O Programa Bolsa-Escola em Minas Gerais concepção, implementação e desafios
Carlos Amaral*
Caio Márcio Silveira*
Este relatório analisa a experiência do programa "Bolsa Familiar de Educação - Bolsa-Escola"
em Minas Gerais, criado por iniciativa do Governo do Estado e implementado, até meados de
2001, em 30 municípios da região do Vale do Jequitinhonha.
O programa em foco representa uma importante contribuição no contexto das iniciativas de
bolsa-escola e, mais amplamente, das políticas sociais no país. Entre as particularidades que o
distinguem e indicam a relevância de seu estudo, destaca-se que a iniciativa é realizada em
uma região com características socioeconômicas particularmente desfavoráveis, que dizem
respeito não a uma parcela mas à quase totalidade da população ali residente (o que o
diferencia da maioria dos programas de bolsa-escola até então constituídos no Brasil, incluída a
experiência do Distrito Federal 1). Outras características distintivas podem ser acentuadas, como
o fato de incorporar um público predominantemente rural e requerer um processo complexo de
consolidação de parcerias, envolvendo o governo estadual e dezenas de governos municipais,
além de representações da sociedade civil.
O trabalho de campo que apoiou este estudo foi realizado em quatro municípios (Almenara,
Berilo, Santo Antonio do Jacinto e Turmalina), nos quais o programa foi iniciado no ano 2000.
Sem prejuízo da referência específica a estes casos, a análise que se segue diz respeito ao
conjunto da experiência do Programa Bolsa-Escola em Minas Gerais.
1. 0s Programas de Bolsa-Escola e Renda Mínima no Brasil
Os programas de bolsa-escola e renda mínima vinculada à educação vêm se
firmando como uma das principais experiências inovadoras surgidas nos últimos
anos, no cenário das políticas sociais no Brasil.
Tendo origem nas experiências pioneiras dos governos de Campinas e Distrito
Federal (ambas iniciadas em 1995), esses programas vêm se disseminando por
* Carlos Amaral e Caio Márcio Silveira são sociólogos, integrantes do NAPP - Núcleo de Assessoria
Planejamento e Pesquisa.
1
A experiência do Distrito Federal foi objeto de um estudo específico no âmbito do projeto Parcerias e
Pobreza, projeto especial do programa Gestão Pública e Cidadania (FGV-SP, Fundação Ford,
BNDES) apoiado pelo Banco Mundial. Ver Santos Junior, Orlando Alves. "Programa Bolsa-Escola:
educando para a cidadania" in CAMAROTTI, Ilka e SPINK, Peter. Parcerias e Pobreza - Soluções
locais na Implementação de Políticas Sociais. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.
2
todas as regiões do país, através de iniciativas de governo municipais, estaduais e, a
partir de 1999, do Governo Federal2.
O núcleo básico desses programas consiste na concessão de uma renda complementar
a famílias muito pobres, condicionada à matrícula e frequência escolar de seus filhos e
dependentes. Em relação aos programas tipicamente assistenciais (distribuição de
alimentos, roupas, cestas básicas, etc), essas iniciativas contêm dois importantes
elementos inovadores.
O primeiro refere-se à concessão do benefício em dinheiro, o que traz implícita a idéia
de que as famílias são capazes de gerir suas necessidades e recursos de forma mais
adequada que os programas assistenciais de tipo tradicional. O segundo - e mais
decisivo - reside no incentivo à escolaridade de crianças de famílias de baixa renda, que
introduz um componente estratégico nos programas, vinculando-os às prioridades
colocadas para o desenvolvimento econômico e social do país.
Para além desse núcleo básico, compreendido no binômio transferência de renda incentivo à escolaridade, diversos programas de bolsa-escola têm buscado articular
suas ações com outros serviços, em áreas como assistência materno-infantil,
alfabetização de adultos, capacitação profissional, acesso a serviços de documentação,
etc. Neste sentido, os programas têm contribuído para o desenvolvimento de novos
modelos de política social, baseados em enfoques intersetoriais e sistêmicos, oferta
integrada de serviços e focalização nos segmentos com maior pobreza.
Apesar da crescente visibilidade e aceitação social dos programas, sobre eles há
poucos estudos sistemáticos. Nesse sentido, seus resultados atuais, bem como suas
potencialidades e limites, permanecem em boa parte desconhecidos. Ainda assim, a
partir dos poucos estudos disponíveis3 e do depoimento de gestores e participantes, é
possível chegar a um quadro inicial da trajetória dessas experiências. Ali emergem
desafios e dificuldades, ao lado de vários aspectos positivos.
O principal elemento positivo, observado em praticamente todos os programas,
relaciona-se ao aumento da frequência escolar e à redução da taxa de evasão a níveis
2
A atuação do governo federal ocorre atualmente nos marcos do “Programa Nacional de Renda
Mínima vinculada à educação (bolsa-escola)” instituído pela Lei 10.219 de 11/04/2001 e
operacionalizado pelo MEC. Esse programa consiste em uma versão modificada do “Programa de
Garantia de Renda Mínima” implementado pelo MEC em 1999 e 2000. No seu formato atual, o
programa prevê a concessão de um benefício de R$ 15,00 a 45,00 (dependendo do número de filhos)
a famílias com renda per capita de até R$ 90,00 e que tenham todos os seus filhos entre 6 e 15 anos
matriculados na rede escolar. Os recursos para o pagamento dos benefícios advém da União e o
programa, embora extensível a todo o país, prioriza o atendimento a estados e municípios com menor
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH inferior a 0,5).
3
próximos de zero, no universo dos alunos beneficiados. Ao romper com os mecanismos
tradicionais de expulsão das crianças mais pobres das escolas, os programas de bolsaescola contribuem para uma universalização de fato do ensino fundamental, ajudando a
combater uma das principais fontes de reprodução das desigualdades sociais.
No tocante às famílias, além dos efeitos imediatos ligados à superação da indigência,
os programas têm contribuído para o fortalecimento da auto-estima e melhoria do
convívio familiar, possibilitando a seus membros o conhecimento e o exercício de
direitos básicos de cidadania.
Em relação aos aspectos problemáticos, podem ser mencionados: i) a desvinculação
entre o valor dos benefícios e os mínimos sociais necessários à subsistência familiar
(visível especialmente no caso do programa do governo federal); ii) a falta de
mecanismos que assegurem a continuidade da formação educacional das crianças e
adolescentes, após o término do benefício; iii) a ausência ou insuficiência de
estratégias voltadas para a inserção econômica das famílias em bases sustentáveis.
A convivência entre aspectos positivos, dificuldades e questões não resolvidas pode ser
vista como natural, em experiências sociais inovadoras como os programas de bolsaescola. A consolidação e replicação dessas iniciativas em escala nacional exige um
conjunto de ações destinadas a ampliar sua eficácia, sustentabilidade e capacidade de
adequação a contextos diferenciados. Nesse sentido, o presente artigo, que enfoca o
programa desenvolvido pelo governo de Minas Gerais no Vale do Jequitinhonha,
considerado uma das regiões mais pobres do país, deve ser visto como uma
contribuição para o enfrentamento dos desafios implícitos na proposta de transformar a
bolsa-escola em um dos eixos estruturantes das políticas sociais no Brasil.
2. Características Gerais do Programa Bolsa-Escola em Minas
Gerais
Instituído através de decreto pelo Governo de Minas Gerais, em março de 1999,
o
Programa Bolsa Familiar para a Educação - Bolsa-Escola definiu como seu objetivo
"a admissão e permanência na escola pública de crianças de idade entre sete e 14
anos completos, em condições de carência material e precária situação familiar e
social"4.
3
Para uma relação desse estudos, consultar as referências bibliográficas no final desse artigo.
