AU TO RA L TO EI DI R AVM – FACULDADE INTEGRADA EG ID O PE LA LE I DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA DO CU M EN TO PR OT AXÉ NA EDUCAÇÃO INFANTIL DIANA MATTOS DA SILVA PROF. DR. VILSON SÉRGIO DE CARVALHO RIO DE JANEIRO 2O11 2 AVM – FACULDADE INTEGRADA LICENCIATURA EM PEDAGOGIA AXÉ NA EDUCAÇÃO INFANTIL Apresentação de monografia ao IAVM como requisito parcial para obtenção do grau licenciatura em Pedagogia. Por Diana Mattos da Silva Orientador: Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho Rio de janeiro 2011 de 3 AGRADECIMENTOS Aos meus queridos incentivadores, amigos, familiares e professores, que sempre me apoiaram e contribuíram com os meus estudos e trabalhos voltados para implementação da lei 10.639 em meu trabalho docente. 4 DEDICATÓRIA Ao meu Pai celeste, aos meus avós e pais, já falecidos, mas que me forneceram durante a sua breve estada nesta vida, formação moral e estrutura necessárias para a minha formação como ser e, que são hoje motivo de muito orgulho e verdadeira saudade, fonte de toda inspiração para a minha luta diária. 5 EPÍGRAFE “ Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar , as pessoas precisam aprender; e, se elas podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente coração humano do que o oposto” Nelson Mandela ao 6 RESUMO Esta pesquisa aponta uma forma possível de aplicar a lei 10.639, já a partir da Educação Infantil, através da utilização dos valores civilizatórios africanos. Seus capítulos abordam a importância da implementação desta lei além de explicar porque a Educação Infantil é uma fase propícia para esta aprendizagem, assim como revelam as contribuições que a utilização dos valores africanos trazem para o desenvolvimento infantil. 7 METODOLOGIA Foi feita uma pesquisa pura, com a utilização de material bibliográfico, com referência em temas voltados para a cultura afro brasileira, constantes em livros e revistas que tratam do tema. 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I – MAMA ÀFRICA -CONHECER A LEI E RECONHECER SUA ORIGEM 11 CAPÍTULO II – EDUCAÇÃO INFANTIL – FASE DE DIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO 17 CAPÍTULO III – CULTURA AFRO – O VALOR NA EDUCAÇÃO INFANTIL 25 CONCLUSÃO 37 BIBLIOGRAFIA 40 9 INTRODUÇÃO Este trabalho visa mostrar a importância do conhecimento referente à cultura afro-brasileira para o educando desde que este ingresse na Educação Infantil, visto que, a sociedade brasileira em sua formação, recebeu importante influência africana, no entanto,a mesma por um forte domínio europeu, vem perdendo o seu valor de cultura, sendo folclorizada. O conhecimento sobre cultura afro-brasileira é incoerente e, na maioria das vezes, ignorado e esquecido. Pensando em minimizar as diferenças, através do aumento do conhecimento referente a cultura afro-brasileira e, conseqüente respeito à cultura de um povo que se vê muitas vezes sem um referencial, pois não encontrando um parâmetro de identificação, assume um padrão que lhe é imposto. Então surge a urgência em inserir-se o tema a partir da Educação Infantil, período em que o aluno começa a encarar o diferente com respeito, a enxergar a diversidade sóciocultural brasileira e valorizá-la como patrimônio do seu povo. A criança a partir os dois anos de idade, começa a perceber as diferenças entre os seres. Então, na Educação Infantil é possível começar a se desenvolverem os conceitos de identidade e alteridade, tão importantes para o desenvolvimento do indivíduo, quanto para o desenvolvimento da sociedade, já que, no caso da tão massacrada população afro descendente este processo de construção da identidade torna-se ainda mais árduo, pois é uma verdadeira garimpagem para resgatar valores e conhecimentos culturais visando reconstruir e restabelecer conceitos que foram erroneamente distorcidos. A inclusão do estudo de cultura afro brasileira desde a Educação Infantil, vem a favorecer o desenvolvimento da sociedade como um todo, visto que, a formação da identidade individual gera a construção da identidade coletiva. E a escola, 10 ciente de que educação e aprendizagem fazem parte de um processo, devem reverter paradigmas a fim de favorecer o conhecimento dessa diversidade cultural, assim como oferecer um novo olhar, com novas formas de visualizar a cultura brasileira. Garantir a criança um ambiente rico em possibilidades de exploração e convívio com a diversidade étnico-cultural, é estar garantindo o desenvolvimento social mais saudável em que as relações humanas desenvolvam-se muito melhor, com menos ranços sociais estereotipados. Compreender a diversidade nesta fase da vida ajudará e muito no desenvolvimento humano do indivíduo. Desta forma, este trabalho quer mostrar que, o trabalho com cultura afrobrasileira, contribui não somente com a questão da formação da identidade do aluno negro, mas para uma nova perspectiva para a educação, que é o olhar afro, como novo ponto de visão educativa, que encara o indivíduo como um todo. Este novo olhar exige muita criatividade para utilizar novas formas e estratégias para combater ao ideário racista. O fazer pedagógico deve receber uma nova orientação, buscando agregar a todos de forma que usufruam das mesmas oportunidades, com igualdade de condições a fim de que chegue ao exercício pleno da cidadania. Este deve ser o objetivo da escola sob um novo olhar. Desta forma, este trabalho, visando cooperar um pouco com este processo estará dividido em três capítulos que se apresentarão da seguinte forma: O primeiro capítulo propõe-se a apresentar o porquê do ensino de cultura afro brasileira, a sua importância para a sociedade brasileira; o segundo capítulo analisa porque estes conhecimentos devem ser tratados já a partir da Educação Infantil; e, o terceiro capítulo demonstra como pode ser feito o trabalho com cultura afro brasileira na Educação Infantil através da utilização dos valores civilizatórios africanos. 