INVESTIGAÇÃO A NEGÓCIO NA DEFESA
CHEFE DE GABINETE DE PORTAS NO GOVERNO ESTEVE SOB ESCUTA
Nº 206 – 10 A 16 DE ABRIL DE 2008 – € 2,80 (CONT.)
CRIME NO JET SET
OS ESQUEMAS
DE MARIA
DAS DORES
NA PRISÃO
Como a socialite passou os últimos 14 meses
na cadeia, depois de o marido ter sido
assassinado: conseguiu ganhar a confiança
de uma guarda prisional, trocou cinco vezes
de advogados e fez tudo para controlar
uma herança de 2 milhões de euros
BRIDGE, VELA E NEVE
HISTÓRIAS DE HIPOCONDRÍACOS
Como se distraem os antigos
administradores do BCP
Pessoas que vivem
à procura de doenças
OS ANOS DE SALAZAR
VOLUME 7 POR APENAS € 7,95
Destaque
REPORTAGEM. OS ÚLTIMOS 14 MESES DA EX-SOCIALITE
AVIDA
DE MARIA
DAS DORES
ATRÁS DAS
GRADES
Nos últimos 14 meses, teve duas grandes preocupações. Uma
era a sua vida na cadeia: tentou ter um tratamento especial,
ganhou a confiança de uma guarda e fez exigências
mirabolantes. Outra era a vida cá fora: escreveu cartas com
pedidos e ameaças a familiares e amigos e lutou pelo controlo
sobre uma herança de 2 milhões de euros. Por NunoTiagoPinto
! DIAS NA CADEIA
“Rosinha, (...) A Dr.ª
Judite emprestou-me
€ 22 que agradeço que
lhe pague que logo que
chegue a casa lhe pagarei. O meu advogado, o Dr. Nabais, está
a tratar da pulseira
electrónica, penso que é
mais 15/20 dias. Acredite que estou inocente. Deusvaiajudar-me.
AamigaMariaCruz”
Carta escrita
a 14/2/2007 para Rosa
Capelo, a quem queria
vender um carro
Quando lhe passavam
à frente na fila para o
telefone, o máximo
que Maria das Dores
Correia Alpalhão Pereira da Cruz conseguia era provocar as
gargalhadas das outras reclusas. Seja porque os protestos eram
feitos de formaeducada ou por partirem de
alguém que nos primeiros meses parecia
querer transformar a
estadia no Estabelecimento Prisional de Tires numas férias. De
acordo com o relatório de perícia de personalidade realizado
pela Direcção-Geral
de Reinserção Social
(DGRS), aque aSÁBADO teve acesso, Maria
das Dores, 48 anos,
“procurouinicialmente que lhe fosse conferido um estatuto diferenciado, com privilégios relativamente às
restantes reclusas”.
Chegou a pedir sushi,
cremes e artigos de
beleza. Até telefonou
transferida pouco depois, numarotação de
directores. Hoje lidera
o Estabelecimento Prisional da PJ, em Lisboa, e recusou falar
com a SÁBADO.
Anovarotinadiária
também foi uma alteração brusca. As detidas levantam-se às
7h15, saem da cela
uma hora depois e tomam o pequeno-almoço às 8h30. Entreas
9he as 11hpodemandar pelo recreio. Foi aí
que Maria das Dores
teve um dos últimos
problemas, a 8 de Fevereiro deste ano. Várias reclusas estavam
a jogar ao “mata” e,
quando foi atingida
por uma bola, Maria
das Dores terá protestado. As companheiras não gostarame, segundo os seus advogados, vandalizaram-lhe a cela. De acordo
com o relatório da
DGRS, Maria das Dores não teve qualquer
sanção disciplinardesde que foi detida no
início de 2007, acusada de mandar matar o
marido, Paulo Pereira
da Cruz, no dia 20 de
Janeiro do mesmo
ano. Houve, contudo,
“um processo de averiguações, entretanto
arquivado”.
As reclusas almoçam às 11h45 e a partir do início da tarde
podem dedicar-se a
actividades ou não fazer nada. É o caso de
Maria das Dores, que,
mais de um ano depois, continua sem
participar na vida pri-
sional. Prefere arranjaro cabelo e as unhas
e, segundo o filho
mais velho, David
Motta, “ajudar outras
reclusas aescrevercartas”. Jantam às 17h45
e às 19h voltam às celas, de onde só saem
no dia seguinte.
