UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY
COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO
ANNA MARIA DE OLIVEIRA SALIMENA
O COTIDIANO DA MULHER APÓS A HISTERECTOMIA
À LUZ DO PENSAMENTO DE MARTIN HEIDEGGER
Rio de Janeiro
2007
ANNA MARIA DE OLIVEIRA SALIMENA
O COTIDIANO DA MULHER APÓS A HISTERECTOMIA:
À LUZ DO PENSAMENTO DE MARTIN HEIDEGGER
Tese de Doutorado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação da Escola de
Enfermagem Anna Nery da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do título
de Doutora em Enfermagem.
Área de concentração: A Enfermagem no
Contexto Social Brasileiro
Núcleo de Pesquisa de Enfermagem em Saúde
da Mulher-NUPESM
Orientadora: Profª. Dra. Ivis Emília de Oliveira Souza
Rio de Janeiro
agosto de 2007
Salimena, Anna Maria de Oliveira
O cotidiano da mulher após histerectomia a luz do pensamento de
Martin Heidegger / Anna Maria de Oliveira Salimena ; orientador: Profa
Dra. Ivis Emilia de Oliveira Souza. - - 2007.
137 f.
Tese (Doutorado em Enfermagem) – Escola de Enfermagem Anna
Nery, Universidade Federal de Juiz de Fora.
1. Saúde da mulher. 2. Enfermagem. 3. Heidegger, Martin.
4. Fenomenologia. I. Souza, Ivis Emilia de Oliveira. II. Titulo.
CDD 613.99
O COTIDIANO DA MULHER APÓS A HISTERECTOMIA
À LUZ DO PENSAMENTO DE MARTIN HEIDEGGER
ANNA MARIA DE OLIVEIRA SALIMENA
Tese submetida à Banca Examinadora da Escola de Enfermagem Anna Nery, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau
de Doutora em Enfermagem.
Aprovada em 30 de agosto de 2007
por:
____________________________________________
Dra. Ívis Emília de Oliveira Souza
Orientadora
Profª.Titular da Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ
____________________________________________
Dra. Matilde Meire Miranda Cadete
1ª Examinadora
Prof Adjunta da Faculdade de Enfermagem UNESA/ MG
_____________________________________________
Dr. Octavio Muniz da Costa Vargens
2º Examinador
Profº Titular Faculdade de Enfermagem da UERJ/RJ
____________________________________________
Dr. Michel Perreault
3º Examinador
Profº Associado da Faculdade de Enfermagem da Université de Montreal- CA
Profº. Visitante na Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ
_________________________________________
Dra. Maria Antonieta Rubio Tyrrell
4ª Examinadora
Profª Titular da Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ
____________________________________________
Dra. Claudia Santos
Suplente
Profª Adjunta Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ
____________________________________________
Dra. Teresa Caldas Camargo
Suplente
Enfermeira do Hospital do Câncer III HCIII - I N CA - RJ
Dedicatória
Ao meu pai, que inesquecível se faz pre-sença no meu cotidiano.
A minha mãe, pelo meu ex-istir sendo-mulher-com-no-mundo.
Ao Luiz Céu Mar, meu marido, com quem compartilho todas as alegrias e
dificuldades.
Aos meus filhos Leandro, Fernando e Lucianna pela imensa alegria de ser-mãe,
sendo-no-mundo com vocês.
À Drª Ívis Emília, que me mostrou um universo de possibilidades.
Às mulheres que prontamente concordaram participar do meu estudo e, ao se abrirem
falando do seu cotidiano, compartilharam comigo suas vivências.
Para você minha orientadora,
Inteligente, importante, imprescindível,
Você
Iluminou meu caminhar
Sua presença me estimulou a continuar
Enquanto eu trabalhava,
Minha amiga, você me apoiava
Independente dos percalços
Lentamente com você eu avançava
Inimaginável a principio, quão longe nós chegaríamos
Agora aqui estamos, no fim da nossa jornada.
E, a você meu companheiro,
Lutando contra as adversidades
Ultimamente você quase ficou só.
Imprescindível no caminho,
Ziguezagueando ao meu redor.
Companheiro leal
Enquanto eu caminhava.
Uma vez ao meu lado,
Meu espírito se acalmava.
Assim consegui chegar ate aqui.
Rumo a essa vitória com você, graças ao seu apoio velado.
AGRADECIMENTOS
À Deus, pela minha existência e luz em meu caminhar, mostrando sempre um amanhecer,
dando forças para eu prosseguir em minhas propostas e me guiando nesta trajetória.
Ao meu pai, não mais presente, por ter sido motivo de forças nos momentos em que pensei
não mais ter. Por ter sido o primeiro a ensinar-me o significado do amor, do respeito e
dedicação ao próximo, sendo-aí-com em todas as possibilidades de ser.
À minha mãe, por me incitar a ter aquilo que não teve, por me fazer confiante e acreditar
nas possibilidades e por tudo que fez para que eu estudasse, pois sempre me estimulou.
Aos meus filhos, dos quais tirei muitas horas de com-vívio no percurso de suas adolescências
para meus estudos no mestrado e doutorado. Mas, também, por despertarem em mim força e
vontade, sendo ser-com-carinho-e-dedicação no cotidiano.
Ao marido, pela ajuda, por termos vivido esse trabalho juntos, por sempre confiar e apoiar,
enfim, pela cumplicidade e amor.
À minha orientadora, pelos nossos encontros que, com serenidade, segurança e competência,
me conduziu aos caminhos da fenomenologia e do pensar de Heidegger. Não encontro
palavras para agradecer, pois que no modo de ser-com, se abriu e compartilhou: sua
sabedoria, solicitude, amizade, cuidado e carinho e, mais que uma orientadora uma amiga
que, na co-vivência autêntica, compreendeu minhas dificuldades pessoais, atropelos do
cotidiano e possibilitou o meu desenvolvimento pessoal e profissional.
Aos jovens, Joyce Eliza e Ivan Marcos, pelo carinho com que sempre me atenderam ao
telefone.
À Ana Inês, pelo carinho com que me acolheu em sua casa, no Rio, durante o curso.
À Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Juiz de Fora-MG e à Escola de
Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro-RJ, pela oportunidade
de realização do Curso de Doutorado.
Às professoras do Curso de Doutorado da Escola de Enfermagem Anna Nery/ UFRJ e aos
membros do Núcleo de Pesquisa de Enfermagem em Saúde da Mulher, pela acolhida
carinhosa e pela oportunidade de aprendizado compartilhando os seus saberes para o meu
enriquecimento.
Aos Membros das Bancas de Defesa do Projeto, Qualificação e Defesa da Tese, pela
disponibilidade de participar e apresentar contribuições decisivas e consistentes no
aprimoramento deste estudo.
À professora e Drª Matilde Meire Miranda Cadete que, sendo minha orientadora no
mestrado, despertou-me para o caminho da fenomenologia.
Às colegas do Curso de Doutorado, pelo inestimável companheirismo, troca de experiências e
oportunidade de crescimento no con-vívio de estudos no cotidiano da vida acadêmica, sendo
co-presenças nessa trajetória.
À Sonia Xavier e demais funcionários da Secretaria Acadêmica da Coordenação de PósGraduação da EEAN-UFRJ, que sempre atenderam com gentileza, carinho e eficiência a
todas as minhas solicitações.
À colega e amiga Maria Carmen, parceira de estudos, pela amizade, carinho, pela troca
constante de conhecimentos, solidariedade nos momentos difíceis e compreensão no estarcom.
À Daiane, pela amizade, “ filha por escolha”, que com carinho, me ajudou com as traduções
em inglês.
Às colegas e amigas Girlene, Cristina Arreguy e Betânia pelo incentivo, generosidade, apoio
e solicitude, pois que, sempre disponíveis, me ajudaram nesta caminhada.
Aos colegas do Departamento de Enfermagem Aplicada, da Faculdade de Enfermagem da
UFJF, pelo apoio em mais esta etapa.
Aos médicos – professores da UFJF: Itagyba (anestesiologista) amigo que sempre me
incentivou nos estudos e Homero (gineco-obstetra) na ajuda com o referencial bibliográfico e
Dr. Marcio José (epidemiologista) que trouxe contribuições ao projeto deste estudo na
organização de dados quantitativos.
A todos do Bethel Kéren Happouk nº 8 de MG, pelo apoio e incentivo para mais este
momento vivido.
A todos que fazem parte do meu existir, que de forma direta ou indireta, me ajudaram neste
caminho e na concretização deste sonho.
RESUMO
SALIMENA, Anna Maria de Oliveira. O COTIDIANO DA MULHER APÓS A
HISTERECTOMIA À LUZ DO PENSAMENTO DE MARTIN HEIDEGGER. Rio de
Janeiro, 2007. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Escola de Enfermagem Anna
Nery,Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2007.
Este estudo de natureza qualitativa teve como objeto o cotidiano de mulheres
após a histerectomia. Neste sentido foi utilizada a abordagem fenomenológica como
método de pesquisa e o pensamento de Martin Heidegger como referencial teóricometodológico. Foram depoentes 25 mulheres submetidas à histerectomia, sendo que
a entrevista fenomenológica ocorreu num tempo variado de quatro a dezenove
meses após o procedimento cirúrgico. A análise interpretativa em seu primeiro
momento metódico, da compreensão vaga e mediana, permitiu a construção de oito
unidades de significação: os problemas que determinam a cirurgia são relembrados;
a decisão do tratamento é/foi do médico; a rotina do acompanhamento de saúde é
obedecida; houve necessidade de ajuda no domicílio; o retorno às atividades do lar e
de trabalho foi gradativo; ocorreram probleminhas que determinaram idas e vindas
ao hospital; houve melhoras, mas ainda há queixas; a atividade sexual foi
considerada. A compreensão interpretativa, segundo momento metódico, desvelou à
luz do pensamento de Heidegger que o cotidiano da mulher após a histerectomia se
expressa num movimento que transita da inautenticidade para o indicativo de
propriedades e impropriedades que mostra a autenticidade pela decisão, porém não
desenvolve o movimento da angústia hedeggeriana. A mulher indicou que, no
período que antecede a cirurgia, está no modo de ser da cotidianidade, dominada
pelo temor de estar sangrando e sentindo dor. Entretanto é no dia-a-dia, após a
intervenção, que se compreende sendo-aí-com-os-outros e se desvela, frente a
propriedades e impropriedades, mostrando-se como ser de possibilidades num
mundo próprio. Há, dentre os sentidos desvelados, pelo menos três que,
diretamente, contribuem para a melhoria da qualidade da assistência frente às atuais
políticas públicas de saúde da mulher. Estes sentidos revelaram que na dinâmica
assistencial às condições de busca da mulher pelo serviço de saúde, o preparo para
a alta hospitalar e a alta propriamente dita, e ainda, as rotineiras orientações de
abstinência sexual determinada pelo pós-operatório devem ser considerados a partir
da subjetividade da mulher que será submetida à histerectomia.
Palavras chave: Saúde da Mulher. Histerectomia. Cotidiano. Martin Heidegger.
ABSTRACT
SALIMENA, Anna Maria de Oliveira. Woman´s daily after histerectomy in the light
of Martin Heidegger´s thoughts. Rio de Janeiro, 2007. Thesis (Doctorate in
Nursing) – Anna Nery School of Nursing, Federal University of Rio de Janeiro, 2007.
This qualitative study had as its object the daily-life of women after being submitted to
a histerectomy. Following this sense the phenomenological approach was chosen as
methodological framework , supported by Martin Heidegger´ phenomenology. The
deponents were twenty five women submitted to a histerectomy between four and
nineteen months after the surgical procedure, which was made by open-ended
interviews. Data analysis in its first methodological step of the vacant and medium
understanding allowed to build eight meaning units: the programs that determinete
the surgery was remembered; the decision on treatment is/was a doctor´s choice; the
health follow up´s routine is/was obeyed; homecare was necessary; the return home
and work activities were gradual; little problems occurred and that had determined
the necessity to return to the hospital; there was some improvements but there are
still some complaints; the sexual activity was considered . The hermeneutics
analysis, the second methodological step, showed, under Hedegger perspective, that
women´s daily-life after being submitted to histerectomy expresses itself in a
movement that goes forward and backward for inauthenticity to an indication of
properties and improperties, and that shows authenticity for the decision. However,
does not develop movement of Heidegger´s anguish. The woman pointed out that
during the time period before the surgery, she was in the heidegger´s way of being of
daily-life, dominated by the fear of being bleeding and feeling pain. However, it is in
the daily-life after the surgery that she understands herself as being-there-with-theother and, facing properties and improperties, revealing herself as “being-ofpossibilities” in a self world. There are among the presented meanings, at least three
that contribute to the improvement of the assistance quality even with the current
women´s health public system. These senses showed that, in the assistential
dynamics, the conditions that allowed women to search for health services, to be
prepared for hospital discharge, and also to be prepared for sexual abstinence
determined by the post operative must be considered from the perspective of the
subjectivity of the woman who will be submited to histerectomy.
Words key: Health of the Woman, Histerectomy, Daily, Martin Heidegger.
RÉSUMÉ
Salimena, Anna Maria de Oliveira. Le quotidien de la femme après
l'hystérectomie, à la lumière de la pensée de Martin Heidegger. Rio de Janeiro,
2007. Thèse (Doctorat en Infirmerie) - École d'Infirmerie Anna Nery, Université
Federale de Rio de Janeiro, 2007.
Cet étude de nature qualitative a eu comme objectif, le quotidien des femmes
après avoir subi une hystérectomie. Dans ce sens a été utilisée une abordage
expérimental comme méthode de recherche et les pensées de Martin Heidegger
comme références. Vingt cinq femmes qui ont subi l' hystérectomie ont témoignés
après une période entre quatre et dix-neuf mois après l'intervention chirurgicale.
L'analyse a pu interpréter au premier moment, la construction de huit unités
signiticatives: les souvenirs des problèmes qui ont determiné la chirurgie sont
constant, la décision du traitement est ou a été de la part du médicin, la routine du
suivi médical est obéi, il y a eu la nécessité d'aide dans le domicile, le retour des
activités au travail et de tâches ménagères a ètè graduel, des petits problèmes ont
determinés des aller-retour à l'hôpital, il y a eu des progrès, mais aussi des plaintes,
l'activité sexuelle a été consideré. La compréhension au deuxième moment de
l'analyse a saisi sur le fait que le quotidien de la femme après avoir subi une
hystérectomie s'exprime dans un mouvement que varie entre l'inauthenticité pour
l'indicatif des proprietés et improprietés et que montre l'authenticité pour la décision,
par conséquent, ne développe pas le mouvement de l'angoisse hedeggeiène. La
femme a indiqué qu'avant la periode précedente à la chirurgie, est dans la manière
d'être de la quotidienneté, assujetie par la peur de saigner et d'éprouver de la
douleur. Cependant c'est de jour en jour après l'intervention, que se comprends "en
étant ainsi comme les autres", et se montre face à des propriétés et impropriétés
dans un monde convenable. Il y a au moins trois sens qui contribuent pour
l'amélioration de la qualité d'assistence, face aux actuelles politiques publiques de la
santé de la femme. Ces sens ont revelé les conditions de recherche de la femme
pour les services hospitaliers et les orientations à propos de l'abstinence
sexuelle,determinée après l'intervention, doivent être considerés à partir de la
subjectivité de la femme que subira l'hystérectomie.
Mots-clés: Santé de la femme. Hystérectomie. Quotidien. Martin Heidegger.
RESUMEN
SALIMENA, Anna Maria de Oliveira. El COTIDIANO DE LA MUJER TRAS LA
HISTERECTOMIA A LA LUZ DEL PENSAMIENTO DE MARTIN HEIDEGGER. Rio
de Janeiro, 2007. Tesis (Doctorado en Enfermería) - Escuela de Enfermería Anna
Nery, Universidad Federal de Rio de Janeiro, 2007.
Este estudio de naturaleza calitativa tuvo como objeto el cotidiano de mujeres tras la
histerectomia. En este sentido fue utilizada el enfoque fenomenológico como método
de investigación y el pensamiento de Martin Heeidegger como referencial teórico
metodológico. Fueron testigos 25 mujeres sometidas a la histerectomia siendo que la
encuesta fenomenológica ocurrió en un tiempo entre cuatro y diécinueve meses tras
el procedimiento cirúrgico. El análisis interpretativa de su primer momento metódico
de comprensión no precisa y mediana, permitió la construcción de ocho unidades de
significación: los problemas que determinan a la cirurgia son recordados; la decisión
del tratamiento es/fue del médico; la rutina del acompañamiento de salud es
obedecida; hubo necesidad de ayuda en domicilio; el retorno a las actividades del
hogar y del trabajo fue gradual; ocurrieron algunos pocos problemas que
determinaron vueltas al hospital. Hubo mejoras, pero todavía hay quejas; la actividad
sexual fue considerada. La comprensión interpretativa, segundo momento metódico,
reveló a la luz del pensamiento de Heidegger, que el cotidiano de la mujer, tras la
histerectomia se expresa en un movimiento que transita de la inautenticidad para el
indicativo de propiedades y impropiedades que muestra la autenticidad por la
decisión, sin embargo no desarrolla el movimiento de la angustia hedeggeriana. La
mujer indicó que en el periodo que antecede a la cirurgia está en el modo de ser de
la cotidianidad dominada por el temor a la sangre y al dolor. Sin embargo es en el
cotidiano, tras la cirurgia que se comprende siendo-ahí-con-los-otros y se revela
delante de propiedades e impropiedades enseñandose como ser de posibilidades en
un mundo propio. Hay entre los sentidos desvelados, por lo menos tres que
directamente contribuyen para la mejora de la calidad de asistencia delante de las
políticas públicas de la salud de la mujer Estos sentidos revelaron que en la
dinámica asistencial las condiciones de búsqueda de la mujer por el servicio de
salud o la preparación para la alta del hospital o la alta propiamente dicha y todavía
las orientaciones de rutina respecto a la abstinencia sexual tras la cirurgia deben ser
considerados a partir de la subjetividad de la mujer que será sometida a la
histerectomia.
PALABRAS CLAVES: Salud de la mujer, Histerectomia, Cotidiano, Martin Heidegger.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. Trajetória Profissional
16
2. A problemática do pós-operatório de histerectomia: um olhar para
o cotidiano da mulher
22
3. Objetivo do Estudo
27
4. Relevância e Contribuição
28
I – O CONTEXTO DE SAÚDE DA MULHER: aspectos políticos,
assistenciais e sócio-culturais
31
II - A PROBLEMÁTICA GINECOLÓGICA E SUAS IMPLICAÇÕES
2. 1 A histerectomia como tratamento
41
2. 2 Repercussões para a mulher após a histerectomia
44
2. 3 Cotidiano de saúde da mulher como problemática existencial
49
III - REFERENCIAL FILOSÓFICO
3. 1 - Fenomenologia
57
3. 2 - O pensamento de Martin Heidegger
59
IV – TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
4. 1 Fenomenologia: um caminho de investigação
63
4. 2 O método em Heidegger: um caminho para compreensão
64
4. 2. 1 Cenário de acesso às depoentes
65
4. 2. 2 As depoentes
66
V - ANÁLISE COMPREENSIVA
5.1 Os significados e as estruturas essenciais
71
5.2 Compreensão vaga e mediana - 1º momento metódico
82
5.2.1 Unidades de Significação
82
5.2.2 A compreensão das mulheres: o cotidiano após a histerectomia
98
5.2.3 Fio condutor da interpretação: o conceito de ser mulher após a 103
histerectomia
5. 3 Compreensão interpretativa - 2º momento metódico
104
VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS
115
REFERÊNCIAS
122
ANEXOS
I - Autorização do chefe do Serviço de Ginecologia do HU - UFJF
131
II - Autorização do Diretor Geral do HU -UFJF
132
III - Protocolo de entrega do projeto ao Comitê de Ética da UFJF
133
IV - Parecer do Comitê de Ética
134
V - Ficha do Serviço de Arquivo Médico do HU - UFJF
136
VI - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
137
“Comece fazendo o que é necessário,
depois o que é possível,
e de repente estará fazendo o impossível”.
São Francisco de Assis
INTRODUÇÃO
1 - Trajetória profissional
Minha experiência profissional como enfermeira deu-se, inicialmente, na
Unidade de Cirurgia de Mulheres (CM) e na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), do
Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU-UFJF) sendo,
por dois anos, responsável por estas duas unidades. Como plantonista tive a
oportunidade de desenvolver atividades laborais no Centro Cirúrgico, fato que
despertou meu interesse pela assistência a clientes cirúrgicos. A partir de 1982 até
os dias atuais, tenho como atuação principal o exercício da docência em atividades
teóricas, práticas e de estágio no setor de Centro Cirúrgico, acompanhando
acadêmicos de Enfermagem do Curso de Graduação da UFJF.
Questões de foro profissional, contextual e familiar me impediram de
ingressar em curso de pós-graduação stricto sensu em períodos anteriores.
Persistindo minha intenção de aprofundar as questões que me inquietavam e as
oportunidades
que
surgiram,
inicialmente
foi
possível
aprimorar
meus
conhecimentos através de cursos de especialização: em Didática do Ensino Superior
(1980), Assistência de Enfermagem (1985), Administração Universitária (1987).
Esses cursos foram compatíveis com a minha vivência na ocasião, o que subsidiou
decisões conscientes e firmes, além de, ao realizá-los com vistas ao meu
crescimento profissional e pessoal, ter corroborado a contextualização de minhas
inquietações.
No final da década de 90, foi possível também concretizar a realização do
curso de mestrado, vislumbrando a oportunidade de pesquisar uma das minhas
inquietações relativas ao mundo cirúrgico, valorizando as questões da mulher-mãe
de crianças atendidas cirurgicamente. O motivo para este estudo foi subsidiado pela
minha
percepção
da
assistência
prestada
à
mulher-mãe
ser
enfocada
preferencialmente “na criança hospitalizada” ou “numa doença a ser tratada” sem se
atentar com profundidade às pessoas que integram o mundo circundante da
infância.
No hospital, o centro cirúrgico é uma unidade que atende aos usuários com
peculiaridade e particularidades: de faixa etária, gênero, cultura, raça, valores, com
agravos de saúde e necessidades terapêuticas, relacionados às diversas
especialidades e onde identificamos pessoas em estados emocionais distintos. Por
isso realizei uma pesquisa para melhor compreender os sentimentos da mãe ao
entregar o seu entregar o filho a um profissional que está à porta da sala de cirurgia.
A conclusão do estudo realizado no mestrado1 veio contribuir para o
1
SALIMENA, A. M. de O. Buscando compreender os sentimentos da mãe ao deixar o filho à porta da sala de
cirurgia. 2000. Dissertação ( Mestrado em Enfermagem) Escola de Enfermagem, Universidade Federal de
Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais.
aprofundamento de minhas reflexões em dois aspectos: o primeiro diz respeito ao
redimensionamento dos compromissos éticos da enfermagem no atendimento às
necessidades
de
mulheres-mães
quando
seus
filhos
são
submetidos
a
procedimentos cirúrgicos; o segundo, à noção de que a assistência no centro
cirúrgico atende a grupos específicos sem considerar a família, portanto, não
disponibilizando o atendimento para as mães e família (SALIMENA, 2000, 2002,
2002, 2003, 2003).
A ocorrência de uma cirurgia é motivo de forte mobilização emocional para o
paciente e sua família. Percebem-se sentimentos de inquietação, de insegurança e
de medo, como descrito na literatura sobre esta temática por Silva et al. (1997),
Smeltzer, Bare (2002), Parra, Saad (2001), entre outros estudiosos. Atribuo tais
manifestações à natureza intervencionista do tratamento terapêutico proposto e às
necessidades emocionais da clientela submetida ao tratamento cirúrgico, uma vez
que o enfoque, via de regra, está centrado na dimensão biológica da doença.
Para muitas mulheres, com as quais tive oportunidade de estar durante as
atividades de ensino e de extensão, em seus períodos de pré-trans-pós operatórios,
percebi que a hospitalização e a constatação diagnóstica de uma situação de
morbidade foram vivenciadas como uma experiência impactante sobre seu cotidiano.
As inquietações oriundas da vivência no centro cirúrgico referentes a cirurgias
específicas do gênero feminino que afetam a sua condição de ser mulher, ou seja,
as cirurgias ginecológicas, acarretam limitações que exigem, quando for o caso,
afastamento laboral, distanciamento da família e necessidade de repouso.
Essa constatação é tão mais relevante, quando se considera o fato de que
tais procedimentos cirúrgicos, muitas vezes, não podem ser eletivos, trazendo
embutidos em si a premência do processo de opção do tratamento. As pessoas, que
têm a indicação para serem submetidas a tal intervenção cirúrgica, estão diante da
iminência de uma decisão.
Observo nessa condição que, as escolhas são limitadas, impedindo o ensejo
de se organizarem pessoal e/ou profissionalmente, o que equivale a dizer que suas
opções restringem-se a uma chance de continuarem ou não a luta pela vida,
independentemente do ônus que isso possa significar na vivência da cirurgia e,
também, posteriormente considerando o contexto familiar, profissional e domiciliar.
Portanto, identifico como sendo relevante, na compreensão do processo
vivencial de uma mulher com alterações ginecológicas que possua indicação para
tratamento cirúrgico, que a decisão desta intervenção seja estabelecida pelo
profissional que a está assistindo. A tal assertiva, alia-se a incapacidade cognitiva
atribuída culturalmente à mulher para compreender e opinar, com respaldo, sobre as
opções terapêuticas de que dispõe, uma vez que como usuárias não são
consultadas para opinar diretamente sobre a sua saúde/doença e a definição
terapêutica.
Na apreciação de Boltanski (2004) sobre a condição de saúde e doença nas
classes sociais baixas, fica enfatizado o poder de decisão do médico sobre os
tratamentos, a desconsideração do conhecimento que o próprio doente tem de seu
corpo, bem como a despreocupação em ouvir ou conhecer as suas condições
socioeconômicas e culturais. Mas Simões, Souza (2002) já sinalizaram que a mulher
tem tomado novas posturas/decisões em relação aos cuidados com sua saúde.
Percebo que a pessoa, ao ter necessidade de submeter-se a um
procedimento cirúrgico, perde o controle sobre o seu estado de saúde, sente-se
ameaçada real ou imaginariamente face a uma recomendação médica ou também
devido ao fato de buscar perpetuar suas possibilidades de vida pelo maior tempo
possível.
Além destas reflexões, ainda observo que as cirurgias são planejadas em
consonância com as rotinas do serviço e, na maioria das vezes, não é dada à mulher
a possibilidade de decidir o momento mais adequado e tempo necessário à
reorganização de seu cotidiano pessoal e profissional. Assim, ela não tem opção.
Algumas vezes tive a oportunidade de pensar que aceitar submeter-se a um
procedimento cirúrgico mutilador, histerectomia, pode equivaler a concordar em se
internar e enfrentar o “tão temido” procedimento, sem ter tempo para se preparar
psico e emocionalmente e reorganizar o seu cotidiano, quer para o período de
internação ou quer para o pós-operatório. Penso, então, que o enfermeiro deve estar
atento às necessidades de cada paciente e, como indicam Galvão et al (2002),
buscar atendê-las de modo significativo a fim de propiciar uma assistência
perioperatória de qualidade.
Merece destaque a Consulta de Enfermagem após o diagnóstico e
deliberação cirúrgica para orientações sobre o procedimento cirúrgico e atividades
no pré e pós-operatório como uma forma de contribuir para o envolvimento da
família ( DIÓGENES et al, 2001).
Acredito que as situações anteriormente mencionadas intensifiquem o estado
emocional e sejam fontes geradoras de ansiedade para a mulher que precisa
submeter-se a um procedimento cirúrgico. Socialmente existem crenças que foram
introjetadas ao longo da história de vida de cada mulher, que podem justificar a
existência do medo da dor, da anestesia, do desconhecido e da própria cirurgia,
conforme SMELTZER, BARE (2002) e GALVÃO et al. (2002).
Há que se considerar os mitos e as idéias assimiladas pela mulher sobre a
cirurgia ginecológica, principalmente a histerectomia, pois que eles estão atrelados a
sentimentos e valores de cada mulher. E, segundo Khastgir et al.(2000), a incidência
de morbidade psicológica é mais alta antes da cirurgia, pois a perda do útero
significa para a mulher o fim de um potencial reprodutivo e diminuição da
sexualidade.
Tais situações se expressam pelo tempo de duração, pela exposição do seu
corpo ao trauma cirúrgico e pela presença de intervenções mutiladoras sobre órgãos
que, culturalmente, possuem significados vinculados à feminilidade como o útero, de
acordo os estudos de SBROGGIO (2004) e DAVIM (2005).
A assistência de enfermagem deve enfocar, por isso, atividades que
contemplem a mulher de maneira humanizada, sendo ela vista em sua totalidade,
em todos os aspectos biopsicossocioculturais. Assim, este cuidar envolverá ações,
atitudes e comportamentos respaldados em conhecimentos científicos. A mulher
estará sendo considerada como ser humano, uma vez que a mulher com
possibilidade cirúrgica terá no período perioperatório um plano de cuidados
elaborado, conforme recomendaram Ferraz, Salzano, Torres (1982) e Castellanos,
Jouclas (1990). Destaco que são de grande importância para o sucesso do
tratamento as orientações tanto no pré-operatório quanto no pós-operatório, tanto
mediato quanto imediato.
A aplicação de técnicas de comunicação interpessoal é imprescindível e as
questões a serem orientadas devem, segundo Meeker, Rothrock (1997, p. 363) “ir
progredindo do geral para o específico” e, em todo o processo, deve-se estar aberta
e disponível para um franco relacionamento terapêutico.
Embora, durante minha formação acadêmica, marcada pelo método científico
e pautada no atendimento biológico, eu tenha aprendido como atender o ser humano
em suas necessidades básicas bio-psico-sócio-espirituais, sempre me questionei
sobre esse atendimento. Então, com parte de minhas inquietações sanadas no
mestrado, decidi atingir uma outra dimensão da assistência à mulher, estando atenta
ao ser humano a quem estaria cuidando. Ampliando o cuidado centrado na
dimensão terapêutica e técnica de enfermagem para uma dimensão mais
humanizada e individualizada, comecei esta incursão por um projeto de extensão no
próprio hospital onde exerço minhas atividades de docência.
Ao coordenar e participar de atividades desenvolvidas no Projeto de
Extensão, “Visita de Enfermagem Pré-operatória: implementação da Assistência de
Enfermagem às mulheres da Enfermaria de Ginecologia do Hospital Universitário da
UFJF”, tenho a oportunidade de verificar que emergem questões na dimensão do
modelo biomédico, mas que me fizeram repensar meu existir como mulher. Este
projeto é destinado à preparação psicoemocional e social de mulheres internadas
para um procedimento cirúrgico pélvico. Diante disso, busquei um movimento de
ultrapassar a dimensão biológica, no qual procuro sair de uma técnica provocadora e
ir ao encontro da dimensão existencial. Isso me fez repensar o meu existir-sendomulher e sendo profissional.
De tais aproximações emergiu do meu sendo-no-mundo-com-a-cliente, esta
mulher que enfrenta a cirurgia, como ser-existencial, vivenciando em seu modo
próprio, como sendo-no-mundo, segundo seu sentido, sua maneira e modo de ser
( HEIDEGGER, 1999).
Pensando
em
criar
oportunidades
de
implementação
de
modelos
assistenciais no campo da formação de enfermeiros e de cenários propícios ao
exercício de habilidades e competências afins, optei por inserir os discentes do
Curso de Graduação em Enfermagem no projeto de extensão anteriormente citado,
com vistas a contribuir para a sua formação acadêmica. Esta dimensão de como o
enfrentamento das intervenções cirúrgicas é vivenciado pela mulher, construído
duplamente nesta articulação docente-discente, contribui para o processo de minha
aproximação com a real vivência destas mulheres durante os períodos delicados do
pré/trans/pós-operatório e com o ensino de peculiaridades de cada período junto a
futuros enfermeiros.
Como estratégia para me aproximar da compreensão das questões
significativas à existência humana da clientela por nós assistida na área da saúde,
como o medo, a angústia, a tristeza, a finitude da vida e, buscando suporte para o
desenvolvimento da pesquisa a ser realizada no Curso de Doutorado em
Enfermagem, participei como aluna especial de algumas disciplinas. Assim, foi
possível cursar através do Núcleo de Pesquisa de Enfermagem em Saúde da Mulher
do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil, ministradas na Escola de
Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro as seguintes
Disciplinas: ”Política e Problemática da Saúde da Mulher na Perspectiva LatinoAmericana” (2001), “Problemas, Métodos e Fontes da Pesquisa em Saúde da
Mulher” (2002) e “Métodos Qualitativos da Pesquisa Abordagem Fenomenológica e
Hermenêutica” (2004).
Acredito ainda que a apropriação desses conhecimentos é significativa para a
melhoria da assistência de enfermagem e seu desdobramento na docência bem
como na pesquisa, pela possibilidade de desenvolver novas reflexões, e estimular
mudanças necessárias na assistência às mulheres nos procedimentos cirúrgicos.
2 - A problemática do pós-operatório de histerectomia: um olhar para o
cotidiano da mulher
Na medicina as especialidades se desenvolveram de forma gradativa. À
medida que o conhecimento em cada campo do saber se tornava mais extenso
sobre as condições de saúde e de vida do homem, surgiam novas especialidades.
No que se refere ao campo cirúrgico, a cirurgia geral é a base de todas as
especialidades cirúrgicas. É progressiva e evoluiu a partir dos povos nômades até
tornar-se uma forma científica de terapêutica. Berry, Kohn (1977) relatam que
Soramus de Ephesus é considerado como o fundador da ginecologia, pois no
segundo século depois de Cristo, clinicando em Roma, deixou escritos, que
permaneceram por mais de 1.500 anos, sobre as doenças de mulheres, e sabe-se
que cirurgiões daquela época já recomendavam a remoção do útero quando
prolapsado.
A cirurgia ginecológica, portanto, é um ramo da cirurgia geral que trata do
aparelho genital feminino, das afecções cirúrgicas da mulher, considerando as
mamas e a pelve. Não existem registros com exatidão da época em que aquela se
iniciou, mas se sabe que tanto a obstetrícia quanto a ginecologia foram separadas
da cirurgia geral no começo do século XIX. A primeira cirurgia ginecológica
abdominal realizada foi a Ooforectomia por McDowell, em 1840, a Miomectomia, e
depois
realizadas
Histerectomia
e
Fístulas
Vesico-Vaginal
(LINDE,
MATTINGLY,1971).
Nos Estados Unidos, dentre as cirurgias de grande porte, a histerectomia em
termos de ocorrência é considerada a cirurgia mais comum entre as mulheres na
idade reprodutiva, ocorrendo em aproximadamente 650.000 ao ano (GARBONE et
al., 1990). No Brasil, ela ocupa lugar de destaque entre as cirurgias ginecológicas ou
mesmo entre as cirurgias em geral (SMELTZER, BARE, 2002).
Para melhor contextualizar e dimensionar a problemática da vivências das
mulheres nos momentos de intervenção ginecológica, desenvolvi um levantamento
de natureza exploratória de todas as cirurgias ginecológicas da pelve realizadas
numa instituição hospitalar, que possui dez leitos femininos para a ginecologia, em
Juiz de Fora, Minas Gerais, ocorridas no período de janeiro de 2000 a dezembro de
2003, construindo uma série histórica de quatro anos.
Na Tabela I, a seguir, apresento a distribuição desses procedimentos
cirúrgicos ginecológicos pélvicos realizados.
Tabela I: Distribuição e Participação Percentual dos Procedimentos Cirúrgicos
Ginecológicos Pélvicos, segundo Tipos de Procedimentos Realizados: Instituição Hospitalar
X, Juiz de Fora, Janeiro de 2000 a Dezembro de 2003.
Tipos de Procedimentos Cirúrgicos Ginecológicos
F. Absoluta
F. Relativa
Amputação parcial/total de colo uterino
143
34,3
Histerectomia
129
30,9
Curetagem
47
11,3
Colpoperienoplastia
35
8,4
Ooforectomia/plastia
16
3,8
Laparotomia
15
3,6
Miomectomia
8
1,9
Marsupialização
6
1,0
Anexectomia
4
1,0
Slingue
4
1,0
Traquilectomia
3
0,7
Exerese corpo estranho/cisto
2
0,5
Ressecção de septo
2
0,5
Cauterização vulvar
1
0,2
Fistulectomia
1
0,2
Salpingectomia
1
0,2
Total
417
100
FONTE: Livro de Registros do Centro Cirúrgico da Instituição Hospitalar X, Juiz de Fora – MG.
É possível identificar que, dos 417 procedimentos cirúrgicos realizados,
65,2% foram de amputação parcial ou total de colo uterino e de histerectomia. Sendo
assim,tais dados representam a participação mais significativa justamente de
cirurgias mais invasivas e com maiores repercussões no cotidiano dessas mulheres.
Na Tabela II, está apresentada a distribuição dos procedimentos cirúrgicos
ginecológicos pélvicos, segundo os órgãos que foram alvo da intervenção cirúrgica.
Obviamente que o resultado reforçou os dados anteriormente descritos. Assim
observo que, das intervenções realizadas, 78,7% foram ocorridas no útero, órgão
culturalmente identificado como gerador da vida.
Tabela II: Distribuição dos Procedimentos Cirúrgicos Ginecológicos Pélvicos Realizados,
segundo Órgãos que foram Alvo da Intervenção: Instituição Hospitalar X, Juiz de Fora,
Janeiro de 2000 a Dezembro de 2003
Órgãos da Intervenção Cirúrgica
F. Absoluta
F. Relativa
Útero
328
78,7
Vagina
46
11
Ovário e anexos
28
6,7
Não especificado
15
3,6
Total
417
100
FONTE: Livro de Registros do Centro Cirúrgico da Instituição Hospitalar X, Juiz de Fora – MG.
Diante das informações contidas nas Tabelas I e II, foi possível delinear
subsídios iniciais da população alvo para a presente pesquisa, que visou analisar o
cotidiano de saúde da mulher após a histerectomia.
Destaco aqui, no entanto, que tais resultados correspondem apenas a
sinalizações preliminares. Dessa forma, os dados apresentados correspondem
somente a uma ilustração. Quanto à análise deles, caberia aprofundamento mais
significativo do que o de agora apresentado.
Na maioria das vezes, a alta hospitalar da mulher que realizou um
procedimento cirúrgico ginecológico pélvico de maior amplitude ocorre entre quatro a
sete dias, sendo então marcado um retorno para a retirada dos pontos e outro, para
avaliação, após trinta dias.
A enfermagem deve orientar a mulher quanto aos cuidados que deverá
observar após a alta, os quais poderão alterar seu cotidiano como, por exemplo:
circulação periférica, infecção, micção e hemorragia. Segundo Smeltzer, Bare (2002)
é importante que a cliente seja informada sobre as limitações e/ou restrições a que
será submetida no pós-operatório no processo de restabelecimento.
É
recomendável
reassumir
atividades
gradualmente,
evitar
esforços,
levantamento de peso, relações sexuais ou reinício do intercurso entre outras
atividades até que suas tarefas cotidianas sejam permitidas pelo (a) cirurgião (ã).
Cabe, pois, à enfermagem parte das atividades de acompanhamento e
orientações à mulher no período de perioperatório, que vão desde os cuidados
físicos aos psicossocioemocionais numa interação efetiva com os demais membros
da equipe multiprofissional que a assiste.
No momento em que surgiu como perspectiva concreta o curso de doutorado
em Enfermagem, desenvolvi um estudo do cotidiano da mulher após a histerectomia.
Este
estudo
pretende
considerar
as
características,
as
questões,
os
comportamentos e as atividades das mulheres, que foram submetidas à realização
de histerectomia, focando o seu cotidiano após o procedimento cirúrgico.
Penso que os procedimentos cirúrgicos relacionados aos órgãos genitais
femininos representam a densidade da exposição da mulher. Pode-se, por exemplo,
destacar o útero como um órgão incubador da vida e o que poderia representar para
uma mulher tê-lo mutilado e/ou removido. Isso, entre outras inquietações, me faz
indagar, como pertencente ao gênero feminino: quais seriam as minhas
expectativas? Em que elas se modificariam pelo fato de necessitar realizar
histerectomia? Como me organizaria para esse momento cirúrgico e para o pósoperatório? Que implicação e/ou impacto traria para minha vida a realização desta
cirurgia? Como eu me sentiria tendo sido retirado todo ou parte de um órgão com o
qual eu nasci, principalmente em se tratando do útero com o qual pude gerar meus
filhos? Como seria minha reinserção no contexto sóciofamiliar e laboral? Que
alterações teria o meu cotidiano?
Se, diante da possibilidade de ser submetida a um procedimento cirúrgico
ginecológico tais inquietações anteriormente mencionadas me mobilizam, fico a
indagar como pesquisadora: como mulheres que estão diante de situações
concretas de indicação terapêutica para a realização de uma histerectomia
enfrentam e/ou vivenciam tais questões anteriormente citadas? Como elas se
organizam para o pós-operatório em relação a seus filhos, marido, vida doméstica,
vida social e retorno ao trabalho/atividade profissional.
A partir do meu mundo-vida, alço vôos e retorno a terra, firme e sólida,
relembrando e refazendo os caminhos e descaminhos na abordagem do mundo
hospitalar, especificamente no contexto de mulheres em condições cirúrgicas de
histerectomia e na compreensão do vivido pelas próprias mulheres.
Cabe compreender, pois, que a cirurgia como procedimento terapêutico
resolve um problema de um órgão doente, mas traz implicações no pré-trans e pósoperatório para sua condição de mulher. Muito além de ser um procedimento
objetivo, em seu bojo existem relevantes considerações subjetivas para quem o
vivencia. Trata-se, então, de ir além do biológico e se dedicar a encontrar faces do
fenômeno que contribuam para o cuidado, compreendendo a saúde em seu sentido
amplo, integral e humano.
Sabe-se que são muitos os estudos científicos e avanços da tecnologia
através do desenvolvimento de pesquisas sistematizadas e aperfeiçoadas na busca
de tratamento adequado para as mulheres submetidas à cirurgia, para o controle e
cura de suas patologias. No entanto, temos consciência de que, apesar de os
estudos serem imprescindíveis, é necessário compreendermos as questões
subjetivas do ser humano, que é único e singular.
Penso que para compreender o cotidiano da mulher que se submeteu à
histerectomia, posso utilizar a fenomenologia como método de investigação e o
referencial heideggeriano de análise para compreender o sentido do ser-mulher após
a histerectomia na situação cotidiana ao cuidar de sua saúde. Acredito que não
basta observar a mulher e prejulgar as suas necessidades de ajuda, é necessário
captar o sentido de ser, ou seja, deixar que ela explicite seus anseios, ocupações e
preocupações. Assim é possível construir uma “abertura” para que o profissional
ajude o ser-aí-mulher a decidir-se, assumindo e mostrando seu cotidiano de vida e
de saúde. E, segundo Souza (1993, p. 64), “esta ajuda, no mundo positivo de
cuidado, não implica em fazer pelo outro e sim levar o outro a assumir o seu próprio
fazer...” .
As recomendações pertinentes ao pós-operatório de histerectomia trarão
interferências as mais diversas em seu mundo-vida, e este remete ao ser-aí-com
(Heidegger, 1999), uma vez que este ser se apresentará como mediador de suas
relações como mulher, esposa, mãe, e com os profissionais.
Nesse sentido, o enfoque a ser dado a esta investigação deverá ser capaz de
captar o sentido do cotidiano da mulher que vivencia a situação de póshisterectomia, percebendo suas necessidades de modo a atender a sua
singularidade. Tal perspectiva pode ser corroborada por Luz (2001) ao desenvolver
um estudo de natureza fenomenológica acerca do cotidiano da pessoa portadora de
ostomia intestinal:
Uma perspectiva que valoriza o compromisso humanístico, político e
social da prática profissional implica numa visão ampliada da
realidade com uma pretensão de totalidade, holismo e, ao mesmo
tempo, unidade da diversidade, individualidade e singularidade, em
que a pessoa a ser cuidada, deve ser vista em sua condição
existencial na cotidianidade (2001:11).
