorrências da categoria espaço fechado 1 foram com o termo casa introduzido pela preposição em. Desse total, apenas uma ocorrência, exemplo (14), possui elemento definido no SPLOC. Além disso, o termo ainda é seguido de um pronome possessivo de terceira pessoa, deixando claro que a casa não é do falante. (14) eu fiquei oito meses na Argentina porque eu tinha uma tia... aquela...aquela pseudo-portuguesa casou-se com um argentino e foi morar lá... e eu sempre ia... sempre ia LÁ [na casa dela] até ela morrer né... até ela morrer não... até o plano real né... [018-AC-FE 2-M] Esses dados parecem apontar para uma relação entre o uso do locativo com o termo casa e a ausência de elemento definidor. É como se o locativo fizesse o papel geralmente atribuído ao determinante definido de se referir a algo específico e particular,independentemente da proximidade em relação ao falante especificada pelo locativo, como se observa em (15) e (16). (15) em casa também os pais já eram assim pessoas... simples... e não... uhn...valorizavam nada assim material... né... e nós andávamos vestidas... uhn/na maior simplicidade e ninguém fazia questão... dede moda... de salão...é/quer dizer que nós nunca gastamos... nessas coisas não é...éh/éh/éh/éh/então comida não... comida era farta... a família toda... ia almoçar... LÁ [em casa]... né com papai e mamãe... iam os/os filhos casados vinham... isso já... não na meninice mais tarde... [019-AC-FE2-F] (15a) a família toda... ia almoçar... Ø [na casa]... né compapai e mamãe... iam os/os filhos casados vinham... isso já... não na meninice mais tarde... (15b) a família toda... ia almoçar... Ø [em minha casa]... né com papai e mamãe... iam os/os filhos casados vinham... isso já... não na meninice mais tarde... Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 484 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O (15c) a família toda... ia almoçar... Ø [na minha casa]... né com papai e mamãe... iam os/os filhos casados vinham... isso já... não na meninice mais tarde... (16) Então, toda hora tinha alguém oferecendo alguma coisa diferente ao meu pai. E eu me recordo quando se colocou LÁ [em casa], foi a primeira máquina de lavar que eu vi,foi a primeira geladeira que eu vi. É, a geladeira tinha uma bola em cima,não sei porque, eu tenho a impressão que a serpentina, ou o motor, ou o compressor era em cima, era esquisito mesmo. [028-AC-FE3-M] (16a) Então, toda hora tinha alguém oferecendo alguma coisa diferente ao meu pai. E eu me recordo quando se colocou Ø [na casa], foi a primeira máquina de lavar que eu vi, foi a primeira geladeira que eu vi. (16b) Então, toda hora tinha alguém oferecendo alguma coisa diferente ao meu pai. E eu me recordo quando se colocou Ø [em minha casa], foi a primeira máquina de lavar que eu vi, foi a primeira geladeira que eu vi. (16c) Então, toda hora tinha alguém oferecendo alguma coisa diferente ao meu pai. E eu me recordo quando se colocou Ø [na minha casa], foi a primeira máquina de lavar que eu vi, foi a primeira geladeira que eu vi. Na década de 70, destaca-se o fator topônimo, com uma diferença significativa de .14 em relação à espaço fechado 1, fator com segundo maior peso relativo. Já em 90, a relevância dos fatores se inverte, pois espaço fechado 1, com PR .74 é maior que topônimo, cujo PR é .59. A diferença entre os pesos relativos dos primeiro e segundo fatores mais significativos, selecionados tanto em 70 quanto em 90, praticamente se mantém. De uma década para outra, fica mais nítida ainda a relevância do fator espaço fechado 1, demonstrando um aumento do uso do locativo nesse contexto. a)Topônimo Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 485 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O (17) LOC. [...] agora fora de de Botafogo morei... em outros lugares mais afastados... DOC. no Rio mesmo? LOC. no Rio sempre... salvo na infância que era AQUI [na Gávea] eh...quando pequenininha depois... já fui pra Lagoa e... e depois sempreBotafogo... [133-70FE1-F] b) Espaço Fechado 1 (18) nós tivemos a... de uma família de grande de... de grande