Breves aspectos da SCP e o grupo econômico para fins
trabalhistas
Carlota Bertoli Nascimento1
Resumo: O Novo Código Civil passou a prever de forma mais clara a Sociedade em Conta de
Participação. Essa forma societária tem se mostrado mais célere e ágil para a consecução de
negócios imobiliários, especialmente em tempos de Copa do Mundo, onde a rapidez é a palavra de
ordem. No entanto algumas cautelas devem ser tomadas ante a possibilidade legal prevista da
Consolidação das Leis do Trabalho de se alcançar a responsabilidade das empresas sócias
participantes pelos créditos trabalhistas.
Palavras chaves: sociedade em conta de participação - grupo econômico - responsabilidade.
Abstract: The New Civil Code now provides more clearly the unincorporated Participation. This
corporate form has been shown to be faster and more responsive to the achievement of real estate,
especially in times of World Cup, where speed is the watchword. However some caution should be
taken against the legal option under the Consolidation of Labor Laws to reach the liability of members
participating companies for labor credits.
Keywords: unincorporated participation - economic group – responsibility.
Introdução
Com o grande fomento à construção civil pelo governo federal nos últimos anos,
somado à realização da Copa do Mundo no Brasil, tem ganhado ênfase a figura da
Sociedade em Conta de Participação, que esta sendo muito utilizada para a
realização de incorporações imobiliárias ou da própria execução da obra, tanto por
empresários, como por sociedades.
A nova roupagem dessa figura jurídica apresentada pelo novo Código Civil trouxe
inovações importantes sobre esse tipo societário, permitindo sua utilização nos mais
diversos ramos empresariais, e principalmente, possibilitou a ampliação de seu uso
ante a simplicidade na sua constituição e administração.
No entanto, muito cuidado deve ser tomado no uso dessa figura na área imobiliária,
pois, apesar de a legislação privada eximir alguns tipos de sócios de
1
Advogada; professora do curso de Direito da Faculdade Cenecista de Osório; Mestra em Direitos
Fundamentais pela Pontifícia Universidade Católica de Direito do Rio Grande do Sul, especialista em
Direito e Processo do Trabalho e Direitos Públicos.
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responsabilidade, a legislação Trabalhista, no que tange à responsabilidade pelo
pagamento dos direitos dos trabalhadores pode vir a alcançar as sociedades que
figurem como sócias ocultas a fim de garantir o pagamento dos creditos trabalhistas
reconhecendo a existência de grupo econômico, especialmente quando não haja
contrato social publicado.
Além do grande fomento à economia nacional e local, ante a ocorrência de jogos em
determinadas cidades do país, como em Porto Alegre, portanto, a promoção no
setor construtivo (rede de hotelaria, comércio, vias públicas, etc.), não se pode
esquecer a responsabilização social que um evento de porte mundial traz consigo.
O presente estudo pretende avaliar alguns aspectos referentes à sociedade em
conta de participação e a possibilidade de reconhecimento, ou aplicação da figura do
grupo econômico para fins trabalhistas e a possibilidade de responsabilização dos
sócios ocultos nesses casos.
Características e natureza jurídica da sociedade em conta de participação
A SCP é a junção de duas ou mais pessoas (físicas ou jurídicas), onde uma delas, o
sócio ostensivo, atua como administrador-gerente, e o outro, sócio oculto ou
participante, apenas investe seu capital participando dos lucros e perdas 2.
Alguns autores negam a este tipo societário a natureza jurídica de sociedade em
virtude de suas características, para Borba faltar-lhe-ia a característica principal de
uma sociedade, qual seja a plurilateralidade3.
Nesse mesmo sentido Sergio Campinho assevera que a sociedade em conta de
participação pode ser conceituada como um contrato associativo ou de participação,
2
Segundo Borba, “na sociedade em conta de participação, uma ou mais pessoas fornecem dinheiro
ou bens a um empresário, a fim de que este os aplique em determinadas operações, no interesse
comum.” BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 13 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012,
p.114.