Decreto nº 40.327 de 23 de março de 1999 e Exposição de Motivos - Governo do Estado de Minas
Gerais.
4
4
A concepção que orienta o programa parte da consideração de que "não basta
afirmar que toda criança tem que estar na escola": é preciso garantir as condições
objetivas
de
acesso
e
permanência,
colocando
ao
lado
do
princípio
de
universalização o de equidade, isto é, "a democratização das oportunidades
educacionais". Formula-se que o Programa é mais do que um programa de renda
mínima, pois seu enfoque principal não seria apenas a distribuição de renda, mas "a
educação como direito à cidadania"5.
Agrega-se a esta perspectiva a idéia de que o programa deve se converter em foco
gerador de ações articuladas e complementares, incluindo propostas pedagógicas
inovadoras, apoio à capacitação e inserção profissional e ações no campo da saúde
e da cultura, envolvendo órgãos públicos e entidades não governamentais.
É enfatizado ainda que os critérios técnicos devem nortear, com a máxima exatidão
possível, todas as ações, evitando "o assistencialismo e o clientelismo, muito
comuns em iniciativas governamentais de cunho social" 6.
Ao longo de 1999, foram definidos os contornos institucionais e o desenho
operacional
do Programa, abrangendo atribuições dos organismos de gestão,
critérios de elegibilidade, mecanismos de seleção e permanência das famílias,
definição dos municípios prioritários e elaboração dos instrumentos e sistemas de
funcionamento - processo que contou com a participação de consultores contratados
e que teve inspiração direta no programa implementado no Distrito Federal, na
gestão Cristovam Buarque (1994-1998).
Uma primeira definição disse respeito à abrangência geográfica do programa. Em
função das suas características e indicadores sociais mais desfavoráveis, definiu-se
que a Bolsa-Escola seria direcionada para a região do Vale de Jequitinhonha,
embora com a perspectiva de sua expansão posterior para todo o estado.
A região do Jequitinhonha
A região do Jequitinhonha abrange 51 municípios do estado de Minas Gerais, sendo
reconhecida como um foco de concentração de pobreza, não apenas no âmbito
estadual, mas também face aos parâmetros nacionais - com base nas informações
disponíveis quanto ao Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M) e aos
indicadores específicos de renda per capita, analfabetismo e inserção escolar.
5
6
Ibid.
Ibid.
5
A definição da ordem de prioridade, para incorporação dos municípios da região ao
programa, envolveu o estudo e escalonamento de indicadores relacionados à evasão
escolar (com base nos dados de 1997, da Secretaria Estadual de Educação), ao
trabalho infantil e à proporção de crianças fora da escola (com base nos dados do
Censo do 1991). Até o final do primeiro semestre de 2001, o programa já estava
implantado em 30 municípios, cuja relação e características básicas podem ser
visualizadas na Tabela 1.
Os 30 municípios totalizam uma população de 409.708 habitantes, sendo todos de
pequeno porte, porém com variações significativas, envolvendo desde municípios com
menos de 5 mil habitantes (Aricanduva, Leme do Prado, José Gonçalves) até
municípios com população acima de 30 mil (Almenara, Capelinha, Minas Novas e
Araçuaí).
A distribuição da população por zona de moradia indica uma ligeira maioria de
população urbana, nos 30 municípios em questão, já de acordo com os dados do
Censo de 2000. Ainda que a proporção de moradores no meio rural seja superior à do
conjunto do estado de Minas Gerais, observa-se que - ao longo da década de 90 - o
perfil marcadamente rural deixou de ser uma característica da região: dos 30 municípios
tomados como referência, 18 têm população já predominantemente urbana.
Salienta-se que o IDH-M situa-se aquém de 0,500 em praticamente todos os municípios
(portanto, na faixa considerada pelas Nações Unidas como indicativa de "baixo
desenvolvimento humano"). O índice para os 30 municípios aqui considerados
apresenta-se não apenas bem abaixo da média do estado de Minas Gerais (0,699),
como inferior ao da região Nordeste como um todo (0,517) e, ainda, de todos os
estados do Brasil: os estados com menor IDH-M (Maranhão, Piauí, Alagoas e Paraíba)
mostravam índices acima de 0,450 - de acordo ainda com o Censo de 1991, base para
os índices municipais disponíveis até meados de 20017.
7
Vale observar que o Mapa do Desenvolvimento Humano no Brasil (PNUD/IPEA/FJP), com a
aplicação do conceito de Índice Municipal de Desenvolvimento Humano (IDH-M), só foi publicado em
1997.
6
Tabela 1. Jequitinhonha - indicadores sociais (municípios abrangidos
pelo Programa Bolsa-Escola até 2001)
Município
Pessoas
Residentes
% pop
urbana/
rural
IDH-M
Mortalidade
infantil
Analfabetismo
Evasão
Ensino
Fundamental
ALMENARA
Almenara
35.356
79%
0,486
53,0
45,4
17,8
Felisburgo
6.231
73%
0,438
46,6
43,7
14,3
Jacinto
12.067
72%
0,404
61,8
44,4
11,0
Jequitinhonha
22.855
70%
0,456
39,3
44,4
10,5
Joaíma
14.559
71%
0,418
56,2
50,5
12,8
Jordânia
9.869
72%
0,475
48,6
41,4
13,8
10.706
42%
xx
xx
xx
12,0
Rio do Prado
5.384
54%
0,388
47,6
48,0
9,8
Rubim
9.642
78%
0,452
53,0
40,1
11,5
Salto da Divisa
6.813
82%
0,509
52,8
49,9
25,3
Santa Maria do Salto
5.283
69%
0,403
45,7
46,4
9,0
Sto Antonio do Jacinto
12.129
50%
0,372
73,0
52,1
8,3
ALMENARA (REGIÃO)
150.894
69%
0,436
52,5
46,0
13,0
Angelândia
7.470
43%
xx
xx
xx
11,0
Aricanduva
4.254
25%
xx
xx
xx
11,0
Capelinha
31.014
64%
0,465
57,7
38,2
12,2
Carbonita
8.928
62%
0,468
47,3
40,5
7,1
Chapada do Norte
15.220
32%
0,416
xx
xx
9,2
Itamarandiba
29.170
61%
0,448
39,7
50,2
11,7
4.712
33%
xx
39,7
36,8
14,3
Minas Novas
30.630
25%
0,405
xx
xx
8,6
Turmalina
15.644
65%
0,463
36,2
35,3
7,0
Veredinha
5.262
59%
xx
39,7
34,9
11,5
152.304
49%
0,444
43,4
39,3
10,4
Araçuaí
35.439
57%
0,496
36,2
35,3
7,0
Berilo
12.989
23%
0,483
39,7
34,9
11,5
Palmópolis
DIAMANTINA
Leme do Prado
DIAMANTINA (REGIÃO)
TEÓFILO OTONI
Coronel Murta
9.124
71%
0,442
53,0
31,0
9,3
Francisco Badaró
10.294
24%
0,392
48,0
43,6
7,0
Itinga
13.836
41%
0,394
43,8
46,6
9,7
6.461
31%
xx
xx
xx
12,8
José Gonçalves
4.706
17%
xx
xx
xx
12,5
Virgem da Lapa
13.661
43%
0,425
48,3
44,1
8,3
106.510
44%
0,439
44,8
39,3
9,7
409.708
55%
0,439
48,1
42,5
11,2
Jenipapo de Minas
TEÓFILOOTONI(REGIÃO)
TOTAL
Fontes: IBGE - Censo de 2000 (população e proporção urbano-rural); PNUD/IPEA/FJP - Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil - 1991 (IDH, mortalidade infantil, analfabetismo); SEE/MG - 1997
(evasão escolar).
