GÊNERO NA PERCEPÇÃO DAS GESTORAS DOS SERVIÇOS
ASSISTENCIAIS À MULHER VÍTIMA DE VIOLÊNCIA NO PIAUÍ
FERREIRA, Maria Tamires Alves 1
2
CANUTO, Mary Ângela de Oliveira
NERY, Inez Sampaio 3
VASCONCELOS, Tatianne Bandeira de4
RESUMO
INTRODUÇÃO: A violência representa um fenômeno complexo que atinge mulheres
no mundo inteiro. Na definição da Convenção Interamericana para prevenir, punir e
erradicar a violência contra a mulher, a violência contra a mulher consiste em
qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento
físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera
privada (OEA, 1994). Assim, para analisar a violência contra mulheres, é
indispensável o entendimento do conceito de gênero. Com base nesta problemática,
a presente pesquisa tem por objetivo descrever e analisar a percepção de gênero
das gestoras dos serviços assistenciais à mulher vítima de violência no Piauí.
METODOLOGIA: Trata-se de recorte de um estudo descritivo qualitativo intitulado
“Gênero e violência doméstica: a percepção das gestoras dos serviços de apoio”. Os
sujeitos do estudo foram nove gestoras dos serviços de assistência às mulheres
vítimas de violência do Estado do Piauí, localizados na cidade de Teresina: as duas
defensoras públicas do Núcleo de Defesa da Mulher Vítima de Violência, a
coordenadora do Centro de Referência para Mulheres Vítimas de Violência
Francisca Trindade, a coordenadora do Serviço de Atenção às Mulheres Vítimas de
Violência Sexual, a presidente do Conselho Estadual de Direitos da Mulher, as duas
delegadas das Especializadas no Atendimento à Mulher, a coordenadora da CasaAbrigo e a diretora da Diretoria de Política para as Mulheres. A coleta de dados
ocorreu no período de março e abril de 2009, cuja técnica de abordagem empregada
foi a entrevista e como instrumento utilizou-se um roteiro semi-estruturado contendo
dados de identificação do sujeito e questões abertas. As entrevistas foram
transcritas e os dados produzidos foram organizados e tratados por meio da técnica
de análise de conteúdo, que permitiu identificar categorias e estas foram analisadas
à luz do referencial teórico A pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética e Pesquisa
da Universidade Federal do Piauí sob o protocolo nº 0228.0.045.000-08. Todos os
1
Especialista em Terapia Intensiva. Enfermeira do Prontomed. Email: [email protected]
Especialista em Saúde Pública. Enfermeira da Associação Reabilitar / CEIR. Email:
[email protected]
3
Doutora em Enfermagem. Professora Associado II do Curso de Bacharelado em Enfermagem e
Membro Efetivo do Mestrado em Enfermagem e do Mestrado e Doutorado em Políticas Públicas da
Universidade Federal do Piauí (UFPI). End.: Rua Antonio Chaves, 1896, Bairro dos Novos, TeresinaPI, CEP 64.045-340. Email: [email protected]
4
Mestranda em Políticas Públicas na Universidade Federal do Piauí (UFPI). Delegada de Polícia Civil
do Estado do Piauí. Email: [email protected]
2
2
sujeitos da pesquisa assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e,
para garantir o anonimato das participantes, foram a elas atribuídos nomes fictícios
de deusas. RESULTADOS: A partir da análise das entrevistas emergiram categorias
analíticas com base na semelhança de conteúdo dos discursos, dentre elas, enfocase o gênero como um conceito cultural e socialmente construído. Essa categoria diz
respeito à maneira como as gestoras compreendem o conceito de gênero e, ao
falarem do “ser homem” e do “ser mulher”, como percebem as relações e os papéis
de gênero. Verificou-se, baseado nos depoimentos, que as gestoras diferenciam
entre gênero e sexo, definindo gênero como o sexo social, ou seja, uma maneira de
se referir aos papéis atribuídos aos homens e às mulheres, baseada em regras,
normas, valores, convenções e comportamentos que permeiam as relações sociais.
Os papéis destinados tanto para homens como para mulheres foram construídos e
naturalizados pela própria sociedade, cabendo à mulher a função de cuidadora da
casa e dos filhos, devendo obediência na infância ao pai e, mais tarde, ao
companheiro (AMARAL, 2005). Isso diz respeito ao sistema patriarcal de família,
baseada em relações assimétricas de poder entre homens e mulheres (SAFFIOTI,
2004). As gestoras ressaltam que essas desigualdades de gênero são transmitidas a
cada geração, sendo que um dos fatores que contribuem para a perpetuação e
naturalização dessas relações é o fato das próprias mulheres educarem seus filhos
baseadas nesta hierarquia de gêneros. Neste ponto, quando as gestoras discorrem
sobre a posição de inferioridade e de dependência do homem, ficou evidenciado o
duo “dominação masculina x subordinação feminina”. Assim, o gênero representa o
“elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre
os sexos e uma forma primária de dar significado as relações de poder.” (SCOTT,
1995, p. 86). Portanto, falar em gênero, em construção social requer do Estado uma
abordagem multidimensional (saúde, educação, assistência social, segurança
pública, cultura e justiça) com uma atuação conjunta, para dar conta da
complexidade da violência contra as mulheres e de garantir a integralidade da
assistência à mulher, constituindo uma Rede de Atendimento a essa mulher em
situação de violência (BRASIL, 2011). No âmbito da saúde, a enfermagem é uma
categoria que tem muito a contribuir para melhorar a qualidade da assistência à
mulher pelas suas práticas e pelo seu corpo de conhecimento científico e teórico,
pois é uma profissão plenamente inserida nos programas atuais de assistência à
saúde da mulher. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Diante do exposto, este estudo
possibilitou refletir sobre a percepção de gênero das gestoras que pensam e
executam as políticas e ações voltadas para as mulheres vítimas de violência e
perceber que elas compreendem o gênero como uma construção histórica, cultural,
relacional e dinâmica sobre o masculino e o feminismo, cujas representações
acabam por naturalizar papéis sexuais e sociais. É por esta razão que consolidar
ações públicas na área de gênero envolve desafios relacionados a vencer
resistências internalizadas. São necessárias ações que minimizem essas
resistências e que funcionem como correções nas distorções existentes, igualando
os direitos entre homens e mulheres. Por fim, ressalta-se que a existência de
serviços voltados para repressão e prevenção da desigualdade de gênero não
implica automaticamente na mudança cultural da sociedade, sendo preciso estimular
a construção de uma nova cultura de pensar, onde o respeito e o compromisso com
os direitos das mulheres sejam valores incorporados ao cotidiano de todos.
DESCRITORES: Percepção. Gênero. Violência. Enfermagem
REFERÊNCIAS
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AMARAL, Célia Chaves Gurgel. Debates de gênero: a transversalidade do conceito.
Fortaleza,CE: Editora UFC, 2005.
BRASIL. Rede de enfrentamento à violência contra as mulheres. Brasília: Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres, 2011.
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Interamericana para
prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher. Belém-PA, 1994.
SAFFIOTI, Heleieth. Gênero, patriarcado, violência. São Paulo: Editora Fundação
Perseu Abramo, 2004.
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para a análise histórica. Revista Educação
e Realidade. Porto Alegre, v. 20, n. 2, jul/dez 1995. p. 71-99.
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gênero na percepção das gestoras dos serviços - Abenfo-CE