11 CAPÍTULO I MAMA ÁFRICA CONHECER A LEI E RECONHECER SUA ORIGEM ( Há também que o leão ter o direito que contar sua história) Provérbio africano Um vínculo placentário une o Brasil ao continente africano devido à ligação umbilical construída em dois terços do tempo de existência do nosso país. Porém,a visão eurocêntrica imposta pelo colonizador cria uma esfinge social, o que vem dificultando o reconhecimento do negro como sujeito no processo de construção deste país. A participação do povo africano neste processo não se deu ao acaso. Os africano foram trazidos por terem conhecimentos específicos, assim a história do negro deve ser contada sob uma perspectiva atlântica diasporana, encarando a diáspora como um processo. Segundo OLIVEIRA(2003): “Na diáspora africana, o que vem para o Brasil não é a estrutura físico-espacial das instituições nativas africanas, mas os valores e princípios negro-africanos. É a isto que doravante chamaremos de aspectos civilizatórios”(p.83) 12 Assim sendo, esta incapacidade de reconhecer as matrizes formadores da sociedade brasileira justificam a instituição da lei 10.639/03 que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História da áfrica e Cultura Afro-brasileira nas instituições de ensino e da criação das Diretrizes Curriculares Nacionais da Relações Étnico-Raciias e para o Ensino de História e Cultura Afro- Brasileira, visando minimizar os danos causados por séculos de exclusão em uma sociedade extremamente excludente. A conquista do direito à história, cumpre a um direito previsto na Constituição Federal em seus artigos 5º, 206-210; 1º do 242/ 215 e 216, bem como nos artigos 26, 26-A e 79-B na lei 9.394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que asseguram direito á igualdade de condições de vida e de cidadania, assim como garantem igual direito às histórias que compõem a nação brasileira. Todos estes dispositivos legais corroboram para que, Estado e sociedade tomem medidas visando ressarcir os descendentes de africanos dos danos causados por séculos de escravidão e negação à sua origem e história. Transtorno estes que não atingem somente aos afro descendentes, mas a sociedade como um todo que perde com isso seu eixo formador. As lutas, não apenas no Brasil, como também em outros povos africanos, segundo PEREIRA(2006), são fundamentais para o devido entendimento de todo o processo aqui fundamentado, como cita o autor: “Todos, como nosso país, for para nós no Brasil é particularmente importante a referência e o conhecimento das lutas de libertação que levaram à independência de Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. Em colônias portuguesa oficial.”(p.16) e guardam ainda o português como língua 13 Muito pouco foi publicado ou é conhecido no Brasil sobre estes fatos. Essas lutas tornaram-se um marco para os estudos sobre cultura africana, à partir destes estudos o tema virou alvo de especialistas no assunto. Três eventos contribuíram para o aprofundamento nos estudos sobre cultura africana: o Seminário de Dakar, em 1961; o 1º Congresso de Africanistas no gana, em 1962 e o Seminário Dar- es Salam na Tanzânia, em 1965. Devido a este aprimoramento intelectual criou-se um movimento mundial e elaborou-se um documento oficial sobre historiografia africana, como continua no revelando A. PEREIRA. Então conhecer os fatos históricos de um povo é essencial para traçar seus dados identitários. Como nos diz OLIVEIRA (2003): “A identidade de um povo normalmente é pesquisada quando este povo passa por problemas de afirmação social ou, pelo contrário, quando este povo procura por ascendência ao poder social. Tanto num caso, quanto no outro, ou seja, tanto num contexto de dominador ou de dominado, a identidade joga aí um papel fundamental, o de conferir legitimidade”(p.154) Legitimidade esta que o povo afro descendente brasileiro começa a galgar, buscando não apenas reconstruir a identidade deste, mas também reconstruindo a identidade da sociedade brasileira como um todo, uma vez que esta assegura a identidade cultural do povo, que concebe muitas vezes, cultura como folclore. A lei 10.639 reconhece essa legitimidade e afirma a relevância do espaço escolar para a formação da cidadania. E. PEREIRA(2010) cita dois aspectos importantes sobre a interferência da cultura africana na cultura brasileira. O primeiro é o de conhecer o histórico da chegada das diversas culturas africanas ao Brasil e, em segundo, os desdobramentos desta infusão cultural desde o passado até o presente. 14 Reforça a tese de E. PEREIRA(2008) o fato exposto por ele na revista Diálogo, de ser importante a aprendizagem da cultura afro brasileira na vertente da diversidade, pois os vários modelos africanos geram várias formas diferenciadas de cultura. Toda essa diversidade representa dentro da escola, um enriquecimento às práticas educacionais voltadas para a democracia, já que, segundo o autor, ajuda a desenvolver cidadãos cientes da responsabilidade social e os transforma em atores da história. “Reconhecer as especificidades dos diferentes contingentes culturais que dão forma a nação brasileira é uma condição fundamental para construirmos uma sociedade justa e solitária, que tenha no diálogo e no respeito ao outro o ponto de partida para a promoção do bem comum.” (2010 - p.23) A lei 10.639 vem fomentar um movimento diferente no processo educativo brasileiro. Se no Brasil, nos anos 30 a 50 houve uma desapropriação da identidade, afro que foi submetida a um processo de folclorização, como explica M. SANTANA citando que, os mitos gregos são muito bem aceitos enquanto os mitos africanos são rejeitados e pior, passam a ser demonizados. A dominância mítica exerce influência nas visões de mundo, ideologias, utopias e sistemas pedagógicos. Então, OLIVEiRA(2003) explica que se o mito transforma-se em norma cultural, a introdução de outros mitos pode, através da escola difundi-los para que agreguem-se ao sistema dominante, servindo como fonte de renovação que tratam a diversidade de forma positiva e não como forma de exclusão. Hà uma questão, a Constituição ( art 206) e a LDB ( art 29) citam “ pleno desenvolvimento da pessoa” e “ desenvolvimento integral da criança” . E, a UNESCO possui a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural que reconhece a identidade cultura como direito da pessoa. O nosso sistema educacional está voltando-se para preparar os indivíduos para valorizar a diversidade humana tornando-a um patrimônio da humanidade. 