MUDANÇAS E CONFLITOS NO MERCADO DE TRABALHO NA REGIÃO CACAUEIRA DA BAHIA Henrique Tomé da Costa Mata1 Miguel Vergara2 RESUMO: A analise que se apresenta procura debater a lógica do desenvolvimento local a partir de algumas reflexões sobre os aspectos socioculturais e econômicos do mercado de trabalho no corredor Ilhéus-Itabuna, por ser o pólo de desenvolvimento econômico e de absorção de trabalho para as populações rurais da região cacaueira. Estes aspectos dizem respeito aos conflitos e mudanças nas políticas de empregos que afetam a identidade rural e o bem-estar regional. A metodologia usada para o desenvolvimento e analise do trabalho consistem de depoimentos junto aos agricultores e trabalhadores rurais, os quais foram interpretados na perspectiva da mudança de emprego. Além disso, alguns indicadores sócio-econômicos da região fizeram parte da analise tendo em vista as restrições de uso do estoque da força de trabalho, à luz de uma abordagem teórica do tipo de teoria dos ativos fixos. A lógica de desenvolvimento local passa pela adoção de políticas que visem a implementação de atividades produtivas diversificada que permitam explorar as potencialidades da força de trabalho regional. Palavras-chaves: Mercado de trabalho, desemprego, desenvolvimento regional. 1. INTRODUÇÃO Muitos trabalhadores rurais deixam suas casas em busca de emprego em cidades próximas, a migração rural no Brasil tem se tornado preocupante na medida em que o emprego vai além da sobrevivência do individuo e retrata a condição de miséria de várias regiões no país como se observa da realidade regional do corredor Ilhéus - Itabuna. No século XX, sem dúvida as cidades urbanas (metropolis) foram o grande pólo de atração de populações rurais em áreas pobres, especialmente no Nordeste. Os meios de comunicação de massa, como a televisão estimulou população rural a migrarem para os centros urbanos. Isso criou uma ilusão de que na cidade tudo seria melhor e existem oportunidades para todos. Como aqueles que migram são considerados deserdados e excluídos, diz-se que o êxodo rural representa uma transferência da pobreza do campo para as cidades. Hoje, na década dos transgênicos, a economia brasileira vem se caracterizando por um processo de reestruturação produtiva, aliado à diminuição do crescimento econômico, implicando na baixa capacidade de geração de novos postos de trabalho. O desemprego crescente que tem sido observado neste período, decorrente desse processo de reestruturação, merece por parte dos economistas e sociólogos, entre outros cientistas sociais, uma atenção que evidencie a gravidade social do problema. Na região do cacau, por um lado, se desafia a promessa do retorno de empregos massivos nas fazendas de cacau “clonado” ou novos plantios para outras culturas no âmbito do agro-negócio. No entanto, esse conjunto de mudanças gera conflitos que precisam ser avaliados e administrados 1 Do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Santa Cruz; e-mail: [email protected] Do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC; e-mail: [email protected] 2 de forma a garantir o ambiente sócio-econômico favorável como garantia ao desenvolvimento regional. Para tanto, a analise reflexiva que se segue aponta na direção de reflexões e sugere uma abordagem crítico sobre os indicadores subjetivos e quantitativos da renda e da força de trabalho agrícola ante novos empreendimentos produtivos na região. Como estrutura geral do trabalho, apresenta-se num primeiro momento, o objetivo geral e específico. Em seguida são delineados de forma resumida os aspectos metodológicos para posteriormente se desenvolver reflexões críticas sobre mudanças e conflitos no mercado de trabalho rural na região de Ilhéus- Itabuna 2. OBJETIVOS Em termos gerais a proposta de analise busca refletir e discutir sobre a lógica do desenvolvimento regional a partir do mercado de trabalho e seus conflitos levando em conta o comportamento de variáveis sócio-culturais e econômicas. A partir daí, estabelece-se uma comparação das implicações teóricas e restrições da força de trabalho como ativo produtivo no desenvolvimento de atividades rurais. Nesse sentido pode-se observar o comportamento da dinâmica de mudanças e os conflitos culturais em torno da força de trabalho rural e da comunidade em geral. 3. CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS Quanto aos aspectos metodológicos usados, o trabalho, visa privilegiar os depoimentos orais de agricultores e trabalhadores rurais por considerar-lhes atores sociais diretamente envolvidos na analise da conjuntura econômica e social no novo cenário de emprego regional. Por outro lado, com base na teoria dos ativos fixos e entendendo o fator trabalho também como um ativo produtivo problematiza-se a dinâmica de mercado de trabalho na região e apresenta-se e discutese sobre alguns indicadores sócio-econômicos disponíveis. 4. DESENVOLVIMENTO E ANÁLISE 4.1. Significado de uma produção cacaueira “sem agricultores” A pesquisa sobre agricultura familiar tem nos mostrado, no decorrer do processo histórico capitalista, que os dilemas agrícolas estão sujeitos às dimensões sócio-culturais significativas (WOLF,1976). Nesse sentido, a mentalidade do agricultor tem sido desafiada ou prejudicada no processo de transformação econômica. Essas mudanças exigem não só novas formas de conhecimento voltado para a produção, mas interfere também na reestruturação e organização social, bem como na superação de uma crise de identidade. A crise se estabelece entre “ser o que não se quer ser”, desencadeando processo de negociação sobre as condições de existência de sujeitos, tanto da sobrevivência, quanto da continuidade das relações sociais (WOLF,1976). A polêmica vivenciada pelos habitantes da Cidade do Cacau no Sul da Bahia foi provocada pelas constantes “crises da cultura agrícola cacaueira”, de insistência no cultivo de cacau, que se reflete, sobretudo, na manutenção dos modos de vidas da comunidade. Pese a que, cidades como Ilhéus e Itabuna tenham o potencial de um lugar histórico fundado no período colonial brasileiro 1 e suficientemente competente para ser pensada como grande cenário para o turismo cultural. Ou, mesmo assim, a riqueza natural do lugar poderia ser orientada para um tipo de atividade turística de preservação ambiental. A questão da identidade rural que se ocupa do espaço conflitante no processo de definição da cidade e dos lugares, para novos empreendimentos que levem a desconsertos tanto aos visitantes, estes, turistas, quanto à população que busca a sobrevivência neste espaço. No caso de turistas e visitantes, estes se preocupam com as condições de ofertas de bens e serviços a preços razoáveis e, sobretudo, com bom atendimento (PELLEGRINI, 1993). Porém não existe aptidão da população local para atendê-los, como força da própria estrutura cultural local, que sempre esteve atrelada à produção de cacau. Já no caso dos habitantes locais existe a urgência de qualificação para essas demandas de atendimentos turísticos. Com isso, a identidade turística é problematizada ante um processo de desenvolvimento local muito difuso. Porquê? A identidade da população rural, aquela que migrara para o perímetro urbano, nos levanta a reflexão sobre os impactos das iniciativas turísticas atuais e as referencias de formas tradicionais de viver e ser do lugar (BANDUCCI JÚNIOR, 2001). Essas contradições e dilemas incidem na mentalidade dos moradores e no modus operandi da produção, mesmo em se tratando de esquemas produtivos alternativos. Desorganizam toda a atividade econômica local? As respostas para essas indagações serão obtidas à medida que se levantarem o problema da ruralidade como um espaço de inserção onde se pode desenvolver o turismo cultural e local. Assim, o que de fato se pretende é assinalar algumas considerações que contribuam para uma melhor percepção dos problemas locais e regionais. Em primeiro lugar é fundamental destacar que a população de outrora cacaueira da região tem tradição cultural acumulada para trabalhar e dominar tarefas agrícolas nas fazendas, desenvolver as atividades extrativistas pesqueiras, porém, já há algum tempo, ante o processo de mudança de trabalho e das características desse mercado, começam a deslocar-se para as mais diversas ocupações, destacando-se o turismo. Não se pode sustentar que atividade do turismo, no caso de Ilhéus, apareça meramente como negócio econômico alternativo, na busca de meios financeiros concretos