* Dr. Sami A R J El Jundi, MD, MSc Master of Science em Medicina Forense pela Universitat de Valencia Professor de Criminalística e Medicina Legal – Faculdade de Direito/UFRGS Coordenador do Curso de Especialização em Direito Médico – ESVJ/RS *A perspectiva epistemológica da biomedicina é positivista, assentada na pressuposição de encontrar na Razão (...) um critério inequívoco de determinação de cientificidade, frequentemente associado de modo excludente a ideais de verdade e reprodução fidedigna de um mundo “real”. *Ou seja, trata-se aí de estudar o que ocorre na realidade observada de forma “objetiva”. O conhecimento científico seria uma representação fiel da realidade observada e a cognição, o processo pelo qual se chega a esta representação. Camargo Jr., K.R.d., Racionalidades médicas: a medicina ocidental contemporânea. Série Estudos em Saúde Coletiva. Vol. 65. 1993, Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. *A medicina, enquanto prática social e humana de caráter estocástico, determinada histórica, social, cultural e politicamente, orientada para o alívio (e, quando possível, a cura) do sofrimento humano e detentora de métodos e uma moral próprias não é passível de ser abarcada por uma definição geral, sendo mais adequado se falar em “sistemas médicos”, de acordo com o lugar e a época. * *Admitir que a medicina possui um caráter eminentemente estocástico é dizer que seus métodos e recursos não são capazes de oferecer mais que uma aproximação da realidade, expressa em termos de probabilidades (de acerto e de erro) em um processo de “árvore de decisão”. *Cada etapa produz diversas novas possibilidades, ainda que por vezes com probabilidades de resultados similares. * *Em condições ideais de aplicação do método clínico, a probabilidade de acerto deve aumentar em cada etapa, mas isso nem sempre se verifica. *Em casos complexos e de rápida evolução, a seleção de um “ramo” equivocado da árvore poderá levar a resultados desastrosos, devido à falta de elementos suficientes para que se fizesse a seleção correta, desde o ponto de vista cognitivo. * Decision tree to compare the incremental cost-effectiveness of an interventional strategy (intravenous [IV] tissue-type plasminogen activator [tPA] and interventional treatment) compared to a medical strategy (IV tPA alone) for large-vessel ischemic stroke. Kim A S et al. Stroke 2011;42:2013-2018 Copyright © American Heart Association Decision tree of health states resulting from having atrial fibrillation with utility values (median (interquartile range)) for each health state. Protheroe J et al. BMJ 2000;320:1380-1384 ©2000 by British Medical Journal Publishing Group Levels of disagreement between treatment preferences based on decision analysis and recommendations of treatment guidelines from a consensus conference9 and absolute risk. Protheroe J et al. BMJ 2000;320:1380-1384 ©2000 by British Medical Journal Publishing Group * * * 1) A prática clínica de medicina se tornou dependente no laboratório * 2) As ciências como a anatomia, fisiologia e bacteriologia se tornaram básicas no sentido de que a realidade clínica foi reescrita em termos científicos básicos. Uma nova linguagem científica ou discurso médico surgiu, o que reestruturou a metalinguagem da clínica. * 3) As queixas de pacientes, a fim de serem reconhecidas, passaram a ser confrontadas com valor “verdadeiro” anatomopatológico e fisiopatológico; elas tinham que ser afiançadas pelas ciências básicas. * 4) O viés do observador foi reconhecido como um problema a ser abordado por meio de correlações patológicas clínicas (a autópsia se tornou central), experimentos controlados (o laboratório chegou para definir a clínica), e a análise estatística dos resultados (estatísticas vieram para orientar as escolhas clínicas). * 5) A Arte da medicina se tornou dependente da Ciência da medicina. Engelhardt, H.T., Medical Ethics, Codes of Medical Ethics, and Bioethics, in Conferência Nacional de Ética Médica. 2008, Conselho Federal de Medicina: Brasília, DF. * A comprehensive understanding of human health includes the greatest possible harmony of all of man’s forces and energies, the greatest possible spiritualization of man’s bodily aspect and the finest embodiment of the spiritual. Häring, B. and G.L. Jean, Medical ethics. 