Universidade Federal do Rio de Janeiro
Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento em Ensino de
Matemática e Ciências – LIMC
NOTA TÉCNICA
04/2008
FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS
E MATEMÁTICA PARA UMA EDUCAÇÃO DE
QUALIDADE
Marta Feijó Barroso
(apresentação feita no GT-Educação da SBPC em dezembro de 2008)
Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
SBPC – GT Educação – 12 de dezembro de 2008
Formação de professores de ciências e matemática
para uma educação de qualidade
Marta Feijó Barroso
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
Instituto de Física e LIMC (Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento em Ensino de
Ciências e Matemática)
1. Introdução e apresentação
Agradeço o convite para participar da discussão junto ao Grupo de Trabalho da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, sociedade da qual sou sócia.
Considero que o envolvimento das sociedades científicas na discussão das questões
da educação em nosso país é fundamental para que possamos produzir mudanças na
situação atual.
Meu trabalho profissional, nos últimos anos, está estreitamente relacionado à
área de ensino de ciências (em particular, de física) e formação de professores.
Desenvolvo atividades de ensino de graduação na licenciatura (física, química
e matemática) e no bacharelado em física, em geral nos cursos do primeiro ano, e na
pós-graduação no Mestrado (Profissional) em Ensino de Física do Instituto de Física
da UFRJ, mestrado para professores de física em atuação na educação básica (e sem
sair da sala de aula) criado em 2008.
Minhas atividades de pesquisa estão concentradas nas áreas de pesquisa e
desenvolvimento de materiais para o ensino de ciências (com forte componente de
uso de tecnologias, como vídeos, aplicativos computacionais, hipertextos e outros), e
em avaliação educacional (como por exemplo a análise dos resultados do Pisa de
Ciências).
Desenvolvo também atividades classificadas como de extensão, associadas à
formação de professores da educação básica (programas para sistemas de ensino,
como o PROMED do MEC/SEB, o projeto da Reorientação Curricular para estado do
Rio de Janeiro / SEE, a participação na Rede Nacional de Formação de Professores,
com a produção de materiais didáticos e oferecimento de cursos de formação
continuada de professores – exemplo, o ProLetramento Matemática).
Criamos, no Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza, na UFRJ, o
Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento em Ensino de Matemática e Ciências, que
é um dos cinco centros de referência do MEC/SEB da Rede Nacional de Formação
Continuada de Docentes da Educação Básica.
Os pontos que vou abordar, de forma resumida, nesta comunicação, estão
todos baseados na experiência acumulada nos últimos (talvez) 10 anos.
Gostaria de chamar a atenção para o fato que essas atividades envolvem
professores de todos os níveis da educação (com exceção da educação infantil):
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
ensino fundamental, ensino médio, ensino superior na graduação e na pósgraduação.
E esse é o primeiro ponto que gostaria de frisar: as questões da educação no
Brasil devem ser tratadas globalmente, envolvendo todos os níveis de ensino.
O abandono das exigências de qualidade na educação básica refletem-se na
educação superior, pois (à exceção dos cursos altamente valorizados socialmente,
como os de Medicina e Direito, por exemplo) os alunos chegam às universidades mal
formados. A menor importância dada às licenciaturas reflete-se rapidamente nos
cursos superiores e no ensino médio. A valorização da educação básica em
detrimento da educação superior provocaria uma descontinuidade na formação de
profissionais (por exemplo, de ciência e tecnologia).
Não tenho a intenção de discutir, aqui, questões que chamaria de políticas:
especificamente, as questões relacionadas à partidarização das direções dos
sistemas de ensino, as relações entre os poderes do Estado e o sistema educacional,
e mesmo as questões que envolvem os salários dos professores e as condições de
trabalho nas escolas. Essas questões são importantes, fundamentais, mas não são o
meu tema.
2. O diagnóstico é conhecido
O diagnóstico relativo a questões educacionais no Brasil é conhecido: temos
problemas no processo educativo que se refletem no universo profissional.
E esse diagnóstico tem duas componentes principais, do ponto de vista do
tema que me propus a abordar. A primeira componente, que não há como
questionar, é que a situação de aprendizagem dos estudantes é ruim; indicadores
quantitativos e qualitativos o dizem com toda clareza (SAEB, do PISA, a análise de
concursos vestibulares, do ENEM, e outros).
Sobre a segunda componente, não há consenso. E a segunda componente é
que a formação de professores em todos os níveis de ensino é inadeqüada.
Antes de prosseguir na discussão sobre a formação de professores, devemos
reconhecer que o diagnóstico sobre a baixa qualidade da educação no país deve
estar associado à compreensão mais global da questão. O número de jovens no
Brasil é muito grande, e portanto a transição ocorrida nas últimas décadas, de uma
educação para poucos para a educação para todos, traz problemas de qualidade
bastante grandes. Uma avaliação da Figura 1 pode nos dar uma idéia mais clara das
dimensões do problema.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Figura 1
A evolução do total de matrículas na educação brasileira. O número de matrículas é dado
em milhares, e as curvas contínuas são ajustes (livres) dos dados disponíveis (gráfico
preparado por L.C. Guimarães para apresentação na Bienal de Matemática, nov/2008)
Evolução: total de matrículas
nos diversos níveis
Primeira a Quarta
22000
20000
18000
Matrículas (1000)
16000
14000
Fonte 1960/72 - L. A. Cunha, 1980/2006 - INEP
Quinta a Oitava
Ensino Médio
Ensino Superior
1a a 4a
5a a 8a
12000
Ensino Superior
10000
8000
6000
4000
2000
0
1960
1965
1970
1975
1980
1985
1990
1995
2000
2005
Ano
6
Deste gráfico, podemos observar que o número de matrículas nos anos iniciais
do ensino fundamental cresceu de 7,5 milhões na década de 60 para 19 milhões em
2005. Os anos finais do ensino fundamental começam a crescer muito rapidamente
nos anos 90, atingindo cerca de 15 milhões em 2005. O ensino médio crece mais
rapidamente de 4 milhões em 1990 para 9 milhões em 2005, e o ensino superior
começa a crescer mais rapidamente em 2000, passando de 2 milhões a 4,5 milhões
em 2005.