num mercado de trabalho precário e ausente nas fazendas, no passado, ambiente estável de emprego regional. Porém, esta realidade regional repercute-se na mentalidade da monocultura remanescente e no discurso para a construção da identidade turística regional, no que, tentando modificar as atitudes e consciências de ser na nova forma de prestação de serviços turísticos básicos, confunde e mascara as pretensões de mudança e construção de uma imagem de região com atributos naturais ao desenvolvimento do turismo. Essa configuração nova de produtos e serviços, querendo ou não se apóiam no emblema rural do fruto “cacau” que passa a ser usado como um bem cultural de propaganda associado a um potencial para o lazer e cultura que se pode ofertar na Costa do Cacau. Como se pode observar, o fruto, posto simbolicamente, desloca-se da fazenda para o ambiente do litoral, nas praias, pousadas, áreas de lazer, hotéis, talvez com a visão de que a região volte a ganhar prestígio e outorgue sustentabilidade do negócio. Apesar do fruto doente pela vassoura-de-bruxa estar sempre presente no artesanato e outros semi-industrializados. 2 No entanto, o sentimento e a percepção dos residentes sobre as imagens projetadas na região, particularmente na cidade de Ilhéus, no que toca ao turismo não constituem, em certa medida, uma mudança significativa na tentativa de assimilar um novo conteúdo de cultura local baseado no serviço de praias, ou seja, “trocar o trabalho dos frutos” que dava o sustento da família pelo “atendimento aos turistas” com domínio e competência para presta-lo de forma esporádica. Por isso, o novo negócio proposto pela identidade turística demanda a compreensão dos traços distintivos de resistências das comunidades ante o discurso da prestação de um bom serviço turístico. Ou seja, entender como realmente aquilo que pode estimular a mentalidade cultural da população residente para uma identidade de cidade que tenha o turismo como um novo modo de vida. Sem dúvida, é nesse sentido que os depoimentos das pessoas e os entendidos que convivem nessa atividade cotidiana são relevantes, sobretudo, quando os micro-empresários do turismo na região procuram alterar a mentalidade cultural para superar os danos no desenvolvimento dos negócios. A crença de que a fazenda dá grandes lucros e acúmulo de capital já foi influência determinante na mentalidade dos residentes locais, pese a que as vivências e lembranças da impotência do fruto após as crises desestruturaram a vida regional como mostra o seguinte relato histórico da revista IR :. Fundada em 1935, Ilhéus foi sede de uma das mais prósperas capitanias hereditárias do período colonial, com os engenhos de cana-de-açúcar. Em 1881, foi elevada a categoria de cidade. Ficou conhecida no início do século como maior centro produtor de cacau do mundo. O apogeu desse ciclo se deu nos anos 20-30, período de grande fausto que deixou suas marcas profundas na cultura local. Na década de 70, a crise começou a abalar a economia regional, que até então girava exclusivamente em torno da monocultura cacaueira (1997, p. 07). De outra parte, o turista começou a ter um olhar da cidade do cacau a partir da produção impressa das obras de Jorge Amado que talvez seja considerada o retrato distintivo dessa identidade turística que a cidade pretende dar. É incluso o próprio trabalho do literato que passou a se constituir como outro produto turístico no qual o visitante busca conhecer já que as estórias acontecem nesta região. Como destaca o depoimento de FAHEL ( IR:,1997: p.15) Jorge Amado, o mais famoso ficcionista brasileiro, (...) é inegavelmente, o grande épico da literatura sobre a Bahia, particularmente, sobre as terras do cacau. ............................................................................................................. Suas obras que contam primordialmente a história da conquista da terra, a posse e formação de uma civilização – em Terras do Sem Fim e São Jorge dos Ilhéus – abundam em elementos de caráter grandioso: as personagens são fortes, dispostas a morrer, a matar por seus objetivos. A cultura do cacau pese outros períodos históricos de Ilhéus, mesmo encarnada na crise existencial, reúne elementos emblemáticos na coesão