Tendo em vista as perspectivas assinaladas e descritas anteriormente,
acredito que minhas reflexões para a realização deste estudo, concretizado durante
o Curso de Doutorado, constituíram-se em desafios a serem enfrentados devido a
minha condição de enfermeira e mulher. E ainda, a de buscar compreender,
justamente, o mundo/cotidiano da mulher acometida por um agravo à saúde que a
obriga a submeter-se a uma histerectomia.
A partir do exposto, delimitei como objeto deste estudo o cotidiano da mulher
após a histerectomia, focando a dimensão existencial que envolve sentimentos,
percepções e comportamentos
a partir do vivido. Tal busca, mediante análise
compreensiva, não pressupõe o universal que seria o padrão de normalidade no
paradigma biomédico. Ao contrário, considera a possibilidade norteadora da
singularidade como diretriz de cuidado ao ser do humano.
3 Objetivo do estudo
Analisar o cotidiano da mulher após a histerectomia à luz do pensamento de
Martin Heidegger.
4 Relevância e contribuição
Ao penetrar no mundo-vida das mulheres após a histerectomia, o presente
estudo contribui para a compreensão de situações-problema, subsidiando a
realização de abordagem das problemáticas emergentes vivenciadas por essas
mulheres.
Dessa forma, acredito que se trata de contribuir para redimensionar as
peculiaridades do processo de cuidado sob um outro paradigma, que não do cuidado
padronizado destinado à mulher. Para que os conflitos do cotidiano possam ser
ouvidos e compreendidos, além de prevenidos/tratados precocemente, e para que
ocorram vínculos mais consistentes entre profissional e cliente, como ressaltam
Silveira, Progianti e Vargens (2007), é necessário considerar um outro paradigma
para o assistir à mulher no contexto da área da saúde.
Vejo que uma compreensão mais atentiva das expectativas e situaçõesproblema dimensionadas e/ou vivenciadas por mulheres submetidas à histerectomia
subsidiará a intencionalidade pretendida dentro do processo de cuidar da
enfermagem, evidenciando características definidoras de situações passíveis de
serem abordadas por enfermeiros e por profissionais que atuam na área de saúde,
principalmente na saúde da mulher.
Do ponto de vista do processo ensino-aprendizagem da graduação e da pósgraduação, creio que a efetivação desta pesquisa poderá contribuir, também, para a
apreensão de situações de gênero peculiares da mulher que requeiram e/ou
propiciem aos discentes o desenvolvimento de habilidades e competências
coerentes com as diretrizes da reforma curricular da enfermagem. Com destaque
para as atuações extensionistas, conforme o tripé ensino, pesquisa e extensão, que
caracterizam as atividades universitárias hoje.
Creio também que este estudo pode contribuir com Núcleo de Pesquisa de
Enfermagem em Saúde da Mulher - NUPESM - do Departamento de Enfermagem
Materno Infantil da Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN/UFRJ) e com o Grupo
de Pesquisa O cotidiano do cuidar em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem
da Universidade Federal de Juiz de Fora (FE/UFJF). No NUPESM, se insere na linha
de pesquisa sobre questões do cotidiano de saúde da mulher, utilizando o método
de investigação da fenomenologia na perspectiva de Martin Heidegger.
Além disso, a presente proposta consistirá numa contribuição de abordagem
focada na dimensão da própria mulher, sendo significativa para os profissionais de
enfermagem, em particular e profissionais da área da saúde, uma vez que pesquisei
o cotidiano de mulheres em um momento singular e/ou crucial de sua dimensão
existencial.
“ Todo cuidar só tem valor
quando
o outro tem valor para mim”
Boff
I – O CONTEXTO DE SAÚDE DA MULHER: aspectos políticos,
assistenciais e socioculturais
No desenvolvimento do evento cirúrgico, faz-se necessária a atuação dos
profissionais envolvidos nos procedimentos anestésico-cirúrgicos, ou seja, uma
equipe multiprofissional que irá agir no suporte e desenvolvimento das atividades
que lhe são concernentes. As ações desenvolvidas por esta equipe têm seu início no
período pré-operatório, estendem-se durante os procedimentos trans e pósoperatórios, prestando assistência ao cliente até a sua alta hospitalar, bem como,
algumas vezes, por um longo período após a alta. Neste conjunto de atuação, a
equipe de enfermagem tem papel relevante no desempenho de suas atividades,
considerando que qualquer ato cirúrgico conta com a atuação de bastidores: do
Centro de Material Esterilizado, além da circulação de sala de operação.
Ao me aproximar do conhecimento científico referente às questões de saúde
da mulher, encontrei uma diversidade de situações, mas me detive no que julguei
mais pertinente para subsidiar este estudo, ou seja, o que tinha em mente em
minhas pré-reflexões sobre a temática. Dessa busca, passo a apresentar algumas
situações em que a mulher está inserida.
Com as mudanças significativas nas estruturas socioeconômicas no mundo,
após a Segunda Guerra Mundial, principalmente a partir da década de 60, os
governos dos diversos países latinos começaram a implementar programas de
saúde vislumbrando um atendimento especial à mulher. Tyrrell, Carvalho (1993)
relatam que o grupo materno-infantil vem sendo objeto de estudo pelas autoridades
e profissionais de saúde na tentativa de melhorar e minimizar a situação de saúde
deste grupo. Estes programas incluíam proteção à maternidade, à infância e à
adolescência. Afirmam estas autoras que, em 1975, começou a ser implantado o
Programa de Saúde Materno-Infantil (PSMI), partindo do Ministério da Saúde sob
orientação do Plano Nacional de Desenvolvimento.
O PSMI trouxe como objetivo o acompanhamento pré-natal, controle do parto
domiciliar e do puerpério, dando ênfase e valorizando tanto a mulher na fase
reprodutiva como o concepto. Nesta política pública, posteriormente revista e
acrescida das Atividades de Planejamento Familiar, Paternidade Responsável e o
Programa de Prevenção da Gravidez de Alto Risco, manteve-se a mulher valorizada
apenas na ótica da reprodução. Esses programas, segundo OSIS (1998), tiveram
como enfoque a intervenção no corpo da mulher-mãe, no sentido de assegurar
crianças saudáveis que fossem adequadas às necessidades da reprodução social. A
atenção às mulheres centrada basicamente nas questões relativas à reprodução e
no cuidado materno-infantil com ênfase na criança, também são relatadas por
Simões e Souza (2002).
A Organização das Nações Unidas (ONU) considerou 1975 o Ano
Internacional da Mulher e solicitou que as instituições desenvolvessem políticas
públicas de proteção, visando minimizar os índices de morte materna, a violência
contra mulheres, os abusos sexuais e a discriminação racial, de forma que se
contribuísse para eliminar toda forma de discriminação social contra o grupo
feminino.
No final dos anos 70 e início da década de 80, as mulheres, através dos
movimentos feministas mudam a trajetória da atuação política com suas lutas pelo
direito ao uso do corpo, à opção pela maternidade, contra a violência e o direito de
oportunidade de trabalho.
Segundo Tyrrell, Carvalho (1993), esses movimentos fomentaram as
pesquisas sobre a saúde da mulher e questionaram a atuação do Estado na
implementação de programas de saúde de acordo com a nossa realidade.
Passou-se, então, a se discutir, pelos profissionais de saúde, sociedade e
pelas mulheres através do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, a construção
de políticas de saúde que culminaram com a criação do Programa de Assistência
Integral da Saúde da Mulher (PAISM) e da Criança (PAISC), em 1984, pelo
Ministério da Saúde, em que são estabelecidas as especificidades da mulher e da
criança (TYRRELL, CARVALHO, 1993).
O PAISM rompe com a visão estrita da assistência à saúde da mulher via
binômio mãe-filho. Para Tyrrell e Carvalho (1993), este programa traz enfoques
inovadores, pois a mulher passa a ser vista como sujeito ativo da sua própria saúde,
considerando todas as etapas da vida da mulher e a assistência integral em três
grandes áreas de atuação: a assistência clínico-ginecológica e educativa (incluindo
prevenção
do
câncer
cérvico-uterino
e
de
mama,
doenças
sexualmente
transmissíveis, climatério, concepção e contracepção); assistência pré-natal e a
assistência ao parto e puerpério. As autoras consideram que a atribuição de
responsabilidade é dada à equipe multiprofissional e não mais reforçando a
hegemonia médica para executar as atividades de proteção à saúde da mulher e da
criança.
As diretrizes gerais do Programa enfatizam as ações para o controle das
doenças mais prevalentes nas mulheres, as posturas diferenciadas dos profissionais
de saúde, a proposição de uma prática educativa permeando todas as atividades.
Assim, a clientela pode apropriar-se dos conhecimentos necessários a um maior
controle sobre sua saúde. O PAISM instiga a promoção da autonomia feminina,
estimula o conhecimento e o controle sobre o próprio corpo (SALIMENA,
FERNANDES, BITTENCOURT, 2001).
O Ministério da Saúde (BRASIL,1984, p.5), conceitua, então, como
assistência integral à mulher as “ações de saúde dirigidas ao atendimento global
das necessidades prioritárias desse grupo populacional e de aplicação ampla no
sistema básico de assistência à saúde“. Este Programa apresenta como principal
conceito a eqüidade e a atenção integral, abordando a mulher em todas as fases do
seu ciclo vital.
Ainda não houve implementação efetiva do PAISM em todo o Brasil, o que
segundo Galvão (1999, p. 176), “não pode ser analisado de forma isolada e
exclusiva, mas no contexto do caos em que se encontra todo o sistema público de
saúde no país”.
Num enfoque que valoriza menos a função reprodutiva, temos como exemplo
a análise do quadro representado pelas altas taxas de mortalidade ocasionadas pelo
câncer do colo de útero, considerado responsável por cerca de 15% de todos os
tipos de câncer feminino. Com a proposição de mudanças neste cenário, o Ministério
da Saúde em conjunto com o Instituto Nacional do Câncer (INCA)
propõe o
desenvolvimento de ações preventivas e esclarecedoras para mulheres (BRASIL,
2002). Como estratégia de implantação busca-se articular e integrar uma rede
nacional; motivar a mulher a cuidar de sua saúde; reduzir a desigualdade de acesso
da mulher à rede de saúde; melhorar a qualidade de atendimento e aumentar a
eficiência da rede de controle do câncer (BRASIL, 2002).
Sabe-se que a realização do exame citopatológico é um método de
diagnóstico sensível, seguro e de baixo custo possibilitando a detecção precoce de
formas iniciais da doença. Entretanto, o exame não é realizado de forma sistemática
pelas mulheres, mesmo que tenha o governo brasileiro passado (BRASIL, 2002, p.
22), a “investir esforços na organização de uma rede nacional de detecção precoce
do câncer do colo do útero” após a Conferência Mundial Sobre a Mulher, ocorrida
em 1995 na cidade de Beijing na China.
Uma estratégia importante que merece destaque foi a estruturação do Viva
Mulher - Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero e de Mama,
lançado em 1997, com o objetivo de formar uma grande rede nacional na qual o
profissional de saúde está capacitado a estimular a prevenção, realizar a detecção
precoce e promover o tratamento adequado por meio de padronização de
procedimentos e condutas para controle do câncer.
Visando dar continuidade e atualização ao PAISM, em 2004, o Ministério da
Saúde elaborou a “Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da MulherPrincípios e Diretrizes”, prevendo ações de saúde que possam contribuir para a
garantia dos direitos humanos das mulheres e reduzam a morbi-mortalidade por
causas previníveis e evitáveis (BRASIL, 2004). Para que os objetivos dos programas
implementados pelo governo sejam alcançados, torna-se necessário que os
recursos humanos sejam devidamente capacitados e pratiquem a comunicação
adequada, estabelecendo educação contínua entre os profissionais.
É imprescindível que ocorra um diálogo entre o profissional de saúde e a
mulher assistida, com orientações coerentes e pertinentes à escuta atentiva,
corretas quanto aos exames e queixas, pois, quando descoberto precocemente o
agravo à saúde, isso proporciona chances de cura e, na maior parte dos casos,
possibilita tratamento não mutilador (VERAS, 2005). Entende-se, então, que a
assistência à mulher deveria perpassar os aspectos de suas necessidades físicas,
biológicas, sociais, espirituais, psicológicas e ocupacionais.
Segundo Simões, Souza (2002), na I Conferência Nacional de Saúde e
Direitos da Mulher, em outubro de 1986, em Brasília, entre outras, foram abordadas
questões específicas das mulheres, tais como: a relação autoritária entre os
profissionais de saúde e a clientela feminina; a extrema medicalização do corpo; a
qualidade de assistência (gravidez e parto); a falta de participação nas decisões
sobre a política de saúde e sobre sua execução.
Várias questões de estudo e desafios para a intervenção em saúde, portanto,
se fazem prementes no Brasil, como afirma Brandão (2000): mortalidade materna,
humanização do parto; as questões do aborto; assistência à concepção e
contracepção; prevenção de doenças sexualmente transmissíveis; prevenção do
câncer; problematizar questões pertinentes ao corpo, à violência, ao sofrimento
psíquico, à escolaridade feminina; à inserção no mercado de trabalho; aos
diferenciais de gênero, geração, raça/etnia, classe social e filiação religiosa. Ainda, a
discussão dos direitos sexuais e reprodutivos deve ser levada à luz da questão mais
ampla do combate à pobreza e da promoção do desenvolvimento social.
Na busca científica do cuidado, nós enfermeiros(as) temos desenvolvido
pesquisas sobre a assistência de enfermagem, no sentido de que esta ocorra de
forma própria e autêntica, promovendo uma assistência integral, com compreensão
e resolução de transtornos emocionais como tensão, ansiedade, frustração, medo e
insegurança.
Nesse contexto, foi elaborado, o Sistema de Assistência de Enfermagem
Perioperatório (SAEP) que preconiza uma filosofia individualizada e humanizada,
bem como o Processo de Enfermagem que segundo Horta (1979), é a dinamização
das ações sistematizadas e inter-relacionadas, visando à assistência ao ser humano
– ambas no sentido de atender à Sistemática da Assistência de Enfermagem
Perioperatória.
Acredito que o(a) enfermeiro(a) deve entender o significado e pressupor os
sentimentos da mulher que irá submeter-se à cirurgia ginecológica pélvica e tentar
resolver suas demandas, sendo possível solucionar dúvidas e anseios da paciente à
medida que se presta assistência, e percebendo cada paciente com suas diferenças
individuais a fim de prepará-la para o procedimento cirúrgico. Interações adequadas
minimizam este momento estressante e favorecem um melhor bem-estar, além de
ajudar a enfrentar situações agressivas como no caso da histerectomia (SMELTZER,
BARE, 2002).
No meu cotidiano profissional, observo que a mulher, ao chegar ao Centro
Cirúrgico, mostra-se angustiada e ansiosa, atribuindo ao ambiente cirúrgico
características de sensação térmica de frio e de sentimento de hostilidade, embora
façamos constantes esforços para torná-lo aconchegante e confortável. Observamos
que a pessoa submetida a tal situação demonstra sentir-se ameaçada em sua
identidade e integridade, sentimentos que geram profundo desconforto. No estudo
sobre o ex-sistir no cotidiano da prevenção do câncer cérvico-uterino, Lopes (1996,
p. 4), destacou que
“a mulher experiencia o medo, a vergonha, o temor, a
angústia... tudo pautado em crenças, valores, conceitos e preconceitos”.
Assim, acredito que muitos diagnósticos terapêuticos cirúrgicos poderiam ser
evitados se as mulheres procurassem, sem receio e medo, os serviços de saúde
para fazerem prevenção e ou detecção precoce de agravos à saúde, principalmente
do câncer, pois segundo o Instituto Nacional do Câncer (BRASIL, 1999), ele
representou a segunda causa de morte na década de 80 e, nos anos de 1987 a
1995, aumentou em torno de 2% ao ano.
Apesar das campanhas de prevenção do câncer cérvico-uterino e mama e
dos avanços terapêuticos, o câncer continua sendo a principal causa de mortalidade
nas mulheres nos nossos dias em todo o mundo. E, ainda hoje, existem os tabus,
conceitos e pré-conceitos por este agravo à saúde. O Programa Viva Mulher, em
1999, veio contemplar o controle do câncer do colo de útero e de mama (SOUTO,
2003). Mesmo assim, para muitas mulheres, enfrentar o câncer é submeter-se a
tratamentos e procedimentos desconhecidos.
A cirurgia constitui o papel mais importante no tratamento dos mais diversos
tipos de câncer de ovário e útero, pois através dela pode-se determinar o diagnóstico
definitivo como também seu estadiamento, podendo ainda ser considerada
estratégia paliativa para alguns casos mais evoluídos. Para realizar o tratamento
cirúrgico, porém, faz-se necessário um suporte adequado desde a fase de préoperatório até após a alta hospitalar.
Corroborando tal compreensão, Abrão (1997, p. 229), diz que: “apesar de ser
o procedimento mais importante, geralmente, não é o único, havendo a necessidade
de uma equipe multidisciplinar para outros tipos de tratamento”. Acrescenta ainda
que a finalidade desta cirurgia de complexidade tão variável é extirpar a maior
quantidade de tumor possível.
O que temos visto são, então, grandes incisões no abdome para a realização
de Laparotomias e/ou Histerectomia quando o tumor se desloca, permanecendo
restrito à pelve; ou a Pan-Histerectomia, quando há maior comprometimento com os
anexos. Existem, também, os procedimentos que são feitos através da vagina, que
são ditos “por via baixa”, onde há o comprometimento do períneo e colo do útero
(MEEKER, ROTHROCK, 1997).
Nesse contexto, a título de ilustração do universo empírico, destaco dentre as
cirurgias ginecológicas femininas que vivencio no meu cotidiano as seguintes:
Conizações de colo uterino; Cauterizações de colo uterino por alta freqüência;
Anexectomias;
Ooforectomias;
Marsupinações;
Perineoplastias
e
Colpoperineoplastias; Curetagens Uterinas; Histerectomias (abdominais e vaginais);
Pan-histerectomias; Miomectomias e Laparotomias.
Assim sendo, no pós-operatório, a mulher terá alguns cuidados restritivos,
proporcionando alterações em seu cotidiano de mulher-mãe-esposa e profissional.
Será preciso que ela receba orientações de ações para este período, de modo geral,
e, especificamente, para as situações de cirurgias ginecológicas da pelve.
Obviamente, essas orientações devem ser ditas em uma linguagem clara e
compreensiva para a cliente, atendendo às suas necessidades de orientação e
contemplando-a como ser existencial no seu cotidiano.
Nesta busca bibliográfica, no Portal da CAPES - Banco de Teses foram
identificadas 105 dissertações de mestrado e 26 teses de doutorado com enfoques
variados no cotidiano de saúde da mulher com análises, ora quantitativas ora
qualitativas, em pesquisas nas áreas da Psicologia, Medicina, Serviço Social,
Educação, Enfermagem e outras. Nos mais variados aspectos, os estudos das teses
versam sobre variadas dimensões do cotidiano: o sentido atribuído, a busca do
sentido, do profissional enfermeiro, do trabalho doméstico, do trabalho feminino, do
cuidar da saúde, das práticas de cuidado com o corpo, das representações sociais
do sofrimento e prazer da enfermeira assistencial entre outros.
No dimensionamento das questões relativas ao gênero, encontramos suporte
na fala de Nascimento (1996), ao considerar que ainda existem diferenças e
desigualdades relativamente grandes que separam homens e mulheres no mundo
contemporâneo, e que muitos teimam em não enxergá-las sob o discurso da
universalidade dos fenômenos sociais.
Estudos atestam as discriminações das quais as mulheres são vítimas,
revelando assim as diferenças e a inferioridade em relação aos homens. Traduzindo
assim, a situação da mulher nos dias atuais, na vida social, sexual, afetiva e
principalmente no mercado de trabalho.
Para Nascimento (1996, p. 34), “mesmo depois que se tenha provado que
temos alma, que a menstruação não representa impureza e indignidade”, ainda
assim, a capacidade produtiva e intelectual é entendida como inferior a dos homens.
A autora considera que as próprias mulheres, ao terem a consciência de gênero,
transformarão a realidade social, com a eliminação das discriminações a que estão
sujeitas. Um passo importante será o entendimento de que a diferença não está na
natureza biológica de homens e mulheres mas nas relações sociais construídas.
A palavra gênero foi utilizada, segundo Passos (1996, p. 45), “entre as
feministas americanas com o objetivo de demonstrar o caráter social das diferenças
entre os sexos” e “uma maneira de referir-se à organização social da relação entre
os sexos”. Assim, compreende-se que gênero não é para ser usado no sentido
biológico, ou seja, para apontar as diferenças sexuais entre homens e mulheres,
mas para ser uma forma de significar as relações de poder entre eles.
Percebe-se,
especificamente
em
relação
ao
movimento
feminista,
intensificado no final da década de 70 e início na década de 80, que vários estudos
surgiram e com estes a utilização e expansão do termo gênero pelas estudiosas
feministas, principalmente, as americanas. Então, as enfermeiras passaram a
também dele se utilizar em suas pesquisas, tal como Lopes et al (1996, p. 8), se
aproximaram desse conceito e, convencidas de sua potencialidade teórica,
passaram a utilizá-lo, considerando que “não tratava de uma substituição de rótulo”,
mas que, “optar pelo conceito de gênero, significava uma decisão de ordem
epistemológica, implicando uma opção teórica”. As pesquisas passam, a ter como
sujeito-objeto de estudo a mulher bem explicitada, provocando algumas concepções,
entre elas, a de que o sujeito se produz em relação e na relação.
Ao se considerar o estudo do cotidiano das mulheres após a histerectomia,
estamos lidando com um fenômeno que é, ao mesmo tempo, biológico, social e
cultural. O modo como a mulher concebe a perda do seu útero está articulado com a
categoria gênero, uma vez que é no “trabalho reprodutivo, o lugar onde a diferença
se instala” (HEILBORN, 1999, p.103). Gênero, conforme a definição de Heilborn
(1999, p.102), é um conceito das ciências sociais “que se refere à construção social
do sexo” e que ajuda a distinguir a dimensão biológica do social.
