ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 AVALIAÇÃO DA BIODEGRADAÇÃO DE LODO DE INDÚSTRIA CÍTRICA NO SOLO ATRAVÉS DO ENSAIO DE RESPIROMETRIA Bruno Coraucci Filho(1) Engenheiro Civil, formado pela Faculdade de Engenharia de Limeira (UNICAMP), mestre em Engenharia Civil pela Escola Estadual de São Carlos (USP), doutor em Hidráulica e Saneamento pela escola Politécnica FOTO de São Paulo (USP), professor Assistente no Departamento de Saneamento e Ambiente, Faculdade de Engenharia Civil (FEC), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Antonio Roberto Siviero Biólogo, formado pela Faculdade de Ciências Biológicas de Araras, mestre em Ciências Biológicas - Área de Microbiologia, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), doutorando na Área de Microbiologia Aplicada, Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista (UNESP) Campus de Rio Claro, professor Msc, Colégio Técnico de Limeira - COTIL - (UNICAMP). Luciana Carla Ferreira de Souza Tecnóloga em Saneamento pelo Centro Superior de Educação Tecnológica - CESET, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Anjaina Fernandes de Albuquerque Tecnóloga em Saneamento pelo Centro Superior de Educação Tecnológica - CESETmestranda na área de Saneamento e Recursos Hídricos, Faculdade de Engenharia Civil, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Endereço(1): Cidade Universitária “Zeferino Vaz” - Distrito de Barão Geraldo - Campinas, SP - CP: 6021 - CEP: 13083-970 - Brasil - Tel.: (019) 239-7813 - Fax: (019) 239-4823. RESUMO Comparou-se o desempenho do respirômetro padrão de Bartha e de dois outros modelos alternativos de 560 e 800 mL, utilizando-se lodo digerido de indústria cítrica com taxas de aplicação de 0,0 tds/ha, 2,5 tds/ha e 5,0 tds/ha (toneladas de sólidos secos por hectare) em um solo tipo “franco arenoso” (USDA), para verificar a melhor relação taxa aplicada/ tempo de degradação do lodo, determinando-se o conjunto de melhor desempenho. Os respirômetros alternativos foram montados segundo NUVOLARI (1996), e os respirômetros padrão de Bartha de acordo com o projeto de Norma ABNT 01:603.06-607 (1993). Observou-se que o tempo de biodegradação do lodo ocorreu quase que totalmente no período de 20 dias. Em relação a produção de CO 2 conseqüente da biodegradação do lodo, verificou-se que o respirômetro com volume de 800 mL apresentou boa reprodutibilidade, baixo custo e leituras mais espaçadas no tempo sem riscos de avaliação da biodegradação, quando comparado ao modelo padrão de Bartha para as taxas aplicadas. PALAVRAS -CHAVE: Disposição de Lodo, Respirometria, Biodegradação no Solo. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 165 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 INTRODUÇÃO O crescimento populacional das cidades, tende a agravar o problema de disposição dos lodos de esgotos oriundos das ETE’s municipais. As quantidades geradas são grandes e as áreas nem sempre disponíveis e adequadas. Então, torna -se necessário conhecer as quantidades e as características do lodo gerado, para se decidir sobre sua disposição final. O lodo de águas residuárias é resultante da remoção dos sedimentáveis (lodo primário) e dos flocos biológicos (lodo secundário). Trata-se de um líquido mais concentrado em resíduos sólidos que o esgoto bruto. No processo de tratamento, o mesmo passa por diferentes fases como condicionamento químico e desidratação, digestão aeróbia e anaeróbia, espessamento para que haja a estabilização da matéria orgânica e a diminuição dos volumes. O lodo em sua constituição apresenta, matéria orgânica em diferentes estágios de degradação e tem sido aplicado no solo com a finalidade de tratamento e/ou disposição, apresentando resultados satisfatórios. Os solos, quando recebem matéria orgânica têm suas características alteradas e, em termos agronômicos, há uma melhoria, sob vários aspectos. Segundo MATTHEWS (1992), deve -se, no entanto, tomar algumas precauções nesse tipo de utilização uma vez que um balanço deve ser mantido entre dois pontos de vista extremos; um deles é considerar que