AS CONCEPÇÕES DOS ALUNOS SOBRE A MATEMÁTICA E A FÍSICA DO ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO Andréia Silva Pereira Licencianda em Matemática Universidade Católica de Brasília Orientador: Elio Carlos Ricardo RESUMO O presente artigo trata de um estudo exploratório realizado em escolas públicas e particulares do Distrito Federal, envolvendo cem alunos do terceiro ano do nível médio. A partir de questionários abertos buscou-se verificar a concepção desses alunos acerca das disciplinas de matemática e física, com destaque especial para suas representações sociais a respeito da matemática da ciência física, a receptividade da matemática e da física, a capacidade de identificar algumas relações da matemática e da física com o cotidiano e/ou com as tecnologias e a diferença entre a matemática e a física. Outras questões enfocaram as opiniões dos alunos sobre o que entenderiam que seria uma boa aula de matemática e de física e como seria um bom professor de matemática e de física. Ao final, são retomadas algumas questões que emergiram do estudo realizado e possíveis encaminhamentos para discussões são apresentados. Palavras-chave: estudo exploratório, ensino de matemática e de física, concepção dos alunos sobre a matemática e a física. 1. INTRODUÇÃO Cresce a expectativa sobre as oportunidades de aprendizagem neste novo milênio, porém alguns aspectos marcam, por sua vez, o lado duvidoso do conhecimento: o que possa proporcionar ao aluno um conhecimento que esclareça, ilumine torne critico. Com isso observa-se que a escola atual parece manter-se fora da realidade do aluno, sem proporcionar uma educação que desenvolva uma consciência crítica, para que assim possa garantir uma formação para que tenha a capacidade de escolha diante do que a vida vai lhe exigir. Os documentos oficiais elaborados pelo Ministério da Educação a partir da LDB/96 apontam para uma reforma em todos os níveis educacionais e procuram aproximar a escola dos anseios e expectativas dos seus alunos. Isso se torna mais evidente para o caso do Ensino Médio, pois este coincide com o que as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCEM) e os Parâmetros Curriculares (PCN e PCN+) chamam de etapa final de Educação Básica, na qual se espera que os alunos tenham uma formação compatível com o mundo contemporâneo. Ou seja, que estejam aptos a dar prosseguimento em seus projetos pessoais e profissionais. Ainda que críticas sejam bem vindas aos Parâmetros e Diretrizes Curriculares, esses documentos conseguem sintetizar os principais problemas do ensino da física e da matemática e apontam para uma abordagem que supera a simples memorização de fórmulas ou repetição automatizada de procedimentos, para se concentrar em um ensino voltado para objetivos sociais mais amplos. Conforme as orientações complementares dos PCN+, a física e da matemática teriam que oferecer aos alunos a oportunidade de ter acesso a conhecimentos atuais que lhes assegurassem uma visão moderna do mundo, possibilitando sua compreensão e participação, principalmente para aqueles alunos que não terão oportunidade de prosseguir nos estudos. Nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio é destacada a importância em oferecer uma educação que possibilite a iniciativa dos alunos na busca de informações, devendo-se proporcionar-lhes situações que exijam responsabilidades e confiança, valorizando suas aprendizagens anteriores. A utilização de resoluções de problemas, não como metodologias, mas como o princípio, o meio e o fim da prática de construção do conhecimento, poderia contribuir positivamente para essa conquista. A maioria dos conteúdos desenvolvidos no Ensino Médio em física e matemática não são explorados pelas suas aplicabilidades no cotidiano. Os princípios contidos nas DCNEM e nos Parâmetros relativos à física e à matemática relacionam-se harmonicamente, embora os textos tenham autores diferentes. Os Parâmetros têm como objetivo que os educandos percebam as aplicações da física e da matemática em variadas situações, o que ecoa a idéia de um ensino contextualizado; os Parâmetros apresentam como finalidade do ensino a compreensão da física e da matemática, a confiança no seu uso e certa satisfação pessoal com ela, o que reflete, entre outras idéias, a ética da identidade e a promoção da autonomia. Os conteúdos de física previstos para serem desenvolvidos no Ensino Médio possuem uma grande relação e dependência com aqueles a serem desenvolvidos pela matemática. Podemos considerar que a