15 O ECA (1990), LDB (1996), PNE ( 2001), Lei 10639 ( 2003), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico Raciais ( 2004) , Lei 11645( 2008), são instrumentos que vem sendo criados tentando assegurar uma nova forma de resgate pelos danos causados, ao afro descendente como a sociedade brasileira . O Conselho Nacional de Educação contribui para a implementação das leis no momento em que compartilha as responsabilidades pelos órgãos federativos, sistemas educacionais e instituições envolvidas. Assim sendo, a educação das relações étnico raciais, gerencia a aprendizagem para negros, brancos e indígenas, para que em conjunto, construam uma sociedade justa , onde o espaço democrático da escola favoreça a eliminação do racismo, assim como a emancipação dos grupos. Para empreender a construção dessas pedagogias é necessário fortalecer entre negros e despertar nos brancos a consciência negra. Trata-se da ampliação do foco da aprendizagem para a diversidade, fazendo-se necessário repensar as relações étnico raciais. ‘Entre os negros poderão oferecer conhecimentos e segurança para orgulharem-se da sua origem africana; para os brancos, poderão permitir que identifiquem , as influências , a contribuição, a participação e a importância da história e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver e relacionar-se.”(p. 22) O Brasil, por ser um país multi-étnico e pluricultural, deve ter uma educação voltada para a inclusão de todos, garantindo o direito de aprender e de ampliar seus conhecimentos. Ou seja, e educação volta-se no momento para as relações étnico raciais como mostra o parecer homologado pelo CNE em 2004. TEODORO (1987) cita que: 16 “A soma das identidades individuais, dentro do contexto determinado, forma a identidade cultural de um grupo étnico ou de uma sociedade que transmite pela cultura, pelo ensino e pela educação. Daí a necessidade do sistema educacional levar em conta as diversidades que compõem uma mesma cultura a fim de não criar problemas de ordem psíquica nos educandos”(p.46) Desta forma, se faz necessário que a escola esteja voltada para romper preconceitos, rejeitar estigmas e procurar resgatar fatos históricos visando a valorização de dados culturais, devendo esta transformar-se em espaço de discussão e reflexão da positividade desta diversidade, que deve ser encarada como fato natural, de acordo com o processo de constituição da população brasileira. Sendo assim, não somente a escola, mas toda a sociedade brasileira, através de um maior conhecimento dessa diversidade, rompe com um padrão único e passa a valorar a multiplicidade. Ou seja, daí da posição que cria uma falsa sensação de igualdade e passa a encarar a diversidade como natural e muito positiva em suas especificidades. Aprender sobre essa diversidade, conviver e enfrenta-la é função da educação escolar. “A aceitação da diferença como exemplo da diversidade humana é um dos caminhos para a construção verdadeiro processo educativo( SKILIAR) de um 17 CAPÍTULO II EDUCAÇÃO INFANTIL FASE DE DIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO (O conhecimento é como um jardim: se não for cultivado, não pode ser colhido) Provérbio africano A escola é o local propício para a formação do cidadão. A Educação Infantil então, por estar voltada para favorecer o exercício da cidadania e da convivência deve inserir-se num trabalho voltado para a diversidade humana e igualdade de direitos, pois as crianças desde pequenas observam diferenças e estas devem, desde então, aprender a encara-las como naturais à partir do conhecimento da formação da sociedade. A LDB em seu artigo 29 prevê que: “A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.” 18 Ou seja, de acordo com a LDB, o objetivo principal da educação infantil é estimular o desenvolvimento mais amplo da criança, que deve acontecer sob a observância do contexto onde esta esteja inserida. Portanto, nada mais justo do que inseri-la no contexto da diversidade, que é o contexto constituinte da sociedade brasileira. Aprender a encarar as diferenças é então, também função da Educação Infantil. A Educação Infantil tem um caráter democrático, voltado para a formação da consciência cidadã, todavia surge a necessidade de garantir a prestação de atendimento mais amplo, pois independente ao grupo social ou étnico ao qual atenda a Educação Infantil, este ainda é insuficiente em nosso país. Há também que se encarar que, considerando a diversidade étnica , a maior concentração da população negra, não é atendida pela Educação Infantil e que, o atendimento dos que recebem, geralmente é feito em instituições públicas ou filantrópicas , o que não vem atendendo a demanda. A Educação infantil deve então favorecer a sua função de espaço de socialização. Como bem nos afirma Vigotsky(1998): “A construção do conhecimento deve levar em conta o crescimento social e cultural da criança e do adolescente , que afeta não apenas o conteúdo, mas também o método de raciocínio dos estudantes”(p.6) Portanto, levar em consideração estes fatores históricos formadores da sociedade brasileira é essencial para a compreensão do processo de aprendizagem do educando que deve levá-lo a construção de um conhecimento pautado na sua cultura, uma vez que, como cita o autor é do entrelaçamento entre o desenvolvimento das funções psicológicas superiores , a sua origem sócio-cultural e os processos naturais, que são biológicos, que surge o comportamento da criança. 19 O autor relata ainda que aprendizado e desenvolvimento estão interrelacionados e são necessários à formação do pensamento científico, pois Vigotsky aprofunda-se nos estudos da interação existente entre os comportamentos sociais e biológicos, sendo este um processo dialético. Para Vigotsky(2007) essas funções são reforçadas na pré-escola através do brinquedo e da imaginação, no momento em que esta projeta-se nas atividades que envolvem a sua cultura, espelhando assim uma atitude que adquirirá no futuro. “No brinquedo, a criança projeta-se nas atividades adultas, de sua cultura e ensaia seus futuros papéis e valores. Assim o brinquedo antecipa o desenvolvimento; com ele a criança começa a adquirir motivação, as habilidades e atitudes necessárias à sua participação social, a qual só pode ser completamente atingida com a assistência de seus companheiros da mesma idade e mais velhos.”