1 III SEMINÁRIO POLÍTICAS SOCIAIS E CIDADANIA AUTOR DO TEXTO: Júlio Souza Lima Consórcios Públicos: instrumentos para o desenvolvimento regional e local. RESUMO: O objetivo deste artigo é o de apresentar de forma sucinta os desafios presentes na agenda federativa brasileira. Desse modo, inicia-se com a análise da experiência da descentralização do Estado brasileiro; aborda-se aspectos da desigualdade local e regional do Estado da Bahia tornando-se uma pauta importante dos debates sobre políticas públicas. Em seguida será apresentada a trajetória do processo de institucionalização da política territorial na Bahia, elucidando a relevância dos novos desafios que o território vem enfrentando no momento atual. Como sugestão/alternativa de cooperação para o desenvolvimento local e regional é apresentado os consórcios públicos, os quais podem ser utilizados entre os diferentes municípios, visando o atendimento de necessidades comuns entre eles, nas diversas áreas e demandas. Palavras-chave: Descentralização. Cooperação. Estado. Desenvolvimento regional. Consórcios Públicos. ABSTRACT: The aim of this paper is to present succinctly the challenges present in the Brazilian federal agenda. Thus begins with an analysis of the experience of decentralization of the state; approaches to aspects of local and regional inequality of Bahia becoming an important agenda of discussions on public policies. Then be presented with the trajectory of the process of institutionalization of territorial policy in Bahia, explaining the significance of the new challenges that the country is facing at the moment. As a suggestion / alternative development cooperation is presented local and regional public consortia, which can be used by different municipalities in order to meet common needs from among them, in different areas and demands. Key words: Descentralization. Regional development. Public Consortia. Cooperation. State. 1- Introdução O texto constitucional de 1988, ao definir que a República Federativa do Brasil é constituída pela união dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios possibilitando a inovação de um desenho de federação trina, dando aos Municípios status de entes federados similar ao dos Estados e da União. Esta definição constitucional traz consigo, entre outras coisas, a descentralização fiscal, administrativa e política do Brasil e esteve intimamente associada ao processo de redemocratização do país, além de consagrar o processo de descentralização político-administrativo e financeiro dos municípios. A desigualdade local e regional é uma característica marcante do processo de desenvolvimento estadual, constituído por várias tipologias, nos entes federados. Algumas apresentam baixos níveis de desenvolvimento local, chegando à estagnação e a maioria ainda desintegradas entre si. A trajetória do processo de institucionalização da política territorial na Bahia revela-nos um enfrentamento dos novos desafios que o território vem enfrentando no momento atual, a concepção de um novo modelo de gestão, com a criação de consórcios públicos, possibilitando gestão associada de serviços públicos e cooperação entre os entes federados. 2 Sendo assim, o presente artigo espera contribuir para o avanço da discussão pública sobre os desafios que se colocam hoje para as políticas sociais brasileiras, assim como para os caminhos possíveis para a redução das iniqüidades sociais que ainda hoje caracterizam o país. 2- Descentralização do Estado brasileiro A experiência brasileira vem demonstrando, desde meados da década de 1980, um movimento em direção à descentralização do Estado, na perspectiva de reverter o modelo anterior centralizado, a descentralização se materializou, sobretudo, nas transformações institucionais da Constituição de 1988, tornando-se uma pauta importante dos debates sobre políticas públicas no País. De um lado, a discussão passou a focalizar os limites e as potencialidades desse processo, de outro, a definição dos níveis subnacionais na estrutura federativa e ainda, as implicações dessas transformações sobre a governabilidade nacional. Com o número excessivo de desmembramento dos Municípios, a partir de 1988, que depende quase exclusivamente de recursos federais como Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para sua sobrevivência, com baixa arrecadação própria e na construção de uma estrutura política institucional de divisão territorial do poder. Entretanto destacase que a descentralização tanto ampliou a autonomia local, quanto ampliou os seus encargos, inclusive em municípios que não tem como resolver sozinhos os problemas locais. A descentralização é uma estratégia adequada não somente para superar os déficits democráticos dos entes federados, e poderá contribuir com uma maior possibilidade de poder de decisão às comunidades locais e a revalorização do espaço territorial. Como as novas tendências urbanas, estão dando maior importância aos municípios devido à concentração demográfica e a crescente participação destas no desenvolvimento econômico, aonde fenômenos como conurbação sugerem desafios que obrigam a ser criativos nas respostas às necessidades das comunidades, como também, a necessidade da participação dos atores econômicos locais junto aos agentes institucionais, isto é, fundamental para o desenvolvimento local e regional. 