Deve ser neste período que Maria das
Dores escreve um diário que planeia transformar em livro. A
obra terá sido oferecida a várias editoras e
David Motta garante
játerumapropostade
compra. “Só não aceitei porque teria de ser
eu a passar tudo para
computador”, diz.
Desse diário deverá constar a tentativa
de suicídio da semana passada. Na madrugada de sexta-feira, Maria das Dores
tentou enforcar-se na
cela com uma écharpe. Não conseguiu e
fo i le vad a ao p s iquiatra do Hospital
Prisiona S. João de
D e us , e m C axias ,
que decidiu internála. Foi um regresso à
ala psiquiátrica onde
esteve entre 19 de
Abril e 21 de Agosto
e de 6 a 12 de Novembro de 2007.
David é dos poucos
que a têm visitado às
terças-feiras àtarde ou
aos sábados de manhã. Leva-lhe fruta,
pão integralouleite de
sojaporque amãe não
gosta da comida da
cadeia – emagreceu
muito desde o início
do julgamento. José
Castelo Branco não
!
parao dietistaFernando Póvoas para saber
se ele dava consultas
na prisão. “Disse-me
que estava com excesso de peso e que tomava antidepressivos
que engordavam”,
le mb ra o mé d ico .
“Respondi-lhe que a
atendiamas só se viesse ao consultório.” Estes esquemas valeram-lhe alcunhas
como “tia”, “dondoca” e “jetset”.
As outras detidas
também interpretarammalos pedidos de
ajuda da socialite para
tarefas básicas e obrigatórias, como fazer a
cama. O acidente de
viação que sofreu a 1
de Abrilde 2000 levou
à amputação de parte
do seu antebraço esquerdo e a uma incapacidade de 83%.
Hoje, Mariadas Dores
precisade auxílio para
quase tudo – incluindo vestir-se. Uma
companheira de cela
ajudou-a no início.
Mas as duas foramseparadas depois de terem sido publicadas
fotografias de ambas
na revista Lux.
Nemavisitade José
Castelo Branco à prisão, em 13 de Fevereiro do ano passado,
quatro dias após asua
detenção, a ajudou.
Pelo contrário. Realizada fora do horário
normal – e aprovada
pelaentão directorada
cadeia, Fernanda Aragão –, a visita acabou
em forma de entrevista no jornal 24horas.
Fernanda Aragão foi
voltou a Tires. Os ex-amigos cabeleireiros
Duarte Menezes e João Chaves nunca lá foram. AoutrararavisitaéadeAnaGraça, funcionáriadaÁguas de Portugal, que testemunhouaseufavoremtribunal.Contactadapela
SÁBADO, não quis prestar declarações.
Aoiníciodatardede20deJaneirode2007,
Maria das Dores encontrou-se com o marido, Paulo Pereira da Cruz, à entrada do n.º
11 da Av. António Augusto Aguiar, em Lisboa, para conversarem sobre o divórcio. A
pretexto de uma alegada claustrofobia, subiu pelas escadas enquanto o marido foide
elevador. O engenheiro,sócio eadministradordaCampotec, foio primeiro achegarao
apartamento. Lá dentro estavam João Paulo SilvaePaulo Horta. Apanhado desurpresa,terásido morto comumamarretadecarpinteiro. Maria das Dores foi presa e acusadade terordenado o homicídio. Asentença
deverá ter sido lida esta quarta-feira, já depois do fecho desta edição.
Cinco dias depois de terchegado àprisão
deTires,MariadasDoresaindaesperavavoltaracasacompulseiraelectrónica. O pedido
foifeitopeloseuadvogadodeentão,JoãoNabais,ebaseava-senopressupostodequenão
46
Paulo Cruz e Maria das Dores foram
casados quase 13 anos. O engenheiro
e sócio-gerente da Campotec foi
assassinado no apartamento que tinham
alugado no 3º andar do número 11 da
Av. António Augusto Aguiar, em Lisboa
FOTOS ARQUIVO PESSOAL
!