3
Afirma o autor “Embora tenha o nome de sociedade e esteja incluída no título do Código Civil que
trata das sociedades, a chamada sociedade em conta de participação não é uma verdadeira
sociedade.” Para o autor a relação que se estabelece entre os sócios é de contrato bilateral, mesmo
que haja vários participantes, sendo a relação de todos eles tão somente como o sócio ostensivo e
não entre si. BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 13 ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2012, p.113-115.
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pelo qual duas ou mais pessoas físicas ou jurídicas, se obrigam a explorara uma ou
mais atividades econômicas4, tão somente em virtude de suas características, em
especial a administração exclusiva pelo sócio ostensivo.
Nesse tipo societário existem duas espécies de sócios o ostensivo e o oculto ou
participante este não pode, nos termos do Código Civil aparecer perante terceiros,
restando à administração e gerencia da sociedade ao sócio oculto, no entanto, não
se pode dizer que este não possa dar diretrizes àquele, já que tem o direito (e o
dever) de fiscalizar a atuação e as contas geridas pelo sócio operador.
O sócio gestor atua em nome individual, e deve criar um conta para lançar os lucros
que ao final serão apurados e divididos. Como não possui formalidade, não
constituindo-se uma pessoa jurídica, pode ser provada por terceiros por qualquer
forma, mas o contrato feito entre os sócios pode ser registrado, a fim de assegurar
maior credibilidade da sociedade e os direitos dos sócios ocultos, o que não
descaracteriza tal sociedade, pois, o que não é permitido é a participação do sócio
oculto na gestão dos negócios, podendo ele ser conhecido de terceiros 5.
O que é o grupo econômico para fins trabalhistas?
A Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, em seu artigo 2º, § 2º, qualifica como
grupo econômico o grupo de empresas para fins trabalhistas, a fim de poder
responsabilizar pelas verbas trabalhistas, de forma solidária, todos aqueles entes ou
pessoas que obtiveram ganhos com o trabalho de empregados, vejamos os termos
da CLT:
§2º. Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas,
personalidade jurídica própria, estiverem sobre a direção, controle ou administração
4
CAMPINHO, Sergio O Direito de Empresa à luz do novo Código Civil. 4 ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2004, p. 84-85. No mesmo sentido: VENOSA, Silvio de Salvo; RODRIGUES, Cláudia. Direito Civil.
Direito Empresarial. 4 ed. São Paulo: Atlas. 2012, p. 106-107; para quem a SCP possui natureza
jurídica de contrato de participação. Em sentido contrário: JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria
de Andrade. Código Civil Comentado. 8 ed. 2011, p.868, segundo o autor é a SCP uma sociedade
regular, porem sem personalidade jurídica.
5
Nesse sentido: JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 8
ed. 2011, p. 870; para quem: “A sociedade em conta de participação é legal, portanto, regular. Não é
de sua característica exteriorização da sociedade e dos atos societários. Não é próprio, contudo,
denominá-la de oculta, ou secreta, dando o cunho pejorativo. (Brandão Lopes, Sociedade, n. 14, pp.
48/50). O contrato social pode ser registrado e terceiros ter conhecido a existência da sociedade e da
identidade do sócio oculto. Isso não desvirtua a sociedade em conta de participação.”
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de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade
econômica, serão para os efeitos da relação de emprego, solidariamente
responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.
Assim, a CLT pretende que a vinculação formada entre dois ou mais entes que se
favoreçam pelo mesmo contrato de trabalho, possa ser imputada a qualquer dos
favorecidos6.
Segundo Garcia o grupo econômico se forma e se reconhece “em razão da
existência de certa unidade, direção única ou realização de objetivos comuns”, pois,
a relação de emprego existe com o grupo, ou seja, com todos os participantes, e não
com cada empresa ou pessoa figurante da sociedade, já que todos se beneficiam da
atividade do empregado7.
Maurício Godinho Delgado afirma que para a configuração do grupo econômico
deve ser observada a abrangência objetiva e subjetiva do grupo, bem como o nexo
relacional entre os integrantes8.