3- Desigualdade regional/local no Estado da Bahia Revisitar o arcabouço das políticas públicas brasileira, e da gestão do território principalmente no Estado da Bahia, constitui-se uma ação imprescindível para a compreensão do território que permeiam o cotidiano dos entes federados. Pesquisas recentes tendo como base os indicadores demográficos e sócios econômicos do Estado da Bahia valor adicionado ao PIB, IDH, IDEB, Taxa de Urbanização, Densidade Econômica e Demográfica, Incidência da Pobreza, Taxa de Analfabetismo, índice de produto municipal, referente ao valor bruto da produção agrícola, extrativa, pesca, demonstram que a desigualdade local e regional é uma característica marcante do processo de desenvolvimento estadual, constituído por várias tipologias, nos entes federados. Algumas apresentam baixos níveis de desenvolvimento local, chegando à estagnação e a maioria ainda desintegradas entre si. As desigualdades regionais e sociais do Estado, e as diferentes capacidades econômicas, tributárias e administrativas dos entes federados, podem ser amenizadas por meio de uma maior articulação e cooperação entre os municípios. 3 Neste sentido, o consórcio público instrumentaliza e dá nova regulamentação à cooperação entre as esferas de governo, abrindo a possibilidade de potencializar a intervenção do poder público e de otimizar e racionalizar a aplicação de recursos públicos na execução de atribuições que são compartilhadas pelas esferas de governo, instituindo um arcabouço legal e institucional entre os entes cooperados. Esse fato ratifica a necessidade de políticas públicas de desenvolvimento regional de caráter estadual, que contribua para a redução continuada das desigualdades local e regional, através da ativação das potencialidades dos entes federados do Estado. O desenvolvimento local e regional deve ser compreendido, não somente sob a ótica das inter-relações econômicas entre a sociedade e o mercado, mas também nas dimensões políticas e suas implicações sociais. Como também, deve incorporar diferentes escalas como a supra-regional (vinculação ao projeto estadual de desenvolvimento), a abordagem inter-regional (interdependência e integração) e a intraregional (desenvolvimento endógeno com articulação entre os agentes). O processo de redefinição do papel do Estado nesse contexto é de suma importância com o princípio do desenvolvimento local e regional, através de diversos instrumentos de intervenção, que vão desde os processos efetivos de regionalização/descentralização, passando pela alocação de recursos para a infraestrutura logística e tecnológica, a educação e a saúde, até a criação e estímulo a novas formas de gestão, como a criação de consórcios públicos. 4- O Processo de Institucionalização da Política Territorial A trajetória do processo de institucionalização da política territorial na Bahia revela-nos a relevância dos novos desafios que o território vem passando no momento atual, na perspectiva de trazer o desenvolvimento econômico e social, no qual muito pouco foi realizado em seu favor. Assim, constata-se a elaboração de políticas que prejudicaram os entes federados de menor porte, aumentando cada vez mais as desigualdades, visto que o crescimento demográfico aumenta cada vez mais as necessidades básicas da população, refletindo-se na seletividade interna, no aligeiramento e desqualificação do trabalhador, bem como a centralização das tomadas de decisão, tanto nas relações endógenas, como nas relações exógenas que a mantém com os órgãos de instâncias superiores, desencadeando nessas relações, práticas políticas administrativas e financeiras atrofiadas. Diante disso, torna-se imprescindível, além de outros fatores, a participação direta dos vários atores sociais que compõem o território, que se traduz na intervenção deliberativa e consultiva no processo da política pública, administrativa e financeira, que de acordo com Fonseca (2005, p. 16). O município é entendido aqui como uma instituição políticajurídica-administrativa-territorial e escala local de estratégias institucionais, correspondentes aos conjuntos de ações e decisões, visando o fortalecimento econômico e a melhoria da qualidade de vida da população, muitas vezes por intermédio de parcerias e cooperações envolvendo atores próximos e longícuos, públicos e privados. Nesta perspectiva o território como instituição passa a ser uma ferramenta de integração