7
Destacam-se ainda as elevadas taxas de analfabetismo da população com 15 anos ou
mais, também acima da região Nordeste como um todo, equiparando-se aos estados que
apresentam os indicadores mais críticos no país (os mesmos quatro acima citados). Em
alguns municípios, o analfabetismo entre jovens e adultos chega a atingir metade ou mais
da população (Santo Antonio do Jacinto, Joaíma, Itamarandiba). Este é um dos traços
marcantes da realidade do Jequitinhonha, nitidamente desafiante para um programa que,
sendo essencialmente educacional, destina-se a famílias cujos adultos - em grande parte não passaram por um processo mínimo de escolarização.
Estrutura e princípios operacionais do programa
O programa é coordenado pela Secretaria de Educação, através de uma Secretaria
Executiva
criada
especificamente
para
sua
implementação,
juntamente
com
uma
Comissão Executiva formada por representantes de três outras Secretarias (Trabalho,
Assistência Social da Criança e do Adolescente - SETASCAD, Saúde e Cultura) e do
Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente.
A estrutura institucional da região do Jequitinhonha - na área de educação - é constituída
pelas Superintendências Regionais de Ensino (SREs) de Almenara, Diamantina e Teófilo
Otoni, abrangendo o conjunto de municípios da região e todos os estabelecimentos
públicos de ensino, da rede estadual e municipal. A partir destas superintendências são
formadas as Comissões Regionais para execução do Programa Bolsa-Escola - contando
com representantes das diretorias regionais de outras secretarias (SETASCAD e Cultura) e
de entidade não-governamental com atuação na área da infância e adolescência. As
Comissões Locais completam o núcleo do sistema de gestão do Programa, sendo
presididas pelo representante da Superintendência Regional e incluindo a participação das
prefeituras e de representantes da sociedade civil nos municípios.
Para inscrição das famílias no programa, definiram-se três critérios básicos de elegibilidade:
i) ter todos os filhos, em idade de sete a quatorze anos completos, matriculados em escola
pública; ii) residir no município há no mínimo três anos consecutivos; iii) ter renda familiar
mensal que não ultrapasse, por pessoa, a metade do valor do salário mínimo.
A pessoa
requerente deve ser, com absoluta prioridade, a mãe (o pai ou o responsável legal só
poderá ser o requerente por incapacidade ou ausência da mãe).
A bolsa é concedida para vigorar por 24 meses, podendo ser prorrogada e permanecer
enquanto
houver
dependente
na
faixa até 14 anos completos cursando o ensino
fundamental. Após dois anos, as famílias são recadastradas, sendo excluídas as que não
contam mais com crianças nesta faixa, ou que se mudaram para um município não
8
abrangido
pelo
programa
ou
que
tenham
tido
"substancial
melhoria"
de
condições
8
socioeconômicas .
O valor do benefício foi estabelecido em R$ 70,00 por família, mantendo-se inalterado entre
os anos 2000 e 2001 (primeiro semestre). O valor é fixo, isto é, independe tanto de
variações da renda familiar (total ou per capita) quanto do número de dependentes na faixa
etária de sete a 14 anos. Não há, portanto, diferenciação no valor da bolsa para famílias
com um ou quatro filhos, por exemplo, o que é visto como um reforço ao caráter familiar da
bolsa - e reproduz a concepção presente na maioria dos programas municipais até então
implantados.
A contrapartida essencial, por parte das famílias, reside na garantia de frequência escolar
mínima de 90% para todos os dependentes na faixa etária abrangida pelo programa.
Alcance e cobertura
A implantação do Bolsa-Escola na região do Jequitinhonha foi concebida de modo que em etapas sucessivas - os 51 municípios viessem a ser incorporados ao programa. Um
aspecto importante do planejamento estava na idéia de que, para cada município, a
totalidade da demanda potencial fosse atendida. Deste modo, a expansão do programa
significaria necessariamente sua ampliação em novos municípios, e não no interior
daqueles que já tinham a bolsa-escola implantada - pois ali a demanda já estaria
plenamente coberta9.
A estimativa considerou a inscrição de 90% das famílias com filhos entre 7 e 14 anos 10: isto
significaria 24.934 inscritos, de um total calculado em 27.791 famílias. No entanto, o
número de inscrições foi superior não apenas à previsão, como à estimativa do total de
famílias com filhos entre sete e 14 anos no conjunto os municípios abrangidos pelo
programa, chegando a 30.923 inscritos.
A oferta de bolsas atingiu portanto - até maio de 2001 - 16.318 famílias (e 42.271 crianças),
correspondendo a 52,8% da demanda manifesta no cadastramento - para o conjunto dos
30 municípios até então participantes do programa.
Pode-se inferir que o número de cadastrados corresponde à avassaladora maioria dos
matriculados na rede pública estadual e municipal naqueles municípios: somente os que
8
Resolução nº 124 de 03 de setembro de 1999 - SEE/MG. Se o filho mais novo completar 15 anos, o
benefício e o controle de frequência são mantidos até o final do ano letivo em curso.
9
A tabela de implantação previa - para cada etapa - a inserção de novos municípios, vindo a totalizar
45.379 famílias, exatamente a demanda total prevista nos cálculos iniciais do programa.
10
Por sua vez, o número de famílias foi estimado a partir dos dados sobre a população de sete a 14 anos, na
proporção de três crianças por família nesta faixa.
9
obtiveram a bolsa (isto é, em torno da metade das famílias inscritas) chegam a 43% dos
matriculados no ensino fundamental11.
Tabela 2 - Proporção entre famílias inscritas e bolsas concedidas (2000/2001)
Município
Inscrições
realizadas
Bolsas familiares
concedidas
Proporção bolsas
concedidas/famílias inscritas
ALMENARA
Almenara
Felisburgo
2.524
528
1.138
263
45,1%
49,8%
Jacinto
Jequitinhonha
913
1.470
402
724
44,0%
49,3%
Joaíma
Jordânia
1.287
761
667
375
51,8%
49,3%
Palmópolis
626
273
43,6%
Rio do Prado
Rubim
Salto da Divisa
442
805
465
200
369
207
45,2%
45,8%
44,5%
Santa Maria do Salto
374
154
41,2%
Sto Antonio do Jacinto
937
522
55,7%
ALMENARA (REGIÃO)
11.132
5.294
47,6%
568
338
59,5%
DIAMANTINA
Angelândia
Aricanduva
348
207
59,5%
Capelinha
Carbonita
Chapada do Norte
2.126
781
1.342
1.156
348
888
54,4%
44,6%
66,2%
Itamarandiba
2.147
1.037
48,3%
Leme do Prado
Minas Novas
381
2.300
200
1.824
52,5%
79,3%
Turmalina
Veredinha
1.101
453
598
178
54,3%
39,3%
11.547
6.774
58,7%
Araçuaí
2.348
1.139
48,5%
Berilo
Coronel Murta
Francisco Badaró
1.065
815
887
606
365
463
56,9%
44,8%
52,2%
Itinga
1.105
545
49,3%
585
370
63,2%
428
1.011
8.244
279
483
4.250
65,2%
47,8%
51,6%
30.923
16.318
52,8%
DIAMANTINA (REGIÃO)
TEÓFILO OTONI
Jenipapo de Minas
José Gonçalves
Virgem da Lapa
TEÓFILOOTONI(REGIÃO)
TOTAL
11
O dado constante da Tabela 3 abrange todos os matriculados no ensino fundamental público - e portanto
inclui os alunos com mais de 14 anos, idade limite para os bolsistas. Embora não esteja aqui disponível o dado
sobre a faixa etária dos matriculados no ensino fundamental, pode-se considerar que esta proporção
superararia a metade, caso fossem considerados apenas aqueles com idade inferior a 15 anos completos.