coletiva dos moradores da região. Por sua vez estimulam uma polêmica para aceitar a mudança na economia, pois se duvida que esse 3 negócio consiga unir os esforços para recriar a fazenda triste, desolada às novas ocupações e perspectivas. Alguns acham que esses novos caminhos, ao invés de unir, dividem e desagregam, pois existem resistências na aceitação da perda da fazenda, ou, talvez, que o medo ou o temor que estejam nas outras formas de trabalho venham desestruturar as relações familiares que ainda se sustentam por estarem atreladas à posse da terra. Por essa razão, o clima de apreensão e incertezas levou a que muitos herdeiros do cacau procurassem novos caminhos fora da cacauicultura, sem deixar esperanças de retorno à exploração da cultura. Como se mostra no depoimento seguinte: Tomando prejuízo com o cacau e também com outras culturas alternativas que implantou em suas terras, como o cravo-da-índia ele [o fazendeiro Francisco Lima] passou a exercer a atividade comercial, sendo distribuidor de bebidas. (IR 1996: p. 08). No entanto, as resistências no plano cultural podem ser provocadas pelas circunstâncias de sobrevivências que instigam mudanças no comportamento e na mentalidade das pessoas, mas não necessariamente seja uma transformação determinante, pois muitas vezes enganam os interesses culturais dos povos como assinala o seguinte relato: Nesse clima cresce a polêmica (...). Uns acham que sim, que a região deve encontrar novas alternativas para substituir a monocultura cacaueira. (...) Já outros resistem e investem tudo no combate à praga, acreditando que os ‘frutos de ouro’ nunca vão acabar, e a crise será, mais uma vez, superada. ............................................................................................................. Mudou o padrão de vida dos ilheenses- e grapiúnas em geral.. A diversificação (...) é a palavra de ordem na região. Se as gerações passadas ignoram essa orientação, confiantes na eternização da abundância do cacau, seus descendentes se vêem forçados a dar esse passo para salvar a própria pele. (IR, 1997., p. 07) Não é por acaso que este sentimento de resistência e de dúvidas por parte dos donos das fazendas seja um traço distintivo que deve ser contemplado para a dificuldade que este pode ter para empreender algum negócio na atividade turística. Por outro lado, o fato que a identidade turística apresenta como alternativa natural para desenvolver Ilhéus recai na terra, na natureza, no mito agrícola da fertilidade como é veiculada a imagem desta cidade no seguinte depoimento: [As belezas inusitadas da cidade e de seus arredores] tem como finalidade atrair turistas que venham a desfrutar suas praias “paradisíacas”, sem falar dos números de belos rios, lagoas e cachoeiras que estão por toda a parte, isso tudo cercado de extensos coqueirais na orla e de uma impressionante vegetação nativa, remanescente da Mata Atlântica, no interior. (IR:1997, p. 15). Finalmente, não basta insistir somente na acolhida para o “turista” já que o morador de Ilhéus constrói seu cotidiano no litoral, aproveitando para vender alguns bens culturais esporadicamente 4 na alta estação e precariamente na baixa estação. É importante responder se este cenário é feito para expulsar o turista, ou para desatendê-lo ou servi-lo ao modo da região. O dilema agrícola na identidade turística da região não deve ser um entrave desta atividade econômica. Entretanto, o modelo de identidade turística a ser construído deve ter como enfoque de crescimento as reais condições de desenvolvimento da população para atuar no potencial geográfico do território. É necessária a compreensão sobre as alternativas integradoras e novas formas de viver e ser das atividades econômicas. 