para a tentativa de superar a desigualdade. É no local onde as sociedades humanas desenvolvem a sua sobrevivência e manifestam a ansiedade, os conflitos e sua cultura, por conseguinte é possível a implementação de estratégias de fortalecimento econômico de forma integrada e exeqüível para a resolução dos problemas endógenos e nas decisões locais, e impulsiona o envolvimento dos atores considerados, que de acordo 4 com Fonseca (2005, p. 23). As instituições são criações humanas com o objetivo de dar forma às interações sociais. São originadas formalmente e espontaneamente, no âmbito social ou estatal, mas, seja como for, podem reduzir as incertezas e os riscos, pois são guias, marcos para a vida diária. Isso ocorre porque as instituições têm funções que podem permitir a difusão da informação a preços mais baixos; fiscalizar e obrigar cumprimento das leis relacionadas aos contratos e direitos de propriedade mais barata; e agilizar na superação de conflitos e controvérsias ligadas às falhas do mercado, aos direito de propriedade, contratos, dentre outros. Hoje, o mundo globalizado, o município de Salvador, Região Metropolitana e municípios de grande porte na Bahia, exercem a função de centros mundiais ou regionais, e que vivem ao lado de pequenos e médios núcleos urbanos que acabam por constituir a grande maioria dos municípios. Mantendo-se inalterado esse padrão excludente de distribuição de riqueza no Estado, tende “a permanecer reduzido o grau de liberdade para o enfrentamento efetivo e necessário do grave e complexo processo de exclusão social.” (POCHMANN e AMORIM, 2005, p. 27), seja qual for o papel desempenhado pelos grandes centros urbano, o importante é que ela deveria representar a função de integração e inter-relação, aos municípios de pequeno e médio porte, e este, contudo se sentiria legalmente inserida em um contexto maior. Para Fonseca e Silva (2008, p. 17), em seu artigo “Políticas Territoriais de Integração e Fortalecimento Urbano e Regional para o Estado da Bahia, RDE.” Isto significa dizer, por exemplo, que o sistema urbano deve ter um número adequado de cidades médias bem localizadas no espaço. Quando isto não ocorre, por razões históricas, geográficas, econômicas, sociais políticas e institucionais específicas, há uma clara tendência para o crescimento da macrocefalia urbana, com uma enorme metrópole com um pequeno número de cidades médias e com presença de um grande número de pequenos centros urbanos, economicamente frágeis e socialmente limitados quanto ao acesso a bens e serviços o que contribui negativamente na constituição de indicadores de desenvolvimento humano e social. A consciência do desequilíbrio regional se manifesta em torno da descentralização através do argumento da participação e a reestruturação das relações estabelecidas na instituição política-jurídica-administrativa-territorial, fossem asseguradas, que de acordo com Albuquerque e Cavalcanti (1978, p. 51). Essa consciência tardia decorre também do fato de que os fenômenos de desequilíbrio só parecem tender a se acentuarem quando o país a que pertencem às regiões envolvidas ingressa no caminho firme de desenvolvimento do tipo contemporâneo. Esta situação se apresenta como possibilidade de “novas” modalidades de relações intergovernamentais e na tentativa de resolver os problemas do passado político e “corrigir a defeituosa distribuição da população brasileira, que é reflexo da secularmente desordenada exploração do nosso território.” (PRADO JUNIOR, 1980, p. 210), sendo assim, alguns fatores seriam decisivos na corporificação desse processo, entre eles, a implantação no território de consórcios públicos, para o fortalecimento dos entes 5 federados, com relações mais horizontais, descentralização administrativa e a autonomia conforme os preceitos constitucionais. 5- Consórcios Públicos: um novo instrumento de cooperação federativa. Com a finalidade de estabelecer relações de cooperação federativa, inclusive à realização de objetivos de interesse comum, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos, o consórcio público em teoria poderá suprimir a escassez de investimentos, onde o somatório dos recursos de cada ente cooperado, destinados à realização de determinada prestação de serviços comum a todos, poderá minimizar os problemas que assolam toda uma região. Assim, por exemplo, se os municípios X e Y não dispunham, individualmente, de recursos para a construção de um hospital, tratamento de resíduos sólidos, um matadouro frigorífico, saneamento básico, entre outras, juntos os recursos somados poderão propiciar a construção e manutenção da aludida obra e serviços, viabilizando o incremento da prestação do serviço em ambos os municípios consorciados, como também coloca na agenda política os temas da participação cidadã, do controle social, na elaboração e implementação de políticas públicas. Constituindo desta forma um conjunto de premissas que vêm instituir a descentralização enquanto princípio. Por serem imprecisos, muitos dos dispositivos em sua definição, percebe-se que o espírito da legislação vigente passa a ganhar força por meio da apropriação do discurso de autonomia induzindo a participação da sociedade civil. 