Segundo o mesmo autor não é necessário para a sua existência se revista o grupo
econômico de uma das formas societárias previstas do ordenamento jurídico, sequer
sendo necessário a sua formal “institucionalização cartorial”9, já que a configuração
dá-se apenas para fins trabalhistas.
O requisito subjetivo para a existência do grupo é a qualidade de agente econômico,
podendo este ser pessoa física, ou jurídica, bastando que possua “dinâmica
econômica”10, ou seja, que a atividade dos componentes do grupo tenha fins
lucrativos.
Por fim, o nexo relacional pode ser observado pela simples relação coordenativa
entre as partes componentes do grupo, em especial no que toca às sociedades em
6
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 6 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2012, p. 300.
8
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011, p. 397-401.
9
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011, p. 398.
10
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2011, p. 399.
7
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conta de participação, onde todos os sócios, especialmente quando são estes
pessoas jurídicas, buscam o lucro com a atividade do sócio ostensivo.
Não se pode negar que uma sociedade em conta de participação possa se
configurar um grupo econômico para fins essencialmente trabalhistas, admita-se sua
natureza de empresa ou não, pois, ela configura sem sombra de dúvidas a
conjunção de esforços para a obtenção de lucro, seja o grupo uma empreiteira,
construtora, ou incorporadora, como se tem utilizado nesses tempos de fomento à
construção civil.
Responsabilidade dos sócios da SCP frente aos trabalhadores
Quando se fala em responsabilidade nas sociedades em conta de participação, o
Código Civil deixa claro nos parágrafos únicos dos artigos 991 e 993
respectivamente transcritos:
Art. 991. (...)
Parágrafo único. Obriga-se perante terceiros tão somente o sócio ostensivo; e,
exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social.
Art. 993. (...)
Parágrafo único. Sem prejuízo do direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o
sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com
terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que
intervir.
Da redação dos artigos se extrai que a responsabilidade pelos atos sociais,
especialmente
perante
terceiros
é
exclusiva
do
sócio
gestor,
sendo
a
responsabilidade do sócio oculto apenas perante aquele, nos termos do contrato
social assinado entre as partes.
Ou seja, externamente o empresário que representa a sociedade, atua como se esta
não existisse, o sócio ostensivo obriga-se pessoalmente pela sociedade, e os
participantes obrigam-se apenas perante este último.
A sociedade em conta de participação congrega duas espécies de sócios: o sócio
ostensivo e o sócio oculto ou participante. O primeiro é aquele a quem compete
explorar, em nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, o objeto
definido no contrato de participação. O sócio oculto, geralmente prestador de capital,
tem por escopo a participação nos resultados da exploração do objeto, sem, contudo,
assumir riscos pelo insucesso do empreendimento junto a terceiros. Os seus riscos
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são dimensionados e se limitam à prestação pela qual se obrigou junto ao sócio
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ostensivo, nos termos exclusivos do contrato .
Ocorre que quando se trata de créditos trabalhistas a máxima legal civilista não
prevalece, seja pela existência da lei especial regendo os contratos de emprego
firmados por quaisquer tipos societários, seja pela especialidade do credito em
comento que possui natureza alimentar e de direito fundamental social, ou seja, cuja
obrigação constitucional não é determinante apenas ao Estado, mas essencialmente
à iniciativa privada.
O objetivo essencial da legislação trabalhista ao criar o grupo econômico para fins
celetistas foi ampliar as possibilidades de garantia do credito trabalhista, “impondo
responsabilidade plena por tais créditos às distintas empresas componentes do
mesmo grupo econômico”.
Além disso, tem por escopo a norma especial celetista, tentar evitar fraudes, como
por exemplo, a criação de sociedades subsidiárias, ou SCP, criadas para a
contratação de pessoal sem que os contratos firmados respinguem responsabilidade
na empresa principal.
