RPCV (2011) 106 (577-580) 39-42 R E V I S TA P O R T U G U E S A DE CIÊNCIAS VETERINÁRIAS Influência da idade materna e número do parto no desempenho de cavalos puro sangue Inglês criados em Bagé-RS Influence of the maternal age and number of labors in the performance of Thoroughbred horses raised in Bagé, southern Brazil Fabiane P. S. Garcia1, Hero Alfaya2, Luciana A. Lins3*, Janaína R. Velho4, Carlos E. W. Nogueira4 1 Médica Veterinária Autônoma Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel-UFPel 3 Universidade da Região da Camapanha - Campus Bagé 4 Faculdade de Veterinária-UFPel 2 Resumo: Este trabalho teve como objetivo determinar a influência da idade materna e número do parto no desempenho atlético de potros PSI criados em Bagé-RS. Foram avaliados 514 cavalos PSI, de três diferentes haras ou coudelarias, que participaram de corridas nos principais hipódromos brasileiros. Os animais foram divididos em dois grupos: vencedores e não vencedores. Foi considerada a data de nascimento, sexo, desempenho em pista, idade materna e número do parto. A maior freqüência de produtos ganhadores (86,7%) foi de potros nascidos de éguas entre 5 e 12 anos de idade. A percentagem de vencedores produzidos por éguas a partir dos 12 anos foi significativamente menor. Os produtos nascidos do primeiro ao sexto parto apresentaram maior número de vitórias do que os demais. A menor frequencia de vitórias esteve nos potros nascidos entre o nono e décimo segundo parto. O maior número de vencedores foi produzido por éguas no quarto, seguido do primeiro e segundo partos consecutivamente, observando-se um número considerável de ganhadores nascidos de éguas primíparas. Os animais vencedores foram maiores e mais pesados ao nascimento, permanecendo desta forma até os 18 meses. Estes dados demonstram que o número de partos e idade da égua estão associados ao desempenho do potro em pista. Palavras-chave: Equinos, Desempenho, Gestação, Puro Sangue Inglês Summary: The aim of this work was to determine the influence of maternal age and number of pregnancies in the performance of Thoroughbred foals raised in Bagé city, Brazil. The number of foals evaluated was 514 Thoroughbred horses, from three different stud farms that participated in race competitions in the Brazilian racetracks. The animals were separated in two groups: winners and not winners. Birth date, gender, performance, maternal age and number of labor were considered. The higher frequency of winners (86.7%) was found in foals born from mares between 5 and 12 years old. The percentage of winners born from mares older than 12 years was significantly lower. The foals born between the first and sixth labor showed higher number of victories. The lower frequency of victories was found *Correspondência: [email protected] Tel: +(55) 53 92416101 in the foals born between the ninth and twelfth labor. The large number of winners was produced by mares on the fourth, followed by the first and second labors consecutively, with a considerable number of winners born from primiparous mares. Winner foals were larger and heavier at birth, maintaining this trend until the eighteenth month. This data shows that the number of pregnancies and the maternal age are associated with the performance of Thoroughbred foals. Keywords: Equine, performance, pregnancy, Thoroughbred Introdução No processo de seleção de um cavalo de corrida, os fatores considerados fundamentais são a genealogia, a conformação e o desempenho em pistas. O desempenho de um Puro Sangue Inglês (PSI) é estimado pela participação em corridas específicas de produtos com dois a três anos de idade e principalmente pelo lugar de chegada nestas carreiras (Mansilla et al., 1999). O potencial genético para a performance do cavalo de corrida é expresso por um conjunto de genes atribuídos aos progenitores. Entretanto considera-se que a reprodutora contribui com 5 a 10% a mais, no que se refere ao crescimento fetal, devido a influências não genéticas, como tamanho e nutrição intra-uterina durante a gestação e habilidade materna (Hintz et al., 1979; Barron, 1995; Rossdale, 2004). Outras características maternas tais como idade ao parto e número de gestações anteriores, têm sido avaliadas no crescimento e no desempenho dos atletas equinos (Harris, 2008). Finocchio (1985) observou em cavalos PSI ganhadores das