Desses dados, observa-se também que a expansão das matrículas ocorre em
etapas sucessivas, a cada nível. Hoje, a diferença de matrículas entre os anos
iniciais do ensino fundamental (19 milhões) e anos finais (15 milhões, cerca de 80%
dos anos iniciais) não é tão grande quanto já foi. As matrículas no ensino médio (9
milhões) correspondem a 60% das matrículas no ensino fundamental. E no ensino
superior (4,5 milhões), cerca de metade das matrículas do ensino médio.
Os números indicam que o desafio da expansão e universalização foi vencido
no ensino fundamental, e está a meio do caminho no ensino médio. Mas,
evidentemente, essa expansão foi acompanhada de uma queda de qualidade.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
O problema inicial, no país, foi resolvido: transitarmos de um sistema
educacional que atendia a poucos para um sistema educacional que começa a ser
para todos. Falta fazer com que a qualidade da educação para todos seja boa. Em
outras palavras, o desafio atual é responder à questão: se conseguiu-se criar no país
um sistema de ciência e tecnologia bom, isto é, se sabe-se formar a elite acadêmica
do país, saber-se-á educar todo um povo?
E esta questão está intrinsecamente relacionada à formação de professores.
Quando se fala hoje em expandir o ensino (básico, superior), a primeira pergunta a
se fazer é se temos formadores em número e qualidade para sustentar esta
expansão. E portanto a formação de professores torna-se uma questão
absolutamente crucial.
3. Professores são parte do problema, não a causa
No país, a educação brasileira passou por uma grande mudança com a
promulgação, em 1996, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei no
9394, de 20 de dezembro de 1996). Segundo esta Lei, os sistemas de ensino são
organizados em três níveis, federal, estadual e municipal, que devem funcionar em
regime de colaboração. Cito a seguir quatro trechos de artigos desta Lei que
considero especialmente relevantes para a primeira discussão (os grifos são meus).
Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão,
em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.
§ 1º Caberá à União a coordenação da política nacional de educação,
articulando os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa,
redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias educacionais.
§ 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos
desta Lei.
Art. 9º A União incumbir-se-á de:
IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino
fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos
mínimos, de modo a assegurar formação básica comum;
Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as
do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;
Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:
I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento
de ensino;
III - zelar pela aprendizagem dos alunos;
Nestes artigos, estabelece-se que currículos e conteúdos são hoje em dia
definidos em cada estabelecimento escolar, seguindo normas gerais prescritas pelos
governos federal, estadual ou municipal. E os docentes são responsáveis por “zelar
pela aprendizagem dos alunos”.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
No Estado do Rio de Janeiro, nos anos de 2005/2006, tivemos na UFRJ a
incumbência, por meio de um convênio com a SEE, de estabelecer as orientações
curriculares para a rede pública estadual (ensino médio e anos finais do ensino
fundamental). Foi elaborado um documento por professores da educação básica e
professores da UFRJ.
Este trabalho deixou muito claro que os professores da educação básica do
estado estavam sem referências para o trabalho didático diário. Os documentos
oficiais (Diretrizes Curriculares Nacionais, Parâmetros Curriculares para o Ensino
Médio e para o Ensino Fundamental, e outros) não faziam parte de suas referências
profissionais, e foi necessário quase que um trabalho de voltar às origens, de fazer
“listagem de conteúdos” a serem abordados, acoplados a propostas metodológicas e
outros. Não há uma sistematização de pesquisa a respeito deste documento, pois em
seguida (dentro do mesmo governo estadual) a secretaria de educação mudou de
titular e o documento foi arquivado. No entanto, há relatos (esparsos) de que em
algumas áreas de conhecimento o trabalho forneceu subsídios importantes.
A primeira observação então a ser feita é que a nova legislação (que agora
está completando 12 anos) junto às diretrizes curriculares (com quase 10 anos)
mudou as perspectivas de trabalho relativas a conteúdos escolares. Deixa-se de ter
currículos mínimos, listas de tópicos a serem ensinados, e passa-se a ter o
desenvolvimento de competências e habilidades, com currículos definidos dentro das
escolas.
Esta mudança, porém, não foi acompanhada por um processo de formação ou
atualização dos professores que deveriam lidar cotidianamente com ela, tornando
mais difícil aos professores esse trabalho. E, principalmente, trazendo uma certa
confusão entre conteúdos disciplinares e desenvolvimento de competências que,
exagerando um pouco, fez com que o antigo e conhecido fosse abandonado sem uma
reflexão adeqüada do que ser colocado em seu lugar.
Uma segunda constatação refere-se à prescrição da mesma LDB (Lei 9394,
1996) em relação à formação inicial e continuada dos docentes da educação básica.
A seguir, transcrevo um artigo referente ao tema.
Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á
em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação
mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro
primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na
modalidade Normal.
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão:
I - cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o
curso normal superior, destinado à formação de docentes para a educação
infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental;
II - programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de
educação superior que queiram se dedicar à educação básica;
III - programas de educação continuada para os profissionais de educação
dos diversos níveis.