(p.113) A diferença nos estudos de Vigotsky (2007) está exatamente na abordagem histórico-social que o autor dá ao processo de desenvolvimento humano. Fato que em muito interrelaciona-se com a importância do estudo de cultura afrobrasileira na Educação Infantil, por esta ser constituinte da nossa cultura, torna fundamental fazer esta ação já nos primeiros anos de construção do conhecimento. Cavalheiro (2007) cita que esta é uma fase fundamental do desenvolvimento humano, e considera esta educação a base da formação do futuro sujeito social. É nesta fase que ocorre a primeira socialização do indivíduo, o que torna possível compreensão do mundo, que deve ser apresentado pela escola e pela família. Ainda segundo a autora, a experiência escolar amplia e intensifica a socialização da criança que, e o resultado é a formação da sua identidade que possibilita a construção da personalidade. 20 Então, Cavalheiro(2007) diz que; “O entendimento da problemática étnica no cotidiano da Educação Infantil é condição sine qua non para se pensar em um projeto novo para a educação que possibilite o desenvolvimento e a inserção social dos futuros cidadãos da nação brasileira, desenvolvendo neles um pensamento menos comprometido com a visão dicotônica de inferioridade / superioridade dos grupos étnicos.”(p.37) De acordo com a autora esta é uma ação preventiva contra possíveis atitudes de preconceito e discriminação, já que evitam que estas sejam interiorizadas numa fase em que as crianças estão muito sensíveis a influências externas. Estas ações devem ser positivas, no sentido de tratar da diversidade étnica como fato natural dentro do contexto histórico de formação da sociedade brasileira e, passem a valorizar a sua cultura e os seus fatores étnicos. Se faz necessário explicar nesta fase a criança, as diferentes características existentes dentro da nossa sociedade, para que, a partir de então, esta reconheça e entenda as características que recebe e vê na relação que estabelece com o outro observando as diferenças e encarando-as com naturalidade. Para Wallon (2001) , o desenvolvimento da inteligência depende das experiências oferecidas pelo meio e do grau de apropriação que o sujeito faz delas. Diz ainda que, a cada estágio do desenvolvimento infantil ocorre uma reformulação e/ou reorganização dos estágios ocorrendo uma interação entre sujeito e ambiente. Sendo os estágios: • Estágio impulsivo emocional (0 a 1 ano) – predomínio de relações emocionais com o ambiente, fase de construção sujeito, onde são desenvolvidas condições sensório-motoras; 21 • Estágio sensório motor (1 a 3 anos) - predomínio de relações cognitivas com o meio, A criança desenvolve a inteligência prática e a capacidade de simbolizar; • Personalismo (3 a 6 anos) - predomínio das relações afetivas. Ocorre a construção da consciência de si, através das interações sociais que dirigem o interesse das crianças para as pessoas. A criança faz uma mistura entre o afetivo e o pessoal; • Estágio categorial (6 anos) A criança dirige seu interesse para o conhecimento a conquista do mundo exterior. Portanto, pelo que nos demonstra Wallon (2001), é na fase da Educação infantil que a criança inicia o processo de conhecimento de si e do mundo. Já segundo Evaristo (2006), garantir as crianças um ambiente rico em possibilidades de exploração e convívio com a diversidade é estar possibilitando um desenvolvimento saudável no campo das relações humanas, porque através da observação do cotidiano infantil há comportamentos e questionamentos comuns da criança em cada fase: • Dos 8m aos 2 anos – percebem características físicas; • 2 e 3 anos – ganham consciência de gênero, cor textura de cabelo e outros atributos físicos; • 4 anos – tentam explicar características físicas. Ganham maior consciência de sua estética e, sobre semelhanças e diferenças; • 5 anos - começam a construir identidade étnica de grupo, assim como a sua identidade individual. Começam a perceber as diferenças entre grupos étnicos e raciais; 22 • 6 a 8 anos – tornam-se conscientes da história construída dia- a dia, recebem forte influência da mídia e dos adultos e desenvolvem sentido de pertencimento a um ou mais grupos. Vê-se que, tanto na teoria de Wallon (2001), quanto as fases expostas por Evaristo, deixam claro que, esta fase do desenvolvimento em que estão as crianças durante a Educação Infantil é de suma relevância para a formação da personalidade. Como também diz Vigotsky (2007), a imitação é uma forma muito utilizada pela criança como forma de reconstruir aquilo que observam no outro. Felipe diz que cabe ao adulto ajudar na construção da autoestima infantil, fornecendo a criança uma imagem positiva de si, aceitando-a e apoiando-a sempre que for possível. Segundo os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Étnico-raciais a autoestima que a criança desenvolve é decorrente da estima que se tem por ela. Também Piaget e Bruner (2008) , expressam que as fases do desenvolvimento cognitivo são enriquecidas por estímulos. Bruner explica que a criança tende a representar o mundo com o qual interage em várias etapas que são para ele: *Representação enativa – onde a criança representa o mundo pela ação; • Representação icônica – onde a criança já possui imagem ou representação mental dos objetos; * Representação simbólica – a criança representa o mundo por símbolos; Bruner 2008) diz ainda que, a idade em que passarão pelos estágios vai depender do ambiente em que esteja inserida. A criança deve, desde cedo, ser 23 exposta a estímulos variados, que é o que também explica Evaristo (2006), ressaltando que, as crianças desde pequenas observam as diferenças entre as pessoas e necessitam de explicações simples e reais. Já para Piaget (2008), o desenvolvimento acontece em quatro estágios e , não há rigidez entre as idades em que as crianças atingiram cada fase, o que pode variar individualmente. As fases são: sensório-motor pré-operatório, operatório concreto e operatório formal., mas a criança da Educação Infantil estaria nas duas primeiras fases que são: • Fase sensório – motora (0 a 2 anos) – a criança percebe e age sobre o ambiente • Fase pré – operacional (2 a 6 anos) - a criança desenvolve a capacidade de simbolizar Nesta fase Piaget (2008) cita uma variedade de características do pensamento infantil como: egocentrismo, centralização, animismo, realismo nominal, classificação, inclusão de classe e seriação. Por todas estas características é possível perceber que, é nesta fase que a criança começa a realizar uma série de distinções, devendo-se então, aproveitar para incluir a percepção da diversidade