A pretensão fenomenológica não exclui gênero, apenas não destaca gênero
nem como questão ou categoria.
“O caminho se faz, caminhando”
Paulo Freire
II - A PROBLEMÁTICA GINECOLÓGICA E SUAS IMPLICAÇÕES
2.1 A histerectomia como tratamento
O
século
passado
foi
de
grande
desenvolvimento
da
ciência
e,
conseqüentemente, da medicina. Com a anestesia, antibióticos e transfusão de
sangue, muitos métodos diagnósticos e terapêuticos clínicos e cirúrgicos puderam
ser introduzidos e modificados, restringindo a utilização de cirurgias radicais
somente aos casos em que elas são a única escolha.
A terminologia cirúrgica, segundo Parra, Saad (2000) é formada por prefixo
que indica o órgão em causa e sufixo que indica o ato cirúrgico realizado. Assim, a
cirurgia realizada para retirada do útero é denominada histerectomia.
Segundo Linde, Mattingly (1971), a primeira histerectomia vaginal de que se
tem notícia foi realizada em 1813, por presença de carcinoma da cérvix, sem
sucesso, pois a extirpação do útero pela via vaginal causou uma profusa
hemorragia. Somente em 1879, no final do século XIX, o interesse por essa técnica
cirúrgica despontou nos Estados Unidos. E, Berry, Kohn (1997) relatam que a
primeira histerectomia bem sucedida aconteceu em 1818 e que McDowell realizou a
primeira ovariotomia em 1808, tendo sua paciente sobrevivido por 31 anos.
O procedimento cirúrgico ginecológico ao longo da história, vem sendo
utilizado como opção terapêutica para as mais diversas situações de doença. A
partir do número cada vez mais elevado de casos de câncer de colo uterino e
também em razão do avanço no conhecimento científico possibilitando melhor
identificação da doença. Isso vem influindo para que esta modalidade terapêutica
assuma inquestionável relevância (BRASIL, 2002).
Apesar dos esforços empreendidos visando à detecção cada vez mais
precoce das neoplasias, ainda hoje elas representam a principal causa das cirurgias
ginecológicas realizadas (ABRÃO,1997). Embora o tratamento cirúrgico seja de
importância incontestável ainda em nossos dias, a sua realização tem implicações
variáveis no cotidiano das mulheres a ele submetidas. Muitas vezes, o tratamento
cirúrgico não é utilizado isoladamente, sendo necessário o emprego de outras
formas terapêuticas como coadjuvantes no controle da doença.
A inserção e o desenvolvimento de exames como, o ultrasom, tomografias e
outros tipos de métodos diagnósticos por imagem vieram propiciar uma identificação
mais efetiva e mais bem delineada dos problemas de saúde feminina. Surgiram
também as várias técnicas endoscópicas como as videolaparoscopias e, não mais,
as grandes incisões que tanto dificultavam a recuperação pós-operatória
(ABRÃO,1997).
Os
tratamentos
por
radioterapia,
quimioterapia,
hormonioterapia
e
laserterapia, segundo Souen (2001), têm sido utilizados nas mais diferentes áreas
da medicina, encontrando na ginecologia aplicação ampla nos casos de neoplasias.
Cada uma destas possibilidades terapêuticas acarreta efeitos positivos em sua
essência, na medida em que representam as possibilidades de controle do câncer,
suas manifestações e complicações. É, porém imprescindível a análise apurada de
seus efeitos, já que a sua realização também irá interferir no cotidiano das mulheres
a eles submetidas.
Ao final do século passado, já havia um conhecimento considerável das
neoplasias nas mulheres, apontando possibilidades para a sua detecção precoce,
tratamento e cura. Com a política de saúde, instituída pelo Ministério da Saúde,
especialmente para a população feminina, ampliaram-se as expectativas de controle
da doença.
Na última década, foi consistentemente definida a relação existente entre
alguns tipos sexualmente transmissíveis do papiloma vírus humano (HPV) e o
processo de iniciação do câncer de colo de útero (BRASIL, 2005). Segundo o
Ministério da Saúde (2003), as pesquisas sinalizam que a infecção por este agente
ocorre geralmente em mulheres jovens ao iniciarem sua atividade sexual e vai sendo
reduzida, possivelmente pela eliminação do vírus por ação imunológica, à medida
que há avanço na idade. O risco de desenvolver anormalidades epiteliais,
reconhecidamente precursoras da doença, se dá quando a mulher, entre trinta e
cinqüenta anos, permanece infectada pelo HPV.
Os avanços nas pesquisas das patologias refletiram em importantes
descobertas não só nos seus mecanismos de ação, como também na configuração
de medidas preventivas primárias e secundárias e de suas complicações. A
diversidade de descobertas científicas possibilitou analisar melhor os diagnósticos e
possibilidades terapêuticas com tratamentos mais específicos, clínicos e cirúrgicos,
para as mulheres e seus problemas ginecológicos.
As indicações para histerectomia são: falha do tratamento clínico ou da
ablação endometrial em pacientes com sangramento uterino anormal; miomas
uterinos associados a dor ou com sangramento uterino anormal; úteros de volume
até 500cm3. A histerectomia subtotal está indicada nos casos de: colo de útero
normal à colpocitologia oncótica e colposcopia; pacientes jovens (abaixo de 45
anos)(MEEKER, ROTHROCK, 1997).
Jeffcoate (1983, p. 921), considera a histerectomia abdominal subtotal
quando “a parte vaginal do cérvice e uma quantidade variável do cérvice
supravaginal não são removidos”.
A Histerectomia Abdominal Total (HAT) é indicada para colo de útero
anormal; hipermotilidade do colo uterino; paciente que não realiza colpocitologia
oncótica anualmente, conforme exposto por LIPPI et al. (2002, p.20). Segundo
Meeker, Rothrock é:
para o relaxamento pélvico sintomático ou prolapso, dor associada
com congestão pélvica, doença inflamatória pélvica, endometriose,
cisto ovariano recorrente, fibróides (miomas), sangramento idiopático
em mulheres na pós-menopausa, adenomiose ou sangramento
uterino disfuncional (1997, p. 396).
Tais autores sugerem ainda que nas situações de doença anatômica, estado
maligno e em condições de alto risco para o desenvolvimento ou recorrência deste,
deve ser feita a HAT com salpingo-ooforectomia bilateral.
A histerectomia, porém, é voltada às mulheres portadoras ou não de câncer
de colo de útero, ou até mesmo de útero. Para Meeker e Rothrock considerando a
amplitude e a abrangência:
a HAT é a remoção de todo o útero, incluindo a cérvix. Quando a HAT
á combinada com a salpingo-ooforectomia, o procedimento é
comumente denominado pan-histerectomia ou histerectomia completa
(1997, p.396).
A histerectomia também pode ser realizada por via vaginal (HV). Sendo
considerada de menor traumatismo, devido à ausência de incisão abdominal não há
exposição da cavidade peritonial. Ambas as vias de acesso têm vantagens e
desvantagens, sendo que cada uma tem suas próprias indicações e contraindicações (MEEKER, ROTHROCK, 1997).
Como alternativa à histerectomia abdominal, pode-se, ainda, usar como
recurso a histerectomia vaginal laparoscópica-assistida (HVPA) ou a histerectomia
vaginal pelviscópica-assistida (HVPA), nas quais são realizados pequenos orifícios
no abdome, retirando o útero através da vagina.
A indicação da histerectomia, ou seja, dessa terapêutica cirúrgica,
normalmente inclui um conhecimento específico da fisiologia e das patologias dos
órgãos do aparelho genital feminino, das manifestações clinicas das afecções da
pelve da mulher, para que haja sucesso nesse procedimento. Assim, trata-se de um
procedimento definitivo, seja ele qual for, de perda irreversível do útero, que pode
ser para restabelecer a saúde ou mesmo salvar a vida da mulher. Mas a
histerectomia determina uma série de implicações com alterações, desde as
condições físicas até a fortes perturbações emocionais, com modificações em sua
vida.
O profissional de enfermagem, envolvido com a prática assistencial em todas
as suas dimensões, deve propiciar uma assistência holística à mulher e, segundo
Diógenes et al. (2001) na Consulta de Enfermagem Ginecológica, ele deve
considerar a cliente como ser único e, estar atento, capacitado e com disponibilidade
de tempo.
2 . 2 Repercussões para a mulher após a histerectomia
As teorias Hipocráticas sobre a anatomia e fisiologia do aparelho reprodutor
humano, como assinala LeBlanc (2004), traziam um vago conhecimento de
anatomia do útero em relação às víceras e ignoravam a inexistência dos ovários. No
entanto, os avanços das pesquisas na área hoje têm definido o papel do aparelho
reprodutor humano. No que diz respeito ao significado atribuído pela mulher em
relação ao útero e seus anexos, ainda requer maior aprofundamento.
De modo geral, as mulheres atribuem ao útero vários significados. Entre
tantos, tem-se o útero como órgão sexual para procriação, fonte de competência
feminina e de vitalidade, como também o da atração. Por isso, a sua retirada pode
também ser significativa e trazer para as mulheres alterações na vida sexual e
emocional. Além das alterações determinadas pelos fatores psíquicos, físicos,
fisiológicos, sociais e culturais (SBROGGIO, 2004).
Ao saber que será retirado seu útero, a mulher pode experienciar o
sentimento de perda, pois trata-se de uma parte dela que será amputada
cirurgicamente. Órgão com que nasceu e convive até então, além de também
reconhecer suas funções definidas como a de procriar para perpetuar sua família.
Isso pode trazer-lhe transtornos emocionais, será uma nova situação com a qual
ainda não tem vivência, porém tem experiência e conhece situações até familiares.
Enfrenta o medo do desconhecido e do sucesso da cirurgia, visto que não tem
certeza dos resultados. Não conhece os efeitos que a histerectomia trará sobre sua
imagem corporal, pois desconhece como será seu corpo após a cirurgia. Ela não
sabe, também, como será ou ficará afetado seu desempenho sexual e como seu
parceiro enfrentará a mudança de seu corpo, ou seja, as alterações anatômicas
ocorridas. E, segundo Davim et al. (2005), é uma experiência pessoal, mas que
também envolve pessoas importantes em seu cotidiano, como por exemplo, o
marido.
Normalmente, dizem Parra, Saad (2001), surgem as preocupações em
relação à dor e ao desconforto, pois todo processo cirúrgico envolve corte,
recuperação posterior, isso aumenta a apreensão, sensibilidade e ansiedade.
Smeltzer, Bare (2002) expressam que, se as manifestações das alterações
psicológicas não forem percebidas e cuidadas, poderão se tornar distúrbios
psiquiátricos. Também é de suma importância perceber as manifestações físicas e
fisiológicas que poderão surgir, visto que no pós-operatório a mulher terá algumas
restrições, como, por exemplo, não fazer exercícios que forcem a musculatura
abdominal e, principalmente, a da pelve.
Devido ao manuseio das alças intestinais durante a histerectomia, pode haver
alteração da função intestinal. A mulher
deve ser orientada a não se esforçar
durante o ato de defecação, na cesariana seguida de histerectomia, conforme
recomenda Rezende (1999). E o sistema urinário também pode apresentar
alterações, pois para as histerectomias, via de regra, é realizada a cateterização
vesical, tornando-se necessária a reeducação posterior para a reintegração da
micção (CAMANO, 2003).
Torna-se necessário fazer orientações relativas ao pós-operatório para o
retorno ao cotidiano, de forma compreensiva para a mulher, clara e numa linguagem
acessível aos seus conhecimentos e vivências. Esta mulher, numa ótica biologicista,
estará enfrentando um procedimento cirúrgico e deverá acreditar na sua
recuperação e em que tudo dará certo, visto que não é relevante a sua dimensão
existencial. Mas, quando essa dimensão é considerada, sua dimensão existencial,
pensando no seu cotidiano após a histerectomia, encontra-se o exposto por
Heidegger (1999, p. 35), em que não se pode desvincular que esta mulher é ser e
que “o ser é sempre o ser de um ente”. E, compreende-se então, que é na dimensão
existencial que funda-se o cotidiano, quando o ser que é ser-com e ser-aí, pode
tornar-se dominado por aquilo que se espera dele.
Por ser considerada a histerectomia uma cirurgia de grande porte, além de
um período maior de internação no pós-operatório são recomendados repouso e
limitação de alguns hábitos, o que afasta a mulher de imediato do convívio social,
trazendo em algumas circunstâncias, inibições e desajustes sociais. Também, existe
repercussão no labor, tanto doméstico quanto no trabalho fora do lar, tendo em vista
que nos dias atuais a mulher é força no mercado de trabalho (CAMANO, 2003).
Na perspectiva de olhar a dimensão existencial da mulher, recorrendo a
Heidegger (1999, p.105), para entender o mundo, encontra-se que: “o mundo pode
ser usado como um conceito ôntico e funciona como termo ontológico e significa ser
dos entes”. Para o entendimento deste “mundo”, precisa-se recorrer à dimensão
existencial e considerar, então, que ora se está num mundo público e ora num
doméstico. Penso, então, que as mulheres, para vivenciarem o cotidiano após
histerectomia, têm que receber orientações que as ajudam a se sustentarem sendono-mundo-com-os-outros. Compreendê-las e não só considerar o seu mundo
público, com rotinas pré determinadas, sem se voltar para o ser-aí-com dessa
mulher, com suas expectativas e com uma vida sem os desconfortos de natureza
ginecológica.
Estar-se-á, então, com um olhar no ôntico que é a questão da cirurgia e no
ontológico, o que leva a um olhar diferente, considerando a existência do ser.
Destaco a seguir alguns estudos já realizados sobre a temática.
Silva (1980) realizou pesquisa exploratória sobre a orientação para alta de
pacientes submetidas à cirurgia ginecológica e verificou a atuação da enfermeira no
processo de orientação quanto ao preparo para continuidade do tratamento e
cuidados pós-alta e as reais necessidades das pacientes sobre tais atividades.
Constatou que as pacientes, de modo geral, têm necessidade de orientação e que
esta é fornecida de maneira assistemática. Estabelecendo uma comparação entre os
resultados dessa investigação e minha atuação profissional e com o grupo alvo,
percebo que após duas décadas desse estudo a realidade ainda não se modificou.
Na minha prática cotidiana e em outros estudos mais recentes, encontro as mesmas
condições, a falta de orientação e, quando ela é realizada, é padronizada segundo o
procedimento cirúrgico, não considerando a singularidade.
Também Caliri (1994) realizou um estudo de natureza quantitativa junto a
mulheres histerectomizadas com o objetivo de compreender e descrever o processo
vivenciado por elas sob as suas próprias expectativas. Os resultados encontrados
permitiram compreender que, para as mulheres estudadas, existia uma situação de
ambigüidade: necessidade de resolverem os problemas que impediam que tivessem
uma vida “normal” e a incerteza sobre as conseqüências de ficarem sem o útero.
Penso que as mulheres ainda não estão bem esclarecidas sobre a condição de sua
saúde, o processo da doença, sua cidadania e que, muitas vezes, se vêm sem
opção para o seu próprio cuidar.
A pesquisa de Garcia, em 1999, teve como objetivo analisar as expectativas
dos pacientes com câncer em relação à orientação pré-operatória. Utilizando a
abordagem quanti-qualitativa apresentou como resultado, entre as implicações para
a assistência de enfermagem, a necessidade de maior interação do paciente com a
equipe.
Reconheço que o enfermeiro recebe, desde a graduação, informações sobre
o relacionamento e interação com o paciente, estabelecendo uma aproximação, mas
sei também, que isso se adquire na prática diária ao longo dos anos, quando em
exercício profissional. É um processo construído com o tempo, com a capacidade
individual e que, muitas vezes, se encontram barreiras próprias para a proximidade
do outro. Vejo que, para melhor assistir a paciente, torna-se necessária uma
aproximação, escutando, percebendo e compreendendo-a.
Abordando questões sobre o útero, feminilidade, sexualidade, imagem
corporal e relacionamento conjugal, Sbroggio (2004) também realizou pesquisa com
mulheres em pré-operatório para histerectomia. Constatou mitos sobre retirada do
útero (ficar frígida, envelhecer precoce e perda da feminilidade) e que a insegurança
marca mulheres no período que antecede a histerectomia. Recomendou tratamento
psicológico, desde o pré-operatório, para as mulheres e familiares, visto que o apoio
do marido é fundamental. Considero que esse estudo realizado por profissional da
área da psicologia traz para a enfermagem importante contribuição, pois reforça o
trabalho de assistir a mulher emocionalmente, bem como à sua família.
Os diferentes aspectos da qualidade de vida em mulheres em tratamento de
câncer do colo do útero e o papel do profissional de enfermagem na oferta de
conforto e segurança às mulheres e seus familiares foram abordados no estudo de
Ohnuma (2005). O resultado apontou que a qualidade de vida é afetada
radicalmente e de forma negativa tanto pela doença quanto pelos efeitos agressivos
do tratamento. Percebo ter que se considerar as modificações psicoemocionais,
fisiológicas e anatômicas a que as mulheres ficam sujeitas quando acometidas pela
doença e tratadas, e que o impedimento da realização de tarefas do cotidiano pode
gerar transtornos na família.
Davim et al. (2005) realizaram uma pesquisa para identificar as causas que
levam mulheres, de uma área rural do Rio Grande do Norte, a se submeterem à
histerectomia e para verificar informações recebidas antes e após a cirurgia, e a
percepção das mesmas quanto ao procedimento. As autoras constataram que as
causas para o procedimento são relacionadas à presença de miomas, útero
crescido, cistos de ovário e sangramentos constantes. Acrescentam ainda que as
mulheres recebem antes da cirurgia informações sobre a prevenção do câncer de
colo do útero e, no pós-operatório, sobre os problemas de menopausa precoce e
terapia de reposição hormonal. Supõem a histerectomia como uma cirurgia
mutiladora que irá interferir em suas funções femininas, em especial, no seu
desempenho sexual, e expressam o medo das interferências na vida matrimonial.
2. 3 Cotidiano de saúde da mulher como problemática existencial
Toma-se conhecimento através da evolução que a mulher foi uma
trabalhadora incansável, pois, nos primórdios da civilização, a encontramos
envolvida com o trabalho em suas mais diversas formas. Sua vida diária sempre foi
repleta de atividades laborais. As ações que garantiam ao homem a manutenção de
sua sobrevivência estavam intimamente ligadas ao trabalho feminino que foi sem
dúvida uma forma de manifestação de cuidado do ser humano. No início da
civilização, desde as cavernas, era a mulher quem cuidava da família e das
atividades do lar (SALIMENA, BARA, 1998).
A proteção materna surge, então, como a primeira forma de manifestação do
cuidar do ser humano, surgindo daí a associação do trabalho feminino e cabendo à
mulher tudo o que se tornava necessário para o desenvolvimento da família, ou seja,
a manutenção da saúde, a educação dos filhos e o cuidado com o lar.
Afirma Giovanini (1995) que as práticas de saúde surgiram entre os grupos
nômades, cuja estrutura familiar contemplava a mulher como responsável pelo
cuidado com as crianças, velhos e doentes. Assim, os cuidados de saúde eram
praticados pela mulher e repassados entre elas e suas gerações. Podemos pensar
que desde a adolescência a jovem menina já aprendia a cuidar de outros e de si.
Com a evolução dos tempos, a mudança nos regimes políticos e sociais dos
feudos ao capitalismo, surge a necessidade de novas organizações para expansão
da produção e economia, conseqüentemente, novas forças de trabalho, o que faz
com que a mulher não mais seja só trabalhadora do lar, mas também trabalhe para
contribuir para o sustento da família. Apesar disso, ela continuou sendo a
responsável pela saúde e educação dos filhos até os dias atuais.
Como é de meu interesse o cotidiano da mulher após à histerectomia, realizei
uma busca bibliográfica com o intuito de aproximar-me desta temática,
aprofundando-me neste assunto a partir da produção científica “stricto sensu” de
enfermagem já produzida.
A busca nos anais da ABEN, no período de 1990 a 2000, acusou a existência
de 37 pesquisas em saúde da mulher, sendo 04 teses de doutorado abordando a
temática em questão.
Na Escola de Enfermagem Anna Nery, no período de 1992 a 2004, a respeito
da saúde da mulher, encontram-se 26 teses, das quais 12 abordaram as questões
de gênero e cotidiano. A realização deste levantamento possibilitou identificar a
produção científica da enfermagem, especificamente na área da saúde da mulher
com enfoque nas questões de gênero e cotidiano, entretanto nelas não se identifica
a histerectomia. Por outro lado, apenas uma delas aborda as questões da
paternidade e suas implicações no gênero masculino.
Isso posto, traço algumas considerações de pesquisas, em dissertações e
teses realizadas por enfermeiras, as quais poderão acrescentar subsídios ao estudo
da temática do cotidiano e saúde de mulheres, pois são estudos com abordagem
fenomenológica, que mostram a condição de ser mulher. Trazem reflexões sobre a
mulher que, inserida no cotidiano, teve modificações no cotidiano devido à
maternidade, situações de doença sua ou nos seus filhos e/ou, até mesmo, por estar
no mercado de trabalho. Neste processo, estão compreendidos, por exemplo, os
estudos fenomenológicos em saúde da mulher, abordando o cotidiano em
Heidegger.
Souza (1993) obteve como resultado de sua pesquisa, no fenômeno do ser
gestante, o significado atribuído pelas gestantes à amamentação. Compreendendo
que esta temática envolve o ser na dimensão do existir e o poder-ser, inseparável
em sua existência. A meu ver, tal fenômeno traz também repercussões no cotidiano
da mulher-mãe e mulher trabalhadora, devido às condições que alteram o seu
comportamento, o poder decisório da amamentação, que, na orientação científica,
não leva em consideração o vivido da mulher-mãe.
Paz (1994) compreendeu que é necessária a valorização da singularidade do
ser mãe ao pesquisar o significado do cuidado de saúde do filho lactente. O cuidado
emergiu nesta pesquisa para o ser mãe como: obrigação, propriedade e disposição.