A partir deste ponto, vou-me restringir à área de ciências e matemática.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Como se dá a formação dos professores de ciências e matemática?
Vamos começar com um olhar sobre a formação de professores para os anos
iniciais do ensino fundamental.
Os cursos normais superiores não estão presentes em grande escala no país.
No Rio de Janeiro, o antigo Instituto de Educação transformou-se num Instituto
Normal Superior, mas não é possível encontrar a sua grade curricular on-line.
Uma rápida avaliação das grades de grandes universidades do país,
especificamente da USP, UFRJ e PUC-RJ (escolhida por ter um grupo de pósgraduação em educação com nota 6 na CAPES) mostra o mesmo cenário para a
formação de nível superior no ensino fundamental. Os cursos de Pedagogia oferecem
conteúdos diversos, mas no máximo uma disciplina de “Metodologia do Ensino de
Ciências / Matemática” ou “Didática do Ensino de Ciências / Matemática”. Na Figura
2, apresenta-se a grade curricular do curso de Pedagogia da UFRJ, onde no 6º
período existem as disciplinas Didática do Ensino de Ciências e Didática do Ensino de
Matemática – na Figura 3, apresentamos as ementas das disciplinas que mais se
assemelham a conteúdos em ciências e matemática. Portanto, o que os alunos
formados em Pedagogia pela UFRJ conhecem a respeito de ciências e matemática é
o que eles aprenderam no ensino médio.
Figura 2 – A grade curricular da formação superior de professores de ensino fundamental na
UFRJ – Curso de Pedagogia
UFRJ – Grade Curricular (Fonte: SIGA – Sistema Integrado de Gestão Acadêmica, dez 2008)
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Figura 3 – As ementas de algumas disciplinas do curso de Pedagogia da UFRJ
Fonte: Sistema de Gestão Acadêmica (SIGA)
EDF417-Intr ao Pens Cient em Educação
Introdução ao pensamento científico. Os principais tipos de conhecimento. As posições da ciência
moderna. Evolução da Ciência.
EDF233-Bases Biologicas da Aprendizag
Estudo da filogênese e da ontogênese do sistema nervoso humano, considerando-se o processo de
aprendizagem e a gênese do conhecimento. Maturação e desenvolvimento.
EDD176-Didática das Ciên da Natureza
Disciplina escolar Ciências: aspectos históricos e epistemológicos. A constituição dos conhecimentos
científicos e escolares em ciências. A educação em ciências como área de pesquisa. Propostas
curriculares, materias e didáticos e atividades de ensino para a disciplina escolar Ciências.
Planejamento e avaliação da aprendizagem em ciências.
EDD362-Didática da Matemática
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Disciplina escolar Matemática: aspectos históricos e epistemológicos. A constituição dos
conhecimentos científicos e escolares em matemática. A educação em matemática como área de
pesquisa. Propostas curriculares, materiais didáticos e atividades de ensino para a disciplina escolar
Matemática. Planejamento e avaliação da aprendizagem em Matemática.
EDD175-Didática das Ciências Sociais
Disciplina escolar: aspectos históricos e epistemológicos. O ensino de Ciências Sociais (História,
Geografia, Sociologia e Antropologia) na educação básica como objeto de reflexão e de pesquisa. A
consturção de conceitos - basilares para a leitura e problematização da realidade social. Propostas
curriculares, materais didáticos e atividades de ensino para as disciplinas escolares inseridas no
âmbito das Ciências Sociais, Planejamento e avaliação de aprendizagem em Ciências Sociais.
Na USP, a situação é similar. Na Figura 4, apresentamos a estrutura curricular
atual do curso de Pedagogia. No 8º período, encontramos a disciplina Metodologia
do Ensino de Ciências, e no 6º período, a disciplina Metodologia do Ensino de
Matemática.
Figura 4 – A grade curricular do curso de Pedagogia da USP (fonte: página do curso)
Na PUC-Rio, a situação é similar. Na Figura 5, apresentamos a grade
curricular do curso de Pedagogia.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
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Figura 5 – A grade curricular do curso de Pedagogia da PUC-Rio.
PUC-RIO – Curso de Pedagogia - Periodização
Código
Nome da Disciplina
Créditos
1º PERÍODO
CRE 1100
O Humano e o Fenômeno Religioso
4
EDU 1764
História das Idéias e Práticas Pedagógicas
4
EDU 1768
Psicologia Educacional I
4
EDU 1778
Educação Brasileira
4
LET 1910
Análise e Produção do Texto Acadêmico
4
CRE 0700**
Optativas de Cristianismo
4
EDU 1761
Estatística Aplicada à Educação
4
EDU 1765
História da Educação no Brasil
4
EDU 1769
Psicologia Educacional II
4
FIL 0102**
Optativas de Filosofia - Núcleo Básico do CTCH
4
NBH 0121**
Optativas de Sociologia/História - Núcleo Básico do CTCH
4
EDU 1762
Filosofia da Educação I
4
EDU 1766
Política Educacional I
4
EDU 1770
Sociologia da Educação I
4
EDU 1774
Criança e Cultura
4
EDU 1779
Gestão de Grupos
4
EDU 1763
Filosofia da Educação II
4
EDU 1767
Política Educacional II
4
EDU 1771
Sociologia da Educação II
4
EDU 1781
Organização Escolar I
4
EDU 1760
Antropologia e Educação
4
EDU 1775
Didática Geral
4
EDU 1782
Organização Escolar II
4
EDU 1787
Processo de Alfabetização
4
EDU 1788
Estágio Supervisionado: Gestão da Escola
4
EDU 1792
Pesquisa Educacional
4
EDU 1773
Avaliação Educacional
4
EDU 1780
Mídia, Tecnologias e Educação
4
EDU 1785
Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa
4
EDU 1786
Metodologia do Ensino da Matemática
4
EDU 1790
Prática de Ensino em Matérias Pedagógicas
4
2º PERÍODO
3º PERÍODO
4º PERÍODO
5º PERÍODO
6º PERÍODO
7º PERÍODO
10
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CRE 1141
Ética Cristã
2
EDU 1772
As Crianças e o Cotidiano na Educação Infantil
4
EDU 1777
Diversidade e Inclusão Educacional
4
EDU 1783
Metodologia do Ensino das Ciências Naturais
4
EDU 1784
Metodologia do Ensino das Ciências Sociais
4
EDU 1791
Prática de Ensino em Escola Fundamental
4
CRE 1168
Ética Profissional
2
EDU 1776
Educação em Direitos Humanos
4
EDU 1789
Estágio Supervisionado de Educação Infantil
4
LET 1801
Língua Brasileira de Sinais I
2
8º PERÍODO
PERÍODO LETIVO INDETERMINADO
ACP 0900
Atividades Complementares
34
EDU 0700**
Optativas de Educação
12
ELU 0900
Eletivas - Fora do Departamento
8
Total de créditos: 212
A conclusão é bastante simples: os cursos de Pedagogia das boas universidades
no Brasil são cursos que não ensinam conteúdos relativos ao que os professores vão
ensinar. Supõe-se, aparentemente, que os conhecimentos adquiridos ao cursar o
ensino médio são suficientes para educar crianças nos anos iniciais do ensino
fundamental.