matemática é uma linguagem fundamental para o aprendizado de física. Porém, não podemos reduzir o ensino de matemática apenas às necessidades da física. A matemática, em si, é uma, área de conhecimento independente, além de ser, também, indispensável para outras ciências. Esse cenário de propostas de mudanças é o pano de fundo para a pesquisa aqui apresentada. Ou seja, em meio a uma tentativa de reorientar o Ensino Médio a partir de reformas educacionais, busca-se neste trabalho investigar o que pensam os alunos acerca da disciplina de física e matemática a que têm acesso na escola, bem como se o que propõem os documentos oficiais atende aos interesses dos educandos. Os conteúdos escolares deveriam proporcionar ao aluno uma compreensão da sua vida cotidiana, conforme estes documentos, levando-os a realizarem tentativas, estabelecer hipóteses, testar estas hipóteses e validar os resultados. Entretanto, esquece-se de verificar o que os alunos pensam sobre o ensino que recebem na escola. Qual a importância da matemática e da física? Essas e outras questões relacionadas ao conteúdo de matemática e física foram objetos de investigação que resultaram no presente trabalho. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA Trata-se de uma pesquisa com enfoque qualitativo, na medida em que se pretendia aproximar o investigador do contexto sócio-cultural do fenômeno que se elegeu para estudar, a fim de superar a mera relação de causa e efeito e expor a complexidade que caracteriza o ambiente escolar (Triviños, 1987). Nessa mesma direção, Lüdke e André (1986), afirmam que “os estudos qualitativos permitem iluminar o dinamismo interno das situações geralmente inacessíveis ao observador externo” (p.12). A opção por um estudo exploratório pareceu pertinente, pois este possibilita ao “investigador aumentar sua experiência em torno de determinado problema” (Triviños, 1997, p.109). Ou seja, a natureza exploratória da pesquisa teve como um dos objetivos centrais fazer emergir da prática cotidiana elementos necessários elementos teóricos que possam auxiliar a análise crítica e a reflexão das práticas educacionais. Em razão da natureza da pesquisa, optou-se por questionários abertos como instrumento para a coleta de dados, os quais foram obtidos no primeiro e segundo semestre de 2006 e envolveu um total de cem alunos, sendo cinqüenta de escola pública e cinqüenta de escola particular. Vale ressaltar que outros instrumentos para a obtenção dos dados poderiam ser usados, mas o questionário aberto se mostrou eficiente para este caso em que o número de envolvidos era elevado e não se dispunha de tempo com cada um para investigação de outra natureza. Uma etapa posterior ao estudo exploratório pode exigir novas investigações e novos métodos. No presente trabalho, são apresentados os dados obtidos apenas com alunos do terceiro ano do nível médio e as perguntas que orientaram a pesquisa foram: Qual (is) diferença (s) você vê entre a física e a matemática?; Você poderia dar exemplos de relação entre a matemática e o seu dia a dia? ; Você acha importante a disciplina de matemática? Por quê? ; Quais relações você vê entre a matemática e a tecnologia? Você poderia dar exemplos de relações entre a física e a tecnologia? Quais? ; Você acha importante a disciplina de física? Por quê? ; Quais relações você poderia descrever entre a física e o seu dia a dia? ; Na sua opinião, como seria um bom professor de matemática? E de física? 3. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS Os dados obtidos receberam aqui um tratamento qualitativo. Para a oitava questão, que referese a um bom professor de matemática e de física na opinião dos alunos, não foi possível fazer um levantamento estático devido à ocorrência de diversas respostas, as quais serão tratadas de forma qualitativa. As transcrições presentes nos itens seguintes são literais, a fim de evidenciar inclusive as dificuldades que os alunos têm para expressar suas opiniões na forma escrita, o que deve ser considerado em uma pesquisa qualitativa com enfoque exploratório. 