20 de Março de 1923 Querido diário, O meu pai morreu na guerra deixando a mulher e os filhos. Desde então que a vida cá em casa não tem sido a mesma. A minha mãe assumiu o controlo e passou a ser a chefe de família, Os meus irmãos, João e José, passaram a ajudar em algumas tarefas, o que não lhes agradou muito. Quanto a mim, passei a frequentar a escola e, agora, uso roupas mais desportivas e leves. Cortei, também, o cabelo “à la garçonne” como muitas raparigas. O desagrado da minha avó perante estas mudanças é, significativamente, grande. A minha avó é daquelas senhoras que ainda acha que as meninas, como eu, devem ficar em casa a aprender a lida da casa. Tanto a minha mãe como a minha tia pertencem a um grupo que luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. Um dia, também gostaria de fazer parte de um grupo desses. Bem, vou dormir pois amanhã tenho escola. Diana… 23 de Março de 1923 Querido diário, Hoje foi um dia super cansativo. Durante a manhã estive na escola e à tarde, fui para a ginástica. Juntei-me à ginástica, juntamente com quatro raparigas. A nossa treinadora diz que quer mais pessoas na modalidade. Por acaso, aquilo é bastante divertido e diferente de tudo o que já experimentei. Na nossa terra, existem mais três modalidades para além da ginástica, o futebol, o boxe e o atletismo. O João anda no futebol e o Zé anda no boxe. A minha avó, mais uma vez, achou mal eu entrar para a ginástica, mas não percebo o mal, a ginástica até é mais para meninas. Vá-se lá perceber a mente da senhora. Tenho de ir fazer os trabalhos de casa, senão levo um raspanete da professora. Adeus, Diana… 24 de Março de 1923 Querido diário, Para hoje tenho planeado uma ida ao cinema com os meus irmãos, durante a manhã, e depois, mais à tarde, iremos ao café-concerto ouvir Jazz. O filme que vamos ver é um dos mais recentes, é o do Charlie Chaplin. Havia em exposição também um filme de desenhos animados, de Walt Disney. À tarde, vamos assistir a uma bande de Jazz tocar ao vivo. Eu gostaria mesmo era de ouvir o Louis Armstrong, mas não é possível. No tempo do meu avô materno, as pessoas iam à ópera e ao teatro. O meu avô disse-me que prefere Jazz ao teatro e à ópera. No outro dia, estive dançar Foxtrot com o meu outro avô e devo dizer que é bastante difícil. Fiquei surpreendida como é que o meu avô dançou aquilo, era demasiado rápido. Tenho de ir. Diana… 26 de Março de 1923 Querido diário, Ontem, estive a ler umas revistas e encontrei lá uns vestidos bem jeitosos. A moda agora é muito melhor que a do tempo da minha mãe, para não falar do tempo da minha avó. Agora, uso o soutien em vez do espartilho, que sinceramente magoava um pouco. As saias subiram e agora deixam à mostra um pouco da perna até ao joelho. Os vestidos são mais leves e deixam à mostra uma parte das costas e das pernas até ao joelho. A maioria das mulheres na minha família, à excepção das mais idosas, já aderiu à nova moda. Também, eu comecei a usar maquilhagem, a mais leve. Nos lábios, coloco um batom cor-de-rosa, nos olhos, ponho uma sombra clara e é só. Hora de ir embora. Adeus, Diana… 27 de Março de 1923 Querido diário, Já lá vai uma semana desde que comecei a escrever este diário e devo dizer que já estou um bocado farta disto. A escola tem sido uma porcaria. Uns rapazes estão sempre a picar-me e a chatear-me por ser rapariga e ser inferior. Que bebés! Hoje estou mesmo chateada. O dia tem-me corrido mesmo mal. Vou estudar um bocado. Diana… 29 de Março de 1923 Querido diário, Estou muito doente. Tenho febre alta e pintas vermelhas na cara. Não tenho ido à escola e não tenho saído muito de casa. A minha mãe já me levou ao médico, mas ele não sabe o que eu tenho ao certo. Espero que não seja nada. Não consigo escrever mais. Diana…