Mas a queda na qualidade do ensino médio brasileiro não permite que
consideremos que os conhecimentos de língua portuguesa, matemática elementar,
ciências naturais e ciências sociais dos egressos desse ensino médio sejam suficientes
para uma formação de professores de qualquer nível.
Nas palavras de E. Durham, numa entrevista concedida no último mês (e
divulgada no JC-email), entitulada “Pedagogia: fábrica de maus professores”,
“As faculdades de pedagogia formam professores incapazes de fazer o básico, entrar
na sala de aula e ensinar a matéria. Mais grave ainda, muitos desses profissionais
revelam limitações elementares: não conseguem escrever sem cometer erros de
ortografia simples nem expor conceitos científicos de média complexidade. Chegam
aos cursos de pedagogia com deficiências pedestres e saem de lá sem ter se livrado
delas. Minha pesquisa aponta as causas. A primeira, sem dúvida, é a mentalidade da
universidade, que supervaloriza a teoria e menospreza a prática. Segundo essa
corrente acadêmica em vigor, o trabalho concreto em sala de aula é inferior a
reflexões supostamente mais nobres.”
A avaliação das grades curriculares dos cursos de Pedagogia, no que se refere
às áreas de ciências e matemática, revela que a prof. Durham tem alguma razão – os
estudantes não aprendem a matéria que deveriam ensinar, e não é possível ensinar o
que não se conhece. Segundo Tardif (Maurice Tardif, Saberes Docentes e Formação
Profissional),
11
Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
“Parece banal, mas um professor é, antes de tudo, alguém que sabe alguma coisa e
cuja função consiste em transmitir esse saber a outros”.
Para a formação inicial dos professores dos anos finais do ensino
fundamental, a exigência é de Licenciatura (Plena ou curta) ou formação pedagógica
complementar. Em geral, as licenciaturas que habilitam para esse ensino são as
Licenciaturas em Ciências Biológicas. Como um exemplo, no curso de Licenciatura
em Ciências Biológicas há uma única disciplina de Física, “Física para Ciências
Biológicas”. Isso significa que “ciências” é sinônimo de “ciências biológicas” no
ensino fundamental. Tanto em ciências quanto em matemática, em geral a
formação para os anos finais do ensino fundamental quanto para o ensino médio
ocorre nos mesmos cursos.
Novamente, os professores dos anos finais do ensino fundamental ensinam
ciências (com exceção de biologia) com base no que aprenderam em seu ensino
médio.
Para a formação inicial dos professores do ensino médio, há cursos de
Licenciatura (em geral, plena) em todas as áreas do conhecimento. Os cursos de
licenciatura, de forma não explícita mas claramente reconhecido nas instituições,
não tem o valor dos cursos de bacharelado equivalentes. O sistema de ensino
denominado “3+1”, que prevalecia anteriormente – um sistema em que o
bacharelado e a licenciatura compartilhavam o currículo nos três primeiros anos e
depois, no último ano, tinham currículos separados, deixou de existir no Brasil por
conta das diretrizes para a formação de professores. Há o reconhecimento que a
prática é uma componente fundamental da formação dos professores, e que deve
estar presente durante toda a formação.
Nas licenciaturas, há uma exigência legal de 400 horas de estágio (o que
corresponde, aproximadamente, a 3,3 horas semanais de estágio durante os 8
períodos do curso). Estes estágios são supervisionados, na UFRJ, pelos professores
de Prática de Ensino (ou Didática) da Faculdade de Educação, e acontecem em
escolas que fazem convênio com o curso de Licenciatura, em geral da rede pública
(estadual ou federal).
Mas certamente a formação de conteúdo, disciplinar e pedagógico, deixa a
desejar, e não apenas por um “excesso” de horas de estágio supervisionado. Um
repensar nesses currículos torna-se necessária, pois não é possível que o professor do
ensino médio conheça pouco a disciplina que vai ensinar. E também não pode
apenas conhecer a disciplina.