A construção civil, em especial, tem demonstrado utilização dessa figura societária
para a contratação de pessoal, numa tentativa de fraudar a legislação laboral e
permanecer com “ficha limpa”, a fim de que possam figurar em vários
empreendimentos de incorporação12.
No que toca à relação de trabalho firmada entre o sócio ostensivo e o empregado,
observa-se
pela
finalidade
própria
dessa
configuração
societária,
que
o
aproveitamento da atividade prestada pelo empregado não limitar-se-á àquele sócio,
mas a todos os componentes da sociedade, em especial quando o sócio investidor
ou participante é outra pessoa jurídica, não se podendo negar a existência do grupo
11
CAMPINHO, Sergio O Direito de Empresa à luz do novo Código Civil. 4 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p.
83.
12
Tal constatação se dá através da análise da jurisprudência do Tribunal Regional da 4ª Região, cuja
pesquisa tem relevado um alto índice de condenação e execução de tais empresas em casos como o
ora estudado, a título de exemplo pode-se citar os seguintes julgados: 0012100-13.2008.5.04.0020;
0000419-47.2012.5.04.0233; 0213300-59.2005.5.04.0252; 0133200-45.2002.5.04.0019; 003730015.2009.5.04.0302; 0050300-39.2001.5.04.0019.
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econômico para os fins trabalhistas, e portanto, a possibilidade de alcance da
responsabilidade deste ultimo de forma solidária no pagamento dos creditos
trabalhistas.
Conclusão
Em tempo de Copa do Mundo fica visível o investimento do governo Federal e da
iniciativa privada na construção civil. Algumas cidades como Porto Alegre, preparamse às pressas para a chegada do evento de proporções grandíssimas, tornando-se
verdadeiros canteiros de obra.
A sociedade em conta de participação, nesse cenário econômico, tem se mostrado
uma ótima alternativa para investidores e empresários dos mais diversos ramos,
ante a simplicidade e rapidez de sua constituição, o que vem ao encontro da atual
situação socioeconômica, em especial nos investimentos imobiliários que exigem
agilidade e rapidez na sua constituição para o cumprimento dos fins a que se
propõe: a Copa do Mundo.
No entanto, necessário o discernimento e atenção do sócio participante,
especialmente no que tange à escolha do sócio gerente, já que este toma a frente
das negociações, mesmo que instruído por aquele, e comanda a força de trabalho
contratada para os fins empresarias responsabilizando-se pelo sucesso do negócio.
No que tange ao regramento laboral dos empregados dessa forma societária,
entretanto, não pode o sócio participante fugir à responsabilidade que lhe impõe a
legislação juslaboral, sendo imprescindível a sua observância constante das contas
mesmo com a plena confiança no gestor das contas.
Assim, a sociedade em conta de participação pode ser um ótimo instrumento para a
realização de negócios com rapidez e agilidade ante as suas características, sem
implicar em comprometimento do patrimônio do sócio investidor, desde que
observados os regramentos jus laborais à risca a fim de se evitar a busca do
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patrimônio das empresas participantes, através da formação do grupo econômico a
fim de satisfazer credito de natureza fundamental e que por esse motivo, ignora os
termos da não responsabilização do sócio oculto pela lei civil.
Referências
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 13 ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2012.
CAMPINHO, Sergio. O Direito de Empresa à luz do novo Código Civil. 4 ed. Rio
de Janeiro: Renovar, 2004.
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 14ª ed. São Paulo: Saraiva,
2003.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr,
2011.
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 6 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2012.
JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 8
ed. 2011.
PORTUGAL, Bernardo Lopes. A sociedade em conta de participação no Novo
Código Civil e seus aspectos tributários. RODRIGUES, Frederico Viana (Coord.).
Direito de empresa no novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 1º Vol. 22ª ed. São Paulo:
Saraiva, 1995.
VENOSA,
Silvio
de
Salvo;
RODRIGUES,
Cláudia.
Direito
Civil.
Direito
Empresarial. 4 ed. São Paulo: Atlas. 2012.
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