DESTAQUE
havia quem cuidasse do filho mais novo, o
único do casamento com Paulo Pereira da
Cruz. David Motta estava nos Estados Unidos,os avós maternos tinhammorridoe,segundoaarguida,ospaternosnãoseriampróximos dacriança. Estapossibilidadedesapa-
receu com o regresso de David Motta a
Portugal e com aentregado rapaz aos avós.
Avidaque tinhaantes dadetenção continuouairtercomelaaTires. A14deFevereiro de 2007, Mariadas Dores recebeu avisita
daadvogadadeRosaCapeloparatentarconcluir um negócio combinado antes da sua
prisão. As duas conheceram-se em Leiria,
uma semana antes da morte de Paulo Cruz.
O suficiente para, no dia 22, pouco depois
do homicídio, Rosa Capelo a ter visitado no
apartamento do Lumiar: “Mostrou-me fotografias deNovaIorqueecontou-mecomo
eramfelizes”, lembraàSÁBADO. Passouair
ao Lumiar quase dia sim, dia não. Um dos
seus funcionários chegou a mudar os cortinados. E foi entre chávenas de chá que Mariadas Dores lhepropôs avendadeumMercedes Classe Apreto e, de imediato, lhe passou as chaves para a mão.
As duas combinaram ir ao banco para
transferir a posição no leasing do automóvel
namanhãde 8 de Fevereiro. Mas quando, às
8h30, Rosachegouao Lumiar, recebeuanotícia do porteiro: “A senhora foi presa pela
PJ.” Foiaprimeiraasaber dadetenção.
Umahoraemeiaantes,osagentesdaPJencarregues da investigação tinham tocado à
campainhadocondomíniofechado. Umdos
alegadoscúmplices,JoãoPauloSilva,erapreso àmesmahora. Paulo Hortaseriaapanhadodias depois emEspanha. Fontes dainvestigaçãodisseramàSÁBADOqueaviúvaficou
surpreendida com a chegada da PJ. E a sua
calmaaumentouaconvicçãodosinspectores:
“Quando seestáinocentenão serecebebem
os agentes às 7h.” Foi levada para a sede da
10 ABRIL 2008 SÁBADO
Carta para Rosa Capelo, escrita em
Tires a 14 de Fevereiro de 2007
GomeseJoãoFerreiradaCosta,queapresentaram uma queixa contra Maria João SantananaOrdemdosAdvogados.Oprocessoaindadecorre. Cercadeseis meses depois,os juristas foram substituídos pela advogada
oficiosa Ana Valentim – que iniciou o julgamento e foi dispensada por divergências
quantoàestratégiaaseguir.Nenhumdostrês
quis falar à SÁBADO. Na audiência de 30 de
Janeiro, Mariadas Dores apresentouaactual
equipadedefesa: Fernando CarvalhaleBrito
Ventura, que lhe deram apoio no dia do homicídio. O seuescritório ficaporcimado andar onde Paulo Cruz foiassassinado.
" OS CONFLITOS COM A FAMÍLIA
DE PAULO PEREIRA DA CRUZ
“Eu, Maria das Dores Correia Alpalhão Pereira da Cruz, viúva de Paulo José de Margarido Pereira da Cruz, pela 2.ª vez lhe escrevo, no
sentido de solicitarque não estimule ou demova
o seu filho João Amílcara dirigir-se à loja do cidadão dos Restauradores (...) solicitando o fecho da luze gásde prédiosurbanosque são propriedade minha (...).
Maria Pereira da Cruz
Carta dirigida ao sogro,
José Pereira da Cruz, em 20 de Maio de 2007
Nos meses seguintes à prisão de Maria
das Dores, as contas de luz e gás do apartamento do Lumiarcontinuaramachegarem
nomedePauloPereiradaCruz. AtéqueJoão
Cruz decidiu cancelar os contratos de abasPUB
!
A Drª Judite emprestou-me
22€ que agradeço que lhe
pague que logo que eu chegue a casa lhe pagarei.”