Para professores de nível superior, na área de ciências e matemática – de
onde sairão os quadros que serão professores universitários, e portanto formadores
de professores – só há, em geral, disciplinas de conteúdo específico da área de
formação. Em geral, cursos de pós-graduação não possuem nada além dos conteúdos
específicos e especializados (com exceção de uma exigência de estágio didático feita
aos bolsistas da CAPES) .
Portanto, na minha avaliação, temos um problema na formação de professores
atual no Brasil. Os cursos de licenciatura e Pedagogia são bastante fracos em termos
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
de aprendizagem de conteúdos de ciências, e os cursos de nível superior desprezam
a formação metodológica dos futuros formadores de professores.
Essas questões, evidentemente, não podem ser isoladas do contexto social. A
profissão professor é desvalorizada salarialmente e socialmente. As palavras de B.
Shaw,
“Quem sabe faz, quem não sabe ensina”
são realmente consideradas verdadeiras por muita gente, inclusive por grande parte
da comunidade acadêmica brasileira, que quase sempre considera que dar aula (e
portanto formar estudantes) atrapalha as suas atividades de pesquisa.
Nos últimos tempos, é comum a referência, nas áreas de pesquisa em ensino e
educação, ao “professor pesquisador”, ao “professor investigador”. Poder-se-ia
radicalizar a argumentação, afirmando que a arte de ser professor tornou-se tão
menor em nosso país que é necessário garantir que o professor é um pesquisador
para que ele ganhe novamente o status necessário para ter uma profissão
respeitável.
4. O que fazer - pressupostos
Para que possamos provocar mudanças na educação brasileira, alguns
pressupostos devem então ser afirmados.
Inicialmente, a educação de qualidade deve ser um direito de todos os jovens
brasileiros.
É na escola que se dá o cerne da ação educativa da sociedade.
As escolas precisam ... de edifícios, de secretarias, de computadores, de
laboratórios, de giz, aparelhos de vídeo, ... mas principalmente precisam de
professores – bem formados, estimulados a continuarem a aprendendo sempre, bem
pagos e respeitados pela comunidade em torno da escola.
Portanto, as ações a serem desenvolvidas devem refletir essas idéias: um
repensar na formação inicial, para que ela dê condições ao professor de ensinar, e
ânimo para continuar a estudar. E fornecer um estímulo aos professores que já
estão em exercício, para que eles, através de bons programas de formação
continuada, recuperem as condições para serem bons professores, muitas vezes
aprendendo o que já deveriam saber.
5. Um parênteses: o ensino de ciências
Segundo K. Appleton (da Central Queensland University, Australia, em
“Elementary Science Teaching”, cap. 18 do Handbook of Research on Science
Education, ed. S.K. Abell e N.G. Lederman, 2006), ensinar ciências no nível
fundamental (crianças de 5 a 12 anos) é uma preocupação recente na maior parte
dos países.
“Science in the elementary school is framed by the social and cultural context
of elementary schooling. This varies considerably from country to country,
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
despite some similarities in tradition and practice. An overriding tradition is
that elementary schooling´s major priorities are literacy and numeracy, with
other subjects taking second places.”
E as pesquisas em ensino de ciências revelam (Appleton, 2006) que os
professores de ensino fundamental evitam ensinar ciências. Eles possuem um
conhecimento de conteúdo bastante limitado, e pouca confiança em sua própria
capacidade de ensinar ciências – e portanto, é melhor desenvolver estratégias para
evitar ter que ensinar ciências (o trecho do artigo encontra-se anexo, ao final).
Temos desenvolvido, nos últimos anos, algumas atividades relacionadas ao
ensino de ciências no nível fundamental da escola. Em particular, neste último ano,
após termos elaborado volumes para cursos semi-presenciais de formação continuada
de professores com características de mãos e cérebros na massa (numa equipe com
professores do ensino fundamental), aplicamos esses materiais em projetos piloto –
cursos dentro das escolas das professoras participantes do projeto.
Nesses cursos, levou-se em conta as duas posições usualmente trabalhadas na
literatura da área de ensino de ciências: a de que a formação continuada deve ser
feita dentro de instituições produtoras de conhecimento (a universidade, no caso), e
que a formação deve ser feita dentro da escola. Para isso, os cursos foram
produzidos no ambiente universitário, com muita discussão e elaboração de oficinas,
textos e experimentos, e realizados no ambiente da escola, com professores que
fazem parte da mesma equipe e trabalham juntos.
Os cursos foram realizados em escolas da rede pública – uma escola de ensino
fundamental no bairro de Jacarepaguá, município do Rio de Janeiro, e uma escola de
ensino fundamental e médio do município de Duque de Caxias.
É interessante relatar algumas das frases e episódios ocorridos nestas
atividades.
“Porque ninguém me explicou isso antes?”
(frase de uma professora após a discussão da flutuação de corpos)
“Será que não entra nem sai nada mesmo? [sobre um terrário]
– Por que você não pesa o terrário hoje e no próximo encontro pesa
novamente? [nenhuma ação]
- Posso pesar o teu terrário? [o terrário é pesado pela tutora]
- Será que você pode pesar o meu também? [outra professora]”
“O experimento fez o maior sucesso na sala. Mas no final o tubo ficou
preto, por causa da chama da vela. E um aluno falou que a água tinha
ficado preta. Eu deixei correr, esperei o tubo ficar frio, e aí peguei e
passei a água para um copo. O aluno ficou impressionado. Eu não tive
medo de tentar uma solução para uma questão inesperada, que eu
nunca tinha visto antes. E a discussão com os alunos foi muito boa.”
[professora, anos iniciais do ensino fundamental, anotações apenas,
sem gravação]
14
Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Alguns desses episódios revelam que os professores não ensinam ciências
porque não conhecem seus conceitos básicos, e porque não se sentem confiantes
para ensinar.