étnica, que é percebida pela criança, porém não é esclarecida pela sociedade. Vigotsky (2007) ainda cita outro ponto relevante para o desenvolvimento social, que é a aquisição da fala. Esta é muito importante dentro do trabalho da educação Infantil, pois através dela a criança planeja como solucionar um problema, fala e ações fazem parte de uma mesma função psicológica mais complexa, é por meio desta que o indivíduo abstrai e generaliza o pensamento. Consoante com o pensamento dos diversos autores e teóricos apresentados e , independentemente do grupo social ou étnico ao qual atendam, é necessário ressaltar que a Educação Infantil deve estar voltada para atender a sua função 24 social de atendimento das necessidades das crianças, como está relatado nas Orientações e ações para a Educação das relações Étnico Raciais(MEC,2006): “Que as instituições de Educação Infantil reconheçam seu papel e função social de atender às necessidades das criança constituindo-se em espaço de socialização, convivência entre iguais e diferentes e suas formas de pertencimento como espaços de cuidar e educar, que permita às crianças explorar o mundo, novas vivências e experiências, ter acesso a diversos materiais, como livros,brinquedos, jogos, momentos para o lúdico, permitindo uma inserção e uma interação com o mundo e com as pessoas presentes nessa socialização de forma ampla e formadora.”(p.35) A LDB Amplia e assegura direitos ao declarar ao declarar que, a Educação Infantil oferecida em creches e pré – escolas é parte integrante da educação básica compreendida como a primeira etapa, pois é neste processo de interação contínua entre o ser e o meio que se constrói o conhecimento. Segundo Cavalheiro (2007), os estudos apresentados indicam que o sistema formal de educação brasileira apresenta poucos pontos para a identificação favorável do aluno negro. Ainda segundo a autora , as pesquisas que se referem a questões étnicas na Educação Infantil são menores ainda. Eliete Aparecida Godoy afirma que, as crianças negras nesta faixa etária ainda se sentem desconfortáveis em assumir sua condição étnica porque, segundo a pesquisadora as crianças demonstram uma interiorização negativa das diferenças raciais. A Educação Infantil deve então, oferecer a alunos negros ou brancos a oportunidade de serem aceitos, respeitados e atuantes dentro da sociedade brasileira. O desenvolvimento psicossocial se dá neste período da vida, de acordo com Piaget,(2010) o conceito do “eu” para o autor é o mais importante de todas as fases da vida. É importante que a criança tenha na escola e em casa modelos que possa imitar para formar uma autoimagem positiva. 25 CAPÍTULO III CULTURA AFRO O VALOR NA EDUCAÇÃO INFANTIL (Uma filha tola ensina sua mãe a como carregar as crianças) Provérbio africano A utilização de uma prática pedagógica que respeite a diversidade cultural, enfatiza uma postura de combate a discriminação e ao racismo no interior da escola. O acesso ao conhecimento, a valorização da cultura e dos saberes sociais, tornam-se a efetivação, a partir da escola de um direito social. Gomes (2006) destaca que é necessário incluir alternativas pedagógicas como: literatura, história, geografia, política, arte, memória também pela perspectiva do povo africano. Cita ainda que,para a escola brasileira a cultura negra ocupa um lugar na vida social e escolar, haja visto que, fazemos parte de uma nação miscigenada. “A cultura negra possibilita aos negros a construção de um ‘nós’, de uma história e de uma identidade. Diz respeito a consciência cultural,à estética, à corporeidade, à musicalidade, à religiosidade, marcadas por um processo de africanidade e recriação cultural. Esse nós possibilita o posicionamento do negro diante do outro e destaca aspectos relevantes ancestralidade.”(p.37) da sua história e de sua 26 Sob esta ótica, há princípios básicos que são valorizados dentro da cultura afro e que são totalmente mescláveis com o processo pedagógico. Ao utilizar os saberes referenciais afro, estamos saindo do lugar comum e, implementando um fazer pedagógico que, favorece o desenvolvimento global da criança, seja a qual grupo étnico pertença, em igualdade de condições galgando alcançar a cidadania plena. Circularidade, oralidade, corporeidade, musicalidade, ludicidadade, ancestralidade, cooperatividade, religiosidade e axé, que são os valores civilizatórios africanos e, plenamente aplicáveis à Educação Infantil. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação da Relações Étnico Raciais(MEC,2005) prevê que: “O ensino de história e cultura afro-brasileira e africana , a educação das relações étnico raciais , tal como explica o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das escolas , nos diferentes níveis e modalidades de ensino como conteúdo de disciplinas, particularmente, Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das demais, em atividades curriculares ou não,trabalhos em sala de aula, nos laboratórios de ciências e informática , na utilização da sala de leitura, biblioteca , brinquedoteca , áreas de recreação, quadra de esportes e outros ambientes escolares.” (p.21) Nota-se então que, os elementos estruturadores das sociedades africanas, são congruentes com as solicitações feitas nos referenciais. Estes elementos são eixos centrais que estruturavam de forma geral, as sociedades africanas, apesar das suas especificidades e, mesmo depois da diáspora, foram mantidos por seus descendentes e são, estruturalmente diferentes dos impostos pelo sistema colonial português a sociedade brasileira. 