1972, Slough,: St Paul Publications. xiii, 250 p. * A saúde é um estado de completo bem estar físico, mental e social e não somente ausência de doença ou enfermidade. A definição consta no preâmbulo da Constituição da Assembleia Mundial da Saúde, adotada pela Conferência Sanitária Internacional realizada em Nova York (19/22 de junho de 1946) e assinada em 22 de julho de 1946 pelos representantes de 61 Estados, com vigor a partir de abril de 1948. Disponível em http://www.who.int/home-page/index.es.shtml. * Um estado físico e mental em que é possível alcançar todas as metas vitais, dadas as circunstâncias. Nordenfelt, L., Understanding the concept of health., in Homage à Wlodek. Philosophical Papers Dedicated to Wlodek Rabinowicz., T. RønnowRasmussen, et al., Editors. 2007: Sweden. * * “Nesse contexto, a ciência e a arte da medicina receberam um lugar crucial, estratégicas que são na consecução dos objetivos dos wellfare state concebido pela sociedade brasileira e seus legisladores constitucionais. Atualmente, apesar da pouca percepção disso pelos próprios profissionais, médicos e demais profissionais da saúde são pessoas importantes, consideradas, respeitadas e, em alguns países, bem remuneradas. Em alguns círculos, substituíram os sacerdotes e até mesmo os deuses de outras eras”. El Jundi, SARJ. Uma perspectiva socioantropológica do novo Código de Ética Médica. In: Dadalto, L. (Org) Dos Hospitais aos Tribunais, Del Rey, 2013. * * Total de cirurgias plásticas estéticas realizadas no mundo: 11,5 milhões Brasil: 1,49 milhões (12,9% do total mundial) EUA: 1,45 milhões (12,5% do total mundial). Fonte: Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (Isap). Trad, Giovanna. II Simpósio Médico Jurídico: Biodireito e Saúde. Campo Grande, 2014. *“Juridicização” da vida social *Aumento da regulamentação, monitoramento e controle *Mediação de conflitos *Acesso a bens e serviços *Judicialização da saúde * *“Medicalização” do cotidiano *Escolha dos alimentos, roupas, cosméticos *Estabelecimento de rotinas regulamentadas *Controle social: comportamentos e escolhas *Acesso a bens: medicamentos, alimentos especiais, benefícios tributários e previdenciários, licenças maternidade e médica. *Acesso a serviços: saúde, educação, transporte. *Acesso a medicamentos: antibióticos, antiinflamatórios, antidepressivos, emagrecedores, estimulantes. *Acesso à felicidade e à realização pessoal? * *“Tecnologização” da assistência *Intermediação dos meios tecnológicos *Persistência do pensamento mágico *Conflito de expectativa x realidade *Aumento no nº de procedimentos *Novos riscos (alguns desconhecidos) *Novas magias: medicamentos e equipamentos * * Médico Assistente Atestad o Perito * Laudo Perícia (laudo pericial) Atestado Perito Médico Assistente Objetividade Empatia Compromisso com a verdade Compromisso com o paciente Dever legal do profissional Autonomia do paciente * Dever de imparcialidade Dever de cautela (“garante”) Acesso a bens e serviços * Acesso a bens e serviços *** Pode ser contrária ao interesse Favorável ao interesse do paciente *"O dever de um perito é dizer a verdade; no entanto, para isso é necessário: primeiro saber encontrá-la e, depois querer dizê-la. O primeiro é um problema científico, o segundo é um problema moral." Nerio Rojas (1890-1971) *“O laudo pericial, muitas vezes, é o prefácio de uma sentença.” Hélio Gomes *“A soberania do juiz é, na maioria dos casos, mais teórica que real...” Ambroise Paré (1510-1590) *“... os juízes decidem de acordo com o que são informados...” Ambroise Paré (1510-1590) * * Perícia (laudo pericial) Atestado Benefícios previdenciários Benefícios previdenciários Ações judiciais (sentença) Ações judiciais (inicial / sentença) Concessão de medicamentos Aquisição de medicamentos Apoio psicopedagógico escolar Interdição Controle social Acesso a suporte terapêutico Faltas ao trabalho Cuidado dos filhos Licença maternidade Médico = “gatekeeper” de benefícios * “O simples não existe: só o que há é o simplificado. A ciência constrói o objeto extraindo-o de seu meio complexo para pô-lo em situações experimentais não complexas. A ciência não é o estudo do universo simples, é uma simplificação heurística necessária para desencadear certas propriedades, até mesmo certas leis.” Morin, Edgar (citando Bachelard). Obrigado! [email protected] [email protected]