10
Não apenas pelos bolsistas efetivados, mas também pela demanda revelada,
constata-se que a oferta da bolsa-escola não se restringe a um segmento da
população local, mas a quase todos cujos filhos estão - ou deveriam estar - cursando
o ensino fundamental. Isto, além das repercussões que traz sobre a necessária
abrangência do programa, induz também à concepção de que sua implantação
naqueles
municípios
deve
assumir
características
"universalizantes".
Independentemente das distinções entre "selecionados" e "não selecionados" mencionadas a seguir, há elementos para considerar que a quase totalidade dos
matriculados
na
rede
pública
-
municipal
e
estadual
-
apresenta
o
socioeconômico do público-alvo do programa.
.
Tabela 3 - Proporção entre bolsistas e alunos matriculados na rede pública do
ensino fundamental (no primeiro ano de implantação do programa - 2000)
Município
alunos matriculados no
ensino fundamental (rede
pública)
alunos
bolsistas
Proporção
bolsistas/
matriculados
Almenara
8.793
2.747
31,2%
Felisburgo
1.729
714
41,3%
Jacinto
3.110
1.076
34,6%
Jequitinhonha
5.573
1.919
34,4%
Joaíma
3.916
1.885
48,1%
Jordânia
2.847
1.028
36,1%
Rubim
2.343
987
42,1%
Salto da Divisa
2.088
589
28,2%
Santa Maria do Salto
1.588
456
28,7%
Sto Antonio do Jacinto
4.366
1.431
32,8%
Carbonita
2.427
984
40,5%
Chapada do Norte
4.102
2.631
64,1%
Leme do Prado
1.318
651
49,4%
Minas Novas
8.834
5.524
62,5%
Turmalina
4.124
1.742
42,2%
Berilo
4.208
2.000
47,5%
Francisco Badaró
2.710
1.337
49,3%
Jenipapo de Minas
1.852
983
53,1%
José Gonçalves
1.589
823
51,8%
67.517
29.507
43,7%
TOTAL
perfil
11
Perfil do público incorporado ao programa
Tendo como universo as famílias inscritas no programa, pode-se observar que o
quadro
de
carecimentos
é
mais
agudo
para
o
público
selecionado,
comparativamente ao não selecionado e aos índices detectados na região como um
todo (ver Tabela 4). A taxa de analfabetismo é um dado eloquente a respeito, não
apenas por este diferencial mas pelo que permite inferir do perfil do público efetivo
do programa.
As famílias apoiadas são majoritariamente de origem rural, numa proporção de
aproximadamente dois terços do total. Com vimos, isto não é simplesmente um
reflexo das características da região, onde já há uma ligeira maioria de população
urbana - nos 30 municípios focalizados.
Não ocorreu um direcionamento mais
explícito para a população rural, como critério de prioridade. Todavia, esta foi a
tendência, uma vez que a precariedade ali é maior, em particular nas variáveis
relacionadas às condições de habitabilidade - um amplo contingente que não dispõe
de água encanada, energia elétrica e, sobretudo, instalações sanitárias. O perfil
básico da população atendida traduz-se ainda na posição ocupacional, com uma
maior concentração de famílias de produtores rurais e autônomos ou biscateiros,
destacando-se ainda a baixa proporção de assalariados, tanto entre as mães (7,2%)
quanto entre os cônjuges (9,8%). No caso das requerentes, é também bastante
elevada (40%) a proporção das que - de acordo com o formulário de inscrição - "não
trabalham", isto é não exercem atividades associadas a ganhos monetários.
Outro aspecto a destacar diz respeito a famílias mais numerosas e à maior
incidência de mulheres sem cônjuge entre os selecionados, sendo este um dos
critérios de prioridade assumidos pelo programa.
Ainda que deva ser considerada a existência de um componente não monetário na
renda real das famílias, a renda familiar situa-se em patamares de extrema pobreza
ou indigência - com uma média per capita de R$ 23,00 - ou seja, menos de oitenta
centavos ao dia.
Isto significa que - para lidar com médias - o valor da bolsa familiar corresponde a
três vezes a renda per capita ou aproximadamente metade da renda familiar considerando o padrão de famílias com seis pessoas, como é o caso. Para a maioria
dos beneficiários (correspondendo a mediana a R$ 22,00), o valor da bolsa tende a
representar a maior parcela do orçamento familiar.
12
Apesar da diferença significativa entre selecionados e não selecionados (tomados
como conjuntos) a renda per capita média é extremamente baixa em ambos os
grupos, muito aquém do referencial de meio salário mínimo por mês.
Tabela 4 - CaracterÍsticas das famílias inscritas
Item
Famílias
selecionadas
Famílias não
selecionadas
Analfabetismo
50,02%
34,27%
Moradia na zona rural
64,56%
36,03%
Familias monoparentais (mulher sem cônjuge)
29,4%
19,6%
6
5
R$23
R$41
Moradia sem energia elétrica
50,26%
84,15%
Moradia sem instalação sanitária
75,29%
37,54%
Moradia sem água encanada
47,25%
15,57%
Tamanho médio da família
Renda per capita média
3. Implementação e gestão local do programa
Esse item aborda a implementação do programa em quatro municípios da região:
Almenara, Berilo, Santo Antônio do Jacinto e Turmalina - onde foram realizados
trabalhos de campo. Em todos esses municípios o programa encontra-se implantado
desde 2000.
São aqui examinados aspectos referentes à formação e funcionamento das
instâncias de gestão local, aos procedimentos de seleção e acompanhamento dos
beneficiários, à natureza e extensão dos serviços oferecidos e ao relacionamento
entre as diversas instituições envolvidas na execução do programa.
As comissões locais
O programa é operacionalizado em cada município por uma Comissão Local (CL).
As atribuições da CL envolvem divulgação do programa, organização dos processos
de cadastramento e seleção dos beneficiários, acompanhamento dos bolsistas e
suas famílias, apuração de denúncias, gestão dos processos de desligamentos,
articulação com as escolas e com outras instituições locais.
13
As CLs são formadas via de regra por oito pessoas: dois funcionários da Secretaria.
Estadual
de
representante
Educação,
do
dois
FUNDEF,
representantes
dois
da
representantes
Prefeitura
de
Municipal,
organizações
um
não
governamentais e um representante do Conselho Municipal de Educação. Os
representantes do governo estadual são indicados pela SRE e os demais pelas
respectivas organizações ou comissões. Os representantes da prefeitura são em
geral funcionários da área de educação, sendo que na maioria dos municípios
visitados o secretário municipal de educação integrava a comissão. A coordenação
da CL (titular e suplência) é
assumida pelos representantes da Secretaria Estadual
de Educação. Nos municípios abrangidos pela SRE de Diamantina, a coordenadora
titular exercia esta função em regime de dedicação exclusiva. Nos outros casos,
essa tarefa é conciliada com outras atividades profissionais. Para os outros
membros da CL, a participação nessa instância significa em geral uma sobrecarga
de trabalho, uma vez que ela não está associada a uma redução proporcional do
seu tempo de trabalho em outras atividades. Esse fator é visto como causa de
frequentes desligamentos de pessoas e de uma rotatividade relativamente alta na
composição das CLs.
A capacitação dos membros das CLs é realizada anteriormente à implantação dos
programas nos municípios, através de seminários organizados pela Secretaria
Executiva, com duração de dois dias, reunindo grupos de municípios próximos.
Participam desses seminários os coordenadores (titular e suplente) e, em alguns
casos, outros membros das comissões locais. O conteúdo da capacitação está
centrado
no
conhecimento
do
programa
(objetivos,
instrumentos
legais,
operacionalização) e em geral não envolve a transmissão de outros conteúdos e
técnicas (nas áreas de formação de lideranças, organização comunitária, geração de
renda, etc) que, na visão de integrantes das CLs, poderiam ser de grande utilidade
na gestão do programa.