Penso que este estudo traz em seu bojo um cotidiano velado, onde a mãe nele
inserida é a responsável pela alteração dele. Dando continuidade a seus estudos no
nível de doutoramento (1998), desvelou o sentido do cuidado de saúde prestado às
crianças pela equipe de enfermagem nas unidades básicas de saúde, mostrando
que esta equipe não se preocupa com a saúde da criança, mas sim, se ocupa dela,
pois que sua assistência está centrada nas normas propostas pelos serviços. De
acordo com os resultados dessa pesquisa, mais uma vez a equipe em seu cotidiano,
no seu mundo do trabalho e no falatório do cuidar, experiencia seu cotidiano sem
considerar o cotidiano da clientela assistida ( MALVEIRA, 1998).
Simões (1995), ao pesquisar o significado das vivências do trabalho de parto,
na fase de dilatação, compreendeu que a mulher em seu modo-de-ser-parturiente,
demonstra em sua possibilidade de ser-um-ser-autêntico, trazendo uma forma de
compreensão de sua vivência e da atuação da equipe de saúde que a assiste.
Percebe-se haver para quem está na vivência do trabalho de parto, um cotidiano
hospitalar sem reflexões em que se está atentamente assistindo, não considerando
que essa mulher está num cotidiano que não é seu, em que tudo é novo e estranho.
A mesma pesquisadora, em 1998, em sua tese de doutorado, ao estudar os
significados atribuídos pela mulher ao cuidar da sua saúde, constatou que a mulher
encontra-se lançada nas ocupações emergentes de seu cotidiano doméstico aos
quais interferem nas suas de-cisões de cuidar de si. Mesmo existindo nesse
cotidiano, ela pode decidir se cuidar, fazer escolhas devido às possibilidades
traçadas pelas políticas de saúde do governo e implementadas pelos profissionais
de saúde. Tal estudo remete à reflexão do quanto a mulher evoluiu no seu processo
de decisão de se cuidar, de sua inserção nos programas de saúde e mercado de
trabalho, trazendo conseqüências ao seu cotidiano.
Lopes (1996), ao analisar o significado atribuído pela mulher à realização do
exame preventivo ginecológico para a prevenção do câncer cérvico-uterino
encontrou
o
ser-mulher
como
pre-sença
temerosa,
sem
compreender
o
procedimento, sentindo vergonha, ansiedade e medo. Partindo dessa facticidade em
busca do desvelamento desse fenômeno, a autora compreendeu o sentido do sermulher, e, que os profissionais que dele participam estão voltados ao cotidiano do
serviço não direcionado ao atendimento particularizado da mulher que vivencia esse
exame, que não faz parte do cotidiano vivido por ela. Por meio desse estudo,
percebe-se o quanto é importante para os profissionais de saúde compreender as
dificuldades enfrentadas pela mulher ao procurar os Serviços de Saúde e que ali são
atendidas de modo diferenciado para que sintam a necessidade de inserir no seu
cotidiano a regularidade do exame.
Camargo (1997), tendo como objeto o ex-sistir da mulher frente à queda de
cabelo em conseqüência do tratamento quimioterápico para o câncer de mama,
percebeu que ela se encontra exposta ao falatório no cotidiano assistencial e com
pre-sença temerosa enfrenta o temor da perda do cabelo. Compreendeu, em sua
análise, que no cotidiano a mulher transita da inautenticidade para a autenticidade,
através da angústia e encontrando o seu poder ser-mulher. Prosseguindo em seus
estudos, em 2000, a autora realizou outra pesquisa, na qual aprofundou a dimensão
da angústia dessa mulher que enfrenta o tratamento quimioterápico para o câncer de
mama e desvelou esse temor num movimento existencial marcado por um temor
cíclico, ou seja, um temor a cada ciclo do tratamento. Sob esta ótica, os profissionais
de saúde devem compreender que, na cotidianidade, o ciclo de quimioterapia foge
do esquema padronizado e seqüencial, pois ele é único a cada vez que a mulher o
enfrenta.
Oliveira (1999), dedicou-se a compreender o significado atribuído pela mãe ao
choro do filho recém-nascido e dele o sentido que funda o seu comportamento.
Compreendeu, assim, que esse choro representa a concretização do projeto sermãe. Posso entender que o reconhecimento desse choro se concretiza no cotidiano
dessa mulher.
Ghelman (2000), ao analisar o cotidiano de mães de crianças diabéticas,
buscou compreender o significado deste ser-mãe. Desvelou que essas mães se
mostram preocupadas com o cotidiano: as mudanças nos hábitos de cuidar do filho
e o não-compartilhamento desse cotidiano com outros membros da família. E,
Salimena (2000) aponta a mudança do cotidiano do ser-mãe-estar-com ao deixar o
filho à porta da sala de cirurgia, pois a mãe, que é pre-sença no cuidar cotidiano com
o filho, entrega-o a outra pessoa para este cuidar.
Luz (2001), ao indagar o sendo da pessoa estomizada, desvelou o seu
cotidiano no qual, de início, encontra-se dominado pelo temor e falatório mas que,
inserido no mundo da cotidianidade, mostra-se como ser-aí autenticamente e se
descobrindo como ser do humano libertando-se do ente, se descobre ser de
possibilidades. Encontro respaldo em sua pesquisa ao pensar que é no cotidiano
assistencial que se compreende como os estomizados transitam da inautenticidade
para a autenticidade, sendo-aí-com-outros.
Pompa (2003), realizou um estudo sobre o cotidiano de vida e saúde de
mulheres peruanas em uma comunidade rural no Peru, tendo desvelado que elas se
mostram no modo de ser da cotidianidade dominada pela ocupação, pela
preocupação e pelo temor de doenças na família. Considerou que a perspectiva da
humanização da assistência de enfermagem às mulheres de uma comunidade rural
precisa apreender o sentido do movimento ex-istencial, sua singularidade e então o
seu cotidiano. A maneira do seu ser-mulher precisa fundamentar o trabalho de
saúde e da enfermagem, considerando-a na família e respeitando o seu cotidiano.
Acredito que tal estudo realizado em uma comunidade rural e em outro país vem ao
encontro da nossa realidade, pois creio que aqui também se encontram situações,
ainda hoje, iguais ou parecidas, com aquelas vividas pelas mulheres peruanas e que
os profissionais da enfermagem devem considerar e acatar as recomendações de
seu estudo.
Na Universidade Federal da Bahia, Jesus (2002), buscou o fenômeno da
vivência do primeiro ciclo da quimioterapia antineoplásica a que mulheres
mastectomizadas foram submetidas e des-velou o sentido do ex-sistir na dimensão
cotidiana, compreendendo a possibilidade da autenticidade das mulheres a partir
das experiências do cotidiano: como o adoecer, o estar em perigo, o estar diante do
desconhecido, o estar frente à possibilidade da morte e a superação do temor.
Também considerou que o estudo não somente revelou o cotidiano de saúde das
mulheres, mas que, na cotidianidade do nossa existência, estamos presos à
tecnologia, reduzindo o espaço de um cuidar em que seja compreendido o cotidiano
da clientela.
Os estudos elaborados, portanto, por pesquisadoras da enfermagem, a partir
dos anos 90, mostraram como a abordagem Fenomenológica, utilizando o método
do filósofo Martin Heidegger, propicia um conhecimento original sobre o outro, ou
seja, no depoimento de quem vivencia o fenômeno. O profissional, ao utilizar esta
metodologia, tem que estar aberto a ouvir, estar atento ao não-verbal explicitado
para captar o movimento do outro, o/a depoente, na possibilidade de mostrar-se
como um SER com suas particularidades e especificidades em seu mundo cotidiano.
Buscando construir uma relação autêntica no cotidiano profissional, espaço onde o
enfermeiro encontra as possibilidades de ser-cuidador.
Outros estudos em saúde da mulher e cotidiano, que não utilizaram a
fenomenologia como abordagem, também podem contribuir para o enriquecimento,
com os métodos: dialética e história de vida. Trago alguns desses estudos.
Ao aprofundar suas reflexões acerca da mulher enfermeira e o auto-exame da
mama, Melo (1992), discorre sobre a temática fazendo uma ponte entre o cotidiano
da mulher enfermeira e as questões referentes ao “Saber, Fazer e Ensinar” como
alicerce para a prática profissional, no enfoque de suas questões. Já naquela época,
considerou como de grande relevância a preocupação relacionada às questões que
envolvem o diagnóstico precoce do câncer, já que somente a partir deste, a doença
pode ser combatida com maior eficácia. Consideração esta que, ainda na atualidade,
expressa a realidade, constituindo ainda hoje, condição prognóstica. Seu enfoque da
prevenção secundária “salienta a postura manifesta do Fazer ou Não Fazer o autoexame da mama, associada ao autoconhecimento da enfermeira e á projeção da
importância atribuída” como elementos básicos para as análises referentes à
temática.
Em seu estudo, Maluhy (2001) constatou que a mulher-profissional da equipe
de enfermagem sente dificuldade em separar o ser mulher do ser profissional, não
está em dia com o exame ginecológico preventivo do câncer cérvico-uterino e,
sente-se constrangida ao expor seu corpo para ser examinado. E, ainda, que o
tecnicismo está mais evidente que o atendimento humanizado. Percebo, nessa
pesquisa, que as mulheres-enfermeiras ainda têm resistência em se perceber como
clientes e que ensinam o cuidar, mas que nem sempre fazem o que ensinam ou
exercem no cotidiano profissional. Preocupo-me com o cuidado prestado à mulher
que procura atendimento técnico para o exame, mas que espera ser tratada como
ser humano, com medo, apreensões, ansiedades e angústias ao vivenciá-lo.
Também a pesquisadora Spíndola (2002) em seu estudo descreveu o
cotidiano da mulher-mãe-trabalhadora de enfermagem e discutiu a interferência da
profissão na vida desta mulher, bem como analisou a sua percepção em relação ao
seu cotidiano tomando como base a sua história de vida. Evidenciou que elas
consideram o trabalho remunerado, fora do espaço doméstico, como forma de
independência; que trabalham em condições precárias; o ressentimento por que não
serem valorizadas; enfrentam a sobrecarga de trabalho e o sentimento de culpa pela
ausência do lar. No cotidiano convivem com a ambivalência e conflito devidos aos
vários papéis desempenhados e se esquecem de ser mulher.
Nesse sentido, percebendo a complexidade do cotidiano de saúde da mulher
é que me interessei por desenvolver um estudo sobre o dia-a-dia da mulher no pósoperatório, no seu contexto de saúde de acordo com as políticas públicas atuais, os
aspectos assistenciais, as questões de gênero e as repercussões no cotidiano da
mulher após a histerectomia.
“...ir às coisas nelas mesmas”
Heidegger
III - REFERENCIAL FILOSÓFICO
Devido às minhas inquietações, já descritas neste trabalho que me incitaram
à realização deste estudo, cujo propósito é o de analisar o cotidiano da mulher após
a histerectomia, justificou-se, na proposta desta abordagem, a fenomenologia como
quadro de referência. Isso significa que se tratou de buscar a compreensão da
mulher em seu cotidiano vivencial, por meio da descrição do fenômeno, a partir de
quem o experiencia e de modo a alcançar a sua essência, não mais biológica, mas ir
além da dimensão factual.
Acrescento, ainda, que o referencial temático sobre a histerectomia está
exclusivamente, centrado na doença e nos procedimentos técnicos, sendo estes
insuficientes para esclarecer questões referentes à existência do ser-mulher, que
sendo um ser existente não é contemplada na dimensão do seu cotidiano. Porque
segundo Canguilhem (2006, p.83), “o que interessa é diagnosticar e curar... os
valores desejados são a vida, uma longa vida, a capacidade de reprodução, a
capacidade de trabalho físico, a força,
a ausência de dor... além da agradável
sensação de existir” .
E, Davis-Floyd (2001), após suas pesquisas entrevistando médicos,
enfermeiras, parteiras e também mães, descreveu os paradigmas de modelos
tecnocráticos, humanísticos e holísticos de cuidados que influenciam o parto
contemporâneo em doze doutrinas de cada um deles e como eles se aplicam na
obstetrícia e suas implicações para o futuro. Ela considera que tais modelos diferem
em suas definições sobre o corpo e sua relação com a mente e, assim, na
abordagem do cuidado.
Em minha experiência profissional, emergem já desvelados que, dentre as
atividades e competências da enfermagem, o confortar, o ser com o outro, o dar
segurança aos clientes, quer seja pelo conhecimento técnico científico, quer seja
pela presença significativa, respeitando sua pluralidade e singularidade, conforme
recomendado por Cadete (1994) em seu estudo de doutoramento.
Considerei, então, que a pesquisa qualitativa, tendo a fenomenologia como
referencial metodológico, abriria perspectivas para que eu buscasse compreender os
diferentes significados atribuídos ao cotidiano pela mulher ao ser submetida à
histerectomia, pois que a compreensão aconteceria quando me voltasse para quem
vivencia essa circunstância, aproximando-me da mulher, em suas diferentes
potencialidades e possibilidades, que me explicitaria este momento com sentido
com o qual é vivido.
Confesso que optar por essa abordagem, vislumbrando a Fenomenologia, em
toda a sua dimensão compreensiva, significou adentrar num universo filosófico de
modo apreensivo, visto que reconheço as lacunas de formação que obtive e,
portanto, o meu desconhecimento dessa área. Mas, ao mesmo tempo encontrei uma
significativa produção nacional, através de dissertações, teses e artigos publicados
em periódicos, desenvolvidos com o suporte da Fenomenologia para a compreensão
de muitas situações de saúde/doença experienciadas em sua condição existencial,
evidenciadas nos pensamentos filosóficos de Martin Heidegger, Maurice MerleauPonty e Alfred Schutz.
Na leitura filosófica, fiz um mergulho profundo e ousei enfrentar o desafio de
estudar Heidegger, o filósofo existencialista. Nesse contexto, situando-me
historicamente e reconhecendo os limites e as possibilidades do meu existir, pretendi
me aproximar e utilizar da parcela da vasta contribuição por ele legada e que vem
sendo aplicada nos estudos de Enfermagem.
3. 1 Fenomenologia
A fenomenologia surgiu como ciência, nos estudos de Edmund Hussel,
filósofo alemão, em contraposição ao positivismo. Despontou como meio de tornar
possível ao ser humano o encontro com ele mesmo naquilo que mais o caracteriza,
sua pre-sença no mundo. Como referencial teórico metodológico, essa vertente em
concordância com o referencial filosófico acima mencionado, permite mostrar,
descrever e compreender os motivos presentes nos fenômenos vividos, que se
mostram e expressam por si mesmos. Estuda o fenômeno tal como ele ocorre.
Por isso, vários autores, entre eles Donzelli (1988) e Bicudo (1992)
consideram esta ciência como um método apropriado aos estudos dos fenômenos
humanos e sociais, como uma proposta de compreensão do humano. Declara ainda
Bicudo (1983, p.11), que “esta corrente filosófica não tem a tarefa de explicar os
fatos, mas de ir além buscando o fundante presente em todo comportamento
humano”. E, ainda, Martins e Bicudo (1989) dizem que a revelação do mundo
acontece por meio da explicitação de quem vivencia um determinado fenômeno num
determinado tempo e espaço, descrevendo assim, a experiência do homem.
Coelho Júnior et al. (1991) mostram que a fenomenologia é o estudo do
homem em sua totalidade existencial e Lopes et al. (1995) a identificam como o
refletir a partir do retorno ao já vivido.
Para Martins, Boemer, Ferraz (1990), a fenomenologia significa a volta ao
mundo da experiência, no qual se busca chegar à essência através das experiências
vividas pelo sujeito, possibilitando, assim, que as coisas sejam vistas como elas
acontecem. E para compreender o homem, a fenomenologia convoca e remete para
uma visão holística, possibilitando a exploração e discussão
do cotidiano da
enfermagem, emergindo numa práxis criativa e intencional.
Aqui cabe destacar, no entanto, que ao me apropriar do método
fenomenológico para conduzir este estudo, busquei a essência do fenômeno,
através das descrições das experiências vividas ou dos discursos das mulheres,
sujeitos desta pesquisa, do seu mundo real vivido (BICUDO, ESPOSITO, 1997). É
uma atitude de abertura do ser humano para a compreensão da vivência a partir do
outro, que segundo Boemer (1994, p. 88-89), “parceiro do pesquisador em seu
processo de descoberta”. E assim, partindo de minhas inquietações procurei o
fenômeno através de quem vivencia uma determinada situação: o cotidiano após a
histerectomia.
Na
Fenomenologia,
portanto,
procura-se
o
sentido
que
funda
o
comportamento do indivíduo quando ele vive, tem saúde ou adoece, ama e sente-se
feliz, quando se entristece, sente angústia ou ansiedade, quando sente a finitude de
quem gosta... e que se expressa através do discurso, das palavras, dos gestos, da
expressão de sua face e de seu corpo, do tom de voz, dos silêncios e, até mesmo
dos discursos escritos (LOPES et al. 1995).
Corroborando Leão (1999), em “Ser e Tempo” diz:
O homem é o ser que fala, mesmo quando não fala e cala,
recolhendo-se no silêncio do sentido...a fala remete para além ou
aquém das palavras, mas este remeter não é semântico nem
sintático. É o silêncio do sentido (HEIDEGGER, 1999:16).
Com esse pensamento, não posso reduzir a uma única dimensão do cotidiano
da mulher frente a histerectomia, independente das circunstâncias do evento e das
contingências de sua realização. Isso, porque, este é significativo para a existência
humana tal como a angústia, o medo, a esperança e desesperança frente aos
procedimentos, bem como o próprio existir, não podendo ser tratado simplesmente
como um fato ocasional.
Operacionalmente, na abordagem Fenomenológica, o conhecimento que
tenho sobre a temática constitui o meu momento pré-reflexivo. Na minha maneira
diferenciada de olhar a situação problematizada, está assumir o olhar de observador
que põe, segundo Heidegger (1999), em suspensão qualquer teoria, crença,
concepção, conhecimento prévio sobre a situação em estudo para ir em busca da
pré-compreensão. Devo também, inicialmente, recusar as pré-concepções sobre a
natureza do fenômeno que estarei investigando e solicitar que as mulheres
descrevam, em sua linguagem própria, como elas estão experimentando essa
situação vivenciada. O que não quer dizer que, ao recusar teorias e explicações,
parto de um marco zero, contrário, considero uma maneira não apropriada para
apreender nas descrições feitas por essas mulheres que vivenciam o procedimento
cirúrgico da histerectomia, a compreensão delas.
Tendo como propósito buscar a compreensão do cotidiano da mulher após a
histerectomia, segundo seu modo de ser-existente, encontrei na fenomenologia de
Martin Heidegger um caminho apropriado para tal compreensão.
3.2 O pensamento de Martin Heidegger
HEIDEGGER nasceu em 26 de setembro de 1889, numa pequena cidade da
Alemanha. Em 1915 aproximou-se de Hussel, tornando-se seu discípulo e
dedicando-se a fenomenologia, na compreensão do Ser. Desenvolveu um método
próprio de interpretação e análise , na busca de compreender os entes dotados do
ser da presença, seu sentido de ser em sua existência. Sua obra “Ser e Tempo” traz
seu pensamento explicitado em texto complexo e de difícil apreensão num primeiro
momento. Considera, Heidegger (1999, p. 65), a fenomenologia como “deixar e
fazer ver por si mesmo aquilo que se mostra, tal como se mostra a partir de si
mesmo”. Portanto, a fenomenologia é uma investigação que está, na realidade, no
nosso campo de atuação, que busca o que não está à mostra, ou seja, o que está
velado, mas que pode ser revelado, o sentido ou a direção do ser.
Heidegger (1999) diz que o Ser é a presença, o manifesto, o percebido, o
compreendido e o conhecido para o humano para “o ser-aí ” ou “Dasein “, portanto,
o homem é “Dasein “ e está laçado no mundo. E, sendo pre-sença é estar aí, e se
torna sendo no mundo, onde se compreende como ser de possibilidades. Buscou,
Heidegger, compreender o ser do humano e nessa compreensão denominou as
pessoas de “ENTE”.
Chamamos de “ente” muitas coisas e em sentidos diversos. Ente é
tudo de que falamos, tudo que entendemos, com que nos
comportamos dessa ou daquela maneira, ente é também o que e
como nós mesmo somos. Ser está naquilo que é e como é, na
realidade, no ser simplesmente dado., no teor e recurso, no valor e
validade, na pré-sença, no “há” (1999, p. 32).
No pensar de Heidegger (1999), encontramos as expressões ôntico e o
ontológico. A instância dos fatos que envolve entes envolventes – o objeto e coisas e
entes dotados do ser da pré-sença, considera ôntico todos os seres humanos, todos
nós. Ontológico como o ser do humano. Partindo desse pensar, podemos interrogar
o ser e o sentido do ser, para então compreender o velado para nós.
A análise, segundo Heidegger9 1999), do nosso existir pode ser feita
valorizando aspectos do pensamento do filósofo desenvolvidos na obra Ser e Tempo
nos quais podem ser destacadas as questões relacionadas ao Cotidiano, à Angústia
e à Morte.
Considerando que o cotidiano é objeto deste estudo, procurei um
aprofundamento conceitual dessa dimensão no pensamento de Heidegger (1999).
Assim, é na dimensão existencial do cotidiano que estamos no nosso factual, onde
nos localizamos e estamos expostos ao falatório, a tagarelice e a ambigüidade.
Vivemos e existimos o dia-a-dia, nós somos para Heidegger (1999, p. 44), “antes de
tudo e na maioria das vezes”, aquilo que determinam que a gente seja. É no
cotidiano que o ser-aí pode se mostrar de maneira inautêntica e envolvido com as
ocupações, sendo à maneira de todos.
A cotidianidade é a possibilidade de ser e a possibilidade de toda
impossibilidade. Então, segundo Heidegger (1999) a angústia é se reconhecer como
possibilidades e a morte é reconhecer a finitude como possibilidade mais próxima,
passando a ser a possibilidade de toda impossibilidade. Dubois (2004, p.50),
expressa que “ a possibilidade da morte é não relativa ... desligada de toda
referência ao outro... ela me dá a compreender a mim mesmo, me dá a assumir a
existência inteira a partir do meu isolamento”.
