entrevista da semana
10 A
A GAZETA
CUIABÁ, DOMINGO, 9 DE OUTUBRO DE 2011
PORQUÊ AGECOPA DEU ERRADO
Ex-diretor de Infraestrutura da extinta Agência da Copa aponta que função da entidade foi desvirtuada
Controle total não é transparência
TÉO MENESES
DA REDAÇÃO
ex-diretor de
Infraestrutura da
Agecopa, Carlos Brito,
finalmente rompe o
silêncio e fala sobre o polêmico fim
da Agência criada para cuidar dos
preparativos para o mundial de 2014
em Cuiabá. Ele aponta
inconstitucionalidades no fim da
autarquia, admite possibilidade de
recorrer à Justiça contra a perda do
mandato e detalha as desavenças
com o então diretor-presidente, Eder
Moraes.
Brito afirma também a seguir
que o Estado já tem amargado
prejuízo nos preparativos da Copa e
critica as interferências políticas na
Agência. O ex-diretor tem 48 anos, é
natural de Recreio (MG), tem 2
filhos, curso superior incompleto, é
divorciado e começou a militância
política na Pastoral da Juventude.
O
Carlos Brito chegou a
preparar mandado de
segurança contra
irregularidades na
Agecopa, mas desistiu após
conversa com governador
Qual sua avaliação sobre o fim
da Agecopa?
Primeiramente, temos que
entender que a Agência teve uma
razão histórica para ser criada. Ela
nasceu como uma autarquia
executiva e especial para que tivesse
maior autonomia gerencial,
clareza para a sociedade.
Isso trouxe algum prejuízo prático?
orçamentária e financeira. Isso serviria para
O senhor faria novamente as críticas como
Sim. Tivemos contratos celebrados e com
assegurar o que estava previsto em lei e que os
ocorreram na audiência pública da
atraso no pagamento. Criou-se uma instabilidade
objetivos fossem alcançados sem ingerências
Assembleia Legislativa, o que foi usado como
que não havia dentro da ideia de uma agência.
políticas.
argumento para o fim da Agência?
Falam que extinguiram a Agecopa pela falta de
Isso pode não ocorrer com uma secretaria
Isso não teria ocorrido se a condução fosse
resultados, mas a falta de resultados foi
de Estado, como é a Secopa?
transparente. Se admitissem o interesse na
construída ao longo do último ano. O que vemos
A autonomia serviria para que, tomadas as
mudança, os estudos que comprovam a melhor
é que trouxeram o orçamento e a receita da
decisões, fossem cumpridas sem depender do
solução e justificassem a
Agecopa para dentro do turbilhão do governo. A
ambiente político. Para isso a Agência foi criada,
troca, nada disso teria
Agência deixou de ter a priorização para cumprir
com compromisso de se assinar um contrato de
ocorrido. Como diretor
prazos. A extinção, diante desse quadro,
gestão a partir de um plano de ação geral dessas
de Infraestrutura, não
questionável até da forma como foi feita do ponto
metas.
tinha apenas o direito,
de vista jurídico, era a única coisa que restava.
Isso foi assinado?
mas obrigação de
A Secopa vai solucionar esses problemas?
Isso foi pensado em 2009 como uma garantia
questionar isso. São
Não basta extinguir uma agência e abrir uma
para a Fifa e o governo federal de que Cuiabá
documentos que teríamos
secretaria. É como encerrar uma empresa com
conseguiria cumprir os acordos. AAgência foi
que assinar. Ora, porque
problemas no mercado e abrir novamente com
constituída, mas o plano de ação não foi
eu penso diferente tenho
um CNPJ diferente, principalmente quando se
estabelecido, o contrato de gestão não foi
que ser expulso? Não é
mantém determinadas práticas.
discutido e nem assinado. Tudo isso me leva a
assim. O
Quais, por exemplo?
dizer que não se aplicou a legislação prevista para
descontentamento não é
A magnitude de uma Copa é diferente de tudo
o funcionamento da Agência. Não há, portanto,
se a opção é BRT ou VLT.