27 A visão de mundo africana possibilita a integração social dos seus participantes e, aplica-la a Educação Infantil estimulará a integração das crianças. Oliveira(2003) nos explica que , estes elementos criam uma estrutura organizacional comum aos países africanos, originando uma cosmovisão africana que sedimenta a organização social política e cultural. Há conforme o autor, um pensamento sincrônico dos africanos, que constrói um universo, exprime um entendimento holístico do mundo. Consoante com a fala do autor, Medeiros (2010) nos expõe que: “A escola pode contribuir muito para reverter uma lógica excludente se, de fato, se comprometer com uma proposta que valorize postos de vista diferentes e que inclua na sua prática, uma metodologia capaz de desvelar as maneiras encontradas pelas pessoas e por diferentes povos para se expressar, para sentir e para viver as suas vidas.” (p.13) Sendo assim, os elementos que alicerçam a cultura africana, devem entrar na escola para alcançar o ‘status’ de saber socialmente valorizado. Devemos ter uma ação pedagógica que valorize e estimule a ação. Estabelecendo correlação entre os valores civilizatórios africanos e a metodologia proposta para a Educação Infantil, podemos constatar que são associáveis e aplicáveis, visando o desenvolvimento globalizado do indivíduo. Vejamos agora : Circularidade – O círculo é um fator de profunda relevância dentro da cultura africana. Neste, princípio e fim tem a mesma ordem, estão hierarquicamente postos em situação de igualdade. Piaget (2010) cita a necessidade de um ambiente que estimule a interação, então a organização das cadeiras, as rodas de leitura, brincadeiras de roda , como a dança, são exemplos de situações onde, o círculo reforça a ideia de igualdade de condições e possibilidades de participação. Este valor pode ser 28 aplicado à Educação Infantil, com grandes ganhos para o processo, pois são momentos onde a circularidade estimula um trabalho e uma visão diferenciada da atual. Neste processo, todos estão em situação de paridade de localização, possibilidade,atenção, enfim, cria-se um ambiente muito mais acolhedor e para a criança da Educação Infantil. Craidy e Kaercher (2001) comentam que o espaço físico e social é fundamental para o desenvolvimento da criança, pois cooperam para estruturar funções motoras, sensoriais, simbólicas, lúdicas e relacionais. Oralidade – esta metodologia valoriza o diálogo, que é um meio de troca de saberes e tem suma importância dentro da tradição africana. Oliveira (2003) relata que além de ser a expressão do preexistente, a palavra está intimamente ligada a uma dimensão histórica. É aqui que ela liga-se ao conhecimento e sua transmissão. Vigotsky (2007) esclarece que , o momento de maior significado no curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas de inteligência prática e abstrata , acontece quando a fala e a atividade prática , estão em duas linhas completamente divergentes de conhecimento e convergem. Para ele, a linguagem ocupa um papel principal, neste desenvolvimento, pois, além de possibilitar a interação entre os indivíduos, é através dela que o sujeito abstrai e generaliza o pensamento. O povo africano trás uma tradição oral muito forte, a palavra tem muito valor nesta sociedade, pois os saberes são transmitidos pelas gerações através das palavras e, estas foram incorporadas ao vocabulário brasileiro que leva a ter uma sonoridade e sotaque característico do povo brasileiro. A linguagem é um dos aspectos mais perceptíveis da contribuição africana à cultura brasileira, mas que é muito pouco estudado. 29 Corporeidade – Lima(2009) diz que o corpo é a forma como a pessoa expressa a sua personalidade e identidade. As manifestações corporais africanas se davam através da dança e da estética. Em geral as danças são circulares, o que reforça a ideia de igualdade de condições e possibilidades de participação. Além da saúde do corpo, as danças de matriz africana ressaltam a sensualidade e, não se envergonham da vitalidade e da beleza, o que é motivo de celebração. Outro aspecto referente à corporeidade, ainda segundo Lima(2009) é a estética, que para este povo , é utilizada também como forma de expressar diferentes sentimentos e, foi absorvida pelo gosto da nossa sociedade em enfeitar o corpo e o cabelo. A corporeidade, além de lidar com a questão do movimento, tão necessário e importante na Educação Infantil relaciona-se também com a questão da auto-estima que a criança está desenvolvendo. A postura corporal possibilita uma maneira de estabelecer vínculos. De acordo com as Orientações e Ações Educativas para as Relações Étnico-raciais (MEC2006): “Falar em autoestima das crianças significa compreender a singularidade, de cada um em seus aspectos corporais, culturais e étnico-raciais. As crianças possuem uma natureza singular que as caracteriza como seres que pensam e sentem o mundo de um jeito muito próprio.”(p.44) As Orientações (2006) citam ainda que, dependendo da forma como é tratada a questão étnico-racial, as crianças desenvolvem uma postura positiva ou negativa em relação ao seu corpo, sua cultura e o seu jeito de ser. 30 Enfim, passar referenciais positivos referentes a cor da pele, aos traços físicos , aos penteados irá trazer um referencial histórico que deve ser compartilhado, lembrando que, Vigotsky (2010) cita a imitação utilizada pela criança como forma de apropriação de padrões sócio-culturais, portanto, deve-se reconhecer o aspecto integrador e global das vivências corporais que favorecem a construção da auto-imagem. Musicalidade – A musicalidade foi algo muito presente na vida dos africanos trazidos para o Brasil. Foi um dos bens culturais trazidos nos tumbeiros. Também na Educação Infantil o cotidiano é repleto de musicalidade. Conforme Craidy e Kaercher (2001), as crianças aprendem que os sons se combinam e ela via adquirindo a compreensão dos sons que compõem a sua cultura e torna-se capaz de utiliza-los em trocas sociais . As autoras ainda dizem que a música pode transformar-se no momento onde serão criados os primeiros vínculos. O manuseio de materiais sonoros também é de suma importância na Educação Infantil. A percursividade é uma marca dos africanos na nossa música. Os tambores e outros instrumentos de percussão, são importantes por associarem-se aos sons do coração, expressando então uma emoção. Toda esta musicalidade era transmitida no trabalho, na religiosidade e no lazer. No desenvolvimento do trabalho da Educação Infantil a educação musical envolve ritmo, audição e ação, associando-se estreitamente á questão da corporeidade. Ludicidade – A ludicidade é encarada numa perspectiva em favor da vida e é tida como fatos de existência . Trindade (2007) declara que a 31 ludicidade é o princípio do prazer, alegria e gozo e marcam a cultura brasileira pois este princípio garante uma alegria de viver. A ludicidade então se encaixa integralmente ao trabalho da Educação infantil que tem no brinquedo e no jogo fortes meios para o desenvolvimento infantil, pois o brincar é uma atividade própria da criança. Wallon(2007) explica a importância do brincar para a criança e como este também é um processo em evolução: • Brincadeiras são funcionais – são as que tem algum efeito como levantar ou abaixar; • As brincadeiras de ficção – são as que envolvem um faz- de –conta, que é uma atividade de interpretação mais complexa. • As brincadeiras de aquisição – são as que desenvolvem atenção • As brincadeiras de produção - as crianças transformam e recriam o brinquedo. Ainda segundo Craidy e Kaercher(2001) : “A criança expressa-se pelo ato lúdico e é através deste atos que a infância carrega consigo as brincadeiras . elas perpetuam e renovam a cultura infantil, desenvolvendo formas de convivência social, modificando –se e recebendo novos conteúdos, a fim de se renovar a cada nova geração. É pelo brincar e repetir a brincadeira que a criança saboreia a vitória de um novo saber fazer , incorporando-o a cada novo brincar.”