Refletindo sobre o pensamento de Heidegger (1999), acerca do “ente”,
entendo que ente é o que somos e que quando procuramos desvelar um fenômeno
temos que dar voz a quem é ente, ao ser que é pre-sença, que pensa, fala e vive,
pois este é sendo-no-mundo. Dessa forma, o ser é existencial mostra-se, faz-se
acontecer, é ser de possibilidades e isso pode acontecer no cotidiano.
Quando dizemos cotidiano, queremos expressar o modo como as coisas se
dão, como expressa Heidegger (1999, p. 44), “antes de tudo e na maioria das
vezes”. Nessa oportunidade, devemos estar apreendendo as estruturas essenciais
“que se mantêm ontologicamente determinantes em todo modo de ser de fato da
pre-sença” (1999, p. 44).
Então, na cotidianidade entenderemos aquilo que é. Estaremos envolvidos
com as preocupações do dia-a-dia, ex-sistindo na facticidade lançados no mundo
sem
possibilidades
de
escolhas,
na
decadência
sendo
impessoais
(na
inautenticidade) vivenciando o falatório, a tagarelice e ambigüidade velando o
sentido do ser. Ao desvelar o seu modo próprio de viver e relacionar-se com-osoutros na abertura para o mundo ocorre a expressão significativa. É no cotidiano que
o ser-aí se mostra.
“Fazer o que gosta, e,
gostar do que faz”.
Stephen Kantz
IV- TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
4.1 Fenomenologia: um caminho de investigação
Acreditando que para estudar esta inquietação acerca do cotidiano da mulher
após à histerectomia, como um sentido, uma maneira de ser, um modo de ser do
próprio Ser, me aproximei dessa experiência para apreender a sua dimensão
existencial no seu cotidiano de vida. O caminho foi, portanto, o da descrição das
vivências.
Para tanto, a trajetória de pesquisa que teve maior sintonia com o meu
objetivo de estudo foi a abordagem qualitativa. De acordo com Minayo (1994, p.16),
a metodologia é “o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da
realidade”. De forma complementar, na expressão de Russo (1997, p. 11), “a
pesquisa qualitativa vem ao encontro dos anseios e expectativas do pesquisador na
área das Ciências Sociais”. O estudo permite um relacionamento mais harmonioso e
natural do pesquisador com as questões de estudo.
Pensei, então, que a abordagem qualitativa, tendo a fenomenologia de
Heidegger(1999), como referencial teórico-metodológico, justificava-se na proposta
de estudo que buscou a compreensão da mulher em seu cotidiano após a
histerectomia, por meio da descrição do fenômeno que a experiência nos oferece
para chegar a sua essência. Acrescento, ainda, que os estudos pautados no
referencial técnico-científico, exclusivamente centrado na dimensão da doença, não
foram suficientes para esclarecer questões referentes à existência da mulher-ser
encontradas no meu cotidiano profissional, tal como mencionado anteriormente.
Como foi visto, a fenomenologia é o estudo ou a ciência do fenômeno.
Permite mostrar, descrever e compreender os motivos presentes nos fenômenos
vividos e que se mostram e se expressam por si mesmos. Estuda o fenômeno tal
como ele ocorre.
4. 2 O método em Heidegger: um caminho para a compreensão
Heidegger (1999), em sua obra “Ser e Tempo” utiliza a expressão ontológica
ao falar do homem, considerando-o como ente: um ser que não é objeto no mundo,
mas que nele está e é Ser de possibilidades. Por isso, o homem já traz em si uma
compreensão do mundo e o tempo todo deve estar se cuidando, pois é possível sua
finitude, ou seja, ele é mortal. Considera (Heidegger,1999, p. 66).que “a
fenomenologia é a via de acesso e o modo de verificação para se determinar o que
deve constituir tema da ontologia".
Se o termo fenomenologia, derivado do grego, significa deixar e fazer ver por
si mesmo aquilo que se mostra a partir de si mesmo, Heidegger questiona então
como buscar a essência desse ser, pois o ser pode encobrir-se até ser esquecido e
a questão do ser e de seu sentido se ausentarem. Sendo assim, o fenômeno pode
estar no ente de modo velado e nunca ser descoberto ou desvelado (HEIDEGGER,
1999).
Heidegger expõe que o pesquisador deve ter com o sujeito interrogado um
olhar atentivo e estar aberto para o diálogo, acolhimento das idéias, opiniões e
sentimentos, colocando-se em seu lugar para ver, sentir e pensar como o
pesquisado e, desse modo, estará mais próximo da sua compreensão. Também,
nesta aproximação com o discurso dito (escrito ou falado) há de se considerar o não
dito, através do silêncio e dos gestos, que são formas de expressão e de
compartilhamento (HEIDEGGER, 1999).
Deverá preocupar-se em mostrar e não em demonstrar, usando de uma
rigorosa descrição para ter então o fenômeno revelado perpassando pela aparência
(a coisa), parecer (a coisa em si) e aparecer (a coisa em si mesma) (HEIDEGGER,
1999).
Dessa forma, só depois de compreender o que está velado é que o
pesquisador poderá fazer a interpretação da questão pesquisada. Para Heidegger
(1999, p. 204), “interpretar não é tomar conhecimento de que se compreendeu, mas
elaborar as possibilidades projetadas na compreensão”. Por isso, a interpretação é o
último momento da pesquisa. Continuando, o autor (1999, p.31), expressa que: “a
compreensão vaga e mediana é um fato”, ou seja, é aquilo que o ente pensa e fala
do ser, mas ainda não é a interpretação, que será alcançada no segundo momento
pela hermenêutica.
Neste estudo, dirigi um olhar atentivo para as mulheres submetidas à
histerectomia, interrogando este ente (mulher), por causa de minhas inquietações
em relação às questões que este Ser demanda, preocupada com a sua
singularidade, e em busca do sentido do seu comportamento no cotidiano após a
histerectomia.
4.2.1 Cenário de acesso às depoentes
Esta pesquisa foi desenvolvida com mulheres que se submeteram à
histerectomia no Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora –
MG ( HU-UFJF) e por ser este tema emergente da minha prática profissional e onde
surgiram as minhas inquietações. Estas mulheres foram internadas na Unidade de
Ginecologia deste hospital. Sendo assim, o projeto de pesquisa foi apreciado pelo
Chefe do Serviço de Ginecologia (Anexo I) e pelo Diretor Geral do HU-UFJF (Anexo
II) que autorizaram o seu desenvolvimento.
Após este consentimento, tornou-se necessária uma revisão para o
encaminhamento ao Comitê de Ética da Universidade Federal de Juiz de Fora,
devido às suas exigências (máximo de sete páginas em folha A4 e letra Arial 11,
orçamento e cronograma à parte). Também os demais impressos, atendendo às
solicitações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, do Conselho Nacional de
Saúde do Ministério da Saúde. Sendo, então, entregue ao Comitê em 04/04/06
(Anexo III), e aprovado em 22/06/06 e somente comunicado o deferimento em
27/07/06, conforme Parecer nº 055/2006 (Anexo IV).
O HU da UFJF está localizado na rua Catulo Breviglieri, s/n no bairro Santa
Catarina, Juiz de Fora, Minas Gerais. Está voltado para o ensino de futuros
profissionais e para o desenvolvimento de pesquisas, oferecendo campo de estágio
e prática para alunos dos Cursos de Graduação da UFJF nas áreas de Enfermagem,
Medicina, Farmácia e Bioquímica, Serviço Social, Psicologia, Fisioterapia e,
eventualmente Odontologia. Também, desenvolve cursos de Pós-Graduação lato e
Stricto Sensu (Especialização, Residência e Mestrado).
4.2.2 As depoentes
Os sujeitos desta pesquisa foram as mulheres submetidas à histerectomia, no
ano de 2005 e nos meses de janeiro a julho de 2006. Para tal, realizei um
levantamento no Livro de Registros de Cirurgia, do Centro Cirúrgico do HU, das
histerectomias realizadas no período proposto para o estudo, onde identifiquei o
nome e o número de registro de seus prontuários. Em seguida, pesquisei e consegui
no Serviço de Arquivo Médico (SAME) do referido hospital, uma ficha contendo o
endereço dessas mulheres (Anexo V).
De posse da ficha-cadastro, do ano 2005, comecei a fazer contatos para o
agendamento dos encontros. Inicialmente, na perspectiva de localizar a mulher e
certificar o seu endereço, fiz várias tentativas através de ligações telefônicas. Como
não obtive sucesso, ia ao endereço e também não conseguia. Ocorreu que elas
mudaram de telefone ou de residência e não atualizaram as fichas de cadastro no
hospital.
Diante desse impasse, refiz a trajetória, voltando ao Livro de Registro do
Centro Cirúrgico e ao SAME, fazendo o levantamento das mulheres submetidas à
histerectomia no ano de 2006, de janeiro a julho.
Nesta relação, encontrei 25 mulheres neste período, sendo que, 05 não
residiam em Juiz de Fora. São de cidades vizinhas e, por isso, optei por não incluílas na pesquisa, considerando a possibilidade de realizar as entrevistas nos seus
domicílios.
Para as demais, fiz contato por telefone para agendamento dos encontros
em suas residências. Quando isso não foi possível, por mudança de número de
telefone ou de residência, ia até a residência registrada na ficha e procurava com os
vizinhos o novo endereço, numa tentativa de encontrá-las, mesmo que esta visita
ocorresse sem o agendamento prévio. Em alguns casos, foi bastante difícil esta
localização, mas com empenho, consegui encontrá-las e promover o encontro
fenomenológico inerente à entrevista empática e colher/ouvir seus depoimentos.
Percorri bairros da cidade, onde nem sabia sua localização e que nunca tinha
estado antes, bem como locais de risco por ser a área de tráfico de drogas. Em
determinado momento, senti-me vigiada ao percorrer as ruas, mas ao mesmo tempo
uma sensação de proteção. Tais encontros ocorreram à tarde, noitinha e noite, de
acordo com a disponibilidade das mulheres e o agendamento prévio. Em algumas
vezes precisei contar com apoio logístico para acesso ao local, devido à
periculosidade do mesmo. Em certos bairros foi também difícil o acesso mesmo de
carro, sendo necessário uma pequena caminhada.
Para realizar as entrevistas, após uma explanação acerca deste trabalho e
sua importância, com a anuência dessas mulheres, elas foram convidadas a serem
sujeitos desta pesquisa que teve, do ponto de vista operacional, as seguintes
questões norteadoras: Como tem sido para você este período após a realização da
histerectomia? Como está sendo o seu dia-a-dia? Como você está se sentindo?
A entrevista aberta foi pautada na metodologia da pesquisa referendada em
Carvalho (1991), por ser uma maneira de o pesquisador adentrar na verdade
mesma, seja ela qual for, sem falseamento ou deslize, sem preconceito ou
impostura. Além disso, tentei estabelecer uma relação empática, com o intuito de
estar num clima descontraído e possibilitador de um diálogo, tal como o preconizado
por essa autora.
Durante os depoimentos, observei, também, o não verbal, expresso em
gestos
ou
outras
manifestações.
Estas
observações,
fui,
posteriormente,
registrando-as em diário de campo. Tão logo saía da casa, em outra rua próxima, já
fazia o registro, sendo este manuscrito no verso da folha de registro do SAME. Pois
como recomenda Minayo (2006), este é essencial no desenvolvimento de uma
pesquisa qualitativa, visto que esta observação é um complemento que se soma de
forma enriquecedora à pesquisa e que permite a percepção direta sem interferência
exterior.
Os depoimentos de 25 mulheres, 5 operadas em 2005 e 20 em 2006, foram
ouvidos e gravados em fita magnética, sendo transcritos por mim mesma, no mesmo
dia, a fim de se manter a fidedignidade dos discursos.
Antes de proceder à coleta dos depoimentos, foi explicado a cada uma das
mulheres participantes a pretensão de se desenvolver um trabalho com elas sem,
contudo, dizer-lhes o conteúdo da entrevista. Foi, também, oferecida plena liberdade
de participação ou recusa e solicitado que assinassem o termo de autorização para
o registro de seus depoimentos, garantindo-lhes sigilo e anonimato, para proteção
da sua privacidade. Tal procedimento visou atender à Resolução n.196/96 do
Conselho Nacional de Saúde (1996), que dispõe sobre pesquisa envolvendo seres
humanos e recomenda ”Termo de consentimento livre e esclarecido” (Anexo VI).
Quadro de Encontros
Identif
.
E1
E2
E3
E4
E7
E23
E24
E8
E16
E5
E22
E12
E9
E25
E11
E14
E13
Idade Est.
Civil
50
Cas.
46
Cas.
47
Solt
54
cas
63
viú
45
solt
66
cas
67
viu
30
solt
31
cas
44
cas
38
cas
39
cas
50
solt
38
solt
77
viú
47
solt
Data da Tempo Data do Profissão
Histerec Realiz. Encontro
14/02/05
19 m 04/09/06 do lar
20/01/05
20 m 05/09/06 costur
03/03/05
18 m 27/09/06 Aposent.
29/03/05
18 m 03/10/06 do lar
16/04/05
19 m 14/11/06 do lar
12/01/06
11 m 29/12/06 domest
13/01/06
11 m 30/12/06 do lar
16/01/06
10 m 15/11/06 do lar
21/01/06
11 m 05/12/06 vended
06/02/06
10 m 14/11/06 Prof.
16/02/06
10 m 29/12/06 do lar
20/02/06
9 m 22/11/06 costur.
21/02/06
9 m 16/11/06 do lar
07/03/06
9 m 30/12/06 At. Enf
09/03/06
8 m 16/11/06 caixa
13/03/06
9 m 01/12/06 do lar
14/03/06
8 m 23/11/06 domést
Endereço
Benfica
N. Era
Araújo
Industrial
Centro
N. Benfica
Sta Clara
Sta Luzia
Progresso
S.Terezinha
Parq.Torre
J Natal 7
J Natal 6
S. Antonio
Sta Rita C1
Cid. Sol
S. Mateus
E17
E18
E21
E19
E20
E10
E15
E6
34
40
39
47
63
74
51
41
cas
solt
solt
cas
viú
solt
solt
viú
16/03/06
20/03/06
20/04/06
08/05/06
15/05/06
25/05/06
03/07/06
13/07/06
9m
9m
9m
8m
8m
6m
5m
4m
05/12/06
27/12/06
28/12/06
27/12/06
28/12/06
16/11/06
04/12/06
14/11/06
manicur
domest
costur
do lar
do lar
diarista
domest
ger. com.
Granbery
N S Aparec
Vila Ideal
Borboleta
V. O. Costa
Sta Rita C2
V. Braga
Centro
Esses encontros e entrevistas, agendados, ocorreram no mínimo quatro
meses após a histerectomia. Desvencilhando-me das amarras do tecnicismo, da
técnica provocadora, do modelo biomédico, que determinam o pós-operatório
mediato, imediato e tardio, fui ao encontro dessas mulheres num período de tempo,
variável de meses após a histerectomia, constituindo o tempo fenomenológico, que
expressa o cotidiano delas. Então, conheci as mulheres, estabeleci uma relação
empática e ouvi seus depoimentos, sobre sua condição cirúrgica e o seu cotidiano
no após a histerectomia, sem interferência dos familiares pois foram em suas salas
isoladas ou até em seu quarto de dormir.
Nos encontros realizados, de forma amistosa e com as questões norteadoras,
anteriormente descritas e feitas de forma aberta, em uma linguagem compreensível
para as mulheres, intencionalmente deixei-as que falassem livremente do fenômeno
vivenciado, cujo significado se encontra na própria experiência de vida.
Ao terminar cada depoimento, este foi transcrito, ouvido, lido e relido tantas
vezes se fizeram necessários, buscando a fidelidade à linguagem da mulher
entrevistada, de forma a garantir o fiel pensamento e expressão dela. Também,
nesse momento, estive utilizando meu “diário de campo” onde foram anotadas as
expressões
não-verbais
durante
o
encontro,
que
Heidegger
chama
de
comportamento, tendo em vista que este poderia ser um suporte para a análise
compreensiva.
A análise dos dados ocorreu concomitante à coleta dos depoimentos. Após a
descrição
do
fenômeno
vivido
pelas
entrevistadas,
foram
destacadas
as
significações constituindo-se então a compreensão vaga e mediana sendo este o
primeiro momento metódico em Heidegger. Surgiu, assim, a compreensão do ser –
fio condutor da compreensão interpretativa que é o segundo momento metódico
desenvolvido sustentado no referencial metodológico. Os estudos de Camargo e
Souza (2002), bem como de Pinheiro (2003, p.106), reportam a esses dois
momentos como sendo o primeiro para explicitação do fato, onde o ente se mostra
na maioria das vezes para todos, e, o segundo momento como o desvelar do ser ou
fenômeno, no qual precisamos “construir o fato para trazê-lo à luz”.
“ Quem não compreende um olhar,
tão pouco compreenderá uma longa explicação”
Mário Quintana
V . ANÁLISE COMPREENSIVA
5.1 Os significados e as estruturas essenciais
Para desenvolver esta etapa percorri um árduo caminho, rico de momentos
singulares. De início, tive em alguns momentos, muitas dificuldades pelas minhas
próprias inquietações e preconceitos. Foi necessário, em algumas ocasiões, um
esforço de concentração para não me desviar do objetivo proposto no estudo, pois
que a cada vez que lia os depoimentos das mulheres, percebia o quanto a
entrevista fenomenológica, também denominada de encontro, foi peculiar. A
dificuldade para desenvolver a análise e, na busca dos significados, encontrava
explicações para os fatos, o que tornava difícil chegar ao contexto da compreensão.
Nessa convivência com as mulheres depoentes, muitas vezes a minha própria
condição de mulher, profissional, dona-de-casa, mãe e esposa, trazia à tona a minha
existência humana de ser de possibilidades e com essa a condição eventual de ter
que um dia submeter-me à histerectomia e de também ter o meu cotidiano
modificado/alterado.
Mas, encontrar-me com essas mulheres após a histerectomia, ouvi-las em
seus depoimentos foi gratificante. Estar com elas em suas residências, conhecê-las
em seu modo de ser, fez com que me aproximasse de uma outra realidade. Através
de visitas domiciliares, pude identificar fatos sociais e econômicos, me aproximar do
factual, bem como, da subjetividade à procura do vivido de cada uma. Tendo como
objetivo fui “às coisa mesmas” para desvelar o fenômeno contemplado nos
significados de quem o vivenciou.
Para realização da etapa de campo tornou-se necessária uma aproximação,
uma conversa empática para que as mulheres se expressassem com liberdade, com
objetividade e subjetividade. Portanto, fui aos poucos me ambientando ao lar da
depoente para ouvi-la. Por isso, a nossa conversa se iniciava com a conferência do
registro dos dados fornecidos pela folha do SAME e depois eu introduzia as
questões norteadoras da entrevista: Como tem sido este período após a
histerectomia? Como está sendo o seu dia-a-dia? Como está se sentindo? Estas
eram feitas de uma só vez e gravadas. Então, ela começava a falar de sua doença,
do seu momento anterior à histerectomia e depois do seu momento atual. Nossa
conversa era mais duradoura e enfática, no momento da gravação, as mulheres
foram mais sucintas e pouco falavam. O fato de gravar não as deixava confortável.
Após a transcrição de cada um dos depoimentos, iniciava-se o primeiro
momento da análise compreensiva tratada como vaga e mediana, visto que esta
medianidade aponta para o sentido que será desvelado na hermenêutica
(HEIDEGGER, 1999).
Neste movimento de análise compreensiva, precisei realizar várias leituras
dos depoimentos e por diversas vezes acompanhadas de consulta ao diário de
campo, para uma melhor aproximação ao “quem” das depoentes. Pois, segundo
Heidegger (1999), o quem responde a partir de um mesmo, do “sujeito” do próprio.
E, essas mulheres são ser-no-mundo e ser-com e, neste modo de ser, funda-se o
modo cotidiano em que estão (HEIDEGGER, 1999).
Contudo, no cotidiano, a pre-sença pode não ser ela mesma podendo perderse em si própria. Considerando Heidegger (1999, p. 39), ”no modo de assumir-se ou
perder-se, a existência só se decide a partir de cada pré-sença em si mesma”.
Mergulhei novamente na leitura dos depoimentos e, através destes, no primeiro
registro dos significados expressos e apreendidos, reconhecendo que em Heidegger
(1999, p.30), “toda procura retira do procurado sua direção prévia”. Tais significados
apreendidos são os fatos que nos permitem alcançar posteriormente a compreensão
mediana do ser, entendendo em Heidegger (1999, p.32), que “O procurado no
questionamento do ser não é algo inteiramente desconhecido, embora seja, de
início, algo completamente inapreensível”. Também pude apreender que somos
entes, sendo ente tudo de que falamos, entendemos e como nos comportamos.
Portanto, só depois de se apropriar dessa compreensão mediana, é que se pode
chegar a um fio condutor para a hermenêutica; pois segundo Heidegger (1999,
p.56), “apreender o ser dos entes e explicar o próprio ser é tarefa da ontologia”.
Na análise da pre-sença o primeiro desafio é a questão do ser. Portanto,
segundo Heidegger (1999, p. 44), “nem sempre se deve impor à pre-sença
categorias delineadas”. por aquela idéia primeira. Para se conhecer esse Ser que é
pre-sença é preciso voltar a considerar os depoimentos, pois é ali no conteúdo das
entrevistas que estão os significados.
Assim, compreendi que teria que reduzir os meus pressupostos, pois senão
eu estaria aplicando uma idéia prévia, ou seja, uma categoria prévia, por mim
colocada, que seria minha, como por exemplo: que no cotidiano da mulher após à
histerectomia ela tenha dificuldades no relacionamento sexual. Esta era uma
pressuposição inicial minha, calcada na tradição de que evidentemente, ela fez uma
cirurgia abdominal na qual foi realizada a retirada do útero, que anatomicamente
está ligado à vagina através do colo e que a relação sexual será uma atividade a ser
postergada, a ser enfrentada. Evidentemente pressupõe-se que esta categoria
deveria existir porque, HEIDEGGER (1999, p.49), “a tradição assim predominante
tende a tornar tão pouco acessível o que ela ‘lega’ que, na maioria das vezes e em
primeira aproximação, o encobre e esconde”.