o que se pensou para Mato Grosso até agora, mas
que se falar que ela não funcionou. Na verdade,
Na verdade, não tinha
percebemos que tentam diminuir a importância
não se deu o devido cumprimento constitucional
nem como ser contra ou a
do evento. Deveríamos estar tentando promover e
e legal das suas prerrogativas.
favor. Até mesmo o BRT caiu de maduro.
envolver a sociedade. Querem pegar essas
Novas leis mudaram o funcionamento da
Ficamos com muitas perguntas sem respostas. E
possibilidades e enfiar tudo dentro de um ônibus
Agecopa. Elas ajudaram ou prejudicaram?
isso não é só o diretor Carlos Brito que diz. São
de BRT ou vagão do VLT. A Copa é maior que
O estabelecimento de mandatos para os
os órgãos de controle, as prefeituras, os
isso. Hoje já temos prejuízos na relação
diretores e a exigência da não filiação partidária e
vereadores e a população de forma geral que
custo/benefício. Só nos resta torcer para dar certo
uma série de previsões nesse sentido visavam
querem saber. Foi no afã de buscar essas
e evitar maiores prejuízos.
atravessar os períodos eleitorais e as questões de
respostas que fiz o que fiz. Como não consegui
A quais prejuízos o senhor se refere?
governo para permitir que os projetos da Copa
internamente, aproveitei a audiência pública para
O prejuízo é inegável. Deixamos de pleitear a
fossem priorizados. Contudo, passada a eleição e
mostrar isso. O importante é que os órgãos de
Copa das Confederações, por exemplo.
não sanados esses pontos que citei e cheguei a
controle já estão mais atentos e não vão
Mas isso não foi optado diante da falta de
cobrar internamente de todos os 3 presidentes e
concentrar atenção apenas em BRT ou VLT.
prazo?
nada foi feito, percebemos que o governo não
Lembro que havia antes um apontamento técnico
Para realizar a Copa das Confederações, as
compreendeu a magnitude do evento em si e a
de que nenhuma das opções ficaria pronta até a
obras condicionantes precisariam estar prontas
ferramenta que tinha em mãos.
Copa. O risco é grande. O curioso é vermos os
em junho de 2012. Como se pretendia mudar de
Mas isso ocorreu pela centralização do
mesmos técnicos que antes me diziam isso e
BRT para VLT, perdeu-se um ano. É aí que
poder?
estão hoje defendendo o VLT. É
Optando-se pelas
preciso ter uma definição, mas
alterações que
QUEM É CARLOS BRITO
tudo isso não foi colocado. Por
deturparam o objetivo
que, por exemplo, essa questão
que tem
‰ Ex-presidente da Associação de Moradores do bairro Parque Cuiabá;
de modal tem que ocorrer
constitucionalmente
‰ Vereador de 1993 a 98;
através de concessão pública, já
uma agência, as
que é financeiramente
mudanças ocorreram
‰ Deputado estadual de 1999 a 2006;
sustentável como alegam? É
sob um pretexto. Houve
‰ Ficou na primeira suplência do PDT em 2007;
fácil fazer tudo com dinheiro
ainda forte campanha
público e repassar à iniciativa
contra a Agência
‰ Ex-secretário de Estado da Casa Civil e Segurança Pública;
privada depois. Isso vai ocorrer?
partindo inclusive de
‰ Diretor de infraestrutura da extinta Agecopa.
Como o senhor vê a
setores do próprio
atuação do governador e dos
governo. Isso veio a se
deputados diante de todo esse
revelar de forma clara
impasse que antecedeu o fim da Agência?
entendemos muitas coisas depois delas
depois como sendo algo proposital e que se
Foi a posição mais cômoda para não se
ocorrerem. Foi por isso que fiquei falando
vislumbrava outros interesses e aí mudou-se a lei
enfrentar o problema. Com Agecopa ou Secopa,
sozinho de Copa das Confederações, sendo que
a pretexto de trocar o colegiado pelo
se não tratar a questão da forma correta os
desde o início a orientação do então governador
presidencialismo. Apesar das alterações,
resultados serão temerosos.