6- Considerações finais A ciência social constitui-se em um corpo de conhecimento historicamente elaborado, que gradativamente progride e funciona em meio às relações humanas estabelecidas. É conhecimento sistematizado e consensual a partir de critérios e elementos que a legitimam de acordo com o fenômeno e as interações das pessoas nos contextos históricos em que atuam. Portanto, os consórcios públicos influenciarão decisivamente na modernização administrativa dos municípios, na agregação de forças políticas diversas em defesa dos interesses local e da região, além de impulsionar a interação cultural das populações otimizando as relações sociais, econômicas e comerciais. Além disso, poderá contribuir para o fortalecimento dos entes federados, com relações mais horizontais, em torno da coesão e da articulação com os centros mais próximos e importantes, com o princípio para o desenvolvimento regional e local. Entretanto é necessário salientar que os consócios públicos são simples instrumentos de cooperação com possibilidades de apoiar a execução cooperada de políticas públicas com conteúdos de propostas territoriais e transversais. É importante que se tenha a consciência de que estes mecanismos não serão capazes de resolver todos os conflitos de interesses e de impasses, no âmbito do processo de organização do Estado federativo. As reflexões sobre os assuntos aqui abordados, trazendo a público a complexidade inerente ao tema, espera contribuir para o avanço da discussão pública sobre os desafios que se colocam hoje para as políticas sociais brasileiras, assim como para os caminhos possíveis para a redução das iniqüidades sociais que ainda hoje caracterizam o país. 6 Referências ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti de; CAVALVANTI, Clovis: Desenvolvimento regional no Brasil. 2. ed Brasília, DF: IPEA, IPLAN, 1978. 153p. BORGES, Alice González. “Operações urbanas consorciadas: Os consórcios municipais como instrumentos de realização do estatuto da cidade”, in: Estudos em homenagem ao Prof. Adilson Dallari.” Coord. De Luiz Guilherme da costa Wagner, Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2004. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. BREMAEKER, François E. J. de. Os consórcios na administração municipal. Rio de Janeiro: BAM/APCM/NAPI/IBAMCO, 2001. CNM. Confederação Nacional de Municípios. Disponível em: http://www.cnm.org.br/. Acessado em: 22 mai 2009. FONSECA, A. A. M. Instituição e desenvolvimento territorial: O desempenho municipal após a descentralização. Feira de Santana: Universidade Estadual de Feira de Santana, 2005. FONSECA, A. A. M.; SILVA, S. C. B. M. Políticas territoriais de integração e fortalecimento urbano e regional para o Estado da Bahia/Brasil. Scripta Nova: Revista Electrónica de Geografia y Ciências Sociales. Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. , Nº extra 11, 245, 2007. v. 17, p. 15-17, 2008. Ejemplar dedicado a: Los problemas del mundo actual: respuestas y alternativas desde la geografía y las ciencias sociales. Número extraordinário dedicado al IX colóquio internacional de geocrítica. Disponível em: http://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2475084. Acessado em: 10 mai 2009. IBGE – Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística, população recenseada e estimada. Informações Sociais do Estado da Bahia. Disponível em: http://www.bnb.gov.br/content/aplicacao/ETENE/Etene/docs/ba_inf_sociais.pdf. Acessado em: 06 set. 2009. IBGE – Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística, População recenseada e estimada. Bahia. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil.php?sigla=ba. Acessado em: 22 set. 2009. OBSERVATÓRIO, de Informações municipais. Disponível em: < http:/www.oim.tmunicipal.org.br//>. Acessado em: 11 mar. 2009. POCHMANN, Marcio; AMORIN, Ricardo. Atlas da exclusão social no Brasil: os ricos no Brasil. volume 3, 2. ed. São Paulo: Cortez, 2005. 204 p. PRADO JUNIOR, Caio. Evolução política do Brasil e outros estudos. 12ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1980. 249 p. PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Disponível em: http://www.pnud.org.br/home, Ranking do IDH dos Estados do Brasil em 2005. Acessado em: 29 set. 2009. 7 PUTNAM, Robert D. LEONARDI, Robert; NANETTI, Raffaella. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. 5ª ed. Rio de Janeiro: Ed. da FGV, 2007. 260p. SEI. Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. http://www.sei.ba.gov.br/. Acessado em: 12 mai 2009. Disponível em: