TEXTO DE APOIO I – PERCURSO ÁGUA Água, recurso escasso ou abundante? É lugar comum dizer que a Terra é o planeta água. Não é mesmo? Você já deve ter ouvido essa frase diversas vezes, reforçada com a afirmação de que três quartos da superfície do planeta são cobertos de água. E é verdade. Mas você já parou para pensar que a maior parte dessa água é salgada? Isso mesmo: 97,5% da água do planeta é salgada. Sobram apenas 2,5% de água doce. Ainda é uma grande quantidade de água, mas há um porém: a maior parte está aprisionada em aquíferos subterrâneos e geleiras. Só 0,26% da água doce da Terra está disponível em lagos, reservatórios e bacias hidrográficas, mais acessíveis ao homem. Isso significa que apenas 0,0065% de toda água na Terra está disponível e é doce. Ok, dá para perceber que 0,0065% é um número pequeno, mas na prática o que significa? Se toda a água da Terra coubesse em um balde de 10 litros, por exemplo, a água doce e disponível seria o equivalente a apenas 13 gotas. E você se lembra das aulas de geografia e ciências sobre o ciclo da água no planeta? A água não é criada nem desaparece. Ela se transforma. Mas o volume de água na Terra é o mesmo hoje do que foi no passado e será o mesmo no futuro. A questão é que o consumo dessas 13 gotas vem crescendo mais que o número de habitantes do planeta. Além de a população aumentar, a cada ano, cada habitante da Terra vem consumindo, em média, mais água. Entre 1900 e 2000, a população mundial aumentou 3,6 vezes enquanto o consumo de água cresceu dez vezes!!! Os dados são da Unicamp: de 1900 a 2000 a população saiu de 1,65 bilhão e chegou a 6 bilhões de pessoas, e o consumo de água saltou de 500 km3 por ano para aproximadamente 5.000 km3 por ano1. Diante desse cenário, o desafio é encontrar uma alternativa sustentável aos atuais modelos de produção e de consumo, que têm criado quatro principais problemas com relação à água: 1. Concentração e dificuldade de acesso: quando se fala em “falta de água”, não estamos falando da inexistência de água, mas da dificuldade ou inexistência de acesso. Trocando em miúdos: a maioria dos países tem água, mas ela não chega para toda a população. No Brasil, as regiões Norte e Nordeste são as que mais sofrem por falta d'água. Na Norte, apesar de a Amazônia 1 Revista MultiCiência dos Centros e Núcleos da Unicamp, outubro de 2003, http://www.multiciencia.unicamp.br/art03.htm concentrar 81% do potencial hídrico do país, menos de 14% da população urbana é atendida por sistemas de abastecimento satisfatórios. Já imaginou? É como ter um montão de água na sua cidade, mas na sua casa não ter sequer uma torneira! No Nordeste, apenas 18% da população tem acesso satisfatório à água. E a situação é mais grave porque a região ainda concentra os maiores problemas de aridez do País, por causa da baixa ocorrência de chuvas. Tanta gente aqui no Brasil sem garantia de água e a gente, às vezes, esquece da vida debaixo do chuveiro, né? Ou “varre” a calçada e o quintal com a mangueira aberta. Segundo o Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento de Recursos Hídricos, apresentado em 2012 na Rio+20, quase 1 bilhão de pessoas em todo o mundo não têm acesso a água potável. Além disso, o número de pessoas que não têm acesso à água corrente nas cidades é maior hoje do que no final do século passado. 2. Poluição: segundo a ONU2, a poluição é hoje a principal causa da redução dos volumes de água adequada para o consumo. Como já vimos, o volume total é sempre o mesmo, mas nosso estilo de vida vem poluindo quantidades cada vez maiores de água disponível. Imagine uma mancha que vai se espalhando na água limpa. A cada ano, esta mancha fica maior. Se não contivermos a mancha, corremos o risco de ela ocupar a água toda. Já imaginou como seria nossa vida se toda a água, aquelas 13 gotas do balde de 10 litros, ficasse poluída? Felizmente, por enquanto, estamos longe disso, mas a ONU alerta para a poluição que só faz crescer e gera sérios impactos na qualidade de vida das pessoas, na saúde, no investimento público, no custo da água para a população e no meio ambiente. E de onde vem essa poluição? De quase tudo o que consumimos. E de tudo que descartamos e não é tratado. Resíduos químicos da produção das indústrias e da agropecuária, esgoto doméstico e lixo sem tratamento são as principais causas da poluição de mananciais de água. Portanto, é hora de pensar o que fazer e mobilizar parentes, amigos, colegas de sala, o bairro, a cidade, para evitar a poluição da água. Somos parte do problema, mas somos também parte da solução. 