Blairo Maggi era que se buscasse os 2 eventos. O
manteve-se conceitos do colegiado com
Por que o senhor não questionou antes
tempo vai deixando as coisas claras, como vai
características do presidencialismo, o que não
essas portarias que modificaram o
fazer com relação a outras coisas também.
ficou resolvido de forma adequada. Inseriram
funcionamento da Agência?
A Copa das Confederações em Cuiabá está
artigos que tiraram da Agência a segurança
Preparei um mandado de segurança para isso,
descartada?
orçamentária e financeira, o que é outro ponto
mas desisti depois de uma conversa com o
É prematuro fazer isso. No mínimo, o
que nos fragilizou muito. Veio com isso a
governador. Esperava que as coisas mudassem.
governo não tem o direito de desistir. Dizer que
dependência do remanejamento orçamentário, a
Aquela resolução que proibia outros diretores de
não haverá prejuízo não é verdade. Foi por isso
dependência do contingenciamento da receita do
conceder entrevista é algo inadmissível no século
que disse que temos que dizer as coisas com
governo.
Chico Ferreira
XXI, mas depois o tempo explica, como está
explicando. Isso é de um egocentrismo e ideia de
controle total para que não houvesse
questionamento. Por que fazer portaria tirando da
Diretoria de Infraestrutura os fiscais e gestores de
contratos? Por que esse desejo de controle total?
Isso não é transparência. Quero crer que essa não
seja a orientação do governo, pois não está nos
princípios da probidade
administrativa. Se pegarmos
as leis que mudaram a
Agência a partir da
Assembleia por sugestão de
deputado que fica
verbalizando ser o grande
autor das sugestões, veremos
que é mais grave
desrespeitar o diretorpresidente do que praticar
improbidade.
O que o senhor disse na
reunião reservada com
governador depois que o
diretor-presidente pediu
sua demissão?
Queria me manifestar, pedi isso, mas não
pude me defender. Então, fica para a história uma
afirmativa mentirosa e de ilegalidades em relação
ao fim da Agência.
O senhor vai recorrer à Justiça contra o
fim da Agecopa?
Existe essa condição. Tenho já parecer
jurídico nesse sentido, mas não vou fazê-lo
apesar do que estabelece a lei em razão do direito
ao mandato. Cargo de diretor não é exonerável a
qualquer tempo. Isso gera direitos e
indenizações, mas não é meu interesse. Da
mesma forma, a extinção da Agência tem vícios.
Fizeram o que não podia ser feito. Esse é um
componente jurídico, mas o componente político
é de desconsideração de todo um histórico tanto
como relação aos diretores, como ao exgovernador Blairo Maggi e ao vice e agora
governador, Silval Barbosa, que eu votei
inclusive. Boa parte das discussões que tive é
porque lembrava o diretor-presidente: opa, Mato
Grosso tem um governador apenas e se chama
Silval Barbosa e eu votei nele. Criou-se uma série
de discussões por lealdade ao governo e ao
governador. Lealdade a gente mede à distância,
longe dos olhos de quem é beneficiado por ela.
Diferente disso, tem outro nome. Saio ciente de
que mantive lealdade a todos os propósitos os
quais nos foram apresentados. Socorrem-se de
obras da Sinfra, como duplicação da estrada da
Chapada, estrada para Santo Antônio. Isso já
estava sendo tratado, mas fingem que não para
dar volume a resultados. E nós não concordamos
com isso, mas digo que faria tudo de novo.
Da mesma forma?
Talvez reavaliasse a consideração
proporcional à que tive do governo. Talvez teria
que ser mais claro. Talvez os questionamentos
deveriam ser mais amplos, mas isso não me cabe
agora. Temos órgãos de controle, como o
Ministério Público, que podem fazer isso.
“
Lealdade a gente
mede a distância, longe
dos olhos de quem é
beneficiado por ela
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Controle total não é transparência