nome... vamos dizer assim... porque nós temos o nome... eh... mas financeiramente era um fracasso... todos nós tivemos que trabalhar muito cedo... e LÁ [em casa] éramos sete... eram...fomos nove e nos criamos sete... agora imagina um só ganhando... [373-70-FE3-F] 3.2.Tipo de preposição introdutora do SPLOC O objetivo da variável tipo de preposição introdutora do SPLOC é verificar se a preposição que introduz o SPLOC é fator favorecedor do uso do locativo à esquerda do SP. Classifica-se em em, de, para e a. De acordo com o que foi desenvolvido na seção 1.2,em e de seriam as preposições que possibilitariam o uso do locativo. A primeira, por ser preposição essencialmente locativa e a segunda por ser a menos marcada semanticamente e poder, em muitos casos, alternar com em (Thomé Viegas, 2008). A preposição em parece ser a que mais propicia o uso do locativo à esquerda, nas duas décadas, inclusive com pesos relativos próximos,respectivamente .60 e .57, o que fica evidenciado nas Tabelas 6 e 7. O resultado confirma a hipótese definida anteriormente, relativa ao fato de ser essa preposição a que apresenta valorl ocativo prototípico. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 486 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Década de 70 Tipo de preposição introdutora do SPLOC Oco/Total % PR Em 49/552 9% .60 De 5/129 4% .37 Para 1/59 2% .25 A 1/57 2% .19 Total 56/797 7% Tabela 6. O locativo e a preposição introdutora do SPLOC, na década de 70 Tipo de preposição Década de 90 introdutora do SPLOC Oco/Total % PR Em 100/623 16% .57 De 3/86 3% .21 Para 2/73 3% .32 A 0/56 Total 105/782 13% Tabela 7. O locativo e a preposição introdutora do SPLOC, na década de 90 A Figura 5 mostra a distribuição das preposições pelas décadas: o uso do locativo àesquerda da preposição em cresce, no intervalo que separa as duas amostras. Figura 5. Distribuição do percentual de uso da preposição introdutora do SPLOC, nas décadas de 70 e de 90 Quanto à preposição de, que também teria um papel importante para o comportamento do locativo, por possuir características específicas (cf. seção 1.2), há Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 487 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O uma estabilidade em relação ao uso, assim como o percentual de uso da preposição para, que praticamente se mantém, de uma década para outra. a)Preposição em (19) o meu avô foi um dos fundadores de Belo Horizonte... [...] agora a comida tem mais legume... tem mais verdura... tem muito mais carne... que LÁ [nonorte] a gente comia camarão... né... às vezes comia até lagosta... né... tinha um preço barato... né... peixe... peixe é uma delícia... né... já AQUI [em Minas] não... come a carne muito gostosa... lingüiça... outro dia mesmo eu comi tutu com torresmo couve... couve mineira né e e lingüiça... às vezes vem feijão de tropeiro... você conhece feijão de tropeiro? [011-70-FE 1-F] b) Preposição de (20) nós tivemos a nossa lua-de-mel... nesse apartamento onde nós íamos morar mesmo né?... um amigo... um amigo nosso que já tinha carro naquela época que também não era uma coisa muito comum... ter carro... ele tinha um chevroletzinho... não sei de que ano trinta e pouco sei lá... e... então ele nos trouxe... de carro LÁ [da Tijuca] pro Flamengo e tal... ainda são meus compadres até... até hoje são... são muito nossos amigos... [071-70-FE 3-M] c) Preposição para (21) não não... os fins de semana... eu geralmente tenho um hobby... todo mundo tem... o meu talvez seja mais sadio... porque a minha distração é o esporte...então... eu dedico praticamente o fim de semana meu... a uma espécie e de higiene mental... eu pratico... pratico não... corro atrás de uma bola...durante uns noventa minutos e isso nós vamos geralmente com um grupo de colegas... pra fora ou LÁ [pra uma residência nossa] em Petrópolis... onde nós temos um campo... ou então pra clubes mesmo... há em Nogueira...esses clubes campestres... então nós vamos lá... bater uma pelada [052-70-FE 2-M] Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 488 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O