3.1. Diferença entre física e m matemática Com relação à primeira pergunta, a maioria dos alunos respondeu tentando resgatar conhecimentos adquiridos, a fim de tentar apresentar alguma diferença entre a física e a matemática. Pode-se inferir que os alunos têm acesso a uma física presa a aplicação de fórmula para a resolução de exercícios e essa mecanização, muitas vezes, é tratada como estando fora da física, ou seja, como se fosse matemática. Vale ressaltar que para os entrevistados a matemática é reduzida a cálculos mecânicos e lógicos, conforme pode-se constatar em algumas respostas abaixo: “A matemática é algo mais mecânico, mais lógico, já a física segue mais teóricos, tenta explicar os acontecimentos”. (escola particular) “A física estar em todo nosso movimento e a matemática está presente em algo que possamos contar ou somar”. (escola pública) “Física é uma matéria conceitual interpretativa (que usa a matemática como ferramenta). A matemática é uma ciência independente”. (escola particular) Observa-se que os alunos atribuem à matemática o papel de ferramenta que a física se utiliza. Afirmações como as que aparecem na primeira fala foram comuns nas respostas dos entrevistados: “Matemática é algo mais mecânico, e a física segue mais teóricos”. Esse tipo de resposta pode atrapalhar a visão que alguns alunos têm da matemática e da física, pois existem aqueles que não gostam da disciplina de física porque tem muito cálculo. “Embora as duas usem numeros e ou até sinais na física se estuda termologia na matemática se estuda matrizes que é bem diferente”. (escola pública) “A física explica os fenômenos, a matemática os comprova por meio de cálculos”. (escola particular) “Na física é possível provar matematicamente os fenômenos físicos e calculalos. Na matemática só é possível calcular. A física está mais presente no cotidiano”. (escola particular) Como foi dito anteriormente em relação à física e o cotidiano, os alunos que tentam estabelecer alguma diferença acabam resgatando termos e/ou exemplos. Isso se torna mais verdadeiro nas questões que solicitavam uma justificativa ou explicação, pois foram raras as respostas que conseguiram expressar algum conhecimento. Na maior parte das declarações acima há uma simplificação como, por exemplo, a redução da física ao estudo dos fenômenos e movimentos. Em algumas das respostas dos alunos foram observadas contradições, como: “Nenhuma não dá para explicar essas diferenças, pois a matemática está relacionado com o concreto já a física nem tanto”. (escola pública) Verifica-se que o aluno relaciona a física a algo não concreto, sabe-se que a física está presente no nosso dia a dia. Será que está sendo proporcionado a este aluno um conhecimento sobre o ensino da física e da matemática? Isso pode levar a um questionamento sobre a forma como são apresentadas essas disciplinas aos alunos. “Na minha opinião muito poucas, acredito que não tem necessidade das duas matérias, pois a maioria tem muita dificuldade em matemática, mas quando se depara com a física só falta desistir de estudar”. (escola pública) Observa-se que o aluno perdeu o interesse pelas disciplinas, mostrando que desde o princípio foi lhe proporcionado uma matemática difícil e a física foi reduzido a simples cálculos matemáticos, com isso o mesmo não conseguirá ver a importância da matemática e tampouco da física. Pode-se inferir que a física vista por estes alunos não deixou de se concentrar exclusivamente em explicações dos conceitos, a reprodução de leis e principalmente operações matemáticas, em vez de preparar cidadãos capazes de compreender e participar do mundo em que vivem. “Odeio matemática e física as duas são iguais”. (escola pública) O fato de o aluno afirmar “Odeio matemática e física as duas são iguais” choca, porque caso tivesse dito que tem dificuldade seria algo compreensivo, mas odiar significar que depois de ter visto dois anos e meio de física e ter tido aulas de matemática durante todo o seu período escolar demonstra que não teve nada nessas duas disciplinas que ele gostou ou que entendeu. “Nenhuma, pois tanto a física quanto a matemática envolve calculos, e acabam sendo as matérias mais envolventes de todas as disciplinas”. (escola pública) “Matemática agente soma, diminui, multiplica ou dividi a física também só que de forma diferentes, então não tem diferença”. (escola pública) Não se pode queixar-se das declarações acima, pois a física que está sendo ensinada se resume à resolução de exercícios pela aplicação de fórmulas. Houve casos ainda em que as respostas se reduziram em simples “nenhuma,” “pouca” ou “não tem”. 