E nos revelam uma maneira de melhorar a situação: materiais que façam com
que o professor se engaje nas atividades propostas, que veja nessas atividades
possibilidades de uso com seus estudantes, e que haja discussão de conteúdo e de
transmissão desse conteúdo ao final das atividades, sem que se tenha a realização
das atividades pelas atividades.
6. É possível fazer, e está sendo feito
Esse tipo de trabalho, na formação continuada, nos indica um caminho
possível.
Quero agora relatar uma experiência que vem se desenvolvendo
silenciosamente nos últimos dois anos, e cujos efeitos podem ser observados nos
resultados do SAEB. Trata-se do programa Pró-Letramento Matemática, do MEC/SEB.
Esse programa envolve, nos estados, os sistemas municipal, estadual e federal de
educação numa ação de formação continuada semi-presencial de larga escala –
números muito grandes, 10 mil professores a cada seis/oito meses.
Inicialmente, apresento alguns gráficos. Na Figura 6, a comparação entre as
notas padronizadas do SAEB de Matemática (exame realizado, por amostragem, entre
alunos da 4ª série – atual 5º ano – do ensino fundamental) por região do país.
Figura 6 – Comparação entre as notas padronizadas no SAEB nos anos de 2005 e 2007 –
Matemática – por região
COMPARAÇÃO ENTRE AS NOTAS PADRONIZADAS
DO SAEB 4a série EF - 2005 / 2007
por região
8
6
4
CENTRO-OESTE
SUL
SUDESTE
NORTE
0
NORDESTE
2
BRASIL
Nota padronizada SAEB
MAT - 2005
MAT - 2007
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
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Observa-se da figura que a nota aumentou, em todas as regiões do país. A
Tabela 1 mostra esses resultados em termos numéricos. (Todos os dados foram
trabalhados a partir dos dados públicos do INEP / MEC.)
Tabela 1 – Dados SAEB no país e por região (4ª série do Ensino Fundamental)
Nota Padron.
Nota Padron.
Aumento
Nota Padron.
Nota Padron.
Aumento
Matemática
Matemática
Matemática
L. Portug.
L. Portug.
L. Portug.
REGIÃO
2005
2007
(%)
2005
2007
(%)
Brasil
4,45
3,91
4,17
5,19
5,13
4,90
4,96
4,62
4,70
5,42
5,51
5,32
11,6
18,2
12,7
4,5
7,6
8,6
4,30
3,86
4,14
4,89
4,80
4,64
4,52
4,20
4,36
4,90
4,95
4,84
5,3
9,0
5,3
0,3
3,3
4,5
Nordeste
Norte
Sudeste
Sul
Centro-Oeste
Na Figura 7, apresentamos os mesmos dados, só que agora com o aumento
percentual (dos resultados de 2005 para os resultados de 2007) do SAEB.
Figura 7 – Acréscimo percentual na nota padronizada do SAEB de 2005 para 2007 –
Matemática e Língua Portuguesa
25
Aumento percentual (%)
Diferença Percentual - SAEB 4a série EF
2005 para 2007
20
Matemática
L. Portuguesa
15
10
5
CENTRO-OESTE
SUL
SUDESTE
NORTE
NORDESTE
BRASIL
0
O que poderia explicar esta melhoria tão diferenciada da região Nordeste em
relação ao resto do país?
Muitas discussões podem ser feitas a respeito desses dados. É certamente
mais fácil aumentar a nota no SAEB dos sistemas que estão com nota muito baixa do
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
que quando as notas já são altas, há muitas variáveis envolvidas, etc. Mas há uma
observação curiosa que nos permite uma pista inicial para avaliação.
No ano de 2006, a SEB – Secretaria de Educação Básica do MEC lançou para os
Centros que constituem a Rede Nacional de Formação Continuada de Professores um
desafio. O desafio era conseguir melhorar a formação de professores dos anos
iniciais do ensino fundamental de forma intensa, atingindo um número enorme de
professores e que durasse pouco.
Afinal, “nenhum sistema educacional pode ser melhor do que seus
professores”.
A Rede de formação de professores é composta de centros de universidades
(federais, estaduais e comunitárias) escolhidos por meio de um edital lançado no
final do ano de 2003. Seus objetivos, as universidades que as constituem e sua
produção podem ser encontradas na página da SEB/MEC (www.mec.gov.br).
O programa foi planejado: um curso de caráter semipresencial, envolvendo as
redes federal, estadual e municipal em sua organização e implementação; às
universidades cabia elaborar o material didático e formar os formadores dos
professores (tutores) por intermédio de parcerias locais, com outras universidades e
com os sistemas estadual e municipal. O nome do programa foi inventado: PróLetramento – de Matemática e de Português, para começar.
A SEB escolheu os estados com base na análise dos indicadores de desempenho
dos estudantes e nos indicadores sócio-econômicos da região. Em 2006, o programa
é iniciado em 5 estados da região Nordeste: Rio Grande do Norte (114 municípios,
68% do total de municípios), Ceará (184 municípios, 78% do total), Maranhão (117
municípios, 54% do total), Piauí (104 municípios, 47% do total) e Bahia (76
municípios, 18% do total). O total de professores atingidos nessa primeira fase, até
outubro de 2007, foi de cerca de 40 mil professores dos anos iniciais do ensino
fundamental.
Em seguida, outros estados foram incorporados ao processo, que vem num
crescendo e já está atingindo 20 estados. No entanto, apenas os 5 primeiros
concluiram um ciclo completo de 120 horas de formação em Matemática e outras 120
horas de formação em Linguagem antes da realização do SAEB 2007.