Cadastramento e Seleção
As inscrições para a participação no programa são precedidas de ampla divulgação
(nas escolas e através do rádio, panfletos, faixas e cartazes em locais públicos, etc).
Apesar da orientação inicial de que as inscrições deveriam ser feitas de forma
descentralizada, em todos os municípios visitados elas ocorreram em um local único,
no distrito-sede.
14
Para se inscrever no programa, as mães devem comparecer ao local determinado,
portando
documento
de
identidade,
comprovante
de
residência,
certidão
de
nascimento e atestado de matrícula escolar dos filhos de sete a 14 anos. Os
requerentes que não possuem os documentos necessários são encaminhados aos
serviços de documentaç ão ou às escolas, caso algum dos filhos não esteja
matriculado.
Durante o processo de cadastramento, os requerentes devem responder às
questões constantes do formulário de inscrição. Os formulários são preenchidos
pelos cadastradores, em geral funcionários públicos municipais, que recebem uma
capacitação específica para esta função.
O formulário utilizado baseia-se em um instrumento similar ao desenvolvido pelo
programa bolsa-escola do Distrito Federal. Além de dados básicos de identificação,
o formulário contém um conjunto de itens relativos à situação socioeconômica dos
requerentes e de suas famílias: composição familiar, renda, escolaridade, situação
profissional, condições de moradia, etc. De acordo com as respostas dadas a essas
questões, cada família recebe um total de pontos, que expressa o seu nível de
carecimentos.
A adoção desse sistema de pontuação atende a uma dupla finalidade: i) oferecer um
indicador mais completo e confiável da real situação socioeconômica das famílias; ii)
estabelecer um parâmetro objetivo para a seleção das famílias mais vulneráveis,
entre aquelas que preenchem os critérios para inserção no programa.
A veracidade das informações prestadas pelos requerentes foi parcialmente checada
através de visitas domiciliares realizadas pelas CLs junto a uma amostra de 10% a
15% dos inscritos 12. Além disso, foram colocadas caixas de coletas em locais
públicos, através das quais qualquer pessoa pode denunciar casos de famílias que
tenham sido indevidamente contempladas com o benefício.
Em geral, existe a percepção de que o processo de cadastramento nos municípios
visitados ocorreu de forma organizada e de acordo com as normas estabelecidas
pela coordenação do programa. Não obstante, a opinião praticamente unânime dos
entrevistados foi a de que um número expressivo de famílias que atendiam aos
critérios básicos (algumas delas em situação de grande carência) não foi
incorporada ao programa.
12
No caso dos municípios onde houve trabalho de campo, essas visitas não foram realizadas apenas
em Santo Antônio do Jacinto, devido a limitações operacionais. Deve-se notar contudo que esse
procedimento não foi adotado pelos municípios incorporados ao programa em 2001.
15
Isso se deve em primeiro lugar ao fato de o número de inscritos ter superado em
torno de 100% o número de bolsas concedidas. Considerando que, na grande
maioria dos casos, os inscritos atendiam às condições básicas de enquadramento
no programa, isso significa que cerca de metade dos beneficiários potenciais não
pôde ser incorporada, devido à limitação do número de bolsas disponíveis.
Além disso, de acordo com depoimentos de membros das CLs e de beneficiários do
programa, as famílias selecionadas nem sempre foram as que apresentavam maior
grau de carecimentos, devido principalmente a três fatores:
•
Erros nos dados contidos nos formulários de inscrição, devido a informações
incorretas
dos
requerentes
(em
parte
conscientemente
e
em
parte
por
incompreensão de algumas questões) e a falhas de preenchimento dos
cadastradores.
•
Deficiências do sistema de pontuação utilizado, em virtude principalmente da sua
não adaptação às condições socioeconômicas locais. Entre os pontos críticos
detectados
no
sistema,
destacam -se
o
tratamento
concedido a famílias que residem em imóveis alugados
13
amplamente
favorável
(que normalmente não
constituem o segmento mais pobre) e a excessiva diferença de pontuação entre
os “desempregados” e aqueles que “não trabalham” (desconsiderando que a
condição de não trabalho representa em geral uma situação estrutural de
desemprego).
•
Pouca transparência e baixa capacidade de intervenção das comissões locais no
processo de seleção. Com exceção do caso de Almenara, sede de uma SRE, as
demais comissões não dispuseram de tempo suficiente para a revisão dos
formulários, que eram encaminhados no mesmo dia para as cidades-sedes das
SREs. Além disso, as SREs não disponibilizam posteriormente para as CLs
cópias dos formulários de inscrição, limitando-se a informar a situação do inscrito
(selecionado ou não) e, no caso dos não selecionados, o motivo da sua não
inclusão (não atendimento a determinado requisito ou, mais frequentemente,
pontuação insuficiente). Estes procedimentos não só reduzem a possibilidade de
detecção e correção de erros nos formulários de inscrição, como dificultam que o
13
As famílias que moram em imóveis alugados, além de receberem 100 pontos a mais do que as que
moram em imóvel próprios ou cedidos, não estão sujeitas à pontuação negativa, caso o imóvel
possua energia elétrica, água encanada, instalação sanitária, etc. Isso significa que duas famílias que
residam em imóveis em idênticas condições poderão ter uma diferença de até 200 pontos, caso um
dos imóveis seja alugado e o outro próprio ou cedido. Esta diferença corresponde a quatro vezes o
adicional de pontos atribuídos aos grupos prioritários de atendimento (famílias com crianças
subnutridas ou sob medida de proteção especial, portadores de necessidades especiais, etc)
16
mecanismo de revisão da seleção, previsto no regulamento do programa, seja
utilizado de forma eficaz.
Mesmo reconhecendo a existência de erros e injustiças no processo de seleção, a
opinião predominante é que o programa vem obtendo êxito na sua focalização nos
setores mais carentes da população-alvo. Como antes apontado, os dados sobre o
perfil socioeconômico dos inscritos indicam que, para quase todas as variáveis
consideradas, os selecionados encontram-se em uma situação menos favorável que
os não selecionados.
Em
muitos
casos,
contudo, as diferenças entre os indicadores relativos a
selecionados e não selecionados é pouco expressiva, indicando que ambos situam se
no
mesmo
patamar
socioeconômico,
o
que
dificulta
extremamente
o
estabelecimento de uma clara linha divisória entre os dois grupos. Neste sentido, a
possibilidade de erros de focalização dificilmente será superada enquanto se
mantiver a defasagem entre o contingente de beneficiários potenciais e o número de
bolsas disponíveis.
Pagamento, controle e acompanhamento
O pagamento dos benefícios ocorre em dias predeterminados, na sede local dos
correios. Contudo, pelo menos em dois municípios visitados, ocorrem atrasos
frequentes, embora de poucos dias (menos de uma semana em geral). Além desse
problema, que afeta o conjunto dos beneficiários, foram registrados casos individuais
de famílias indevidamente excluídas da lista de pagamento em um determinado
mês. Nesses casos, o pagamento é feito retroativamente no mês seguinte.
O controle da frequência escolar das crianças bolsistas é realizado pelos diretores
de escola e enviado diretamente às SREs. A norma de justificação de faltas através
de atestado médico tem sido muitas vezes flexibilizada, devido às dificuldades de
obtenção deste atestado (especialmente para famílias residentes na área rural).
O acompanhamento das famílias é feito através de reuniões organizadas pelas CLs,
voltadas para a sensibilização e esclarecimento em relação aos objetivos do
programa e para a identificação e tentativa de resolução de dificuldades. Em alguns
municípios, essas reuniões acontecem mensalmente, no dia do pagamento dos
benefícios.