4.2. Restrições na dinâmica de mercado de trabalho regional Um dos pressupostos básicos para a análise do desenvolvimento regional estabelece a observação e o diagnóstico da estrutura de mercado de trabalho predominante na região. A estrutura de mercado de trabalho reflete a forma e os diferentes arranjos produtivos vigentes, pois a dinâmica de produção resulta de diferentes relações de interdependência institucionais no âmbito das relações de trabalho e a própria estrutura de produção. Partindo deste pressuposto, pode-se antes analisar as bases da estrutura produtiva dominante no corredor de Ilhéus-Itabuna, como marcadamente recalcada no sistema de produção dominado pela monocultura cacaueira e, como tal, representativa de grande parte do processo de absorção da força de trabalho regional. Isso quer dizer que, tendo a região como principal atividade econômica baseada na monocultura, grande parte de seu estoque da força de trabalho deve ser levada a uma especialização forçada ao modus de produção predominante. Desse modo, essa configuração estrutural de mão-de-obra deve ser analisada e interpretada como um dos importantes mecanismos para a mudança socialmente desejável na trajetória de novas alternativas econômicas de desenvolvimento regional, uma vez que o sucesso de qualquer esforço produtivo novo em termos de ganhos de produtividade estaria dependente da disponibilidade do estoque de capital humano existente na região, especialmente no que se refere às suas especificações de habilidade, qualidade e especialização adaptáveis às diferentes segmentos do mercado de trabalho. Logo, os novos arranjos produtivos regionais para se tornarem alternativas econômicas sustentáveis em termos de geração de renda e emprego dependem da forma como os instrumentos de gestão de recursos humanos são administrados e implementados no sentido de uma nova dinâmica na alocação da força de trabalho. 4.2.1. A concepção da força de trabalho como um ativo fixo Os fundamentos da teoria de ativo fixo foram desenvolvidos por Johnson (1972; 1982) para explicar as limitações econômicas da produção agrícola, entre outras, em atividades fortemente marcadas por ativos de grande especificidade. A análise desenvolvida por Glen Johnson é baseada num tipo especial de fator de produção, qual seja, o fator capital no seu verdadeiro sentido econômico. O fator capital assim entendido é considerado um importante ativo produtivo, no que pode ter complementaridade ou substitutibilidade, tal como o fator trabalho, outro importante recurso produtivo, que deve ser tratado como um ativo no sentido das abordagens da teoria de ativo fixo desenvolvido por Glen Johnson. 5 Assim, pode-se afirmar que a estrutura de mercado de trabalho vigente na região dominada pela monocultura de cacau é caracterizada por uma baixa mobilidade, em termos de novas demandas de mão-de-obra decorrentes das exigências de desenvolvimento regional baseadas em novos arranjos produtivos alternativos, a exemplo das atividades de turismo, ecoturismo, agroturismo e outras pequenas atividades industriais e de serviços eminentes. A especialidade e a especificidade da mão-de-obra regional conferiram ao mercado de trabalho características muito restritivas em termos dos custos de totais de mão-de-obra para novas empresas e para a própria estrutura de demanda de mão-de-obra, neste último caso, considerado em termos das produtividades relativas do estoque do fator trabalho. As implicações inerentes a esta baixa mobilidade do fator trabalho conferem e justificam em si, a tendência de queda nos níveis de remuneração salarial na região e, portanto, a geração de um cenário caracterizado pela existência de um ciclo vicioso e deteriorante em termos da capacidade de subsistência das populações, principalmente de sua parte historicamente atrelada à produção agrícola ou mesmo pecuária. O tratamento da mão-de-obra regional como um ativo de grande fixidez à atividade de produção cacaueira permite assim discernir sobre os custos sociais para a implementação de programas econômicos e sociais de desenvolvimento regional, uma vez que fica sinalizada a necessidade de dotar os recursos humanos de capacidade e mobilidade que permita ao mercado de trabalho maior dinâmica no processo de sua alocação entre diferentes segmentos produtivos nascentes. Estas constatações teóricas podem ser demonstradas com base num modelo simples de dois setores como se apresenta na Figura 1. Como ilustra a Figura 1, no eixo vertical esquerdo, representa o comportamento da produtividade do fator trabalho no setor agrícola e no eixo das ordenadas à direita, representa o comportamento da produtividade do setor de turismo na mesma região. Em ambos os casos tratam-se da demanda de mão-de-obra, já que a hipótese é de que os agentes produtivos devam considerar os níveis de produtividade do fator trabalho no processo de contratação, levando em conta os salários a serem pagos. Setor Turismo P Setor Agrícola P b Salár a Salár N1 N0 Figura 1 – Modelo de dois setores para análise da dinâmica do mercado de trabalho. Se assumirmos que existe um nível mínimo de salários praticados no mercado de trabalho da região, nestes dois setores produtivos, por simplicidade analítica pode-se observar a distribuição do número total de trabalhadores em cada setor de acordo com as respectivas medidas de produtividade. 