PJ,naRuaGomesFreire,ondeligouparaoadvogado João Nabais. A partir das 10h foi interrogadanasalada1.ª BrigadadaSecção de
Homicídios. Pararam para almoço e à tarde
foipresenteaojuizdeinstruçãocriminal,que
decretouaprisãopreventiva. EntrounoEstabelecimentoPrisionaldeTiresentrea1heas
2hdamadrugadade 9 de Fevereiro de 2007.
Foi-lhe atribuído o número 325.
Com o carro na sua posse, Rosa Capelo
tentou tratar da transferência de propriedade. Mariadas Dores assinouumadeclaração
a “ceder a sua posição contratual do leasing
do Mercedes ClasseA”. Mas foiinútil. O carro está em nome do marido. “De vez em
quando ponho-o a trabalhar”, diz Rosa Capelo. Haviaaindaumaúltimasurpresa. “Ela
conseguiu convencer a minha advogada a
emprestar-lhe 22 euros e ainda tive de lhe
pagar”, conta entre risos.
No fimdo primeiro mês nacadeia, Maria
das Dores viu-se envolvida num esquema
ainda mal explicado de troca de advogados.
João Nabais era o seu representante. Mas,
entre 21 de Fevereiro e 2 de Março, Maria
João Santana surgiu em vários jornais e revistascomoanovaadvogadadeDavidMotta
e damãe. Ajuristagarante que areclusa325
pediu parafalar com elaquando estavaavisitar outra detida em Tires. “Conversámos
duas horas e passei a representá-la.” David
MottadizqueMariaJoãoSantanasefez“passar por associada” de João Nabais.
O advogado confirma a versão de David
Motta e diz que já estava insatisfeito com o
caso: “Pediàsenhoraqueescolhessealguém
para me substituir.” Indicaram-lhe Catarina
MARTINS ALVES/CM
DESTAQUE
!
Durante as alegações finais, João Paulo Silva
pediu perdão aos familiares de Paulo Cruz
tecimento. Em simultâneo, os pais da vítima foram avisados por vizinhos de que DavidMottaestariaatirarobjectos emóveis do
apartamento. Foi pedida “uma providência
cautelar de arrolamento dos bens daherança, preliminar ao processo de inventário”,
explica Francisco Dias Antunes. O tribunal
deu-lhesrazão.Às10hde31deMaiode2007,
os oficiais dejustiçaFernando Gomes eJoão
Paixão, acompanhados de dois agentes da
PSP,deumserralheiro,DiasAntunes,deJosé
Pereira da Cruz, da mulher, Maria Manuel,
dos filhos, João e AnaLuísa, dos respectivos
companheiros e de amigos, tocaram à campainhado apartamento. Só ouviram os latidos de um cão. O serralheiro começou a arrombar afechadurae, segundo várias testemunhas, a porta blindada só se abriu após
umgrandeesforço. DooutroladoestariaDavidMottaafazerforçaemsentidocontrário.
Este desmente: “Estava a dormir e quando
meti a mão à porta ela abriu-se.”
O apartamento estava em obras. David
Motta diz que preparava a casa para o regresso damãe e do irmão. Haviaparedes às
cores,entulhoeroupas amontoadas nochão
eocofredePauloPereiradaCruzvazionuma
das duas casas debanho. JoãoCruzdisseem
tribunalquedesapareceumobíliaebens valiosos. Não encontraram roupas do menor
nem da vítima. Havia uma divisão cheia de
roupade mulherque não serviriaàsocialite.
“Depois, só um roupeiro com dezenas de
óculos desol,camisas esapatos alinhados”,
conta. “Faltavam as duas guitarras do meu
irmão, uma garrafeira que valia mais de 5
mileuros eacolecção dediscos devinilcom
primeiras edições de LedZeppelin, Whitesnake ou Jimi Hendrix.”
48
O ambiente esteve pesado até às 17h. O
único que apareceuparaacompanharDavid
Motta foi o responsável pelas obras – com
quem David foi a Nova Iorque entre 19 e 23
de Abrilde 2007. Chama-se MiguelPeres e é
filhodasubchefedasguardasprisionaisdeTires,LisetePeres.Terásidoeleatransportarobjectos do Lumiare aconduziro Volkswagen
PassatdeMariadasDores. Namadrugadade
7 de Julho, o carro (comprado ao abrigo da
leidos deficientes) foiarrestado pelaPSP no
bairro 16 de Novembro, em Tires.