Em
outros,
ocorrem
sem
periodicidade
definida,
associadas
ao
tratamento de alguma questão socioeducativa. Neste último caso, é frequente que
as reuniões contem também com a participação de não beneficiários do programa.
17
A assistência familiar individual ocorre quando os filhos de uma família apresentam
um número excessivo de faltas à escola ou quando é identificada outra situação
problemática envolvendo crianças e adolescentes. Dependendo da natureza do
problema identificado, busca-se acionar o Conselho Tutelar (nos municípios em que
este já está formado), o serviço de assistência social do município ou, nos casos que
envolvam violência ou coação grave contra crianças ou adolescentes, a polícia.
Parcerias
O estabelecimento de uma cooperação efetiva com as prefeituras é uma condição
essencial para a operacionalização satisfatória do programa. A contribuição da
prefeitura envolve, entre outros fatores, a disponibilização de recursos humanos
(integrantes das CLs e pessoas de apoio) e materiais (comunicação, transporte),
além da vinculação do programa com os serviços públicos do município (inclusive a
rede de escolas municipais).
Em três dos municípios visitados (Almenara, Berilo e Santo Antônio do Jacinto), o
relacionamento com as administrações municipais enfrentou dificuldades durante o
primeiro ano de funcionamento do programa. Estas dificuldades deveram-se em
alguns casos à existência de divergências políticas entre os integrantes das SREs e
as prefeituras (acirradas pela proximidade das eleições municipais) e, em outros, à
pouca importância atribuída ao programa pelos governo municipal. Em geral, avaliase que essas dificuldades têm sido superadas no decorrer do presente ano (seja em
virtude de mudanças nas administrações municipais ou da superação do momento
eleitoral), possibilitando uma melhoria das condições operacionais do programa e a
dinamização das comissões locais.
Além dos governos municipais, outros parceiros importantes têm sido as escolas
(cuja atuação será adiante descrita), as rádios locais (que contribuem na divulgação
do programa e nas campanhas educativas desenvolvidas junto às famílias e à
sociedade local) e as organizações não governamentais (associações, sindicatos,
entidades de proteção e apoio a crianças e adolescentes, etc). A contribuição das
ONGs envolve a participação nas CLs, apoio ao trabalho de esclarecimento e
sensibilização junto às comunidades locais e, em alguns casos, a incorporação dos
participantes do programa em seus serviços.
18
Atividades e Serviços Complementares
No seu estágio atual, o programa não dispõe de uma oferta de serviços e atividades
complementares para os beneficiários articulada pela coordenação estadual. Desta
forma, a existência desses serviços e atividades depende de iniciativas locais, que
podem contar (ou não) com apoio da esfera estadual.
Nos quatro municípios visitados, a principal atividade complementar consistia nos
cursos de alfabetização de mães e pais dos alunos bolsistas. Embora os cursos não
sejam oferecidos exclusivamente às famílias beneficiárias do programa, esse grupo
tem sido priorizado na divulgação e nas inscrições.
Os cursos são organizados pelas secretarias municipais de educação, com apoio
das comissões locais e da rede estadual de escolas. Os instrutores são professores
da rede pública que, na sua maioria, não foram capacitados para a alfabetização de
adultos. Essa limitação deverá ser superada, através de um convênio firmado entre
a Secretaria Estadual de Educação e a Fundação Banco do Brasil, que prevê a
capacitação de instrutores e a elaboração de material didático para a alfabetização
de adultos.
Outras atividades e serviços complementares (em particular na área de geração de
trabalho e renda) encontram-se ainda em estágio embrionário. Algumas prefeituras
vêm
buscando
articular
a
realização
de
cursos
profissionalizantes
junto
à
SETASCAD, às entidades do Sistema S e à EMATER. A prefeitura de Turmalina
pretende investir com recursos próprios na construção de um “Banco do Povo”
municipal. No campo da sociedade civil, a ARAI (Associação Rural de Assistência à
Infância), entidade não governamental que participa da CL de Berilo e atua em
diversos municípios da região, tem buscado gerar alternativas de trabalho e renda
para famílias pobres, através de projetos produtivos comunitários.
De uma forma geral, contudo, essas iniciativas carecem de alternativas técnicas e
financeiras adequadas. Considerando as condições sociais e econômicas locais,
parece pouco provável que essas limitações possam ser superadas sem o apoio de
ações extra-regionais.
Seja como for, a ausência de uma oferta de serviços voltada para a inserção
econômica das famílias beneficiadas constitui um dos principais pontos críticos do
programa, representando uma ameaça potencial à perenidade e sustentabilidade de
suas ações.
19
Aspectos Educacionais
Os alunos bolsistas encontram-se distribuídos nas redes de ensino público estadual
e municipal. Os diretores e professores de ambas as redes, ouvidos durante a visita
de campo, manifestaram uma opinião favorável ao programa. Os principais aspectos
positivos destacados referem-se ao aumento da frequência dos alunos bolsistas e
ao estreitamento dos vínculos com as famílias, expresso na maior participação dos
pais nas reuniões promovidas pelas escolas.
Apesar de a maioria dos municípios não dispor de dados recentes sobre a evasão
escolar14, predomina a opinião de que sua tendência tem sido declinante, em função
do programa. No tocante ao aproveitamento e rendimento escolar dos bolsistas, a
percepção geral é de que não houve alterações significativas a partir da concessão
da bolsa. Existe contudo a expectativa de que a continuidade da bolsa por um
período maior de tempo, aliada a outras ações educacionais e sociais, venha a
produzir uma melhoria no desempenho escolar dos alunos beneficiados.
Embora com uma postura favorável ao programa, a maioria dos educadores
entrevistados considera que o atingimento de suas metas educacionais demanda
que a concessão da bolsa-escola seja acompanhada de investimentos no sistema
educacional, voltados tanto para a melhoria da qualidade do ensino quanto
para a
ampliação dos serviços oferecidos pelas escolas.
Em
relação
aos
aspectos
pedagógicos,
a
principal
reivindicação
reside
na
contratação de “professores recuperadores”, que realizariam atividades de reforço
escolar para alunos com maiores dificuldades de aprendizagem. Embora essa
atividade não esteja voltada unicamente para os alunos bolsistas, a necessidade
desse grupo tende a ser maior, não só porque sua situação social e sua trajetória
anterior influenciam negativamente seu aproveitamento escolar, como também em
virtude da impossibilidade de que esses alunos contem com apoio educacional por
parte dos pais (que, na sua esmagadora maioria, possuem baixíssimo nível de
escolaridade).
Outro ponto, salientado pelos diretores da rede escolar estadual, refere-se à
necessidade de um maior suporte pedagógico por parte da Secretaria Estadual de
Educação e das SREs. Entre outros aspectos, esse suporte deveria envolver a
14
No caso do único município a dispor desses dados (Turmalina) a taxa de eva são escolar no ensino
fundamental manteve-se praticamente constante no primeiro ano de funcionamento do programa
(2,8% em 2000 contra 2,6% em 1999). De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, isso se
deve ao fato de a evasão escolar no município concentrar-se na faixa etária de 15 anos ou mais, que
não é contemplada pelo programa.
20
transmissão de técnicas pedagógicas e a disponibilização de materiais didáticos
adequados para a realização de atividades de aceleração escolar15, capazes de
reduzir a defasagem idade-série.
No tocante a outros serviços, foi enfatizada a necessidade de que as escolas
contem com o recurso permanente de profissionais (psicólogos, fonoaudiólogos, etc)
capazes de identificar e ajudar a superar problemas de natureza física, psíquica ou
sociofamiliar, que estejam influenciando negativamente o aproveitamento escolar. A
disponibilização de recursos para a criação de espaços de lazer nas escolas (como
quadras esportivas), que favoreçam a socialização dos alunos e tornem mais atrativo
o convívio escolar, é outro ponto mencionado pelos educadores entrevistados.
Um último aspecto, em relação aos efeitos educacionais do programa, refere-se à
possibilidade de continuidade da formação escolar, após o término do benefício. Em
relação a esse aspecto, dois pontos críticos podem ser identificados: o primeiro
relaciona-se à defasagem idade-série dos alunos bolsistas, de modo que a grande
maioria ultrapassa a idade limite de cobertura do programa sem haver concluído o
ensino fundamental.
O segundo ponto crítico refere-se às dificuldades de acesso ao ensino médio, devido
à limitação de vagas nas redes escolares dos municípios, os custos diretos maiores
e a situação de carência material, que induzem uma inserção precoce dos
adolescentes no mercado de trabalho.
Dessa forma, pode-se afirmar que a continuidade da formação escolar das crianças
beneficiadas (requisito essencial para uma futura inserção mais qualificada no
mercado de trabalho) irá demandar a criação de incentivos para a permanência na
escola após o término da bolsa16, bem como a melhoria das condições de acesso ao
ensino médio (e superior) e o desenvolvimento de alternativas de iniciação e
formação profissional, compatíveis com o prosseguimento da formação educacional.
15
Na visão dos diretores de escola entrevistados, a falta dessas técnicas e materiais levou a que
atividades de aceleração escolar realizadas anteriormente não obtivessem resultados satisfatórios.
16
Uma alternativa nesse sentido seria a adoção da “poupança-escola”, instrumento criado pelo
programa bolsa-escola do Distrito Federal, que oferecia um incentivo financeiro (no valor de um
salário mínimo por série concluída) para que as crianças prosseguissem a sua formação escolar até a
conclusão do ensino médio.
21
4. Elementos de síntese
1. Programa Bolsa Familiar de Educação, em Minas Gerais, representa uma
importante contribuição no contexto das iniciativas de bolsa-escola e, mais
amplamente, das políticas sociais no país. Em primeiro lugar, pelo seu alcance e
por
concentrar-se
em
uma
região
com
características
socioeconômicas
particularmente desfavoráveis, que dizem respeito não a uma parcela mas à
quase totalidade da população ali residente (o que o diferencia da maioria dos
programas municipais de bolsa-escola em andamento no Brasil). Em segundo
lugar, pelo que representa de esforço de articulação e parceria entre esferas de
governo (no caso o governo estadual e dezenas de governos municipais) e as
representações da sociedade, de forma combinada com uma ênfase em critérios
técnicos e nos aspectos de equidade e cidadania. Constata-se que sua
implementação vem permitindo ultrapassar condicionamentos político-partidários
e a cultura de apadrinhamento que historicamente incide sobre programas
sociais em regiões com maior pobreza, como o Jequitinhonha.
2. As características sociais da região trazem implicações diretas sobre as
necessidades de alcance e cobertura do programa. Como fator indicativo,
salienta-se que o número atual de participantes representa aproximadamente a
metade dos inscritos. Considerando que na quase totalidade os inscritos
atendem às condições básicas de enquadramento, isso significa que o programa
incorpora apenas metade de seu público potencial.
O programa vem obtendo êxito em focalizar o segmento mais crítico da
população-alvo. Não obstante, nos municípios visitados, foram identificadas
falhas no processo de seleção, deixando de serem incluídas algumas famílias em
situação de maior fragilidade do que outras selecionadas. Em parte, isso pode
ser atribuído a deficiências do processo de seleção (falhas no preenchimento dos
cadastros e inadequação de alguns itens do sistema de pontuação). Por outro
lado, e mais essencialmente, o fato de a maioria dos inscritos situar-se no
mesmo patamar socioeconômico dificulta consideravelmente a implementação de
critérios objetivos de seleção.
Nesse sentido, mesmo com o aperfeiçoamento dos mecanismos de seleção, a
possibilidade de erros de focalização continuará existindo, enquanto não for
reduzida a discrepância entre os contingentes de beneficiários potenciais e
22
efetivos. A redução dessa defasagem nos municípios onde o programa já está
em funcionamento deveria ser prioritária em relação à expansão para outros
municípios.
3. Como uma primeira e mais imediata dimensão a ser mencionada - quanto aos
efeitos do programa, atesta-se que o benefício monetário concedido através da
bolsa exerce um impacto significativo na receita familiar, na maioria dos casos
correspondendo a mais da metade do orçamento doméstico. Como vem sendo
evidenciado, há uma reconhecida melhoria do consumo familiar em função da
bolsa, principalmente em itens essenciais como alimentação e vestuário básico,
traduzindo-se também em investimentos nas moradias (camas, armários, filtros,
etc).
A entrada em cena de novos "clientes" - para estes bens de consumo - gera
efeitos dinamizadores sobre o comércio local. A legitimidade do programa
favorece ainda que a bolsa funcione como um instrumento de acesso ao crédito dada a regularidade do benefício. Tais processos indicam que a bolsa-escola se
constitui como fator estimulador das atividades nos municípios, simplesmente a
partir do adicional de recursos injetados e postos em circulação.
4. Sem desconsiderar os aspectos imediatos associados ao consumo familiar e à
circulação da renda nos municípios, o principal efeito do programa relaciona-se à
questão educacional. De um ponto de vista estratégico, o investimento na
formação de capital humano, através do incentivo à escolarização de crianças de
famílias de baixa renda, constitui o elemento central dos programas de bolsaescola.
O pleno alcance das metas educacionais desses programas exige que a
concessão da bolsa esteja articulada com investimentos na melhoria do sistema
educacional. No caso examinado, é essencial que sejam supridos os déficits
existentes na rede escolar (em relação a recursos humanos, materiais e
pedagógicos) para que o aumento da frequência, motivado pelo programa,
traduza-se também em melhoria do aproveitamento escolar e em integração mais
efetiva dos alunos e suas famílias com as escolas.
5. Um aspecto relevante - a ser considerado no desenho do programa - diz respeito
à defasagem idade-série: uma ampla parcela do público atendido tende a não
completar o ensino fundamental na faixa até 14 anos completos. Trata-se de uma
característica
não
restrita
à
região
aqui
focalizada,
como
vem
sendo
23
continuamente apontado pelas pesquisas nacionais por amostragem domiciliar
(PNADs/IBGE): a parcela majoritária dos jovens entre 15 e 17 anos não chegou a
concluir o ensino fundamental - mesmo no caso daqueles que continuam a
estudar e não trabalham17.
Nesse sentido, é fundamental o esforço de assegurar aos alunos bolsistas a
conclusão do ensino fundamental, seja através da hipótese de ampliação da
faixa etária para a manutenção da bolsa ou de outras iniciativas que estimulem
mais diretamente o rendimento escolar - inibindo a evasão, mais acentuada a
partir dos 14 anos. Entre outros pontos, estas iniciativas devem envolver a
aceleração escolar para alunos com maior defasagem idade-série, a ampliação
das vagas para o ensino médio na região e a criação de incentivos (como a
“poupança-escola”)
para
que
os
bolsistas
- além
de
concluir
o
ensino
fundamental - prossigam a sua formação escolar após o término do benefício.
6. Outro aspecto a ser salientado, na análise do programa em tela, diz respeito à
sua dimensão política ou, mais precisamente, ao seu significado do ponto de
vista da cultura política. Em que pesem as richas e clivagens típicas dos
municípios da região, que não deixaram de se evidenciar na trajetória do
programa, verifica-se que este, em grande medida, é pouco permeável às
práticas clientelistas e ao apadrinhamento político. Isto contribuiu para que a
bolsa-escola
-
reconhecimento
na
experiência
do
Vale
do
Jequitinhonha
-
adquirisse
e credibilidade nos locais onde vem sendo posta em prática: a
despeito de dificuldades identificadas em alguns casos (particularmente no
primeiro ano de implantação), o programa tende a ser visto como pouco sujeito a
manipulações pessoais, partidárias ou eleitorais.