3.2. A relação da matemática com o cotidiano e as tecnologias Esta questão buscou verificar se os alunos tiveram um ensino de matemática que lhes permitisse fazer relação dessa disciplina com o seu cotidiano e/ou com a tecnologia. A maioria vêrelação da matemática com o cotidiano. A grande maioria das declarações ficou restrita à matemática presa às operações fundamentais. Mesmo que lhes fosse solicitado para que explicassem suas respostas, em muitos casos isso não ocorreu. Daí se pode inferir que eles não conseguem fazer essa relação e quando conseguem resumem a matemática somente a fragmentos da matemática. Observa-se isso em algumas falas: “No meu dia-a-dia no trabalho quase sempre me envolvo com número para sabe, por exemplo, quntas camisetas eu emprimo em uma hora”. (escola pública) “No trabalho para dar o troco, no ônibus para pagar a passagem e etc... Precisamos cálculos para saber o valor correto das coisas que compramos e pagamos”. (escola pública) A maioria das respostas, relacionadas à matemática no seu cotidiano, reduziram o conteúdo da disciplina, às operações fundamentais principalmente à soma e à subtração, tendo como base o dinheiro, lucros e perda, tanto na escola pública quanto na particular. Os alunos não viram como calcular a área de um “terreno da sua própria casa” ou fazer um levantamento estatístico, as respostas demonstram que ficaram presos somente à soma e à subtração. Entretanto, na escola particular houve algumas respostas relacionadas a conteúdos. Grande parte dos alunos da escola particular respondeu para calcular a nota de cada prova, jogos e supermercado. Algumas declarações ilustram suas opiniões: “Durante cálculos matérias do colégio, notas. Proporções na cozinha. Jogos de raciocínio lógicos, compras”... (escola particular) “Quantidade de comida que consumo quantidade de paginas que estudo”... (escola particular) “A matemática do dia a dia é bem mais simples, Usa apenas algumas operações e equações simples. A matemática mais aprofundada é para uso mais sofisticados como a engenharia, economia etc”. ... (escola particular) Na resposta a seguir, verifica-se que embora o aluno não goste de matemática sabe que é importante para o seu dia a dia: “Matemática é legal, só que eu não gosto, más acredito que no momento que você vê uma placa de carro, compra algo ai você já está presenciando a matemática”. (escola pública) 3.3. Importância da matemática Neste caso, pretendia-se verificar a opinião do aluno quanto à importância atribuída à matemática. A maioria dos entrevistados declarou reconhecer a importância da matemática. Relacionado com a questão anterior, infere-se que a grande parte dos alunos vê à relação da matemática com o cotidiano e pouco menos que isso vê que a matemática é importante. Algumas declarações ilustram suas opiniões: “Muito, pena que desde a 8º seria quase não tive aulas de verdade. Porque é usada principalmente no comercio, em receitas”. (escola pública) “Sim porque com o estudo da matemática o raciocínio fica mais rapido e, lhe dá noções de espaço e quantidade”. (escola particular) “Sim, apesar de não me identificar muito com essa matéria, mas por quê ela é indispensável em tudo na nossa vida”. ( escola pública) “De ser importante sim, mesmo com a dificuldade de aprende-la, mas sempre com a esperança de um bom desempenho e retorno.” ( escola pública) As respostas ilustram a afirmativa da importância da matemática. Na primeira citação observa-se que o aluno sabe que a matemática é importante principalmente no seu dia a dia, porém afirma “quase não tive aulas de verdade”. A quem compete esta responsabilidade? Ao aluno, aos professores ou até mesmo a sociedade? Nas citações seguintes os alunos também sabem que a matemática e importante mesmo com as dificuldades de aprendê-la ou não se identificar com a disciplina, mas assim como a grande maioria responderam que ela é indispensável à vida porque é vivenciada no cotidiano então, pode-se verificar que a maioria dos alunos tanto de escolas públicas como particulares só conseguem ver a importância da matemática para o uso no cotidiano: “Sim. Até passar no vestibular, e depois apenas para algumas poucas situações”. (escola particular) Não se pode deixar de falar sobre as citações que falam que a matemática é importante até passar no vestibular e concursos. Respostas como essas evidenciam a rejeição à disciplina de matemática. Os que se opõem, apontam sua crítica à matemática escolar à aplicação de alguns conteúdos que aparentemente estão ausentes da prática escolar. O ensino da matemática, na atualidade, desenvolve-se basicamente sobre o conhecimento científico e de forma descontextualizada. Na maioria das realidades escolares percebe-se a preocupação com o preparo para vestibulares por parte dos professores de matemática. Assim os conteúdos são trabalhados distantes da realidade dos alunos e a aprendizagem acaba tornando-se sem significado para estes, causando angústias e anseios nos alunos. Algumas respostas, todavia, são mais elaboradas: “Sim. Pois acho que através dele podemos criar e desenvolver varias coisas, resolver problema etc. O estudo de matemática vai muito além do vestibular, serve também para aumentar o raciocínio e admistrar coisas”.