Ao reduzir este pressuposto que segundo Heidegger (1999, p. 44), “nem se
deve impor a pre-sença categorias delineadas”, ou seja, a idéia que temos da
dificuldade no relacionamento sexual em decorrência da histerectomia, pude
considerar o vivido da mulher que foi histerectomizada e, através dos significados,
compreender o cotidiano de sua situação após essa cirurgia em relação à
sexualidade.
A partir do ente e pensando acerca do ser, percebi como a mulher se mostrou
em si mesma e por si. Pois segundo Heidegger (1999, p.77), “ é o ente que temos a
tarefa de analisar”, considerando que este ente se comporta como seu ser. Mantive
nas transcrições as expressões como foram ditas pelas mulheres, ou seja, como
elas falaram e se expressaram com seus erros de linguagem, porque isto me reporta
a elas, a quem são estas mulheres.
Portanto é o modo em que eu as encontro, embora eu as tenha codificado
num quadro, para a minha análise, o nome e falas que remetem a elas. A
modalidade de acesso, então, mostra a pre-sença em sua cotidianidade mediana, tal
como ela, Heidegger (1999), “é antes de tudo e na maioria das vezes”. Da
cotidianidade expressa nas falas, nos depoimentos, procurei as estruturas
essenciais e não as ocasionais.
Uma dificuldade para o pesquisador nesta abordagem é, sem dúvida, registrar
como desenvolveu a análise em sua pesquisa, ou seja, redigir seus passos,
detalhando como é que se deu a distinção das estruturas e como as definiu. E, eu
me proponho nessa etapa, baseada em Heidegger (1999), a expressar como isto foi
feito, ou seja, como extrair dos depoimentos os significados referentes às estruturas
essenciais deixando à parte as estruturas ocasionais ou acidentais.
Por isso foi que ouvi tais depoimentos várias vezes para captar neles as falas
que expressassem algo que no vivido, ela explicita como diretamente ligado a ter
feito a histerectomia. É ela, a mulher que se submeteu a histerectomia, que faz esta
significação e isto é o que é essencial. O que na fala parece não estar tão próximo à
histerectomia, são questões ocasionais. Se são questões ocasionais/acidentais ou
essenciais ainda é um pressuposto. Mas é a mulher que no seu vivido aponta o que
é essencial.
Portanto, só depois de atentamente ouvi-la, acompanhar uma mudança em
seu corpo (postura), uma fala mais baixa, um gesto é que captamos sua expressão.
Esta expressão, que nem sempre é oral, mas que é gestual, e portanto existencial,
só é captada a cada vez que se lê os depoimentos, de cada uma das entrevistadas
por várias vezes. Pude perceber, então, que as mulheres depoentes deste estudo,
fizeram esse movimento quando a fala tinha uma ligação, um vivido forte ligado
exatamente à histerectomia.
A captação da expressividade do significado é mediada pela empatia, que
marca o encontro entre o pesquisador e o sujeito pesquisado (CARVALHO, 1991). É
mediante a empatia, quando se está aberta para ouvi-las, é que se apreende aquilo
que foi mais significativo, e a própria mulher lhe faz esta indicação. Mas, caso esteja
formalmente fazendo uma entrevista burocrática, nem olhando para ela, nem atenta
a ela, não se consegue captar este movimento, pois não ocorrerá a mediação da
empatia. Como eu busquei estar aberta para uma relação de empatia, durante a
realização das entrevistas, desenvolvidas em seus lares, no seu ambiente do
cotidiano, penso que foi possível captar esse movimento nas mulheres. Mesmo com
a última entrevistada que optou pelo encontro em seu ambiente de trabalho, foi
possível captar o seu movimento.
Então, para Heidegger (1999), o que se está buscando como estrutura
essencial tem que considerar o acidental e valorizar o que está ligado à significação.
Heidegger (1999, p. 44), expõe que: “essenciais são as estruturas que se mantêm
ontologicamente determinantes em todo modo de ser de fato da pre-sença”.
Portanto, está na palavra “ontologicamente” a concepção que clareia o que não está
na dimensão do fato, mas sim, na dimensão do fenômeno. A dimensão ôntica é
factual e a ontológica é fenomenal. Em Heidegger,
a pre-sença possui um primado múltiplo frente a todos os outros
entes: o primeiro é um primado ôntico: a pre-sença é um ente
determinado em seu ser pela existência. O segundo é um primado
ontológico: com base em sua determinação da existência, a presença é em si mesma ontológica” (1999, p.40).
Por isso, neste estudo, quando a mulher se expressa com esse conjunto de
manifestações: na fala, na expressão do olhar, no movimento do corpo, no sorriso,
numa ênfase (fala mais baixa ou mais alta), é que ela diz do seu todo. Então,
algumas vezes ela fala e não tem essa expressão durante a entrevista e em outras é
possível captar essa expressão que é dela, nesse ser dela que é singular, tendo ela
a expressão do vivido do fenômeno do seu cotidiano após a histerectomia.
Foi assim, que consegui captar, na singularidade de cada uma daquelas
mulheres, as estruturas existenciais que podem ser determinantes e que emergem
da distinção do ôntico e ontológico. Sendo assim, Heidegger (1999, p.34), coloca
que: “O privilégio da questão do ser, porém, só se esclarecerá completamente se o
questionamento definir, de modo suficiente, sua função, seu propósito e seus
motivos”. E a respeito do ontológico que: “a essência da pré-sença está em sua
existência” (1999, p.77). Pode-se, então seguindo o pensamento de Heidegger (
1999, p. 79), entender que a pre-sença determina como o ente é e compreender o
seu ser, pois segundo ele “este é o sentido formal da constituição existencial da présença”. E, então, para compreender a problemática do seu ser tem que se partir de
sua existencialidade. Pois, segundo Heidegger (1999, p.79), “o que, onticamente, é
conhecido e constitui o mais próximo, é, ontologicamente, o mais distante”. Portanto
penso que, segundo Heidegger (1999), a expressão ôntico se refere a todos os
seres humanos e ontológico, ao ser do humano.
A seguir trago o depoimento da entrevista número 12, ou seja, E12 para
ilustrar o desenvolvimento do meu pensar. Realizei a transcrição de todos os
depoimentos, sem fazer parágrafos, pois não apreendi nas falas das mulheres algo
que pontuasse os discursos.
Entrevista 12 - 20/02/06
Fiz uma cirurgia pra tirá um cisto no ovário, mas depois de 3 meses já
comecei a sentir sintomas de dores, sangramento. Aí, depois, comecei a fazê
tratamento com injeção na barriga, mas nada disso parava de vim minha
menstruação. Todo dia vinha, pouco, mas vinha. Comecei a faze tratamento na
clínica, os médicos olhavam e tudo. Fiz exames que constatou um cisto novamente
e já grande, e já com outros... que aparecendo lá na ultra-som. Comecei a fazê
tratamento pra podê vê se melhorava a dor, nada tava melhorando. Eu tomava
medicamento e nada passava a dor. Eu aí, voltava lá e tudo. Aí, que eles viram que
eu tinha que sofrê cirurgia novamente. Aí eu falei: de novo! No mesmo lugar? Eu
num tava acreditando, eu ainda falei com a dotora na hora: Puxa vida, novamente! E
ela falo: É, novamente, vamos ter que fazer nova cirurgia, por que voltou o seu
problema. Mas por que não tiraram o útero naquela época se já tinha constatado a
endometriose, devido ao exame que caro já tinha feito, né, exame que faz quando a
gente opera, que leva para Belo Horizonte e tinha dado endometriose. Qué dizê que
continuá tendo a menstruação, por que mesmo depois de operação só dava isso. E
começou novamente aquela agonia de fazê exame e tudo, e se preparando para a
cirurgia. Foi aí que acabo teno que fazê mesmo a cirurgia, preparo e tudo, sendo
que fez e não tirou tudo, tirou o útero, mas ficou o colo do útero, porque no momento
não pôde ser retirado devido à endometriose que adere, né, que cola nos órgão e a
dotôra na época falô que acho melhor não tirar o colo, porque ele estava colado na
bexiga, porque naquele momento se ele fôsse tirado podia ofendê a bexiga e então
dá problema na bexiga. Então a dotôra veio conversá comigo... e que foi muito bem
a cirurgia, só que não tirô tudo não e que eu fiquei com o colo do útero. Aí eu falei:
Pôxa, ainda fiquei com o colo? (risos). Fiquei até um pouco desanimada de novo,
pois puxa-vida, aí ela pegou e disse: Fica tranqüila, pois o que tinha que sê feito foi
feito, não adianta você achá que tinha que tirá, você não podia. Fui pro quarto e foi
tudo bem. Voltei, por que no caso, eu já tinha passado por anestesia geral e agora
foi peri-dural, eu se senti melhor. Fui muito bem acolhida, não tenho nada a reclamar
das enfermeiras e só a elogiá, por que o atendimento que eu tive, melhor não podia
ser. A gente até aprende, acaba aprendendo com as estudantes. Fiz tudo que me
mandaram direitinho, aí eu vimbora pra casa. É claro que a gente fica um pouco
desanimada, puxa-vida, será que ainda vô tê que passá por isso novamente, mas aí
continuo sentindo dor, é claro que dor a gente sente, que vai melhorando a cada dia
que passa, mas aí tem que cicatrizá. Fico purgando e tal, mas no dia de í lá pra olha,
na minha primeira consulta, aí a dotora... que era pra passá uma pomada, para
solucioná e aí melhorou. Depois, já fui lá umas duas vezes e estou com uma vida
normal. Na lida. Só que de dois meses pra cá, estou com problema de pressão que
está alterando, minhas perna inchano e a minha barriga as vezes parece com um...
tipo contração... muitas câimbra na barriga, mas estou indo ao médico, tomando
remédio e tudo, clínico geral aqui do Posto de Saúde. Mas eu tenho que fazê retorno
pra averiguá. Quando eu cheguei em casa num dava pra fazê nada. Mamãe que
fazia comida pra mim, as meninas arrumava a casa e a roupa o marido ajudava. E
foi tipo assim, eu fui devagarzinho voltando a fazê as coisas, como de fato é difícil
né. Por que é como um resguardo, como que ganha uma criança, não dá mesmo, a
gente sente dores e não que também fazê esforço, eu sei que não é a mesma coisa.
Que a gente depois que opera não pode carregá peso mais. Tem que evitar muita
coisa, por que por fora é uma coisa, mas por dentro tá cicatrizando. O
relacionamento com o marido é normal, normal, vida normal não tem nada a
reclamar. Sexo normal, não tem nada diferente, é tudo normal... relação sexual
tranqüilo, tudo normal. Ele tava doido pra cirurgia, devido ao meu sofrimento, de vê
tanta dor e sangramento.
Entrevista 12 – 20/02/06
Fiz uma cirurgia pra tirá um cisto no ovário, mas depois de 3 meses já comecei a
sentir sintomas de dores, sangramento1. Aí, depois, comecei a fazê tratamento com
injeção na barriga, mas nada disso parava de vim minha 2menstruação. Todo dia
vinha, pouco, mas vinha. Comecei a faze tratamento na clínica, os médicos olhavam
e tudo. Fiz exames que constatou um cisto novamente e já grande, e já com outros...
que aparecendo lá na ultra-som. Comecei a fazê tratamento pra podê vê se
melhorava a dor, nada tava melhorando. Eu tomava medicamento e nada passava a
dor. Eu aí, voltava lá e tudo. Aí, que eles viram que eu tinha que sofrê cirurgia
novamente.2 Aí eu falei: de novo! No mesmo lugar? Eu num tava acreditando, eu
ainda falei com a dotora na hora: Puxa vida, novamente! E ela falo: É, novamente,
vamos ter que fazer nova cirurgia, por que voltou o seu problema. Mas por que não
tiraram o útero naquela época se já tinha constatado a endometriose, devido ao
exame que caro já tinha feito, né, exame que faz quando a gente opera, que leva
para Belo Horizonte e tinha dado endometriose. Qué dizê que continuá tendo a
menstruação, por que mesmo depois de operação só dava isso. E começou
1
Sublinhado em azul estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 1
novamente aquela agonia de fazê exame e tudo, e se preparando para a cirurgia.
Foi aí que acabo teno que fazê mesmo a cirurgia, preparo e tudo, sendo que fez e
não tirou tudo, tirou o útero, mas ficou o colo do útero, porque no momento não pôde
ser retirado devido à endometriose que adere, né, que cola nos órgão e a dotôra na
época falô que acho melhor não tirar o colo, porque ele estava colado na bexiga,
porque naquele momento se ele fôsse tirado podia ofendê a bexiga e então dá
problema na bexiga. Então a dotôra veio conversá comigo... e que foi muito bem a
cirurgia, só que não tirô tudo não e que eu fiquei com o colo do útero. Aí eu falei:
Pôxa, ainda fiquei com o colo? (risos). Fiquei até um pouco desanimada de novo,
pois puxa-vida, aí ela pegou e disse: Fica tranqüila, pois o que tinha que sê feito foi
feito, não adianta você achá que tinha que tirá, você não podia. Fui pro quarto e foi
tudo bem. Voltei, por que no caso, eu já tinha passado por anestesia geral e agora
foi peri-dural, eu se senti melhor. Fui muito bem acolhida, não tenho nada a reclamar
das enfermeiras e só a elogiá, por que o atendimento que eu tive, melhor não podia
ser. A gente até aprende, acaba aprendendo com as estudantes. Fiz tudo
que me mandaram direitinho, aí eu vimbora pra casa. É claro que a gente fica um
pouco desanimada, puxa-vida, será que ainda vô tê que passá por isso novamente,
mas aí continuo sentindo dor, é claro que dor a gente sente, que vai melhorando a
cada dia que passa, mas aí tem que cicatrizá.1 Ficô purgando e tal, mas no dia de í
lá pra olhá, na minha primeira consulta, aí a dotora... que era pra passá uma
pomada, para solucioná e aí melhorou. Depois, já fui lá umas duas vezes3 e estou
com uma vida normal. 1 Na lida. Só que de dois meses pra cá, estou com problema
de pressão que está alterando, minhas perna inchano e a minha barriga as vezes
parece com um... tipo contração... muitas câimbra na barriga, mas estou indo ao
médico, tomando remédio e tudo, clínico geral aqui do Posto de Saúde. Mas eu
tenho que fazê retorno pra averiguá. Quando eu cheguei em casa num dava pra
fazê nada. Mamãe que fazia comida pra mim, as meninas arrumava a casa e a
roupa o marido ajudava.
4
E foi tipo assim, eu fui devagarzinho voltando a fazê as
coisas, como de fato é difícil né. Por que é como um resguardo, como que ganha
uma criança, não dá mesmo, a gente sente dores e não que também fazê esforço,
eu sei que não é a mesma coisa. 5 Que a gente depois que opera não pode carregá
peso mais. Tem que evitar muita coisa, por que por fora é uma coisa, mas por dentro
2
Sublinhado em rosa estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 2
tá cicatrizando. O relacionamento com o marido é normal, normal, vida normal não
tem nada a reclamar. Sexo normal, não tem nada diferente, é tudo normal... relação
sexual tranqüilo, tudo normal.
6
Ele tava doido pra cirurgia, devido ao meu
sofrimento, de vê tanta dor e sangramento.
3
Sublinhado em verde estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 3
Sublinhado em vermelho estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 4
5
Sublinhado em amarelo estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 5
4
6
Sublinhado em cinza estão os significados que posteriormente constituíram a US nº 6
Optei por trazer este depoimento como exemplo, porque ele mostra como foi
a primeira compreensão dos significados expressos pelas depoentes e por ele
contemplar a maioria das estruturas essenciais em relação às Unidades de
Significação. Estas, sobre a forma definitiva de análise estão apresentadas com
suas ilustrações nas próximas páginas.
Continuando o movimento de análise, em seu primeiro momento metódico
que é o da compreensão vaga e mediana, foi elaborada a seguinte relação na qual
como exemplo mantenho a distribuição cromática.
Fio Condutor primeiro
- A situação vivida antes da cirurgia relacionada às diferentes ginecopatias é
lembrada, e, comparada com a situação atual é expressa como normalidade.
- Nas primeiras semanas de pós-operatório houve necessidade de ajuda de familiar,
vizinho, amigos e outros
- Os afazeres domésticos e compromissos de trabalho só foram retomados após um
certo tempo.
- Há relatos de idas e vindas ao ambulatório ou a instituição por intercorrências ou
complicações de pós-operatório além da necessidade de repouso.
- A atividade sexual foi retomada por algumas de maneira melhor, para outras
normal e para algumas não foi possível
- As queixas biológicas do período anterior trouxeram a aceitação da indicação da
cirurgia como solução do problema.
Posteriormente, esta relação foi acrescida de significados oriundos do conteúdo de
outras entrevistas de modo a constituir
Fio Condutor segundo
1 - A situação vivida antes da cirurgia relacionada às diferentes ginecopatias é
lembrada e comparada com a situação atual e expressa como normalidade;
2 - Nas primeiras semanas de pós-operatório houve necessidade de ajuda de
familiares, vizinhos, amigos e outros;
3 - Os afazeres domésticos e compromissos de trabalho só foram retomados após
um certo tempo;
4 - Há relatos de idas e vindas ao ambulatório ou a instituição por intercorrencias e
complicações de pós-operatório além da necessidade de repouso;
5 - A atividade sexual foi retomada por algumas de forma melhor ,para outras normal
e para algumas não foi possível em decorrência da cirurgia;
6 - As queixas biológicas do período anterior a cirurgia trouxeram para a mulher a
aceitação da indicação cirúrgica como solução do problema;
7- Algumas se sentem bem, tudo bem e tudo normal e outras estão
insatisfeitas e têm queixas;
8 - Aceitação da sua situação atual mediante a expressão de normalidade ou
redução do risco de vida
9 - Não houve um planejamento que desse conta da necessidade de ajuda
após a alta hospitalar
10 - No cotidiano valorizam o cuidado de si expresso pela rotina do exame
preventivo ginecológico e do controle do pós-operatório.
Entendo que fiz, dessa forma, uma descrição do movimento de análise nem
sempre
presente
em
outros
estudos
de
enfermagem,
na
abordagem
fenomenológica. Considero que essa descrição pode melhor explicitar com se dá a
apreensão das expressões dessas mulheres em seu vivido após a histerectomia.
Trouxe esse detalhamento do meu movimento de compreensão para explicar
como desenvolvi esta etapa. Então, voltando ao exemplo do depoimento da E12, o
que eu pensava antes sobre o retorno à atividade sexual, após à histerectomia, de
que seria uma dificuldade, era pressuposto. Na análise, esse pressuposto se reduziu
para dar espaço à emergência dos significados que podem apontar a questão do ser
pela essência. O que ficou como estrutura essencial não é a dificuldade da relação
sexual porque se submeteu à histerectomia, porque mexeu no colo do útero, porque
a ciência diz que tem que ficar dias em abstinência sexual, mas sim, no vivido delas,
foi o retorno ao cotidiano da atividade sexual. E, naquele depoimento da E12 a
mulher expressa: “não tem nada diferente”. Inclusive, revendo as Unidades de
Significação destaco que quase a totalidade das depoentes está ilustrando com seus
significados a questão da relação sexual.
Tornou-se necessário reler várias vezes os depoimentos para captar as
estruturas essenciais, sublinhando os significados relativos à histerectomia. Desse
modo fui me aproximando da dimensão existencial, o ser ontologicamente pela pre-
sença. Ainda, encontrei respaldo em Heidegger (1999, p. 56), “apreender o ser dos
entes e explicar o próprio ser é tarefa da ontologia”. Então, nesse movimento
consegui apreender o ser do ente porque fui às estruturas essenciais, que são
aquelas que se mantêm ontologicamente determinantes. No exemplo mostro as
estruturas essenciais em cores e as demais, foram compreendidas como ocasionais.
5. 2 Compreensão vaga e mediana – 1º momento metódico
Creio que ficou explicitado como foram estruturadas as Unidades de
Significação a partir da redução dos pressupostos, de como trabalhei os
depoimentos e de como melhorei o foco da compreensão dos significados para
distinguir estruturas essenciais de estruturas ocasionais/acidentais.
Portanto, através dos depoimentos, pude destacar as estruturas significativas
e agrupá-las em Unidades de Significação. Estas são as expressões do que captei
como significação das mulheres acerca do seu cotidiano após a histerectomia. A
seguir, as Unidades de Significação, apresentadas com as ilustrações que as
constituíram.