o lodo é sempre um resíduo perigoso e que deve ser simplesmente disposto ou destruído; outro é que o lodo é sempre um recurso utilizável, particularmente na agricultura, e que esse recurso deve ser sempre utilizado. A determinação das quantidades e das características do lodo é primordial para uma tomada de decisão nesse sentido. No Brasil a maioria das cidades ainda não possuem sistemas de tratamento de esgotos mas, futuramente terão de fazê-lo. O aproveitamento do lodo pode se tornar viável, em muitos casos pode ser feito com a finalidade de melhoria de solos agrícolas; recuperação de áreas degradadas; aplicação em parques, jardins, florestas, etc. A presença de matéria orgânica melhora a estrutura do solo, interferindo favoravelmente na sua capacidade de aeração, de drenagem, de retenção de água, de resistência à erosão e na capacidade de troca catiônica. No entanto, o lançamento de lodo não pode ser feito indiscriminadamente. Existem alguns problemas relacionados com a presença excessiva de metais tóxicos, de nutrientes solúveis (principalmente nitratos que podem contaminar lençóis freáticos) e a presença de patogênicos no lodo de esgotos municipais, que devem ser levados em consideração, pois estão diretamente relacionados com taxas de aplicação de lodo ao solo e com o tipo de cultura agrícola a ser utilizada. Entre outros estão os cuidados a serem ressaltados, como os problemas de custo referentes ao volume de transporte de lodo no estado líquido; a possibilidade de contaminação do lençol freático nos locais de aplicação; o problema com os metais pesados e também os microrganismos patogênicos. Para lançamento do lodo no solo foram recentemente definidas normas, na Europa e nos EUA, elaboradas com base em pesquisas realizadas durante décadas. No Brasil, para que se possa levar em consideração as peculiaridades relacionadas com os tipos de lodo, de solo, de clima, e principalmente com a realidade econômica do país, é necessário que se estude formas de aproveitamento e de lançamento no solo (NUVOLARI, 1996) e defina critérios para a sua disposição e conseqüente definição de Norma Brasileira. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 166 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 Um dos aspectos relacionados com o lançamento de lodo no solo é a capacidade que este apresenta em degradar a matéria orgânica. A velocidade com que essa degradação ocorre depende das condições físicas, químicas e biológicas do solo e das quantidades de lodo aplicadas. O ensaio de respirometria baseia-se na medição do CO2 gerado no processo de degradação de resíduos orgânicos no solo. Tem sido utilizado para estudar a interação entre os diversos fatores intervenientes no processo de degradação de resíduos orgânicos no solo. Sabe-se que a geração de CO2 aumenta com o incremento da taxa de aplicação. No entanto, para os lodos que apresentam uma certa concentração de metais ou outros contaminantes, a incubação a taxas crescentes pode, a partir de determinados valores, começar a interferir, inibindo ou matando os microrganismos e diminuindo assim a geração de CO 2. Nesse caso, através do ensaio de respirometria, pode-se também determinar a eventual toxicidade do lodo aos microrganismos do solo. OBJETIVO Comparar o desempenho do respirômetro padrão de Bartha com dois outros modelos alternativos, utilizando-se lodo digerido de indústria cítrica em um solo tipo “franco arenoso”(USDA), e verificar a melhor relação taxa aplicada/tempo de degradação do lodo, determinando-se o conjunto de melhor desempenho. METODOLOGIA A pesquisa foi desenvolvida segundo o Projeto de Norma ABNT - 01: 603.06-007 (1993), com algumas inclusões e adaptações. Foram realizados alguns ensaios de caracterização do solo e também do lodo, utilizados nessa pesquisa. O lodo líquido digerido utilizado nos respirômetros é gerado no processo de tratamento biológico das águas residuárias da indústria cítrica, e foi obtido na Estação de Tratamento de Esgoto da indústria Citrosuco Paulista S/A, localizada no município de Limeira - SP. O solo utilizado