( escola particular) Na citação, acima embora a grande parte dos entrevistados ache que os conteúdos de matemática só têm importância para o vestibular, não se pode deixar de falar sobre aqueles que acham que a matemática vai bem além das provas e que desenvolve o raciocínio lógico ajudando a administrar situações vividas no dia a dia. Posições contrárias à relevância do ensino da matemática, embora estejam presentes em uma porcentagem menor, são respostas diretas. Ao mesmo tempo em que expressam a opinião da minoria da amostra investigada, essas respostas não podem ser ignoradas, pois podem ser sintomas da matemática apresentada a esses alunos em sua trajetória escolar. Podem-se encontrar, inclusive, declarações bastante contrárias a essa disciplina. Algumas respostas ilustram isso melhor: “Não no nível que a gente aprende. Nunca usei matrizes ou geometria no dia a dia por exemplo”. (escola particular) “Não! E so pra piorar o ensino porque tem coisas que não tem nada a ver e que nos nunca usamos na nossa vida”. (escola pública) Essa concepção sobre o ensino de matemática que a maioria dos alunos apresentou é um bom passo para o avanço de um ensino voltado cada vez mais para o interesse da sociedade, pois se sabe que a matemática não é disciplina muito fácil, mas é importante, ela exige também um esforço individual dos alunos no processo de aprendizagem. 3.4. A relação da física com cotidiano e as tecnologias A intenção foi verificar a capacidade dos alunos em relacionar algum assunto de física com o seu cotidiano e/ou com a tecnologia. Uma grande parte dos alunos afirmou que percebem alguma relação entre a física escolar e o cotidiano e/ou a tecnologia. Algumas respostas procuram evidenciar essa aproximação. “São muitas relações, algumas deles são simplesmente andar de carro ou ônibus, usar uma geladeira ou chuveiro entre outros”. (escola particular) “Sim motores a explosão que são construídos segundo os princípios da termodinâmica. Computadores complexos que obedecem aos vários conceitos e postulados da física quântica e etc”.( escola particular) “Os fenômenos da natureza por exemplo. A velocidade, as distancias percorridas por uma pessoa e outras coisa”.( escola pública) ‘Que a física ajuda a tecnologia a ter mais descobertas. Por exemplo em relação a energia, a luz, calor”....( escola pública) Embora as respostas acima façam uma relação entre a física e a vida cotidiana, trata-se de uma pequena parte do universo pesquisado. A grande maioria das declarações ficaram limitadas a lacônicos “sim” ou “não” e, mesmo havendo uma solicitação para que os alunos explicassem ou justificassem suas respostas, em muitos casos isso não foi feito. Daí se pode observar que eles não conseguem fazer essa relação e, quando o fazem, resume-se ao resgate de fragmentos da física escolar. Ou seja, é uma articulação simplificada da física e o entorno social, muito próxima do senso comum. A idéia de um ensino de física que permita ao aluno compreender o mundo moderno, para usar as palavras dos Parâmetros Curriculares (PCN+) parece ainda longe de ocorrer. E, a outra metade dos alunos que responderam negativamente à pergunta também se restringiram a meros “nada” ou “não sei”. Três exemplos ajudam a esclarecer: “Não. Pois essa matéria não vai ajudar em nada no meu futuro”. (escola pública) “Nada! Porque pouco mim emporto pra essa matéria. Nem que eu quizesse eu nunca vou aprender”. (escola pública) “Pouca a física é bastante inútil”. (escola particular) Na primeira resposta o aluno afirma que não faz nenhuma relação, pois esta matéria não vai lhe ajudar em nada. Na outra resposta, o aluno demonstra um desinteresse pela disciplina de física e, em que pese os muitos erros gramaticais, sugere certa desilusão com o ensino da física. Isso se torna ainda mais grave por se tratar de alunos do terceiro ano, os quais irão sair da escola afirmando que “não aprenderam nada”! É razoável assumir, a partir das declarações dos alunos, que não é uma prática usual no ensino de física estabelecer uma relação entre esta e o cotidiano e a tecnologia, ou quando ocorre são apenas menções motivacionais. 