Na década de 90, não houve ocorrência da preposição a e, ao contrário do esperado, observou-se locativo antecedendo essa mesma preposição, na década de 70, como no exemplo (22). d) Preposição a (22) Não existe teatro na Tijuca. No entanto aqui há inúmeras casas. Então eles vêm de lá pra cá, vêm pro banho de mar, vêm pra jantar, vêm pra almoçar, vêm pra lanchar, vêm pra fazer compras! Apesar de que já há muita casa boa na Tijuca agora, mas o pessoal prefere ainda vir AQUI [a Copacabana]. Eu acho que Copacabana representa mais o que há de mais moderno, de mais novo e o pessoal prefere vir pra cá, foi o que eu notei, desde que eu cheguei aqui. [14070-FE 2-F] Conclusões À luz do quadro teórico-metodológico da sociolinguística variacionista laboviana, em um estudo do tipo tendência (LABOV, 1994),este trabalho apresenta variáveis estruturais apontadas pela ferramenta Goldvarb X (SANKOFF, TAGLIAMONTE e SMITH, (2005)) que atuam no uso do locativo anteposto ao sintagma preposicional locativo, conforme Figuras de 1 a 3. Embora apresente uma ideia geral desse tipo de variável atuante no fenômeno, o trabalho faz um recorte e se aprofunda apenas nas variáveis estruturais pertinentes às duas décadas estudadas, 70 e 90: caracterização do nome contido no SPLOC e tipo de preposição introdutora do SPLOC. A análise dos dados apontam que, (i) quanto à variável caracterização semântica do nome contido no SPLOC, destacam-se os tipos de locativo topônimo, em 70, e espaço fechado 1, em 90 e (ii) quanto à variável preposição introdutora do SPLOC, destaca-se em, nos dois períodos temporais Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 4, nº 12, mai. 2014 489 Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras • UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 • Volume 4 • Número 12 • maio 2014 Edição Especial • Homenageado F E R N A N D O T A R A L L O O resultado, em relação à variável caracterização semântica do nome contido no SPLOC, na década de 70, vai ao encontro da hipótese de que os topônimos, por poderem ser entendidos como nomes únicos e receberem artigo definido (LYONS, 1999), seriam favorecedores de um localizador à esquerda do SPLOC. O fato de os resultados, nas duas décadas, terem comprovado que a preposição em é a que introduz preferencialmente o sintagma preposicional locativo confirma a hipótese de que essa preposição licenciaria o uso do locativo à esquerda por ser a preposição locativa prototípica. Na década de 90, todas as ocorrências de SPLOC com o termo casa e locativo à esquerda não possuem marca morfológica. Nesse tipo de construção, o locativo parece fazer o papel do determinante definido de referir-se a algo específico ou particular. A Figura 3 mostra que, na década de 90, atua um número maior de condicionamentos, parecendo indicar que de uma década para a outra houve uma ampliação no uso do locativo à esquerda. A Tabela 3 mostra a maior frequência dos locativos aqui e lá, representantes dos dois extremos em relação à proximidade ou ao distanciamento do locutor. Esse resultado parece dever-se, respectivamente, a uma maior precisão e imprecisão semânticas dessas formas. Ao contrário do esperado (cf. subseção 1.2), os dados mostram que é possível haver SPLOC introduzido pela preposição a e antecedido por locativo. Referências bibliográficas AVELAR, J. Adjuntos Adnominais Preposicionados no Português Brasileiro. Outubro de 2006. 233 folhas. Tese de Doutorado. Unicamp. Instituto de Estudos da Linguagem. Campinas, outubro de 2006. CHOMSKY, N. The minimalist program. Cambridge, MA: The MIT Press, 1995. CHOMSKY, N. Minimalist Inquiries: The Framework. In R. Martin, D. Michaels e J. Uriagereka. Step-by-step: essays in minimalist syntax in honor of Howard Lasnik. Cambridge, MA: The MIT Press, 2000, pp. 89-155. CHOMSKY, N. Derivation by phrase.In Michael Kenstowicz. Ken Hale: A life in language. Cambridge, MA: The MIT Press, 2001, pp. 1-52. LABOV, W. Sociolinguistic Patterns. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1972. 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