DESENVOLVIMENTO MOTOR DE BEBÊS PRÉ-TERMO DE ACORDO COM AS IDADES CRONOLÓGICA E CORRIGIDA Renan Neves Urzêda1; Amanda Martins Campos1; Thalita Galdino de Oliveira2; Cibelle Kayenne Martins Roberto Formiga3,4; Maria Beatriz Martins Linhares4 1 Bolsista PBIC/UEG, graduandos do Curso de Fisioterapia, UnU ESEFFEGO - UEG. 2 Voluntário de Iniciação Científica PVIC/UEG, graduanda do Curso de Fisioterapia, UnU ESEFFEGO – UEG. 3 Orientadora, docente do Curso de Fisioterapia, UnU ESEFFEGO – UEG. 4 Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da Universidade de São Paulo, USP. Resumo O objetivo do presente estudo foi comparar o desenvolvimento motor de bebês pré-termo de acordo com suas idades cronológica e corrigida no intuito de verificar as diferenças entre estas. A amostra constituiu-se de 190 bebês pré-termo que nasceram no Hospital Materno Infantil de Goiânia, de ambos os sexos. Para a avaliação do desenvolvimento motor foram usados dois instrumentos: Test of Infant Motor Performance (TIMP) e Alberta Infant Motor Scale (AIMS). Os bebês foram avaliados na idade corrigida entre 2 e 4 meses pelo TIMP e entre 4 e 8 meses pela AIMS. Foram comparadas as freqüências das pontuações dos bebês considerando as idades cronológica e corrigida e verificou-se diferença estatisticamente significativa entre elas. Ao considerar apenas a idade cronológica o atraso no desenvolvimento motor dos bebês se torna superestimado. Com base nos resultados concluise a necessidade de corrigir a idade cronológica dos bebês pré-termo de acordo com o grau de prematuridade no primeiro ano. Palavras-chave: Desenvolvimento motor, idade cronológica, idade corrigida; prematuros. Introdução O grande avanço científico e tecnológico do cuidado intensivo neonatal trouxe consigo uma considerável redução da taxa de mortalidade entre os neonatos de risco, ou seja, aquelas crianças que possuem a maior probabilidade de apresentar atrasos em seu potencial de crescimento e desenvolvimento (MANCINI, et al.,2000; HALPERN, et al., 2000). Por 1 conseguinte, houve um aumento no número de bebês que necessitam de atenção redobrada da equipe interdisciplinar dos hospitais. Estes bebês devem ser reconhecidos precocemente, identificando as crianças de mais alto risco e direcionando medidas de intervenção e prevenção, a fim de diminuir a morbimortalidade pós-natal (MELLO & MEIO, 2003). Há uma crescente discussão sobre a utilização ou não da idade corrigida para a prematuridade durante a avaliação do desenvolvimento do bebê pré-termo. Os serviços de acompanhamento (follow-up) de bebês de risco geralmente adotam como rotina a correção da idade gestacional para os bebês que nasceram prematuramente. Segundo Blasco (1989), esta correção é realizada através da subtração do número de semanas de gestação do bebê, de um total de 40 semanas, que é considerado nascimento a termo pela Organização Mundial de Saúde. Esta diferença é, então, subtraída da idade cronológica do bebê. O uso da correção da idade gestacional justificou-se inicialmente pelos estudos de Gesell (MATILAINEN, 1987; BLASCO, 1989), em que as características do desenvolvimento de uma criança pré-termo deveriam ser avaliadas em relação à sua idade corrigida. Desta forma, o nascimento prematuro por si só não seria responsável por retardar o ritmo das aquisições inerentes à maturação. Baseando-se neste pressuposto, espera-se que ao corrigir a idade gestacional nos primeiros dois anos de vida, as seqüências do desenvolvimento das crianças pré-termo tornem-se semelhantes às apresentadas por crianças a termo (que nasceram com idade gestacional entre 37 e 42 semanas). Entretanto, estudos que comparam o desenvolvimento de bebês pré-termo e a termo têm, consistentemente, apresentados evidências indicando que as crianças prematuras demonstram um padrão irregular de desenvolvimento (GORDA et al., 1988; BLASCO 1989), podendo apresentar-se atrasadas, equivalentes ou aceleradas. O objetivo do presente estudo foi comparar o desenvolvimento motor dos bebês prétermo levando-se em consideração a idade corrigida para a prematuridade e a idade cronológica. Material e Método O estudo foi de caráter longitudinal, com uma amostra de 190 bebês pré-termo (Idade gestacional < 37 semanas), de ambos os sexos, que nasceram no Hospital Materno Infantil de Goiânia (HMI). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa e os pais autorizaram a participação das crianças assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os bebês foram avaliados em três faixas etárias (2-4 meses, 4-6 meses e 6-8 meses) por meio de dois instrumentos de avaliação motora: Test of Infant Motor Performance 2 (TIMP) (CAMPBELL et al., 2001), destinado a verificar a performance motora do bebês e o controle postural divididos em 42 itens. O TIMP foi usado na faixa etária entre 2 e 4 meses de idade corrigida; Alberta Infant Motor Scale (AIMS) (PIPER & DARRAH, 1994), para registro das aquisições motoras da criança em quatro posturas: supino, prono, sentado e em pé. A AIMS foi usada na faixa etária entre 4 e 6 meses e 6 e 8 meses de idade corrigida. As avaliações motoras dos bebês foram administradas por examinadores treinados de acordo com as normas de cada instrumento. Todas as avaliações foram filmadas e os vídeos foram analisados por avaliadores independentes para a pontuação do desenvolvimento motor de cada criança. Nem todos os bebês participantes da amostra realizaram todas as avaliações do desenvolvimento, portanto o “n”foi diferente em cada faixa etária analisada. A coleta de dados foi realizada no Ambulatório de Alto Risco do HMI e a análise dos dados foi realizada no Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa da ESEFFEGO (NIPE). O teste de comparação de grupos (teste Qui-quadrado) foi usado para verificar a diferença no desenvolvimento motor dos bebês de acordo com a idade cronológica e corrigida. As análises foram realizadas no programa estatístico SPSS – Statistical Package for Social Sciences (versão 15.0) e foi adotado o nível de significância de 5% (p ≤ 0,05). Resultados A Figura 1 apresenta os resultados do desenvolvimento motor entre 2 a 4 meses de acordo com a classificação pelo teste TIMP. 100 Idade Cronológica Corrigida 90 Idade Cronológica 80 Porcentagem (%) 70 60 50 43 40 30 20 34 30 38 22 14 12 7 10 0 Média Média Inferior Abaixo da Média Muito Abaixo da Média Desempenho Motor Figura 1. Classificação do desempenho motor dos bebês avaliados pelo TIMP na idade cronológica corrigida e idade cronológica (n = 182) 3 Na Figura 1 verifica-se que quando avaliados considerando a idade corrigida, 48% dos bebês apresentaram pontuações no teste TIMP inferior à média considerada normal. Este resultado indica que o desenvolvimento está atrasado, contudo, quando se considera a idade cronológica, este atraso aumentou para 81%, em que os bebês foram classificados como abaixo da média (38%) e muito abaixo da média (43%). A Figura 2 apresenta os resultados obtidos pelas crianças nas faixas etárias entre 4 e 6 meses e entre 6 e 8 meses, respectivamente. 100 Idade Cronológica Corrigida 90 Idade Cronológica 88 80 Porcentagem (%) 70 60 47 50 40 40 30 20 13 10 11 1 0 Normal Suspeito Anormal Desenvolvimento Motor Desenvolvimento de 4 a 6 meses de ICC (n = 146) 100 Idade Cronológica Corrigida Idade Cronológica 90 80 71 Porcentagem (%) 70 60 50 43 36 40 30 24 21 20 10 5 0 Normal Suspeito Anormal Desenvolvimento Motor Desenvolvimento de 6 a 8 meses de ICC (n = 112) Figura 2. Desenvolvimento motor dos bebês pela AIMS entre 4 e 8 meses de acordo com a idade cronológica corrigida e idade cronológica. 4 Na Figura 2, verifica-se que na avaliação pela AIMS na faixa etária entre 4 e 6 meses, apenas 13% dos bebês apresentaram desenvolvi mento motor normal na idade corrigida, sendo o restante em grande parte com suspeita de atraso (40%) ou desenvolvimento anormal ou atípico (47%). Na faixa etária entre 6 e 8 meses, resultado semelhante pode ser encontrado, em que apenas 21% apresentou desempenho normal na idade corrigida. No entanto, ao se considerar a idade cronológica, a porcentagem de bebês classificados com desenvolvimento anormal aumenta para 88% na idade entre 4 e 6 meses e 71% na idade entre 6 e 8 meses. A questão da necessidade da correção da idade em bebês pré-termo ainda é considerada controversa na literatura, mas alguns estudos apontam para a correção total, de acordo com a idade gestacional ao nascimento, durante o primeiro ano de vida. Os resultados do presente estudo são concordantes com os de Restiffe & Gherpelli (2006) que compararam o desenvolvimento motor de bebês até 12 meses de idade utilizando a idade cronológica e corrigida. O estudo sugere que a partir dos 13 meses de idade a correção do índice de prematuridade não é mais necessária quanto se trata da avaliação do desenvolvimento motor amplo de bebês nascidos pré-termo. Os resultados do presente estudo também concordam com os encontrado nos estudos anteriores de Matilainen (1987) e Den Ouden et al (1991). Ambos os autores investigaram a utilização das idades cronológica e corrigida na avaliação do desenvolvimento motor de bebês nascidos pré-termo. Os estudos concluem que a partir no segundo ano de vida a aplicação da correção da idade cronológica não é mais necessária no desenvolvimento dos bebês que nasceram pré-termo. Conclusão O fato de utilizar apenas a idade cronológica do bebê sem realizar o procedimento de correção da idade de acordo com o grau de prematuridade coloca os bebês a termo e prétermo dentro de um mesmo patamar de desenvolvimento, desconsiderando o fato do nascimento prematuro e as complicações advindas deste. Assim, no presente estudo verificouse que é necessário corrigir a idade cronológica dos bebês pré-termo de acordo com o grau de prematuridade no primeiro ano, especialmente para os bebês pré-termo extremos. 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