David Motta não vê qualquer problema
nestarelação: “Aminhamãecomentoucom
a guarda que eu precisava de alguém que
me ajudasse nas coisas de casae que andassecomigo decarro porquenão conduzo. Ela
disse-lhe que o filho estava desempregado
e era a pessoa ideal.”
Umdos esquemas mais insólitos voltoua
10 ABRIL 2008
Carta a José Pereira da Cruz enviada
a 20 de Maio de 2007
ALEXANDRE AZEVEDO
envolver o Volkswagen Passat. Em Maio de
2007, o banco enviouumemissário àprisão
paraconvencê-laaentregaroautomóvel.“Parecia a directora: pintada, maquilhada, penteada, bem vestida. Tentou fazer-me acreditarqueaimprensaatinhacondenado”,dizo
funcionárioque,àfrentedeMariadasDores,
telefonou a uma colega da sede. A arguida
Maria das Dores terá perguntado a José Pessoa
se conhecia alguém que matasse o marido
SÁBADO
encaminhouoassuntoparaoadvogado.Dias
depois, João Cruz recebeu uma chamada de
uma mulher que se identificou como sendo
do banco. Queria saber onde estava o veículo para Maria das Dores o entregar. “Depois
pensei: como é que eles tinham o meu telemóvel?”,recorda. “Ligueiparaonúmeroque
medeueestavadesligado.” No banco,informaram-no que a referida mulher existe (é a
mesmaqueo funcionário contactouàfrente
de Mariadas Dores), mas não lhe telefonou.
Até hoje não tem certezas sobre quem o fez.
Umdiadepois do arresto do Lumiar, José
PereiradaCruzrecebeuumachamadaaalertá-lo para uma tentativa de arrombamento
do apartamento. Ligou para o 112 e chegou
algum tempo depois da PSP. Segundo a denúncia apresentada na esquadra de Telheiras,aqueaSÁBADOteveacesso,aoentrarno
edifício José Cruz cruzou-se com Ana Graça,
que gritou: “Vemaío paido morto.” Junto à
portaestavaMiguelPerescomumarebarbadora. Foram ambos identificados pelaPSP.
Nessemesmomês,foifeitaumadenúncia
àDGSPeàInspecção-GeraldeJustiça(IGJ)sobrearelaçãoentreMariadasDoreseLisetePeres.Asubchefedasguardasprisionaisfoialvo
de um processo disciplinar, proibida de ver
Mariadas Dores e afastadado Pavilhão n.º 1
deTires. Entretanto,foi-lheseraplicadauma
sanção disciplinar. ADGSP não revelaquala
pena aplicada por “estar em prazo de recurso”–aSÁBADOsabequeterásidoumdosprimeiros despachos darecém-nomeadadirectora-geraldosServiçosPrisionais,ClaraAlbino. AIGJ ainda vai avaliar o caso e decidir se
serão precisas mais investigações.
Entretanto, David Motta e Miguel Peres
(que a SÁBADO não conseguiu contactar)
afastaram-se. “Eleficouassustadocomoque
estavaaacontecer àmãe”, diz DavidMotta.
Emrelaçãoaocrime,a famíliade PauloPe-
!
MARTINS ALVES/CM
Gostaria que aconselhasse o
seu filho a não voltar a praticar tais atitudes, caso contrário serei obrigada a agir
de uma outra maneira.
Maria das Dores nunca
desviou o olhar para os
familiares e amigos de Paulo
Pereira da Cruz. Várias vezes
surgiu em tribunal com um
colar de pérolas que
pertenceu à avó materna
do marido. Paulo Horta jurou
que não foi ele a matar o
engenheiro da Campotec e
também pediu perdão à
família da vítima
DESTAQUE
David Motta colocou várias imagens suas no
sítio da Internet dedicado a carteiras The Purse
Forum (www.forum.purseblog.com). Alguns
eram recortes de imprensa que o filho de Maria
das Dores garante serem de paparazzi
reiradaCruznuncaescondeuassuassuspeitas sobre Maria das Dores. João Cruz, irmão
da vítima, foi mesmo dos primeiros a ir depor voluntariamente à PJ. Constituíram--se
assistentes do processo e o seu advogado,
Francisco Dias Antunes, foi o único a pedir
25 anos para os três arguidos – o MP pediu
ao colectivo paraser “implacável”.