3.5. A importância da física Neste caso, pretendia-se verificar a opinião do aluno quanto à importância atribuída à física como ciência. Ou seja, a representação social da física e sua possível interferência na relevância por eles atribuída à física escolar, supondo-se, evidentemente, que a noção de transposição didática é suficiente para evidenciar que há diferenças entre elas. A maioria dos entrevistados declarou reconhecer a importância social da ciência física (84%) ou alguma relação desta com o seu cotidiano. Algumas declarações ilustram suas opiniões: “Sim. Pois o conteúdo tem aplicação direta nos fenômenos naturais e pode ser facilmente relacionados no dia –a – dia”. (escola particular) “Sim, pois se possuo um carro por, exemplo terei que saber calcular a distância com o tempo e o combustível”. (escola publica) “A disciplina de física ajuda e muito compreender a origem do mundo, do espaço que admiro muito”. (escola pública) “A física é a grande impulsionadora das descobertas, das criações”. (escola particular) Essas respostas ilustram a afirmativa da importância da física na opinião dos alunos. A maioria das respostas a essa pergunta apoiou suas justificativas na relação da física com o dia a dia. As declarações precedentes são bons exemplos disso, em especial às duas primeiras. Entretanto, uma informação que estaria além dos dados obtidos é se esses alunos empregam efetivamente os conceitos aprendidos na física escolar para a compreensão de cálculos relacionados ao carro, como ressalta a sua resposta, ou mesmo os conceitos de distância e tempo. O fato de fazerem essa relação não implica necessariamente que estabeleçam a partir dos conceitos científicos, conforme se verá mais adiante. As duas últimas respostas apontam para uma visão mais geral da ciência e suas descobertas para a humanidade. Embora um número significativo dos alunos tenha respondido que acha a física importante para a sociedade, observa-se que as suas respostas se apóiam mais em relações predominantemente ilustrativas entre o que vêm na escola e o seu cotidiano ou em associação com a tecnologia. Entretanto, uma pequena parcela dos sujeitos investigados sequer faz essa relação e se coloca contrária à física escolar, conforme indicam as declarações a seguir: “Não muito; pois de tudo que aprendi, acho que mal irei utilizar 10% de tudo e nada eu utilizo no meu dia-a-dia, física é muito mais específica”. (escola particular) “Para ser sincero eu ODEIO física. Antes eu dizia que era INÚTIL, mas hoje vejo que ela é muito importante. Explica varias coisa”. (escola particular) Respostas como essas, além de evidenciar a rejeição à física, curiosamente o fazem pensando na física escolar. É interessante notar que os que aprovam a física se justificam em sua aproximação com o cotidiano e a tecnologia ou se apóiam na relevância da ciência para a sociedade. E, os que se opõem a ela, apontam suas críticas à física escolar e à aparente ausência de utilidade prática dessa disciplina. Subentende-se que a compreensão e análise dessas respostas são mais complexas do que se mostra em um primeiro momento, conforme se espera em um estudo dessa natureza. Como foi mencionado anteriormente, pode estar presente nessas declarações uma representação social da ciência e sua associação com a tecnologia. Esta sim presente no dia a dia constituindo-se em uma ponte de acesso entre a ciência e as pessoas em geral, o que não significa que seja compreendida em seus conceitos e métodos. Alguns alunos atribuem importância ao ensino da física somente porque a disciplina é exigida nos exames de vestibulares. Essa resposta pode revelar um ensino voltado apenas para a minoria dos estudantes que tem intenções de prosseguir seus estudos em nível superior. Se as interpretações anteriores estiverem adequadas e pertinentes, as posições contrarias à relevância do ensino da física, embora estejam presentes em uma porcentagem menor, não deveriam ser ignoradas, pois podem ser um sintoma da física apresentada a esses alunos em sua trajetória escolar. Pode-se encontrar afirmações duras a respeito da disciplina, de acordo com alguns exemplos: “Sim até passar no vestibular”. (escolar particular) “Não, odeio física e nunca precisei usar o que aprendi fora das provas”. (escola particular) Um estudo exploratório não possibilita extrapolar suas conclusões para além do cenário apresentado. Todavia, pode-se observar que esses alunos (todos do terceiro ano), que evidenciam uma verdadeira aversão à física escolar, tiveram acesso a um ensino voltado para objetivos muito restritos, que não atingem aqueles que não pretendem prosseguir seus estudos nas áreas científicas. Essa parcela de alunos não deveria ser ignorada quando se pretende um ensino de física inclusivo, com vistas a uma formação geral e que garanta uma visão e uma compreensão moderna do mundo contemporâneo. 