JORNAL DE ITAIPU ELETRÔNICO
DATA:23/03/2015
Fontes alternativas: mais que complementares
23/03/2015 | 08h34
O risco do País passar por um racionamento de energia, por conta do baixo nível dos
reservatórios das hidrelétricas, já é admitido até pelo governo. Diante dessa situação de
insegurança, um questionamento se mostra inevitável: por que o Brasil não dispõe de
outras fontes também renováveis que pudessem suprir as necessidades dos
consumidores num momento de escassez de água? Especialistas ouvidos pelo Ambiente
Energia acreditam que o motivo principal pela falta de diversificação da matriz
energética foi o fato do planejamento do setor ter subestimado o potencial da luz solar e
da força dos ventos. Esses tipos de geração foram considerados caros no passado, mas,
como em toda nova tecnologia, a redução de preço é questão de tempo. Sua viabilidade
econômica vem sendo cada vez mais comprovada com a queda no custo de produção e
dos equipamentos. A relutância em lidar com uma geração mais distribuída, de acordo
com estudiosos, foi outro fator que levou os operadores do sistema a desprezarem essas
alternativas.
Jurandir Picanço, consultor da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec) e
expresidente da Coelce, disse que quando ajudou a implantar os primeiros parques
eólicos do estado nordestino, no fim da década de 1990, muitos viam as torres como
excentricidades. Como estão fincadas sobre dunas de areia, próximas a Fortaleza,
viraram até atrações turísticas. Hoje, a força dos ventos gera energia em diversos pontos
do Brasil e já é responsável por cerca de 4% da produção brasileira. Percentual ainda
tímido, segundo ele, diante do potencial do território. Para o consultor, deveria haver
logo de início uma revisão do planejamento do sistema energético. Um exemplo da
desatualização está na característica dos equipamentos disponíveis. Há cerca de dez
anos, predominavam torres de 45 metros de altura, o que favoreceu sua instalação no
litoral. Atualmente estão disponíveis equipamentos mais altos (100 metros de altura),
abrindo maiores possibilidades no interior, ainda pouco estudadas. “A energia eólica
precisa deixar de ser vista como uma solução complementar. Poderíamos hoje ter uma
capacidade instalada três vezes maior e, com isso, não estaríamos passando por essa
crise”, afirma o consultor.
Diversos países já compreenderam que a energia eólica pode ser de fato uma fonte
robusta para suprir sua demanda. É o caso da Espanha, por exemplo, que retira dos
ventos mais de 20% da energia que consome e sua geração por hélices não para de bater
recordes. A Alemanha também é uma referência em termos de uso de recursos
renováveis. A maior potência industrial europeia já supre em torno de 9% de suas
necessidades energéticas com as usinas eólicas e vem investindo fortemente também na
geração através da luz do sol. A energia solar atende entre 5% a 6% do consumo
germânico. Mesmo com atraso em relação a esses países, o Brasil tende a mudar seu
quadro nos próximos anos. Um sinal disso são os leilões exclusivos para essas fontes
alternativas. Em agosto, haverá um novo leilão para contratação de energia solar. Para
novembro, foi marcado uma nova oferta de reserva tanto para geração fotovoltaica,
quanto eólica.
A Superintendência de Pesquisa e Desenvolvimento da Aneel informou que do projeto
de pesquisa e desenvolvimento lançado em 2011 para energia solar, sete plantas já
foram concluídas. São elas: Tanquinho (Campinas-SP), Cidade Azul (Tubarão-SC),
Arena Pernambuco (São Lourenço da Mata-PE), Tauá (Ceará), Megawatt Solar
(Florianópolis-SC), USP (São Paulo-SP) e Usina do Gasômetro (Porto Alegre-RS).
Outras cinco estariam em conclusão. Para Jurandir Picanço, a expansão dessa fonte vai
passar tanto pela construção de novas usinas, quanto pela microgeração, através da
instalação de painéis nos telhados das casas. O retorno para o morador, segundo ele,
vem entre 5 e 7 anos. O investimento inicial alto poderia, entretanto, ser suavizado com
subsídios e linhas de financiamento a juros mais baixos. “Com os aumentos previstos
nas tarifas, vejo que muita gente está se mexendo à procura dessa alternativa”, conta o
consultor.
Amaro Pereria, pesquisador do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ,
salienta que a intermitência dos ventos foi outra alegação usada no passado para se
menosprezar esse recurso. Na balança, não foi levado em consideração o fato das
chuvas também não serem constantes. Mesmo para as termelétricas, é preciso
considerar as paradas necessárias para manutenção, além de se levar em conta o impacto
ambiental elevado. Segundo ele, há maior predominância de ventos nos períodos secos,
o que fortalece a necessidade de expansão da energia eólica para compensar as
limitações das hidrelétricas. “A crise hidrológica pode se tornar persistente. Temos que
nos planejar para o futuro”, afirma Pereira.
O pesquisador da Coppe considera que já foi um avanço significativo a entrada em
vigor da Resolução Normativa 482/2012, da Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), que introduziu o sistema de compensação para micro e minigeradores. Ou seja:
quem produz sua própria energia ganha créditos que são abatidos na conta de luz.
Segundo a Aneel, já há cerca de 320 pontos de instalações fotovoltaicas que se
beneficiam da regra em todo o País. Outros consumidores de baixa tensão adotaram o
mesmo mecanismo, mas utilizam pequenas turbinas eólicas em suas propriedades. É o
caso de 16 empresas no Ceará e duas no Rio Grande do Norte. Daniel Vieira,
especialista em regulação da Aneel, disse que “por se tratar de regras relativamente
novas, a implementação de sistemas de micro e minigeração ainda está em seu início”.
Ele avalia que o número de consumidores que optam por instalar esse tipo de geração
tem crescido rapidamente. De acordo com ele, ainda neste semestre será instaurada uma
audiência pública para se avaliar como a resolução tem sido aplicada. Portanto, é hora
da sociedade participar das decisões.
O Poder Público dá mesmo sinais de que não está surdo em relação às críticas. O
próprio ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, garantiu no dia 4 de março na
Câmara dos Deputados que painéis fotovoltaicos ganharão isenção de PIS e Confins
ainda este ano. Novas regras de cobrança de ICMS sobre a energia solar devem ser
adotadas pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). A pedido do governo
federal, o órgão estuda mudar a base de cálculo do imposto, que passaria a incidir
somente sobre a diferença entre a energia fornecida pelo sistema e a devolvida a partir
da geração local, reduzindo a conta do consumidor. Caso as medidas venham a ser
postas em vigor realmente, podem impulsionar não só a microgeração como as usinas
de painéis solares. O advogado Luiz Gustavo Bezerra, do escritório Motta, Fernandes
Rocha Advogados e professor da FGV Direito Rio, explica que quem pretende instalar
painéis fotovoltaicos em casa e receber sua compensação deve procurar sua respectiva
distribuidora de energia para tratar das regras. Segundo ele, nem sempre é fácil entender
os mecanismos financeiros de abatimento, por conta das complexas questões tributárias.
Os cálculos variam de acordo com cada região, mas as empresas concessionárias
estariam interessadas em diminuir a burocracia. De acordo com ele, empresas podem
procurar abater o resultado de sua microgeração de um imóvel em outra conta com o
mesmo CNPJ. Portanto, as facilidades estão aumentando e em alguns anos a produção
de energia renovável, segura e bem distribuída, pode deixar de ser apenas uma cobrança
dos estudiosos.
Fonte: Ambiente Energia
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