(p.103) Declaram ainda que o brincar é uma forma de linguagem, que a criança que utiliza para construir-se como sujeito, às utiliza na construção de normas 32 para si e para o outro, uma vez que, proporciona a troca de pontos de vista, a percepção do outro e cria formas de interação. Vigotsky (2007) declara que o brinquedo fornece ampla estrutura básica para as mudanças da necessidade e da consciência, conforme a criança avança em seu desenvolvimento, vai apresentando também mudanças na sua atividade lúdica. A criança com um nível real e um potencial, então o brinquedo serve como auxiliar para atingir a zona de desenvolvimento proximal da criança e fazê-la avançar em seu processo de aprendizagem. Ancestralidade – é o princípio da transmissão do conhecimento, pois de acordo com as tradições africanas, o processo de aprendizagem acontece durante toda vida, através das trocas em sociedade, pela utilização da oralidade, o conhecimento é transmitido do mais velho para os mais novos. O respeito aos mais velhos é um conceito difundido dentro das comunidades africanas. Inclusive, nas Orientações e ações para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais (MEC,2006) está relatado que o processo de aprendizagem somente pode acontecer através da interrelação entre novos e velhos visto que estes , por terem mais tempo de vida contribuem mais para a sociedade. OLIVEIRA (2003) cita que, sem a tradição não há formação da identidade e que, é no passado que estão as explicações para o presente. Observamos então, que a Ancestralidade relaciona-se ao trabalho da Educação Infantil cooperando com atividades relacionadas ao tempo. Nas comunidades africanas são os griots responsáveis pela transmissão da história do seu povo, este insere-se na dinâmica do seu povo, apreende os significados de cada acontecimentos e os interpreta de acordo com o tempo presente. Além disso, esta contagem de tempo é marcada pelos 33 fenômenos naturais. A ancestralidade também é marcante na religiosidade, no culto aos ancestrais. Oliveira (2003), ainda afirma que: “A ancestralidade, por sua vez, não é a afirmação do eu, egóico, narcisista; na ancestralidade o que conta é a história de um povo, o arsenal simbólico adquirido por este durante o percurso do tempo. Quem conta a história do eu é sua tradição. A história do eu está vinculada à história dos ancestrais. O eu faz parte do todo e é importante justamente na medida em que compõe esse todo, e não o contrário.”(p. 118) Para Evaristo (2007), a criança da Educação Infantil está em fase de construção da identidade e conhecer a sua história. Craidy e kaercher (2001) relatam que as atividades envolvendo tempo devem atender as necessidades biológicas , psicológicas e sócio-históricas, então, baseadas na lei 11645/08 que configura o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena . Em uma sociedade miscigenada como a brasileira, a ancestralidade coopera para o trabalho da Educação Infantil. Cooperatividade/Solidariedade – Não existe na cultura africana com individualismo, tudo é baseado na troca, no coletivo e na cooperação. A cultura africana favorece um caráter de integração social. Segundo Oliveira (2003), este processo de socialização dentre os africanos, é o processo de formação do indivíduo e de sua personalidade, que é um processo coletivo, de responsabilidade social. Nas Orientações, dizem que não existe aprendizagem sem troca, afeto e solidariedade. 34 Cavalheiro (2007) cita que , o contato das crianças de Educação Infantil, com outras de mesma idade , mas oriundas de grupos diferentes, estimula a criação de outras formas de enxergar o mundo. “A Educação é entendida como um processo social, no qual os cidadãos tem acesso ao conhecimento produzido e deles se apropriam de forma a se prepararem para o exercício da cidadania” (P. 21) VigotsKy (2010) atribui uma dimensão sócio histórica do funcionamento psicológico e interação social, na construção do ser humano. A interação do homem com o mundo se dá através do outro, com isso, o cooperativismo envolve a todos os envolvidos no processo educativo, que é de responsabilidade de todos. Religiosidade – Tudo é sagrado e divino na cultura africana e sempre é utilizada como fator de definição e organização social e política das sociedades africanas. Como a escola é laica, a instrução religiosa da criança é de responsabilidade da família, mas a escola deve favorecer atividades que favoreçam o diálogo, o respeito mútuo e a valorização de diferentes culturas, visto que, o objetivo da religião é o de promover a paz. Dentro da sociedade brasileira há uma diversidade muito grande de manifestações culturais que tem cunho religioso, e a sua aprendizagem contribuirá para uma convivência respeitosa e a alteridade . Oliveira (2003) expõe que as religiões africanas são comunitárias e expressam as concepções de vida e de universo. Valoriza a ancestralidade e o conhecimento profundo da realidade social e da natureza, que pode ser aproveitada nos estudo de efeitos da natureza. Pela observação, investigação e experimentação que aproveitem conceitos referentes á 35 natureza, meio ambiente, corpo humano, alimentação, saúde, relaciona-las aos diversos aspectos, e também a questão das religiões de matriz africana como outras formas de manifestação religiosa. AXÉ ( Força Vital ) – Tudo tem energia e é sagrado. Os elementos integram-se entre si e influenciam uns aos outros, transformando-se . O universo africano é