6 Como se pode observar na Figura 1, para os níveis da produtividade em cada setor e a cada nível de salários, o emprego no setor de turismo é dado pela dimensão da reta horizontal a partir do centro de origem da direita até o ponto N0, uma vez que o equilíbrio entre os dois mercados de trabalho ocorre no ponto (a). Da mesma forma, o tamanho de emprego no setor agrícola é dado pela distância entre o centro de origem da coordenadas a esquerda até o nível N0, mostrando que no equilíbrio inicial no ponto (a) existem mais pessoas empregadas no setor de turismo que no setor agrícola. A distância total do segmento de reta horizontal (abcissa para os dois eixos coordenados) representa o estoque total da força de trabalho empregado nos dois setores. Entretanto, na hipótese de que ocorra uma maior dinâmica dos investimentos em capital no setor de turismo, como tem sido demonstrada pelas tendências nas políticas públicas de adoção e construção de mecanismos e arranjos produtivos alternativos para o incremento da renda e emprego, é de se esperar movimentos de ganhos de produtividade no setor de turismo, pois a produtividade de capital também força ganhos de produtividade no emprego de mão-de-obra. Este efeito força a elevação dos salários no mercado de trabalho, uma vez que a demanda de trabalho no setor de turismo será agora caracterizada por um tipo de qualidade e habilidades consistentes com as novas condições produtivas decorrentes da intensificação do uso de capital. Diante deste cenário, levanta-se a seguinte questão, como as necessidade de emprego com determinadas especificações de qualidade e habilidades podem ser supridas, tendo em contra que partimos da hipótese de uma elevada especificidade e especialização da mão-de-obra regional em atividades de produção agrícola, nomeadamente concentrada nas atividades cacaueiras. O problema da falta de mobilidade da mão-de-obra no mercado de trabalho configura-se de extrema importância para a análise das pretensões desenvolvimentistas, no que as políticas públicas devem ser orientadas no sentido de eliminar esses gargalos do mercado de trabalho, considerados elementos básicos na definição das estratégias de desenvolvimento regional. 4.2.2. Algumas estatísticas sócio-econômicas A Figura 2 ilustra o perfil da distribuição de renda no corredor de Ilhéus e Itabuna, considerando os dados dos Municípios de Ilhéus, Itabuna e Itacaré. As informações relativas às diferentes classes de renda foram agrupadas em cinco classes básicas para efeitos desta análise. Portanto, considera-se que a classe 1 representa a renda de até um salário mínimo; a classe 2 representa a renda maior que um e menor que dois salários mínimos; a classe 3 representa a renda maior que dois e menor que cinco mínimos; a classe 4 representa a renda maior que cinco e menor que quinze; e, finalmente, a classe 5, renda superior a quinze salários mínimos. Como se vê, em médias mais de 40% das pessoas empregadas na região percebem renda mensal inferiores a um salário mínimo, fato marcante, principalmente nos municípios de ilhéus e Itacaré, considerando dados do ano de 2000 (ver Figura 3). Trata-se, portanto, de um perfil praticamente inalterável nos últimos anos, uma vez que não tem sido visível qualquer tipo de dinamismo econômico na região que estimulasse o mercado de trabalho no sentido da geração de emprego e renda. Quando se considera a renda de até dois salários, a Figura 2 mostra que o quadro social na região é bastante perturbador em termos sociais e econômicos, já que a quase totalidade dos proventos é concentrada na classe de renda dois. O perfil da distribuição parece sugerir uma maior homogeneidade no município de Itabuna. 