principais corridas realizadas nos EUA, evidências em que, a idade materna, o número do parto e o desempenho em corridas estão altamente relacionados. No entanto, em outro estudo analisando dados de nascimento de cava39 Garcia F.P.S. et al. RPCV (2011) 106 (577-580) 39-42 los PSI que participaram de corridas nos hipódromos Brasileiros, entre 1995 a 1998, Brito (2000) concluiu que a idade da reprodutora não estava associada ao desempenho desportivo de seus produtos. As éguas com menos de 7 e mais de 11 anos de idade tendem a produzir potros menores e mais leves (Finocchio et al., 1985). O peso aos 510 dias de idade está altamente relacionado com o peso ao nascimento e os potros com menor peso ao nascimento demonstram performance insatisfatória em pistas de corrida (Hintz et al., 1979). Porém, o processo de envelhecimento da mãe não parece ser o único responsável por menor peso corporal ao nascimento, o número de gestações é mais prejudicial ao desenvolvimento fetal do que a idade materna, devido à diminuição da área de superfície coriônica (Finocchio e Rosenzweig, 1995), assim como, a mudanças degenerativas no útero, degeneração glandular, estase linfática, entre outros (Rossdale, 2004). Este trabalho tem como objetivo determinar a influência da idade materna e número do parto no desempenho atlético futuro de potros Puro Sangue Inglês, até os 18 meses de idade, criados em Bagé-RS. Material e métodos Foi realizado um levantamento utilizando dados de 514 cavalos PSI que participaram de corridas nos principais hipódromos Brasileiros (Gávea-RJ, Cidade Jardim-SP, Cristal-RS e Tarumã-PR). Estes animais nasceram e foram criados em três haras ou coudelarias localizadas no município de Bagé-RS, sendo a criação, mancio alimentar e sanitário semelhantes entre as propriedades. Os potros foram desmamados aos 6 meses de idade e separados em lotes de machos e fêmeas, permanecendo nas coudelarias até aproximadamente aos 18 meses, quando vão para centros de treino e começam a competir em corridas oficiais aos 3 anos de idade. Os animais foram divididos em dois grupos de acordo com o desempenho em pista, sendo classificados os potros em vencedores e não vencedores. As informações sobre os animais, tais como, data de nascimento, sexo, desempenho em pista, idade materna e número do parto, foram compilados dos arquivos das coudelarias de origem e da Associação Brasileira dos Criadores de Cavalos de Corridas e distribuídos em tabelas para análise. Foram realizadas análises conjuntas das variações atribuídas aos efeitos principais de desempenho, sexo do animal, idade materna e ordem de nascimento, utilizando teste Qui-quadrado. Como variável dependente foi utilizado o animal ser ganhador de lugar especial (1) ou não ganhador (0) e como variáveis independentes foram utilizados sexo do animal, idade da reprodutora ao parto e número do parto em que o animal nasceu. Foi utilizado o programa estatístico SAS (1985) utilizando o nível de significância 0,05. Resultados e discussão A maior frequência de produtos ganhadores de corridas de grupo, ocorreu em potros que nasceram de éguas com 9 anos de idade, sendo que dos 5 aos 12 anos as éguas produziram um maior número de animais vencedores, acumulando 86,7% dos animais com vitória em provas de grupo (Tabela 1). Estes dados foram semelhantes aos apresentados por Finocchio e Rosenzweig (1995), onde a maior incidência foi em éguas entre 6 e 10 anos. Avaliando a idade materna no desempenho de cavalos PSI que participaram de provas clássicas no Chile, no período de 1985 e 1994, Coloma et al. (1999) notaram que éguas com idade entre 7 e 10 anos ao parto obtiveram produtos com vitórias. A percentagem de vencedores produzidos por éguas a partir dos 12 anos foi significativamente menor. Estudos sugerem que o processo de envelhecimento tem um efeito deletério no crescimento e desenvolvimento fetal (Finocchio, 1985; Ricketts e Alonso, 1991; Kenney, 1993), o que permite afirmar que animais filhos de mães jovens têm maior possibilidade de êxito que os filhos de mães mais velhas. Conforme descrito por Rossdale (2004), um ambiente uterino desfavorável, com comprometimento da circulação materno-fetal, pode impor limites no desempenho atlético futuro do animal. Os produtos nascidos do primeiro ao sexto partos apresentaram maior número de vitórias do que os animais nascidos nos