7. Isto não significa que a gestão do programa - em seus aspectos estritamente
técnicos - ocorra nas melhores condições possíveis, ou que não haja problemas
nesta área. No seu formato atual, o programa não dispõe de uma estrutura
profissional para sua operacionalização nos municípios. Operando em regime de
semi-voluntariado, as comissões locais carecem muitas vezes dos recursos
humanos, técnicos e financeiros necessários a uma gestão eficiente do
programa, em particular no desenvolvimento de ações de integração social e
econômica das famílias apoiadas. Neste sentido, um dos desafios do programa é
a revisão e aperfeiçoamento dos mecanismos de gestão local.
17
Ver, a propósito, Amaral,C.; Silveira,C e Campineiro,D. Trabalho Infantil - Examinando o problema,
avaliando as estratégias de erradicação. Rio de Janeiro, Napp/Unicef, 2000.
24
Essa revisão deveria envolver, em primeiro lugar, a redefinição do papel das
comissões locais, que passariam a exercer principalmente funções diretivas
(em
relação às linhas gerais do programa em cada município) e de sensibilização e
mobilização das comunidades locais. As tarefas cotidianas de gestão do
programa seriam progressivamente assumidas por núcleos técnicos locais, de
caráter profissionalizado, a serem custeados por cada município.
Outro aspecto relevante é a elaboração e implementação de um programa de
capacitação para os integrantes das comissões locais e dos núcleos técnicos,
enfocando temas como desenvolvimento comunitário, planejamento e gestão
participativa de projetos e instrumentos de geração de trabalho e renda
(microcrédito, capacitação de empreendedores, formação profissional).
Para apoiar as instâncias locais, poderia ser constituído um fundo (com recursos
do governo estadual e de outras fontes, como agências internacionais e
fundações empresariais) que viabilizasse o acesso a suportes externos (como
consultorias nas áreas de planejamento, gestão e avaliação) e o financiamento
de atividades e serviços complementares ao programa, nas áreas social e
educacional.
8. Entre as ações complementares ou conexas, uma das principais lacunas do
programa, no seu estágio atual, está na ausência de oferta de serviços voltados
para a inserção econômica sustentável das famílias apoiadas. As iniciativas de
geração de trabalho e renda existentes, geralmente em fase de gestação,
carecem de planejamento sistemático, alternativas de financiamento adequadas
e conhecimentos técnicos especializados.
A existência dessa lacuna representa um sério obstáculo aos objetivos do
programa, não só quanto aos impactos sociais, como também quanto às metas
educacionais - uma vez que, com o término das bolsas e sem melhoria da
situação econômica das famílias, muitas crianças terão dificuldades em continuar
os estudos.
Por outro lado, considerando que o universo dos participantes (efetivos e
potenciais) abrange a ampla maioria da população, é evidente que a questão da
inserção econômica e social das famílias apoiadas não poderá ser resolvida
exclusivamente no âmbito do programa.
Isto significa que, em regiões marcadas por grandes déficits econômicos e
sociais, como é o caso do Jequitinhonha, programas socioeducacionais como a
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bolsa-escola só adquirem um sentido mais profundo, do ponto de vista da sua
eficácia e sustentabilidade, à medida que estejam articulados a iniciativas mais
amplas de promoção do desenvolvimento local.
9. Sem perder de vista a centralidade da questão educacional - e dos benefícios da
escolarização para o futuro das crianças que participam do programa - o
incremento da integração intersetorial das ações em âmbito local passa a ser
uma questão decisiva sob a ótica das famílias e comunidades envolvidas. Como
vem sendo evidenciado em múltiplas experiências, tal
integração não é fruto
apenas da articulação entre secretarias ou órgãos de governo, mas supõe uma
participação mais direta das comunidades, ampliando esferas de expressão de
demandas e de formulação e gestão das políticas públicas. Ou seja, o
investimento nas famílias inclui mas ultrapassa a conjugação de serviços e
instrumentos de apoio, requerendo um investimento na formação de capacidades
e na constituição dos "beneficiários" em atores e sujeitos de um processo que é em essência - de transformação de suas próprias formas de vida e inserção
social.
É importante que o programa alimente e seja retro-alimentado pela geração de
ambientes locais que possibilitem um papel mais ativo por parte das famílias e
comunidades. O sentido do programa não é portanto perpetuar uma clientela,
mas se constituir efetivamente como estratégia - ou elemento de estratégia - que
tendo como eixo a potencialização do capital humano e social existentes em
cada localidade, possa atuar transformadoramente sobre o quadro de probreza e
iniquidade.
10. A implementação do programa Bolsa-Escola em Minas Gerais, como outras
iniciativas
precursoras
ou
desencadeadas
mais
recentemente,
representa
nitidamente um avanço - em termos de política social, em termos de acesso a
direitos. Embora não deixe de ter um componente "assistencial" ou, mais
precisamente, de proteção social, trata-se substancialmente de uma ação de
promoção, uma ação de enfrentamento das desigualdades através da educação.
A experiência em foco permite considerar que o desenho e a gestão do programa
mexem, no sentido democrático, com padrões ainda dominantes de atuação do
estado e relação entre estado e sociedade: o programa efetivamente vem
propiciando o exercício de procedimentos participativos na gestão de políticas
sociais. E, de fato, o público que participa do programa necessita do programa,
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como urgência e principalmente como perspectiva de futuro. É fundamental ainda - salientar: o aspecto distributivo das políticas de bolsa-escola está menos
na transferência de renda monetária e mais no investimento educacional, como
fator de redução de desigualdades.
A combinação desses componentes significa distribuição e democratização de
possibilidades, mais do que inclusão. O programa de bolsa-escola implementado
na região do Jequitinhonha caminha claramente neste rumo, sem prejuízo das
lacunas, dificuldades e incitações aqui expressas.
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Fontes de Informação
Referências Bibliográficas
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Panorama Atual e Perspectivas”, revista Interface nº1. Rio de Janeiro:
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Gestão e Financiamento. NAPP/UNICEF. Rio de Janeiro, 1997.
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o problema, avaliando as estratégias de erradicação. Rio de Janeiro: NAPP/UNICEF,
2000.
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Programa de Renda Mínima de Campinas. São Paulo: IEE/PUC-SP, 1996.
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Potencialidades. São Paulo: Pólis, 1998.
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Federal. Texto para Discussão nº 582. Rio de Janeiro: IPEA., 1998.
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Implementação de Políticas Sociais. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.
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Educação. Belo Horizonte: SEE/MG, 1999.
UNICEF/NAPP. Oficina de Trabalho Incremento da Renda e Políticas Públicas Documento Síntese. Brasília: UNICEF/NAPP, 1996.
Contatos
Reunião com a Secretaria Executiva do Programa Bolsa-Escola e com o Secretário
de Educação de Minas Gerais.
Reuniões com a Superintendente Regional de Almenara e com as Comissões Locais
dos municípios de Almenara, Berilo, Santo Antonio de Jacinto e Turmalina.
Reunião com um grupo de mães inscritas no programa (selecionadas e não
selecionadas) no município de Berilo.
Entrevistas domiciliares com famílias beneficiadas nos municípios de Almenara,
Santo Antonio do Jacinto e Turmalina.
Visitas às escolas e entrevistas com professores e diretores em Almenara e Berilo.
Reunião com diretores de escola da rede estadual em Turmalina.
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O Programa Bolsa-Escola em Minas Gerais