E o SAEB mede o desempenho dos estudantes, apenas. O Pró-Letramento não
foi planejado visando atingir apenas os professores que estão com turmas de final de
ensino fundamental, menos ainda visando prepará-los a ajudar os alunos a terem
bom desempenho na Prova Brasil.
Podemos repetir os gráficos anteriores, agora olhando detalhadamente para
cada estado. A diferença entre as notas padronizadas (medidas em unidades de
desvio-padrão da diferença) está apresentada na Figura 8. Em azul, estão indicados
os estados que completaram o ciclo do programa Pró-Letramento antes da realização
do exame em 2007.
17
Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Figura 8
1.93
0.47
0.47
0.42
MATO GROSSO DO SUL
MATO GROSSO
GOIÁS
DISTRITO FEDERAL
0.23
0.4
1.21
1.17
1.02
0.77
0.91
0.6
SANTA CATARINA
RIO GRANDE DO SUL
PARANÁ
0.8
0.67
1.0
1.26
1.13
1.07
0.98
0.97
0.93
0.88
1.2
SAEB MATEMÁTICA
0.82
1.4
1.46
1.6
1.27
1.3
1.13
1.13
1.8
1.72
1.69
2.0
Diferença entre os resultados da nota padronizada
nos anos 2005 e 2007
em unidades de desvio-padrão da diferença
(diferença Brasil = 1)
-0.01
0.2
0.0
SÃO PAULO
ESPÍRITO SANTO
RIO DE JANEIRO
MINAS GERAIS
TOCANTINS
RORAIMA
PARÁ
ACRE
AMAZONAS
RONDÔNIA
AMAPÁ
PIAUÍ
CEARÁ
MARANHÃO
RIO GRANDE DO NORTE
BAHIA
ALAGOAS
PERNAMBUCO
PARAÍBA
SERGIPE
-0.2
O que vemos indica realmente uma forte correlação entre as duas coisas: os
estados com maior índice de melhora são justamente aqueles onde o programa, no
momento em que os alunos faziam a prova, havia formado uma proporção maior de
professores. No outro extremo está um estado como Sergipe, o último a
efetivamente aderir ao programa.
Esta hipótese é fortalecida se agregamos os dados de Português. Na Figura 9,
apresentamos os dados correspondentes ao aumento das notas no SAEB 4ª série em
alguns estados. As diferenças brutas não são tão grandes, mas são claramente mais
pronunciadas naqueles estados onde o programa começou antes, e já havia
beneficiado uma proporção maior dos professores. Alem disto, em qualquer estado
do Nordeste ela é maior do que o crescimento médio em qualquer outra região.
18
Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Figura 9 – Aumento relativo das notas no SAEB 4ª série
Matemática
Português
1,20
1,00
0,80
0,60
0,40
0,20
Sergipe
Paraíba
Pernambuco
Alagoas
Bahia
Rio Grande do Norte
Maranhão
Ceará
Piauí
Sudeste
Sul
Centro-Oeste
Norte
Pode-se verificar que o aumento se dá apenas na 4ª série do ensino
fundamental – é só contemplar a Figura 10, correspondente aos estados do Nordeste.
Figura 10 – SAEB Matemática – comparação 2005/2007, estados do Nordeste
1,00
0,90
0,80
0,70
0,60
0,50
0,40
4a Série
0,30
8a Série
0,20
3o Ano
0,10
Sergipe
Piauí
Paraíba
Rio Grande do
Norte
-0,40
Pernambuco
-0,30
Maranhão
-0,20
Ceará
-0,10
Bahia
0,00
Alagoas
-0,20
Nordeste
0,00
-0,50
Há algumas indicações fortes, portanto, que este programa está se refletindo
na aprendizagem dos alunos.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
E o que é exatamente esse programa? Quais as características que fazem com
que ele aparentemente esteja tendo sucesso?
Inicialmente, ele foi planejado como um programa de larga escala – para
mudar a situação de um país do tamanho do Brasil, não se pode pensar
exclusivamente em pequenas ações. Para isso, um esquema de formação em cascata
(uma pirâmide de formadores) torna-se necessário. Também é necessária a
conjugação de esforços dos sistemas de ensino – numa ação realmente de
colaboração na educação.
A seguir, as características acadêmicas dessa formação: o material didático
combina os chamados conteúdo disciplinar e conteúdo pedagógico. Isso é,
apresenta-se o conteúdo conceitual básico, que, não surpreendentemente, é
desconhecido pelos professores, e a sua utilização em sala de aula. O professor
precisa, a cada encontro, trazer os resultados da aplicação do que aprendeu em sala
de aula. Os algoritmos de soma e subtração de números inteiros, por exemplo,
deixam de ser uma regra memorizada, e passam a fazer sentido para os professores.
Com isso, eles passam a ter condições de entender as dúvidas surgidas com os alunos
e resolvê-las. E os alunos começam a se interessar por matemática (há muitos
depoimentos escritos, de professores, pais, secretários municipais a respeito dessas
ocorrências). O conteúdo discutido com os professores tem profundidade
pedagógica. Há conteúdo disciplinar, e discute-se a maneira de trabalhar com
estudantes esse conteúdo.
6. Possibilidades: formação de professores de ciências e matemática,
inicial e continuada, para uma educação de qualidade
O diagnóstico é ruim, mas a sociedade brasileira já despertou para a
necessidade de mudança. Há muito a ser feito, mas algumas coisas já vem sendo
feitas.
Vou apresentar aqui, de forma sumária, algumas possibilidades de atuação que
penso podem representar melhoras no curto e médio prazo.