Nas alegações finais, Dias Antunes recordou o testemunho do taxista José Pessoa,
queduranteumano fez vários serviços para
Mariadas Dores eaquemelaterápergunta-
Guerra pela
herança
ESTES SÃO OS BENS
MAIS VALIOSOS DEIXADOS POR
PAULO CRUZ
50
do seconheciaalguémquepudessemataro
marido. Também ele foi à PJ por sua iniciativa. “Acordava de noite a pensar naquilo”,
diz. À SÁBADO, conta porque é que deixou
de trabalhar para a socialite: “Um dia a mãe
dela entrou no carro a tremer e desatou a
chorar. Contou--mequeestavanacozinhae
queadoutoraatinhaatirado ao chão, apontado umafacae dito que amatavase elanão
saísse láde casa.” Mais tarde recebeuumtelefonema de Maria das Dores para a levar à
Av. António Augusto Aguiar. “No caminho
perguntou-me se a mãe me tinha contado
alguma coisa. Respondi que não e ela dizme: ‘Já viu que estava a fazer um pão com
manteiga e ela começou aos gritos a dizer
que a queria matar.’ À chegada, pedi-lhe o
dinheiro que me devia.”
Emtribunal, o ambiente foitenso ao longodos seis meses dejulgamento. Familiares
eamigosdePauloPereiradaCruzesperavam
algum arrependimento de Maria das Dores
– mas isso nunca aconteceu. Nem sequer
olhou para os sogros e cunhados ao percorrerocorredorquedáacessoàsaladeaudiências da7.ªVaraCriminal, no 2.ºandardaBoa
€ 1.250.000
Seguro de vida
É a maior fatia do bolo e terá sido
o móbil do crime. Quem tiver a tutela do menor
deverá administrá-lo.
Não há lugar a citação
prévia, devendo proceder
à penhora em bens do(s)
Executado(s).
Autorização de penhora dos bens
de Maria das Dores
Hora. Atravessavaobatalhãodefotógrafos e
público com ar altivo e só sorria para David
Motta–quandoeleestava. Apareceusempre
elegante e de cabelo arranjado. O uso de um
colar de pérolas revoltou a família e amigos
dePauloPereiradaCruz: ajóiaeradaavómaternadavítimaefora-lheoferecidapelamãe.
Osmétodosdadefesapassaramasercontestados pelaassistência desdequeFernan-
€ 500.000
Apartamento no Lumiar
Situado num condomínio fechado, na zona do Museu do Traje,
é o imóvel mais valioso da
herança. É um T4.
€ 200.000
Casa no Algarve
Localizada na Vila Marachique,
em Alvor, era o destino de férias
e de fim-de-semana preferido de
Paulo Cruz e da família.
10 ABRIL 2008 SÁBADO
!
!
FOTOS ARQUIVO PESSOAL
Fotografia tirada durante o arresto dos bens da
casa do Lumiar por ordem judicial (à direita)
DESTAQUE
Os amigos socialites
JOÃO CHAVES CABELEIREIRO
FORAM APRESENTADOS COMO OS AMIGOS
DO JETSETDE MARIA DAS DORES. MAS APÓS
A SUA PRISÃO AFASTARAM-SE DE IMEDIATO
Refere-se a Maria das Dores como “a assassina” e nem quer ouvir falar dela
LEVOU DAVID MOTTA A PARIS E A EVENTOS DE MODA
JOSÉ CASTELO BRANCO SOCIALITE
CONHECEU MARIA DAS DORES ATRAVÉS DE DAVID MOTTA
DUARTE MENEZES CABELEIREIRO
CHEGOU A PASSAR FÉRIAS COM O CASAL NO ALGARVE
"
Não se falam desde que Maria das Dores
foi presa. Nem sequer por telefone
do Carvalhal e Brito Ventura começaram a
representar a arguida. Era convicção geral
que a dupla queria prolongar o julgamento
– o queestes negam. O ponto alto deu-sena
sessão de 12 de Março. Nessa manhã, Brito
Ventura começou por pedir que os autores
daperíciadepersonalidadeaos arguidos fossem chamados a tribunal. O juiz recusou. O
advogado repetiu o pedido e invocou uma
nulidadeprocessual.Novarejeição.BritoVenturainvocouumincidentederecusadojuizpresidente. Carlos Alexandre decidiu continuar a sessão. O advogado pediu a palavra:
“A defesa lavra protesto em acta e assume a
posição de que se irá retirar da sala de audiências.” Levantou-se,tirouatoga,vestiuo
casaco, agarrou na pasta preta e saiu.