integrado e, tem origem no movimento gerado por esta integração a energia da vida. Oliveira (2003) cita que, esta relação não restringe-se apenas a relação do homem com a natureza porém abrange a realidade social. A Força Vital é, para o autor, fonte de energia que rege o universo. Para Pereira (2006), os ancestrais é que exercem a função de interagir com a força vital, trazendo equilíbrio e harmonia global na estruturação social. As integrações de todos os membros envolvidos no processo de ensino aprendizagem da Educação Infantil, fazendo tanto a cultura de escola quanto a cultura escolar transformem a escola em um sistema complexo de relações, onde o esforço para encarar a alteridade , encaminhe o trabalho para chegarmos a uma democracia racial, nos revela Medeiros (2010). “Uma cultura de escola que priorize as experiências vividas e que , desse modo,procura implementar práticas narrativas , lúdicas e de fruição estética no cotidiano escolar.”(p. 14) O autor cita ainda que vários conceitos da cultura africana fazem parte do cotidiano de cada brasileiro, independente da sua origem étnica. Craidy e kaercher (2001) explicam que educação é o processo pelo qual a criança passa não somente a absorver a cultura do seu grupo , mas 36 quando começa a produzi-la e transforma-la , pois a educação acontece em um processo dinâmico. Portanto força vital e educação são correlatas e conversam entre si, já que ambas tratam de transformação e dinamismo , com muito AXÉ 37 CONCLUSÃO Como exposto na pesquisa apresentada, podemos constatar que os valores civilizatórios africanos podem ser aplicados na Educação Infantil, visando um desenvolvimento global da criança. E, com todo axé, que envolve o trabalho da Educação Infantil, que, somente com muita integração, transformação e dinamismo que concluo este trabalho, afirmando que o trabalho com os Valores Civilizatórios Africanos contribui sobremaneira para o trabalho com a Educação infantil. Valor, por ser algo que impulsiona. Civilizatório no sentido de produção de modos de viver , ser e estar no mundo. Os Valores Civilizatórios Africanos mostram que podem e devem ser utilizados na Educação Infantil para começar a introduzir a criança em seu meio cultural, como forma de minorar situações de desrespeito e discriminação que, podendo formar as novas gerações para encarar a diversidade de forma positiva, pelo aspecto da construção e do enriquecimento cultural. Estes elementos norteadores da estruturação das sociedades africanas integram-se entre si, sendo interligados e quase interdependentes, o que trás uma visão muito mais ampla de homem e de mundo, pois esta relação proposta enxerga a tudo e todos pelos mais variados ângulos, e favorece e estimula a interação social. As crianças, na fase da Educação Infantil, estão em fase de interação para gerar o conhecimento e, estes ‘erês’ estão cheios de axé, e nada como 38 dinamismo e interação para transformar uma sociedade. E não estou falando da comunidade negra, estou pensando em sociedade brasileira onde, negros ou não estão inseridos no contexto da diversidade étnica, mas que ainda carrega sérias questões nas relações étnico-racias, que também não são mais apenas os negros que estão como reféns, porém todo ser que seja diferente. Proporcionar a esta criança, lançar um novo olhar ,não somente para as questões étnicas, mas para as questões de estruturação de mundo. Vislumbrar a natureza, a sociedade, saúde, a relação com o outro, enfim , lançar uma nova ótica, um outro ponto de vista e poder fazer pensar, estar estimulando este pensamento é sim função da escola, já a partir da Educação infantil. É bem verdade que há de se melhorar a qualidade e quantidade de atendimento para esta primeira etapa da Educação. A oferta não atende a demanda de nenhuma etnia. As leis são novas, e não basta criar leis, é necessário mudar a cabeça da sociedade para valorizar esta fase da educação. Mas, de qualquer forma os fazeres pedagógicos tem que se renovar, a sociedade tem que se transformar e, os alunos estão cheios de axé ,e nós como educadores temos que utilizar e transformar nosso espaço com muito Axé. A lei 10.639 em seu artigo 26-A, torna obrigatório o ensino de cultura história e cultura afrobrasileira nos estabelecimentos do ensino fundamental, ainda não citando a Educação Infantil. Para realizar a pesquisa, o material encontrado referente ao que tange a Educação Infantil, foi bastante escasso, mas se pensarmos em políticas públicas voltadas para a Educação Infantil são poucos, os investimentos ainda são parcos em nosso país. Ainda não há um pensamento voltado para investimentos em Educação de base em nossa 39 sociedade como também não há um pensamento voltado para a reconstrução da visão do negro e o entendimento de diversidade que é constituinte de nosso país. Por acreditar na educação de base como solução dos problemas educacionais brasileiros e, como forma de reestruturar uma sociedade colonial, acostumada a utilizar um padrão social como único, porém que desconhece a sua formação e que,nem tão pouco, aprendeu a respeitar-se. O trabalho com valores civilizatórios africanos pode sim contribuir para o desenvolvimento global da criança como também para inseri-la em um contexto de respeito pelo diverso que compõe a sociedade brasileira. Como alguns dos grandes pensadores em educação citam a importância do mundo social para o desenvolvimento da criança, nos embuti a responsabilidade de apresentarmos esta sociedade em que está imersa, que é uma sociedade de constituição multi – étnica em sua constituição. Com valores e influências diversas, esta formação deve ser aprendida sob um enfoque positivo, com um olhar que valorize a todos, e os valores civilizatórios africanos que, até por seu posicionamento circular, não são excludentes e, contrariamente a isto, colocam a todos com ampla e igualitária possibilidade de participação. Pela sua ancestralidade resgata, às novas gerações a sua história, emergindo-as num contexto de respeito pelo que passou, uma atitude de busca pelo seu passado conquistando um novo olhar para o contexto onde está inserida. Repleta de energia, que é o AXÉ que falta, ao processo educativo brasileiro. 40 BIBLIOGRAFIA ABRAMOWICZ/BARBOSA/SILVÉRIO, Anete; Lúcia Maria de Assunção; Valter Rogério. 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