foi classificado como do tipo “franco-arenoso”(USDA) e coletado na área experimental da Indústria Citrosuco Paulista S/A. O lodo foi caracterizado em seus parâmetros físico-químicos de acordo com Standard Methods for Examination of Water and Wastewater (1995) e Boletim Técnico - Métodos de análise química e mineralógica e física de solos (1986), apresentando valor de pH de 6,55; sólidos totais de 85,65 mg/L, teor de matéria orgânica de 6,986% e umidade de 14,35%. Para a avaliação da velocidade de degradação e eficiência do conjunto, foram montados 27 respirômetros sendo: 9 (nove) de Bartha (padrão); 9 (nove) alternativos com volume de 560 mL e 9 (nove) alternativos com volume de 800 mL; montados em triplicata de acordo com o projeto de Norma ABNT 01.603.06-007 (1993). A Figura 1 ilustra os três modelos de respirômetros utilizados no experimento. As taxas de aplicação de lodo utilizadas nos 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 167 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 respirômetros foram baseadas em termos do conteúdo em toneladas de sólidos secos por hectare (tds/ha), e distribuídas nos seguintes valores: taxa 0,0tds/ha (solo-controle); 2,5tds/ha e 5,0tds/ha. A avaliação dos resultados baseada pela quantidade de CO2 produzido nos respirômetros num determinado período de tempo. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 168 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 CONCLUSÕES Os resultados obtidos referentes aos respirômetros padrão de Bartha e aos alternativos com volume de 560 mL e 800 mL tiveram algumas particularidades em relação a produção de CO2 .As Figuras 2, 3 e 4 apresentam o valor médio da produção de CO2 para cada leitura, nos respectivos respirômetros durante o período de incubação. O respirômetro de Bartha na taxa de aplicação de lodo de 2,5 tds/ha apresentou uma produção total, média de três respirômetros, de 21,5 mg de CO2/50g de solo. Para a taxa de 5,0 tds/ha apresentou 37,50 mg de CO2/50g de solo e o controle 12,36 mg de CO 2/50g de solo. Observou-se que o tempo de biodegradação do lodo, ocorreu quase que totalmente no período de 20 dias . Nos respirômetros alternativos com volumes de 560 mL, para a taxa de aplicação de lodo de 2,5 tds/ha a produção total de CO2, média de três respirômetros, foi de 14,36 mg de CO2/50g de solo, para taxa de 5,0 tds/ha foi de 26,96 mg de CO2/50g de solo. Para o solo controle a produção de CO2 foi de 7,06 mg de CO2/50g de solo. Para as duas taxas aplicadas, o tempo de degradação de 20 dias foi suficiente, igualando-se ao respirômetro de Bartha. Observou-se que a produção de CO 2 no respirômetro alternativo na taxa de 2,5 tds/ha e 5,0 tds/ha foram respectivamente de 2,1 mg de CO2/50g de solo e de 5,3 mg de CO2/50g de solo, ambas menor que o CO 2 produzido no respirômetro de Bartha. Nos respirômetros alternativos com volumes de 800 mL, para a taxa de aplicação de lodo de 2,5 tds/ha apresentou produção total de CO 2 de 16,6 mg de CO2/50g de solo, para a de 5 tds/ha de 34,3 mg de CO 2/50g de solo, e para o solo controle a produção foi de 7,3 mg de CO 2/50g de solo. Comparando a taxa de 2,5 tds/ha com a mesma taxa aplicada no respirômetro de Bartha, a produção de CO2 foi menor e da ordem de 0,1 mg de CO2/50g de solo e observou-se um aumento na produção de CO 2 para taxa de 5,0 tds/ha da ordem de 1,8 mg de CO2/50g de solo. Comparando os respirômetros alternativos com volume de 560 mL e o de volume de 800 mL, observou-se um aumento na produção de CO2 neste último para uma mesma taxa aplicada. Na taxa de 2,5 tds/ha este valor foi de 2,0 mg de CO 2/50g de solo e na de 5 tds/ha foi de 7,1 mg de CO2/50g de solo. Os dados obtidos nos permite afirmar a viabilidade do emprego de respirômetros alternativos com volume de 800 mL, devido a sua boa reprodutibilidade e baixo custo quando comparado ao modelo padrão de Bartha para as taxas aplicadas. Tendo como vantagem adicional realizar leituras mais espaçadas no tempo sem riscos de avaliação da degradação. Os resultados demonstram que a da biodegradação do lodo digerido de indústria cítrica em solo tipo “franco-arenoso” se estabelece num tempo aproximado de 20 dias. Este lodo apresentou velocidade de degradação semelhante a um lodo gerado numa estação de tratamento de esgoto doméstico, para a taxa de aplicação de 5,0 tds/ha, utilizado por NUVOLARI (1996), aplicando-se a mesma metodologia. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 169 I - 026 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental FIGURA 1 - Modelo do respirômetro Padrão de Bartha e dos respirômetros alternativos de 560 mL e 800 mL, respectivamente. NUVOLARI (1996) CETESB (1990) LEGENDA A -Tampa da cânula (vedação PARA _FILM); B - Cânula (? int. 1 a 2mm); C - Vedação com rolha de Borracha; D - Braço lateral (? =40mm; H=100mm); E - Solução de KOH - 0,4N; F - Amostra de solo ou mistura lodo-solo (50g); G - Frasco Erlenmeyer (250 mL); H - Válvula; I - Camada suporte (lã de vidro ou algodão); J - Filtro de ascarita ou cal sodada (? =15mm e H=40mm); A - Frasco de vidro (560 ou 800 mL) com tampa metálica; B - Cânula (? int. 1 a 2mm); C - Bequer de 20 mL para colocação da solução de KOH; D - Vedação com rolha de borracha; E - Mangueira de borracha (? 6mm;) F - Tubo de vidro (? 6mm); G - Amostras de solo ou da mistura solo-lodo (50g); H - Presilhas de Mohr (para seccionamento do fluxo de ar); I - Camada suporte; J - Filtro de ascarita ou de cal sodada (tubo de vidro ? 6mm, comp. 0,25m) K - Tampa da cânula (vedação com papel PARA-FILM). FIGURA 2 - Valor Médio da geração de CO2 durante o período, para cada leitura realizada no respirômetro padrão de Bartha. 7 6 Solo Controle 5 2,5 tds/ha 5,0 tds/ha 4 3 2 1 0 0 1 2 4 7 9 11 15 17 21 24 31 38 Tempo de Incubação (dias) 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 170 I - 026 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental FIGURA 3 - Valor médio da geração de CO2 durante o período, para cada leitura realizada no respirômetro alternativo de 560 mL. 7 6 Solo Controle 5 2,5 tds/ha 5,0 tds/ha 4 3 2 1 0 0 1 2 4 7 9 11 15 17 21 24 31 38 Tempo de Incubação (dias) FIGURA 4 - Média da geração de CO 2 durante o período, para cada leitura realizada no respirômetro alternativo de 800 mL. 6 5 Solo Controle 2,5 tds/ha 5,0 tds/ha 4 3 2 1 0 0 1 2 4 7 9 11 15 17 21 24 31 38 Tempo de Incubação (dias) 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 171 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 026 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. Projeto de Norma 01:603.06-007 (no prelo). Determinação da Biodegradação em Solos - Método Respirométrico. Jan. 1993. AWWA - Standard Methods For Examination of Water and Wastewater - 18ºEdition, 1995 BOLETIM TÉCNICO - Métodos de análise química e mineralógica e física de solos. Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Campinas, SP, n 106, 1986. HEMPHILL, B. Rules and Options for Sludge Disposal. In: Water Engineering and Management, v.139, n.2, p.24-26, feb. 1992. MATTHEWS, P.J. Sewage Sludge Disposal in the UK: A New Challeng for the next Twenty Years In: J. IWEN , nº. 6, p. 551-559, oct. 1992. NUVOLARI, A. Aplicação de Lodo de Esgotos Municipais no Solo: ensaios de respirometria para avaliar a estabilidade do lodo. Campinas, 1996. Dissertação de mestrado - Faculdade de Engenharia Civil - Universidade Estadual de Campinas, 1996. NUVOLARI, A; CORAUCCI FILHO, B, FADINI, P. Respirometria no Monitoramento da Aplicação de Lodo de Esgoto Municipal no Solo. XIII - Congresso Latino Americano de Ciência do Solo, 04/08/96 a 08/08/96. Águas de Lindóia, SP, S.09006, 1996. ____________ Aplicação de Lodo de Esgoto no Solo e Monitoramento de pH e Teores: umidade, sólidos voláteis, carbono e Matéria orgânica. XXV COMBEA Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola e I Congresso Latino Americano de Engenharia Agrícola, 22/07/96 a 26/07/96, Bauru, SP, EAS-210, 1996. USEPA - ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY (USA). CFR-40- Part 503 - Standard for the Use or Disposal of Sewage Sludge - Federal Register, v.58, 1993. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 172