3. Desperdício e excesso: nas cidades brasileiras, o maior desperdício se revela nas chamadas “perdas na rede”. Água perdida é aquela que sai limpa e tratada da distribuidora, mas que não chega ao consumidor. E você sabe por que isso acontece? Porque parte da água se perde pelas tubulações velhas ou 2 Site oficial do Dia Mundial da Água 2012 (em inglês). In FAQ: Tópico “How can we protect this precious resource?”. http://www.unwater.org/worldwaterday/faqs.html sem manutenção das empresas fornecedoras ou em instalações clandestinas, os chamados “gatos”. Em média, 37% da água tratada é perdida – um a cada três litros. Isso significa que, se não houvesse essas perdas, o brasileiro médio, que vive 73,5 anos, poderia viver até os 100 sem necessidade de aumentar o volume de água tratada para ele. E, portanto, sem necessidade de investimentos em estações de tratamento de água. Bastaria que as concessionárias de água cuidassem de suas redes. A melhor média mundial é do Japão, que alcançou apenas 3% de perdas na rede3. Além dessas perdas na distribuição, há os maus hábitos de uso da água pelo consumidor no dia a dia, como “varrer” a calçada com a mangueira, tomar banhos demorados, descuidar da torneira aberta sem necessidade ou não consertar pequenos vazamentos. Além da água usada para matar a sede, cozinhar, limpar e se limpar, as pessoas “bebem” muita água embutida nos produtos e serviços que compram. No Brasil, e em média no mundo, agricultura, pecuária e indústria consomem, em conjunto, nove em cada dez litros produzidos. E também há perdas nesse uso na produção de alimentos e outros bens, principalmente no campo. Você sabia que mais da metade da água destinada à agricultura brasileira é desperdiçada? Isso mesmo: apenas 40% é efetivamente aproveitada. O restante é perdido pelos usos em excesso ou fora do período de necessidade da planta e nos horários de maior evaporação4. 4. Aumento do custo: os problemas anteriores não saem de graça, não é mesmo? Eles levam ao aumento do custo da água tratada. Afinal, quanto mais água se consome, se perde, se desperdiça ou se polui, tanto maior será o gasto para buscar em novas fontes – em geral mais distantes. E se o volume do consumo cresce – com ou sem desperdício – serão necessários também volumes crescentes de água nas estações de tratamento e distribuição. Nesse caso, é preciso aumentar a capacidade da estação de tratamento ou o número de estações. E quem paga por essas ampliações? Todos nós. Nas nossas contas mensais de água, que incluem não só o custo líquido da água, mas toda a operação de captação, tratamento, distribuição e instalações de novas estações. Entendendo agora um pouco mais que o uso – bom ou mau – de uma pessoa ou de um estabelecimento impacta todos, já dá para perceber como é falsa a frase e errado o raciocínio 3 Fonte: Sabesp http://site.sabesp.com.br/site/imprensa/noticias-detalhe.aspx?secaoId=66&id=3722, acessado em 08/03/2012. 4 Almanaque Brasil Socioambiental 2005, Instituto Socioambiental, pág. 261; Site Unesp – Sistema de Irrigação sob medida, Fernanda Yoneya - http://www.agr.feis.unesp.br/esp05jul2006.php de quem desperdiça e diz: “a água é minha, eu que pago minha conta”. Essa é uma meia verdade, afinal indiretamente, todos pagamos. Como se pode ver, o problema é complexo e sua solução pede ações de vários agentes da sociedade. Já imaginou que você é um desses agentes? Você e sua família, afinal vocês são consumidores. Aparentemente, a contribuição do consumidor, frente ao conjunto dos problemas, é pequena. No entanto, se os cidadãos do mundo se conscientizarem dos problemas existentes em relação à água, cada um pode levar ao mundo essa mesma consciência – seja como estudante, professor, funcionário do governo ou de uma empresa, seja como cidadão de uma comunidade, seja como consumidor individual ou na relação de consumo com sua família. Nesse sentido, o cidadão-consumidor consciente da importância de não desperdiçar um recurso precioso como a água servirá de exemplo onde estiver. A melhor maneira de “convencer” e mobilizar outras pessoas é dar o exemplo. Nessa perspectiva, as ações do consumidor individual passam a ter um significado e um impacto além dos muros da escola e das paredes de casa. E o que fazer então? Pra começar, é possível: Economizar água nas atividades domésticas; Optar por produtos que usem menos água em sua cadeia produtiva, de modo a incentivar a indústria e, sobretudo, a agropecuária, a inovar para reduzir o seu uso e a zerar o desperdício e a poluição da água; Usar todas as oportunidades de reduzir o desperdício de água ao mínimo na empresa ou organização onde trabalha; e Pressionar governos e empresas fornecedoras de água para que reduzam as perdas na rede de distribuição, assim como o desperdício de água em suas próprias atividades.