7 Percentagem 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 ILHEUS CLASSE 1 ITABUNA CLASSE 2 CLASSE 3 ITACARE CLASSE 4 CLASSE 5 Fonte: IBGE – Itabuna, 2004. Figura 2 – Concentração percentual da população empregada por classes de renda nos municípios de Ilhéus, Itabuna e Itacaré, em 2000. 0,5 Percentagem 0,4 0,3 0,2 0,1 0 CLASSE 1 CLASSE 2 CLASSE 3 CLASSE 4 CLASSE 5 Fonte: IBGE – Itabuna, 2004. Figura 3 – Concentração percentual da população empregada por classes de renda na região representa pelos municípios de Ilhéus, Itabuna e Itacaré, em conjunto. A Figura 4 mostra que 13% da população econômica ativa na região não aufere qualquer tipo de rendimento e 87% recebem algum tipo de rendimento como já demonstrado nas distribuições apresentadas nas figuras anteriores. Entretanto, deve-se ressaltar que das pessoas com rendimento, mais de 40% delas auferem renda inferior a um salário mínimo, conforme ilustrada na figura 3. Trata-se, portanto, de um quadro social bastante alarmante, cujo dinamismo deve passar por uma adequada reestruturação do mercado de trabalho, tipo como um dos importantes componentes na alocação da força de trabalho no sentido dos deslocamentos que se evidenciam na trajetória da agricultura via comércios e serviços como novas alternativas de emprego. 8 13% 87% Pessoas com Rendimento Pessoas sem Rendimento Fonte: IBGE – Itabuna, 2004. Figura 4 – Distribuição percentual das pessoas com rendimento e sem rendimento na região nos municípios de Ilhéus, Itabuna e Itacaré. Portanto, ênfases na criação de novos empregos são particularmente importantes em comunidades rurais, especialmente em se tratando de regiões em que o declínio na ocupação das pessoas se verifique em setores historicamente importantes, como a agricultura. Estes setores são normalmente considerados de elementos centrais no processo de revitalização das economias locais (RONKOW, 2003) 5. Conclusão A política de desenvolvimento econômico deve ser orientada no sentido de estimular o crescimento de novos empregos, no que configura a importância da análise das restrições e dinâmica de mercado de trabalho numa região. Existe também o debate em termos da questão de eficiência e eficácia nas estratégias da criação de novos empregos. Normalmente, questiona-se que a adoção das políticas de desenvolvimento regional deve ocorrer de tal forma que a geração de novos empregos devam atender tipos de ocupações e habilidades locais. Entretanto, todo esforço relativo a geração de emprego, deve considerar arranjos que asseguram uma maior plasticidade e adaptabilidade do estoque de mãode-obra, no sentido de ganhos de mobilidades na medida em que novos postos de trabalho são criados em substituição às estruturas tradicionais de produção. E quanto a atividade econômica do mercado turísticos as ofertas empregos devem visar a superação da educação e qualificação na região, caso contrario, a sociedade local viverá sobre pressão num complexo processo de violência e degradação humana causado pelo processo migratório no sucesso da agricultura no passado, hoje comunidades populacionais com grandes demandas de programas socais, infra-estruturas e serviços básicos. Nesse sentido a pesquisa no âmbito ciências sociais aplicadas podem alimentar tanto o poder local para um plano estratégico de desenvolvimento não meramente litoral dispersivo e individualista como acontece na Costa do Cacau. 9 O dilema consiste em sensibilizar as demandas no sentido de explorar estrategicamente as potencialidades para a reestruturação do processo de construção da identidade turística na região, outrora importante na historia brasileira não só pela sua literatura das historias do cacau, mas pelas formas de ser da gente. A sobrevivência impõe a implementação de programas de educação em massa, combate à prostituição e violência, tudo baseado num processo de reestruturação do mercado de trabalho. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA BANDUCCI JÚNIOR, Álvaro; BARRETO, Margarita (Orgs.) Turismo e identidade local: uma visão antropológica. Campinas, SP: Papirus, 2001. (Coleção turismo). 208p. JOHNSON, G. 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