demais partos. A menor freqüência de vitórias esteve nos potros nascidos entre o nono e décimo segundo partos (Figura 1). Estes dados demonstram que o número de partos está associado ao desempenho em pista. O maior número de vencedores foi produzido por éguas no 4º, seguido do 1º e 2º partos consecutivamente, observando- Tabela 1 - Frequência de potros vencedores comparando com a faixa etária da mãe. Faixa etária da mãe anos 5-8 9 - 12 13 - 17 Total 40 Nº de Animais 19 20 6 45 Percentagem de Vitórias (%) Individual 42.2 44.5 13.3 100 Cumulativa 42.2 86.7 100 100 Número de animais ganhadores Garcia F.P.S. et al. RPCV (2011) 106 (577-580) 39-42 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Número do parto Figura 1 - Número de animais ganhadores relacionado com o número do parto na égua Bibliografia Barron JK (1995). The effect of maternal age and parity on the racing of Thoroughbred horses. Equine Veterinary Journal, 27(1), 73-75. Bracher V, Gerstenberg C, Mathias S, Allen WR (1997). Influence of age and parity on the equine endometrium. Pferdeheilkunde, 13(5), 549. Brito E (2000). Análise de características parentais e do produto no desempenho esportivo de cavalos Puro Sangue de Corrida. Dissertação (Mestrado), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre-RS. Coloma I, Mansilla A, Muñoz B (1999). 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A diminuição das chances de vitória de produtos nascidos do sexto parto em diante pode ser explicada por uma diminuição do aporte nutricional ao feto durante as gestações continuadas, causada por um aumento do grau de endometrose e alterações vasculares ou alterações placentárias determinando uma diminuição do peso do potro ao nascimento, como descrito por Bracher (1997) e Rossdale (2004). Um fator importante pode ser o que comentou Finocchio (1985), afirmando que alguns criadores não utilizam garanhões comprovados e com cobrições de valor maior em éguas mais velhas, com presumível número elevado de partos, para não correr o risco de perder dinheiro, com isso diminuindo a possibilidade de produção de animais de melhor qualidade. Observou-se também que os machos tiveram um desempenho desportivo superior às fêmeas, porém a diferença não foi significativa, semelhante ao trabalho de Coloma et al. (1999). Os resultados observados por Hintz et al. (1979), Ojala et al. (1987), Mota et al. (1996) e Brito (2000) afirmam que os machos apresentam maior número de vitórias comuns do que as fêmeas, determinando uma associação do sexo ao desempenho. O peso médio corporal dos potros ao nascer foi 51 kg, não havendo diferença significativa entre os grupos. No entanto existe uma diferença a partir do segundo até o décimo oitavo mês, mostrando que os animais que tiveram melhores resultados em pista apresentaram maior peso corporal praticamente durante todo o período (Figura 2). Na figura 3, observa-se que no primeiro mês os potros que tiveram melhores resultados em pista já mostravam um desenvolvimento superior aos não ganhadores, caracterizado por uma maior altura. Esta diferença permaneceu até o final dos dezoito meses. Os animais vencedores foram maiores e mais pesados ao nascimento e essas diferenças, mesmo não sendo estatisticamente significativas (p<0,05), continuaram até os 18 meses. Corroborando com Hintz et al. (1979) que relataram que os potros mais leves ao nascer tiveram menor peso final e, em pista, os animais menores apresentaram desempenho inferior aos animais mais pesados. Estes resultados demonstram que a idade e o número de partos da égua influencia no desempenho do potro em pista. 250 200 150 1,3 1,2 1,1 100 1 50 0,9 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 1 2 3 4 5 6 Idade (meses) ganhadores 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Idade (meses) não ganhadores Figura 2 - Peso médio corporal (kg) de animais ganhadores e não ganhadores ganhadores não ganhadores Figura 3 - Altura média (m) de animais ganhadores e não ganhadores 41 Garcia F.P.S. et al. Finocchio EJ (1985). Race performance and its relationship to birth rank and maternal age. Proccedings of the American Association Equine Practitioners, 31, 571-579. Finocchio EJ e Rosenzweig M (1995). Significance of birth rank, maternal age, and parity on race performance in thoroughbreds. 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