! AS PENHORAS
“Fica deste modo notificado de que nos autos
supra-identificadosnão há lugara citação prévia, devendo procederà penhora em bens do(s)
Executado(s)”.
Autorização da penhora dos bens de Maria das
Dores em benefício de uma empresária de Leiria
52
Além do julgamento pela morte do marido,Mariadas Dores foialvodepelomenos mais dois processos pordívidas. Umdeles culminounapenhoradecercadeumterço dasuareforma, porordemdo 3.º Juízo de
ExecuçãodeLisboa. Sãomenos 289,30euros
acairnacontadequeétitular. Adecisão teve
origemnumaacção interpostaporumaempresária de Leiria a 6 de Agosto do ano passado. Será assim até ficar saldada uma dívi-
da penhora. David Motta também afirma
desconhecê-la: “A reforma da minha mãe
paga a prestação do apartamento e vários
encargos de saúde.”
Em risco esteve ainda a moradia na Vila
Marachique, no Algarve. Em causa estaria
uma dívida de 7.500 euros às Finanças de
Portimão pelo não pagamento do Imposto
MunicipaldeTransmissões. A2
de Setembro de 2006, Mariadas
Dores terá pedido o pagamento
em prestações de 500 euros. As
mensalidades não foram pagas
e o imóvel foi avaliado para penhora. O processo não avançou
porque a família de Paulo Pereira da Cruz
descobriu a dívida e pagou-a.
Cerca de um terço da reforma
de Maria das Dores foi
penhorada por ordem judicial
da de 6 mil euros – quantia que Maria das
Dores teráconvencidoaqueixosaaentregarlheemtrocadapromessadelevaroseufilho
toxicodependenteparafazerumadesintoxicação nos Estados Unidos.
Como garantia, aempresáriarecebeu da
viúva de Paulo Pereira da Cruz o cheque
pré-datado n.º 7716362783, do Banif, no
valor de 6.450 euros. Os 450 euros a mais
seriam, segundo fonte próxima, “para pagar o fato de cowboy que a doutora levou
para o filho e as máscaras de Zorro que ela
disse serem para os meninos pobres do
Colégio Planalto”.
Contactados pelaSÁBADO,os advogados
de Maria das Dores dizem que não sabiam
! AHERANÇADEPAULOPEREIRADACRUZ
“Lembras-te, quando o paifoipara o céu perguntaste-meseeutambémiria,equeseassimfosse, querias vivercom o David? Sim, meu amor, é
com o David que tens de ficar, em nossa casa, no
teuquarto,natuaescolaeécomoDavidquevais
aprendera serum grande homem . (...)”
Mãe Maria
Carta publicada na revista Caras
a 3 de Março de 2007
10 ABRIL 2008 SÁBADO
"
FOTOS D.R.
Entrevistou-a em Tires e nunca mais voltou.
Estará a ajudar David Mota a sobreviver
FOTOS D.R.
Maria das Dores era
frequentadora de
festas do social e
chegou a aparecer
em revistas. Aqui
com a mulher de José
Castelo Branco, Lady
Betty Grafstein
!
A família Pereira da Cruz algum tempo antes
do homicídio do engenheiro da Campotec
No centro de todo o processo está o único filho do casamento entrePaulo Pereirada
Cruz eMariadas Dores, agoracom8 anos. O
menoré achave do que terásido o móbildo
crime, segundo a acusação: 1,25 milhões de
euros do seguro de vida feito pela Campotec,alémdorestodaherançaconstituídapelo
apartamento no Lumiar, a casa no Algarve,
carros e acções. O totalrondaráos 2 milhões
de euros. Não existe umvalorfinalporque o
processo de inventário não terminou.