3.6 Qualidade nas aulas de física e de matemática Aqui se esperava ouvir dos alunos o que seria uma boa aula de matemática e de física, interessante, atrativa ou mesmo o que eles entendem que seria um bom professor de matemática e de física. As respostas foram muito diversificadas, mas pode-se verificar que a maioria indicou aulas práticas na disciplina de física, conforme ilustram as declarações abaixo: “Gostaria que as aulas fossem mais práticas se, possível em laboratórios que sabe as aulas ficariam mais interessantes”. (escola pública) “Que não só desse as respostas no quadro mas sim explicando parte por parte para que nos entendessimos direito, física a mesma coisa”. (escola pública). Embora alguns não tenham respondido essa questão, observou-se que mais da metade dos alunos deseja mudança no modo de ensinar matemática e física. Em alguns casos as respostas foram bastante duras em suas críticas aos professores, alguns delas chegando a repudiar a disciplina. Ainda que as declarações tenham sido bastante heterogêneas, além da exigência de aulas práticas em física, um outro aspecto que chamou a atenção foi o fato de que poucas declarações apontam como exigência para uma boa aula de matemática e de física o domínio do conteúdo específico pelo professor. Houve algumas indicações nesse sentido, mas de forma indireta. Quanto à atuação do professor, mais especificamente, a maioria dos entrevistados empenhouse em dar algum tipo de resposta. A maior partes dele fazia referência a aspectos afetivos ou habilidades pessoais, tais como: dinâmicos, pacientes, respeitadores. Conforme ilustram as declarações a seguir: “Na minha opinião um bom professor de matemática e de física são aqueles tem a preocupação de tirar as duvidas dos alunos, tentar aprofundar o máximo possível e sempre resolver questões de vestibular, ou seja, procurar direcionar suas aulas para a aprovação do vestibular.” (escola particular) “Dinâmico, tentando fugir ao Maximo da vida rotineira da sala de aula porque apesar de serem matérias extremamente importante são bem complicadas também e isto, não ajuda em nada a prender, a atenção dos alunos”. (escola pública) “Daria aula, sem enrolar. Me ensinaria e se dedicaria como um professor. Respeitaria seus alunos; ajudaria dando revisões (uma coisa muito difícil).” (escola pública) “Um professor de matemática quanto de física é aquele que busca várias forma de te passar a matéria com criatividade saindo um pouco só da exiplação da sala e utilizando recursos diferentes para matéria fica mais desejada.” (escola pública) Conforme foi mencionado anteriormente, houve ainda afirmações do tipo “um professor que domine o conteúdo.” Se esse também é um problema que os próprios alunos identificam, então, qualquer possibilidade de inovação didática fica sensivelmente prejudicada, pois se pressupõe a exigência do domínio do que se pretende ensinar. Dessas respostas muitas discussões poderiam surgir, mas nesse momento talvez a verificação mais importante é a de que os alunos têm algo a dizer em relação ao que esperam da matemática e da física, e da atuação do professor. Lamentavelmente, não só essas expectativas não são atendidas ao que parece, como raramente são ouvidas. Essa foi uma das razões em fazer uma pesquisa dessa natureza. 4. CONCLUSÃO A partir dos objetivos propostos inicialmente e das estratégias metodológicas adotadas, podese dizer que o presente estudo exploratório, alcançou seu objetivo visto que permitiu uma aproximação do contexto escolar e verificou-se a opinião dos alunos em relação à disciplina de física e de matemática. Fez surgir um grande número de temas para investigações futuras e aponta a necessidade de (re)pensar a escola e, particularmente, o ensino de física e de matemática, pois parece que a maioria dos alunos reprova ambos. Observa-se ainda a grande dificuldade dos alunos em se expressarem na forma escrita. Esse problema é apontado pelos PCN+ para a área das Linguagens e Códigos, os quais destacam que os estudos básicos da língua deveriam ser aprendidos no ensino fundamental e “cabe ao ensino médio oferecer aos estudantes oportunidades de uma compreensão mais aguçada dos mecanismos que regulam nossa língua, tendo com