Formação continuada de larga escala
É interessante observar que aparentemente há programas (que precisam ser
melhor estudados e entendidos) que conseguem atuar em larga escala na formação
continuada. O Pró-Letramento Matemática parece ser um deles, outros devem
existir. Não se tem uma avaliação muito precisa sobre seus resultados nem sobre as
características do programa que proporcionam esses resultados.
Mas uma característica é clara: as ações de formação continuada precisam
combinar conteúdo disciplinar com aplicação pedagógica. Programas com conteúdos
diluídos, com mera discussão da prática da sala de aula ou dos problemas da
comunidade certamente não são o caminho a ser seguido.
A colaboração entre universidades e escolas é outro fator importante nessas
ações de formação continuada.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Formação pós-graduada de professores
Há necessidade de combinar a ação de larga escala com as ações de pequena
escala. Os professores que atuam como tutores em programas de larga escala são
em geral professores melhor formados, e essa melhor formação se dá em cursos de
pós-graduação.
Nos últimos anos, o país vê surgir e aumentar o número de mestrados
profissionais para professores – cursos de pós-graduação com objetivo de melhorar a
formação sem transformar o professor num pesquisador acadêmico. Esses cursos
devem ser incentivados.
A Capes da Educação Básica tem um papel importante nisso. Esses cursos não
tem apoio financeiro por parte da CAPES, e muitos deles vão apresentar problemas
caso não sejam disponibilizadas bolsas de estudo ou ajudas de custo para os
professores que deles participam.
Formação inicial de professores
É necessário repensar a formação dos professores, principalmente do ensino
fundamental. Talvez “despedagogizar” a educação, separar a formação do gestor e
pesquisador da formação do professor. Mas com a ressalva que movimentos
pendulares – “pedagogos substituídos por cientistas” – normalmente não são uma boa
opção. Quase sempre, a solução parece ser a posição intermediária, o equilíbrio
entre a formação científica e a formação pedagógica, a construção de um “regime
de colaboração” entre esses dois setores.
O papel das sociedades científicas e acadêmicas
A formação de professores é tão importante para o país e para a ciência
quanto a formação de pesquisadores. Uma mudança cultural precisa ser iniciada, e
as sociedades teriam um papel importante nisso: a ciência não sobreviverá se não
existirem bons professores, e a atividade de formação de professores não pode ser
uma “boa ação” praticada por cientistas abnegados de forma eventual.
O papel dos órgãos financiadores
O desafio é muito grande, e a multiplicidade de esforços é fundamental para
que consigamos encontrar formas de atuação produtivas, que provavelmente não
possuem uma forma única. Editais como os que a CAPES e as FAPs vêm lançando,
que permitem desenvolvimento de projetos variados, são fundamentais.
Agradecimentos
A L.C. Guimarães (LIMC e IM-UFRJ), com quem foi feita a avaliação dos resultados do
SAEB, e a Roberta de Oliveira (MEC-SEB), pelo fornecimento dos dados do
Proletramento.
Financiamento
Os trabalhos aqui apresentados tiveram financiamentos da FAPERJ e da SEB/MEC.
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Formação de professores de ciências e matemática para uma educação de qualidade
MFB, dez/2008
Anexo
Elementary Science Teaching
Ken Appleton, in Handbook of Research on Science Education, Sandra K. Abell e
Norman G. Lederman (ed), 2006, Lawrence Erlbaum Associates Publishers, New
Jersey
Teacher avoidance of science (p. 496)
“That elementary teachers tend to avoid science has been an issue for a long time.
(…) The main issues identified in research over the decades are that elementary
teachers tend to have limited science subject matter knowledge, limited science
pedagogical content knowledge (PCK) (Schulman, 1986), and low confidence/sefefficacy in science and science teaching, with the consequence that many avoid
teaching science. Harlen (1997) identified six avoidance strategies used by teachers:
1. avoidance – teaching as little of the subject as possible,
2. keeping to topics where confidence is greater – usually meaning more biology than
physical science,
3. stressing process outcomes rather than conceptual development outcomes,
4. relying on the book, or prescriptive work cards which give pupils step-by-step
instructions,
5. emphasising expository teaching and underplaying questioning and discussion,
6. avoiding all but the simplest practical work and any equipment that can go wrong.
(…)
Harlen also cautioned that, although some teachers are more confident about
teaching science, avoidance behaviors allow them to teach a form of science with
which they are comfortable, and therefore they do not see their science teaching as
problematic. In self-report surveys, these teachers may appear as confident, regular
teachers of sciecnce. However, King, Shumow, and Lietz (2001) found that there
was a considerable discrepancy between teachers’ views of their own practice in
elementary science and the views of science educators who observed their teaching.
What teachers saw as inquiry, the science educators saw as expository. (…)
A consequence of elementary teachers’ limited science knowledge and low
confidence in teaching science is a tendency for them to use teaching strategies that
allow them to maintain control of the classroom knowledge flow, but which are
often not appropriate ways of engaging students in science. (…) A naïve solution to
this problem has been to demand that elementary teachers take more science
content in their pre-service preparation. However, Roth noted that “subject-matter
competence in and of itself was insufficient”, and others (…) have shown that more
content knowledge, of itself, does not necessarily help teachers use strategies
appropriate to recent reform initiatives (…). Schoon and Boone (1998) suggestet
that there may be key, fundamental misconceptions held by some elementary
teachers, characteristic of a lack of understanding of foundational ideas in science,
that particularly affect their self-efficacy.
(…)
The reseach into science teaching practices reveals a fairly depressing picture. A
naïve reaction is to blame elementary teachers for not doing their job properly.
However, the overwhelming majority are doing the best they can under the
circumstances.”
22
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NOTA TÉCNICA 04/2008 FORMAÇÃO DE - LIMC