Casada em comunhão de adquiridos, à
partidaMariadas Dores teriadireito ametadedo património. Os outros 50% seriamdivididos com o filho mais novo. Na prática,
não deveráserassim. “Vamos instaurarum
pedido deindignidadesucessória”, diz Dias
Antunes. Caso seja considerada indigna de
herdar,orapazpassaaterdireitoatudo. Resta a metade dos bens do casal. Nesse sentido, a família de Paulo Pereira da Cruz apresentouumpedido deindemnização cívelde
678.758 euros em favor da criança. Em caso
de condenação, Maria das Dores terá de abdicar dos seus 50% para pagar.
Desde então, a vida do filho de Maria das
Dores mudou radicalmente. Passou a viver
com os avós nos Olivais e teve direito a roupae brinquedos novos, porque quase todos
os antigos desapareceram. Começou a fazer
desporto, abrincarcom os primos e amigos
e tornou-se um aluno assíduo.
Não voltou a ver a mãe. Nem em fotografias, uma vez que as que havia na casa
dos avós foram deitadas fora. O Tribunal
de Família decretou um regime de visitas
quinzenais, que nunca foi cumprido. No
início, seria a irmã de Maria das Dores a
levá-lo àcadeia, mas VenerandaCorreiaAlpalhão indicouAnaGraçano seulugar. Mas
54
esta amiga da arguida nunca levou a criançaporque, segundo DavidMottae os avós,
elaterárecusado ver amãe. Neste momento, as partes aguardam por uma avaliação
psicológica sobre o impacto que as visitas
poderão ter. Ao que a SÁBADO conseguiu
apurar, esta avaliação está marcada para a
primeira quinzena de Maio.
David Motta, que Mariadas Dores queria
que tomasse conta do filho, não tem condi-
ção,contactarFelipaGarnel,directoradaLux.
E até a directora da VIP, Cristina Ferreira Almeida,desmentiuDavidMotta. “Aúnicacoisa que recebeu foi o pagamento de uma fotografiaantigae foram uns 100 euros. Nunca pagámos por entrevistas.”
DavidMottafezaindaalgumdinheirocom
a venda de objectos da casa, a par dos 150
mil euros que transferiu da conta do pai e
que deuorigemaumaqueixa-crime que espera acusação. “Não falsifiquei
assinaturas para transferir o dinheiro.Acontaeraconjunta”,diz.
Masodinheiroeraseu?“Não. Era
dele.” E foi gasto.
No último ano, David Motta
só conseguiu ver o irmão duas
vezes: uma no colégio e a outra alguns dias
doNatal,quandocomAnaGraçatentouleválo a uma das visitas quinzenais e a criança
não quis ir. Foramtambémraras as ocasiões
emqueMariadas Dores conseguiufalarcom
o filho por telefone. Enviou-lhe cartas a jurarinocênciae o seuamor. Apesardisso, foi
impossível mantê-lo afastado do processo.
O caso tornou-se um dos mais mediáticos
dos últimos anos e afotografiadamãe aparecesucessivamentenas televisões, revistas
e jornais. Tudo o que temsido escrito estáa
ser arquivado pela família com a intenção
de lhe sermostrado no futuro “parasabero
que aconteceu”. !
Nunca mais viu o filho mais
novo. O rapaz terá recusado
ir visitá-la à prisão
ções para o fazer. Não trabalha (“Ninguém
me dá emprego”), vive no apartamento do
Lumiar sem pagar condomínio (“Devemos
uns 15 mil euros”) e só consegue saldar as
contas de água, luz, gás e Internet graças ao
que chama de “balões de oxigénio”: a ajuda
deamigos,“uméoJoséCasteloBranco”,eao
dinheiro alegadamente ganho em entrevistasefotografiasparapublicaçõescor-de-rosa.
“Recebi entre 2 mil e 4 mil euros da Caras,
Lux, VIP, entre outras”, diz. “Já que faço papel de palhaço, ao menos ganho com isso.”
Contactada pela SÁBADO, a directora da Caras, Luísa Jardim, não quis fazer comentários. Não foipossível, até ao fecho destaedi-
10 ABRIL 2008 SÁBADO
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os esquemas de maria das dores na prisão