16 Segunda-feira 5 de janeiro de 2015 Jornal do Comércio - Porto Alegre Política Edgar Lisboa Entrevista Especial Repórter Brasília [email protected] Para Biolchi, expansão Lívia Araújo ZECA RIBEIRO/AGÊNCIA CÂMARA/JC [email protected] Política desacreditada “Nós trabalhamos, nos esforçamos, mas o sentido disso tudo fica perdido em razão da falta de crédito que a política tem. E esse descrédito aumentou nos últimos anos.” A frase do deputado federal Renato Molling (PP, foto) reflete o que o Congresso e o governo vêm passando aos olhos da população. Se já existia um sentimento difuso e constante de que a política e os políticos não representam o povo, esse sentimento deixou de ser difuso em junho de 2013, quando manifestações eclodiram pelo País sem pauta, mas questionando “tudo o que está aí”. “Temos que melhorar isso, aproximar o político da população. E isso só vai acontecer reformando a política”, disse o deputado. De acordo com ele, eleger prefeitos e vereadores junto com deputados estaduais e federais, senadores, governadores e presidente melhoraria o quadro, assim como dividir o País em 513 distritos e transformar as eleições proporcionais em majoritárias. “Vamos sempre sentir insatisfação, mas isso é normal. Temos bons políticos, mas temos que aproximá-los do povo.” O fim da indústria O ano de 2013 foi marcado não apenas pelas manifestações, que ecoaram na política e nas eleições de 2014. Foi também o ano que a indústria no Brasil representou a menor do Produto Interno Bruto desde o ano 2000. De acordo com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a fatia da indústria no PIB é a mesma de 1955. E isso é ruim. “Não temos como ter um País forte sem uma indústria forte. E essa mesma indústria perdeu a importância nos últimos anos”, disse Molling. De acordo com ele, há vários motivos para a desindustrialização. Dificuldades de logística, uma lei trabalhista complicada, câmbio ruim. Como resultado, o Brasil exporta produtos primários para serem transformados em outro lugar. “Geramos muitos empregos lá fora. Se tivéssemos uma indústria de transformação forte, geraríamos aqui.” Com isso, aumenta o desemprego e o País tem dificuldade de abrir mais vagas. “O Bolsa Família é importante. Mas só geramos cidadania pelo trabalho.” Direito ao lazer Molling foi conduzido à presidência da Comissão de Turismo da Câmara em 2014. Foi o responsável por organizar as ações parlamentares no ano que o Brasil teve o maior evento do mundo: a Copa. O Brasil recebeu cerca de um milhão de turistas estrangeiros. Mesmo assim, o turismo ainda precisa se desenvolver mais. “O potencial é enorme, tínhamos que explorar mais.” E, de acordo com o deputado, não só atrair estrangeiros, mas fazer com que os brasileiros viagem mais. >>FIQUE POR DENTRO DA POTÊNCIA DESTE MERCADO. CADERNO AUTOMOTOR. TODAS S AS SEXTAS-FEIRAS, NO SEU JORNAL DO COMÉRCIO. Ligue e assine 0800.051.0133 ou acesse www.jornaldocomercio.com Aos 35 anos de idade, Márcio Biolchi (PMDB) é o mais jovem chefe da Casa Civil que já passou pelo governo do Rio Grande do Sul. Indicado pelo governador José Ivo Sartori (PMDB) para fazer a convergência entre a articulação política e administrativa do Estado, Biolchi assume a pasta após um processo de transição que concentrou-se na situação do Estado, considerada pelo secretário como “precária”. “Renegociar a dívida para se endividar mais não traz avanço”, diz Biolchi sobre a decisão do governo de Tarso Genro (PT) de utilizar recursos de depósitos judiciais. Para ele, “renegociar a dívida, mas fazer o uso de instrumentos que comprometam o ganho da renegociação, no fundo, anula todo o esforço do governo”. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o novo secretário fala também sobre a redução em um terço das secretarias em relação à gestão anterior e a redistribuição das atribuições das pastas. Quanto à polêmica que envolve a extinção de secretarias, como a de Políticas para Mulheres, mas garante: “Não abriremos mão dessa percepção da diversidade, da igualdade, principalmente em relação à violência e discriminação contra a mulher”. Jornal do Comércio – Quais desafios o senhor enxerga para o novo governo nestes primeiros meses? Márcio Biolchi – A situação das finanças públicas do Rio Grande do Sul, que chega a ser precária, cria uma expectativa de ter condições de enfrentar uma realidade que talvez não seja conhecida por completo. A Casa Civil dá conta do papel interno entre as demais secretarias, mas também externo em relação à sociedade e as organizações civis. Por mais que tenha uma dedicação política, ela fica atrelada a essa conjuntura. O grande desafio é conseguir fazer um diagnóstico preciso e fazer com que a população tenha uma noção do que é o Rio Grande do Sul, que não pode se ater à questão superficial da disputa eleitoral. O que enfrentaremos tem que servir para ampliar um pouco a visão além do próximo ciclo. Durante 40 anos, em poucos momentos o Estado conseguiu gastar menos do que arrecada. Por quanto tempo vamos ficar nisso? Acho que essa será a tônica de 2015: esgotaram-se os instrumentos com que o Estado sobreviveu ano após ano, e agora o Rio Grande do Sul terá de enfrentar esta realidade. JC – De que maneira ela será enfrentada? Biolchi – A primeira coisa que deve acontecer é compreendermos a profundidade da situação que o Estado enfrenta, com dificuldades e facilidades, problemas e virtudes, nos campo econômico e político-social. Também conseguir que isso seja visto da maneira mais realista e verdadeira, e que o governo consiga mostrar à sociedade que não é possível viver de ciclos. Não se conseguirá criar um ato de governo, se isso não for sustentável econômica, ambiental e socialmente, mas também politicamente, se as pessoas não perceberem que as decisões que o governo tomar são necessárias e precisam ser apoiadas. JC – O que está sendo planejado para transmitir essa mensagem? Biolchi – Eu nem estou falando em planejamento, mas de saber receber o cenário que a gente vai conhecer. Apesar de ter havido uma transição, esta não proporciona o conhecimento necessário para termos a certeza de qual será o quadro enfrentado. Nós trabalhamos com dados que estão disponíveis. Vivemos em um Estado que fez uma lei de orçamento que se baseou em estimativas de desenvolvimento econômico no Brasil que não se confirmaram; criou uma expectativa de receita que ninguém sabe se vai se confirmar, que criou ações que estão aumentando as despesas. Estamos dispostos a receber e compreender a situação verdadeira do Estado, reconhecendo que ele é um paciente em estado crítico. Precisamos estar preparados para receber a verdade. Acho que a metáfora do paciente é boa, porque ajuda a compreender que o serviço público é tão essencial na vida em sociedade, que não podemos nos dar ao luxo de negligenciar o tratamento verdadeiro simplesmente para adiá-lo. JC – O ex-governador Tarso Genro defendeu o modelo de contratação de empréstimos para investimentos, dando a entender que as finanças do Estado não estariam tão abaladas quanto o governador eleito avalia. Quais são as atuais possibilidades de obtenção de recursos para investimento? Biolchi – Nesses últimos quatro anos, o governo federal permitiu um índice de endividamento maior, o que poderia ser chamado, a grosso modo, como antecipação de receita, pois o Estado garante seu pagamento por meio das receitas futuras. Isso é bom para o momento presente, mas isso compromete o futuro do Rio Grande do Sul. Deixamos de tomar medidas mais severas, e partimos para esse endividamento, com inchaço e aumento de gastos. Para um setor público fragilizado, isso é muito ruim. A situação ser grave ou não é quase só uma opinião, pois o que define isso é o balanço do Estado: mais de 200% da sua receita corrente líquida são contas para pagar. O nosso é o estado com maior endividamento proporcional à sua receita no País. Não é possível dizer aos gaúchos que a situação não está ruim. Temos um problema sério de volume de investimentos, em serviços, educação, há criminalidade. Os indicadores econômicos mostram que estamos na pior situação do País, e vamos querer dizer que a situação não é tão grave? Isso é se consolar com menos. “Estamos na pior situação do País, e vamos dizer que a situação não é tão grave?”