ponto de apoio alguns dos produtos mais caros às culturas letradas: textos escritos, especialmente os literários” (Brasil, 2002b, p 55). O que propõem as novas Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, no ensino da ciência e da matemática, vale ressaltar que é um complemento dos PCN. Mostram de forma harmônica os conteúdos e os enfoques escolhidos; favorecem tratamentos contextualizados e interdisciplinares. Competências ligadas à representação, expressão e comunicação tendo boas chances de ser exploradas, também são enfatizadas na parte de física. O novo documento deixa a desejar. É como se estive faltando algo quando se chega ao fim. Na introdução demonstra algo bom, porque cita a interdisciplinaridade, mas do meio para o término do documento a sensação é clara falta algo. Pode-se dizer que não seria necessária ter feito o novo documento relacionado à ciência física porque os Parâmetros Curriculares Nacionais estão bem melhores, com competências, finalidade e relações com as diversas áreas do conhecimento. A escola precisa concientizar-se de seu papel social em proporcionar a formação cidadã como prioridade e oferecer condições de prosseguir nos estudos. É nesse sentido que o presente estudo exploratório pretende contribuir, pois conforme foi dito anteriormente, busca aproximar os pesquisadores da prática profissional e fazer emergir novos elementos para aprofundamento e análise crítica. Do cenário exposto, muitas questões poderiam ser objeto de discussão, mas o espaço disponível limita a abordagem. Então “Dar aula” não implica necessariamente cuidar da aprendizagem. Os professores, como regra, apenas “dão aula”, repassam conteúdos curriculares e aplicam provas, importando-se pouco ou nada com a aprendizagem dos alunos. Em algumas transcrições dos alunos observa-se que algumas aulas deixam a desejar. Não ocorre uma avaliação que garanta que o aluno aprendeu, sabe-se que é de vital importância garantir que o aluno aprenda saber de sua condição de aprendizagem, verificar e constatar se o aluno está ou não aprendendo. Dentro desse contexto se encontra a explicação plausível porque os alunos não gostam de matemática e tampouco de física. Para o professor o desafio é enorme: é-lhe incumbida a tarefa de buscar alternativas para tornar o ensino de matemática e de física mais significativos. Não importa se é um graduado, mestre ou até mesmo um doutor na área, se tem ou não o dom para a profissão que escolheu. É necessária muita disciplina, estudo, coragem, criatividade, respeito pelo próximo, enfim amor pelo que se está realizando, pois os frutos serão colhidos no futuro. Vê-se que são algumas características para o professor, mas observa-se que o papel do professor não é instruir, mas orientar; não é oferecer facilidades e fórmulas prontas, encurtar raciocínios e procedimentos substituindo o esforço do aluno, mas cabe apoiar o aluno e exigir dele o melhor desempenho possível viável. A necessidade que os alunos sentem em serem auxiliados pode se tornar um importante impulso para mudanças significativas. BIBLIOGRAFIA BRASIL, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC, SEMTEC, 2002a. BRASIL, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Brasília: MEC, SEMTEC, 2002b. BRASIL, Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Ciências da Natureza, matemática e suas tecnologias / secretaria de Educação Básica, Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006. CAJAS, Fernando. Alfabetización Científica y Tecnológica: la transposición didáctica del conocimiento tecnológico. Enseñanza de las Ciencias, 19 (2), p.243-254, 2001. DELIZOICOV, Demétrio. Problemas e Problematizações. In: PIETROCOLA, Mauricio (org.). Ensino de Física: conteúdo, metodologia e epistemologia numa concepção integradora. Florianópolis: ED. da UFSC, 2001. LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D.. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. PERRENOUD. Philippe. Construir as Competências desde a Escola. Trad. Bruno Charles Magne. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. PIETROCOLA, Mauricio. Construção e Realidade: o papel do conhecimento físico no entendimento do mundo. In: PIETROCOLA, Mauricio (org.). Ensino de Física: conteúdo, metodologia e epistemologia numa concepção integradora. Florianópolis: ED. da UFSC, 2001. TRIVIÑOS, Augusto N. S.. Introdução à Pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atrlas, 1987. WERNECK, Hamilton. Ensinamos demais, aprendemos de menos. Petrópolis RJ: Ed. Vozes, 1987.