5.2.1 Unidades de Significação
Os problemas que determinaram a cirurgia são relembrados
Eu já tava em casa, já tava com o útero pra fora, já pra saí na
vagina. E4
Eu operei porque tinha muito sangramento, depois da última
cesariana e a ligadura. Fiquei até com anemia. Cheguei até a usar
fralda de tanto sangrá.... foi muito bom a cirurgia, digo até que foi
ótimo. Não tenho mais o desconforto do sangue. Daquele cheiro ruim
de mulher e de sangue. E5
Eu já tinha esse sangramento. Ficava de dez a quinze dias com muito
sangramento. Usava DIU e não era ligada. E resultado... eu, quando
eu me vi nessa situação, eu não tinha como, quando fiz consulta,
minha barriga... Mas, assim, tô me sentindo bem é uma coisa que o
conforto que sinto, que aquele cheiro normalmente a mulher tem
nesta parte, diminuiu muito, e não sei se esse cheiro eu tinha por
causa do sangramento e tudo, que até pra fazê higiene ficava mais
difícil. E6
Foi necessário fazer a cirurgia. Eu tive necessidade porque eu corria
risco de vida. E7
Fiz a cirurgia porque tinha endometriose e sentia muita dor, vinte
dias do mês eu sentia muita dor, era uma dor que não sabia o que
era não sentir dor, doía de mais. E9
No posto a médica falou que tinha que operar, discuti com ela
porque fiquei nervosa, mas acabei aceitando a operação. Ela falou
que tinha uma escamação e ia tirar só três centímetros. E10
Fui fazê a cirurgia por que deu problema no útero, e se eu não me
cuidasse..., sangrando muito. E11
Fiz uma cirurgia pra tirá um cisto no ovário, mas depois de 3 meses
já comecei a sentir sintomas de dores, sangramento. Aí, depois,
comecei a fazê tratamento com injeção na barriga, mas nada disso
parava de vim minha menstruação. Todo dia vinha, pouco, mas
vinha. E12
Operei por que minha barriga, assim... tinha quase uns oito quilos,
que eu tinha esse mioma e aí nada dos médicos preocupá em me
operá, aí depois o Dr (...) falou que a senhora não tem condições de
ficar com este mioma. E13
Eu sentia mal, por que isso me incomodava, sabe, por que até minha
bexiga saía pra fora, por isso procurei a doutora.... E14
Eu fiquei sabendo que precisava fazê uma cirurgia ... Eu tinha uma
animia e eu tinha sangramentos, aí descobri que estava com o
bendito do mioma e depois eu tive trombose, entendeu?. E15
Foi bem assim complicado, por que eu nem sabia que ia fazê a
histerectomia. Eu sentí uma dor... assim...na barriga, bem intensa. E16
Desde nova eu sentia muito sofrimento com a menstruação, era
prolongada e aí depois descobriram o mioma, mesmo antes eu sentia
muitas cólicas, dexava de trabalhar de tanta dor. E17
Eu operei por necessidade mesmo, por que eu tava sentindo muita
dor, né, fiz vários exames e o médico falô que eu tinha que operá. Fiz
vários tratamentos, tomei vários remédios. Pois aí não deu certo. Eu
sentia muita dor, não podia sentá. E18
Eu não tava me sentindo muito bem, aí eu fui na ginecologista que
me encaminhô pra cirurgia no Hospital Escola, fui pra lá. E19
Fui operá por que o útero saía pra fora. Foi tudo muito de repente,
coisa de umas semanas. Saía e eu tentava com a mão empurra ele
pra dentro. Daí... eu não conseguia mais. E20
Em 1990 eu tirei um cisto no ovário. Fiquei fazeno tratamento até
2000. ele cresceu novamente (risos), eu tinha problema de intestino
que só funcionava com remédio. Daí foi crescendo a barriga. Eu fiz
uma laparoscopia com o Dr... você conheceu ele? Já até morreu!
Passei a tratá com o DR... que disse que eu tinha que tirá o útero,
pois ele tinha muita aderência e eu trabalhando só sentada, num ia
melhorá nunca. Decidi pela operação, pois era muita dor e
desconforto na barriga. E21
Eu operei por que perdia muito sangue, saía aqueles pedaços de
sangue, aí eu peguei e fui no Pronto Socorro e aí deu anemia
baixíssima. E22
Descobri em 1993 a endometriose. Em maio operei para tirar cisto
de ovário e aí quando abriu já viu que tava com aderência. Aí para
não perfurar o intestino tirou só o ovário esquerdo. Continuou a dor
e o sangramento. Continuei com tratamento, tomando injeção e
mudei umas cinco vezes de anticoncepcional. Foi tentando pra vê se
segurava, mas nada adiantava. Nada valia. Foi aí que ele disse que
tinha que tirar o útero. E23
Eu cumeçei a apresentá o útero pra fora, assim quando ia butá roupa
no varal eu sintia que ele tava saino. Pensava que era a bixiga, pois
dia muito pra mijá. Demorei a prucurá recurso, mais né, fui na
dotora que falô do meu engano e disse que tinha que operá. E24
Com a situação da Ana Maria Braga, na televisão, resolvi também
me cuidar, pois já vinha sangrando muito durante os dias de
menstruação. Era aqueles pedaços de sangue, coágulos enormes,
que chegava a sujar minha roupa. Nos últimos 2 meses antes de
operar eu já nem vinha trabalhar de tanta dor e sangue. E25
A decisão do tratamento é/foi do médico
...já tava com o útero pra fora, já pra saí na vagina. Depois da
consulta arrumei tudo pra internamento, ele falou da internação, fui,
esperei a chamada deles, eles me chamaram. Eu peguei fui e internei.
E1
Eu operei porque tinha muito sangramento, depois da última
cesariana e a ligadura. Fiquei até com anemia. Cheguei até a usar
fralda de tanto sangrar. Tive que esperá acabá a grave na
Universidade e ter vaga e sê chamada. Fiquei internada três dias.E5
Eu já tinha esse sangramento. Ficava de dez a quinze dias com muito
sangramento. Usava DIU e não era ligada. E resultado... eu, quando
eu me vi nessa situação, eu não tinha como, quando fiz consulta,
minha barriga tinha crescido muito, tinha pessoas que achavam até
que eu estava grávida, né. Por que é... por causa do tamanho do
útero, que eu tinha que fazê esta cirurgia, então pensei... meu Deus,
eu tenho que resolver isto logo, tirar isso de uma vez, que bem não
está me fazendo. E está me fazendo mal. E6
Eu tive necessidade porque eu corria risco de vida. Então o médico
disse pra mim: “ Já que a Senhora tem essa idade e não vai criar
mais, no caso da Senhora é aconselhável que a Senhora tire o útero.”
E eu concordei com ele. Eu tinha uma lesão no útero, sabe e não
tinha como... a condição do meu caso, ele disse que era melho que
tirasse, se eu concordava em tirá. Aí eu falei com ele se era para o
meu bem, concordo. E7
...porque tinha endometriose e sentia muita dor, vinte dias do mês eu
sentia muita dor, era uma dor que não sabia o que era não sentir dor,
doía de mais. Fui tratando e o medicamento não estava respondendo.
Eu tratei três anos e não vi melhora nenhum. E9
No posto a médica falou que tinha que operar, discuti com ela porque
fiquei nervosa, mas acabei aceitando a operação. Ela falou que tinha
uma escamação e ia tirar só três centímetros, mas no Palácio da
Saúde, outra médica examinou e falou a mesma coisa”. E10
Fui fazê a cirurgia por que deu problema no útero, e se eu não me
cuidasse... ainda mais que sou portadora de HIV, sangrando muito.
Internei. Operei. Tiraro o útero. E11
Fiz uma cirurgia pra tirá um cisto no ovário, mas depois de 3 meses
já comecei a sentir sintomas de dores, sangramento. Aí, que eles
viram que eu tinha que sofrê cirurgia novamente. E12
Operei por que minha barriga, assim... tinha quase uns oito quilos,
que eu tinha esse mioma e aí nada dos médicos preocupá em me
operá, aí depois o Dr (...) falou que a senhora não tem condições de
ficar com este mioma. E13
...procurei a doutora e ela falou: “você tem que fazer a cirurgia, por
que isso aí não vai adianta trata nem nada. Tem que fazê a cirurgia.”
Aí foi aonde eu internei lá. E14
Eu fiquei sabendo que precisava fazê uma cirurgia, certo. Sabe...
muita burocracia tamem, né. Lá no Hospital, não na minha vida... Eu
tinha uma animia e eu tinha sangramentos, aí descobri que estava
com o bendito do mioma, entendeu? E15
Foi bem assim complicado, por que eu nem sabia que ia fazê a
histerectomia. Eu sentí uma dor... assim... na barriga, bem intensa...
Comecei a fica muito fraca, a tê tonteira e ... pediu internamento com
urgência, e ele viu que eu até podia morrer de choque, entrar em
estado de choque e falecer, aí ele mando í correndo e interna...e fazê
a cirurgia que tevê que sê urgente. E16
Desde nova eu sentia muito sofrimento com a menstruação, era
prolongada e aí depois descobriram o mioma, mesmo antes eu sentia
muitas cólicas. E17
Eu operei por necessidade mesmo, por que eu tava sentindo muita
dor, né, fiz vários exames e o médico falô que eu tinha que operá. Fiz
vários tratamentos, tomei vários remédios. Pois aí não deu certo. Eu
sentia muita dor, não podia senta. E18
Eu não tava me sentindo muito bem, aí eu fui na ginecologista que me
encaminhô pra cirurgia. E19
Fui operá por que o útero saía pra fora. Foi tudo muito de repente,
coisa de umas semanas. Saía e eu tentava com a mão empurra ele pra
dentro. Daí... eu não conseguia mais. E20
Em 1990 eu tirei um cisto no ovário. Fiquei fazeno tratamento até
2000. ele cresceu novamente (risos), eu tinha problema de intestino
que só funcionava com remédio. Daí foi crescendo a barriga. Eu fiz
uma laparoscopia com o Dr... você conheceu ele? Já até morreu!
Passei a tratá com o Dr... que disse que eu tinha que tirá o útero, pois
ele tinha muita aderência e eu trabalhando só sentada, num ia
melhorá nunca. Decidi pela operação, pois era muita dor e
desconforto na barriga. E21
Eu operei por que perdia muito sangue, saía aqueles pedaços de
sangue, aí eu peguei e fui no Pronto Socorro e aí deu anemia
baixíssima. Aí que aconteceu... me mandaram pro Hospital escola e aí
falaram que eu tinha que fazê a cirurgia. Me atenderam rápido, mais
tive que esperá a greve acaba. E22
Descobri em 1993 a endometriose. Em maio operei para tirar cisto de
ovário e aí quando abriu já viu que tava com aderência. Aí para não
perfurar o intestino tirou só o ovário esquerdo. Continuou a dor e o
sangramento. Continuei com tratamento, tomando injeção e mudei
umas cinco vezes de anticoncepcional. Foi tentando pra vê se
segurava, mas nada adiantava. Nada valia. Foi aí que ele disse que
tinha que tirar o útero. E23
Eu cumeçei a apresentá o útero pra fora, assim quando ia butá roupa
no varal eu sintia que ele tava saino. Pensava que era a bixiga, pois
dia muito pra mijá. Demorei a prucurá recurso, mais né, fui na dotora
que falô do meu engano e disse que tinha que operá. E24
Com a situação da Ana Maria Braga, na televisão, resolvi também me
cuidar, pois já vinha sangrando muito durante os dias de
menstruação. Era aqueles pedaços de sangue, coágulos enormes, que
chegava a sujar minha roupa. Nos últimos 2 meses antes de operar
eu já nem vinha trabalhar de tanta dor e sangue. Procurei o Instituto
da Mulher, por que não queria olhar isso aqui, sabe, local de
trabalho, podia não ser bem compreendida... Mas fui encaminhada
praa qui mesmo. E25
A rotina do acompanhamento de saúde é obedecida
...fui na médica do climatério a pouco tempo, fui na consulta aí
perguntei sobre o calor da menopausa, tudo isso. E1
...quando fui fazê o preventivo falou que não vai ter jeito deu tê
contato, que se eu quisé vou ter que fazê nova operação. Mas...
agora arriscar minha vida outra vez. E4
Ainda não fiz o preventivo, mas agora é que ta na ocasião, vou
procurar o HU mesmo pra fazê lá. Vou me cuidar, toda mulher
precisa de se cuidar. E6
...ainda vou de 6 em 6 meses lá, né, por que a gente fica no controle
e essa semana passada mesmo eu tive no HU pra fazê o controle ...
por que nós mulheres devemos nos cuida, né, pode dar problemas
mais tarde. E7
Voltei no hospital, fiz acompanhamento de pós-operatório e
continuo fazendo acompanhamento. Tenho que marcar outro
controle por esses dias. Minha saúde vem complicando. E11
Depois, já fui lá umas duas vezes e estou com uma vida normal. Na
lida. Só que de dois meses pra cá, estou com problema de pressão
que está alterando ... muitas câimbra na barriga, mas estou indo ao
médico... Mas eu tenho que fazê retorno pra averiguá. E12
Já voltei pra fazê controle e coisa e tal, mas aí eu não sentia dor.
Estava tudo bem, só me recomendaram fazê um preventivo. E15
...então depois da pressão que meus pais fizeram comigo aí que
peguei e resolvi trata. E17
Volta no médico porque minha barriga incha um pouco e tem 7 ou 8
meses que eu operei e quero saber se é normal, por que nunca fiz
casaria, entendeu? E18
Da cirurgia tô bem é só a pressão que as veis sobe quando choro e
uma tontura que diz que é labirinnnnnn, como é que fala?
Labirintite. Mas tô cuidano disso, pois Deus não me levô ante dele.
E24
Houve necessidade de ajuda no domicílio
Vim pra casa e minha mãe ficou comigo, daí fiz repouso durante um
mês. E5
... minha irmã ficou comigo na primeira semana... e uma amiga veio
e me ajudou muito. E6
...tenho um filho que mora comigo e ele me ajudou muito, sabe... por
que eu dependia de alguém pra me ajudar. E também várias pessoas
que vinha aqui tudo se prontificava a fazê as coisas. E7
..fui para a casa de minha filha... Depois fui praquela casa, que
devido à construção em cima, até o pedreiro me ajudava. E8
Operei e vim pra casa. Foi bem, meu marido estava de férias na
época, meus filhos já são grandes, tenho uma moça de quinze anos e
um rapaz de vinte e um, cada um colaborou como pôde. E9
Meu menino mais novo, o ..., cozinhava e a ..., minha nora, lavava a
roupa. Depois eu chamei a faxineira uma vez, um dia só e falei que
não precisava mais não. E10
Minha mãe, que mora na frente, foi que me ajudou um pouco. Minha
mãe que me dava comida e tudo... eu ficava aqui e minha menina de
dez anos que também fazia... me ajudava um pouco.E11
Quando eu cheguei em casa num dava pra fazê nada. Mamãe que
fazia comida pra mim, as meninas arrumava a casa e a roupa o
marido ajudava. E12
Minha irmã que mora comigo fazia tudo .E14
...todo mundo ajudô bastante, meu marido e minhas filhas. Eu tenho
duas filhas que foram muito compreensivas, coperativas. Aqui em
casa todo mundo colaborou bastante, meu marido principalmente que
lavava a roupa, arrumava a casa e fazia o almoço, por que as filhas
trabalham e estudam. E15
Fui direto pra casa quando saí do hospital, onde eu morava. Quem
me ajudou foi ele( marido), por que minha mãe ficou muito nervosa...
ele que me ajudava. As crianças também. E16
...depois da cirurgia eu fiquei com meus pais aqui em casa, né,. E17
Cheguei em casa e minha filha que hoje tem 18 anos me ajudo
bastante e, também minha sogra que mora aqui em cima tamem que
ajudou e também toda a família, mesmo tudo em família... Então foi a
família do meu marido, minha cunhada e minha sogra. Todo mundo
cooperou um pouquinh. . E19
Não fiquei sozinha por que minha neta ficava lá comigo e minha nora
fazia as coisas pra mim.. E20
Saí do hospital e vim aqui para casa. minha mãe cuidou de mim com
muito carinho. Fui tratada que nem uma princesinha, não fazia nada..
E21
... repouso e meu marido faz tudo. Ele me ajuda muito. E22
Cheguei em casa e nos primeiros dias nem comida eu fazia. Minha
vizinha é que fazia tudo pra mim. Fiquei bem quietinh.. E23
Saí de lá, do hospital, vim aqui pra casa mermo. Minha filha pagô
uma moça, daqui de perto mermo pra ficá aqui .E24
Saí, fui pra casa. Nos 2 primeiros dias minha mãe cozinhou e depois
fui ensinando minha filha de 24 anos a fazer a comida. A roupa eu
contratei uma lavadeira. E25
O retorno às atividades do lar e de trabalho foi gradativo
Fiquei de repouso.... No meu dia a dia como dona de casa eu faço
tudo tranqüila, não sinto nada, sem problema algum. E1
... mas claro que eu fiquei em cima de uma cama de repouso, né. Aí
com menos de um mês eu já estava andando normal, só fazendo o
serviço de casa, porque serviço mais pesado o médico falou que não
era pra fazer. E depois o tempo foi passando...Eu já tava doida pra
voltar a trabalhar. Antes de vencer o tempo que o médico deu eu já
estava doida pra volta. E2
Começei a levar uma vida normal, fazendo o serviço da casa bem
devagarinho e voltei a trabalhar depois de dois mese. E5
Voltei a trabalha com quarenta dias, necessidade, né. Mas sem
problema, tenho elevador no prédio, o escritório é aqui em frente e
também tem elevador. E6
Não pode fazê as coisas logo, por que pede pra fazê repouso. Acho
que mais de mês, a gente fica sem fazê o serviço de casa, mas com a
graça de Deus eu consegui passar esse pós-operatório. Voltei a vida
normal. E7
Fiquei dez dias de repouso. Fazia alguma coisa, lavava vasilhas pra
ela, mas... varrer e lavar não. Segui vida normal, nunca pare. E8.
Fiquei recuperando e com um mês já tava bem. E com três meses eu
já tava fazendo tudo. Sem problem. E9
... Pois o doutor... falou que eu não podia pegar no pesado, o mais a
gente pode, anda pra não fica muito parada. E10
E foi tipo assim, eu fui devagarzinho voltando a fazê as coisas, como
de fato é difícil né. Por que é como um resguardo, como que ganha
uma criança, não dá mesmo, a gente sente dores e não qué também
fazê esforço, eu sei que não é a mesma coisa. E12
Minha filha ia trabalhá e eu ficava fazeno o que agüentava... até dá
conta de tudo. E13
Aí eu fiquei de repouso, que o médico mandô fica uns quarenta dias,
não podia pega peso nenhum, fazê exercício de varrê casa e num
podia fazê nada disso, então... eu fiz mesmo. Minha irmã que mora
comigo fazia tudo. Fiquei de repozo.... Comecei a faze di tudo.E14
Então devido eu tê que subi e desce minha irmã ficou aqui uns três
meses, sabe, por que ficou difícil e eu não podia abusar também. Mas
agora eu já tô fazeno de tudo. E15
Eu levantava e fazia o almoço. Lavava o arroz e sentava. Ia fazendo
as coisas bem devagar e aos poucos e sentava. A roupa eu dei pra
uma moça vizinha lavar e foi assim, quando tinha que resolver as
coisas na rua eu ia andando bem devagar, mas ia. Parava um pouco
e depois andava. E16
... depois da cirurgia eu fiquei com meus pais aqui em casa, né, eles
me cuidano, só que eu tava procurando emprego no Rio... eu tava
afim de ir pra lá. Mas então eu fiquei aqui alguns dias.E17
Aí foi aquela murrinha, fiquei com medo, a gente fica um pouco
enjoada. Mas, depois de três primeiros dias comecei a fazê arte.
Sabe, foi recomendado não subi escada, mas você sabe, minha casa
tem escada. A mulher depois que faz a cirurgia quer limpar a casa,
quer fazer um monte de coisas, e, faz isso e aquilo, e eu já queria fazê
tudo de uma vez e que eu não podia fazê. Aí trabalhá fora eu voltei 2
meses .E18
Alguma coisinha mais leve logo eu comecei a fazer, pegava ia
fazeno, agora varrer e passar pano estas coisas mais pesadas meu
marido fazia. Até porque ele sempre me ajudo muito. Mas agora já ta
tudo bem, faço tudo.E19
Não cheguei a ficá muito deitada. Fiquei mais era sentada e
levantava um pouquinho, as moças lá falarum pra num ficá só
deitada senão dava num sei o quê! Depois comecei a faze as coisas
devagarinho. Ia fazeno. E20
Também com a mamãe me paparicando não era pra fazê nada
mesmo. Voltei pra trabalho depois de 3 meses de licença e tudo
bem.E21
Fiquei de repouso e meu marido faz tudo.Só não lava a roupa, pois é
máquina que lava. Voltei a trabalhá depois de 3 meses. E22
Cheguei em casa e nos primeiros dias nem comida eu fazia. Fiquei
bem quietinha. Depois comecei aos poucos a fazê as coisa. Até 2
meses eu não varria a casa. Fiz tudo direitinho até interá 3 meses.
Depois fui aos poucos e voltei a trabalhar. E23
De pouqinho e pouquinho fui melhorano e já fui logo cuzinhano e
fazeno uma coisinha aqui e ali, daí cheguei a fazê de tudo. Mais eu
fiz o resgardo dereitinho, sabe. E24
Depois de uma semana voltei a dormir no meu quarto, por que ele
fica em cima e eu evitei subir as escadas logo no princípio... Fiquei
de repouso como recomendado e voltei a trabalhar aqui depois de 4
meses . E25
Ocorreram probleminhas que determinaram idas e vindas ao hospital
...depois de uns dias tive infecção urinária, fui lá de novo, tomei
remédio e aí melhorou, ele deu alta. E1
“uns... cinco dias que eu estava em casa sangrou minha cirurgia, tive
que voltar para o hospital. E2
...falei pra ele que meu marido forçou e num deu. E4
Eu tive um probleminha com alguns pontos na parte mais baixa, que
abriu e daí tive que voltar lá no hospital. E6
Lá, mexeu nos meus pontos e não conseguiu tirá, aí deu problema.
Deu um... como se diz... começou fica... deu um probleminha, aí eu
voltei no HU. E7
...cheguei em casa e aí começou a dá um negócio aqui. E então me
explicaram que operação tem que respirá, aí começou a dá
sangramento, aí eu fui lá e o médico falou que era assim mesmo, que
eu não precisava ficá preocupada não. E10
Eu ainda sinto dor, continuo sentindo dor. Voltei no hospital, fiz
acompanhamento de pós-operatório e continuo fazendo
acompanhamento. E11
...mas aí continuo sentindo dor, é claro que dor a gente sente, que vai
melhorando a cada dia que passa, mas aí tem que cicatrizá. E12
Eu só tô sentino uma dor aqui, na barriga... E15
...só que quando eu saí daqui eu vi um furo na cicatriz e que até deu
febre. E desse furo foram abrindo outros, então fui no médico lá
mesmo onde eu tava trabalhando e ele falou que era rejeição de
ponto. E17
Voltá no médico porque minha barriga incha um pouco e tem 7 ou 8
meses que eu operei e quero saber se é normal, por que nunca fiz
cesária, entendeu? E18
Quando eu cheguei em casa e ainda sentia muita dor. Nossa...até
para ir ao banheiro. E19
Só a barriga do imbigo pra baixo não sinto nada, parece que
congelou. E23
... é só a pressão que as veis sobe. E24
Houve melhora mas ainda há queixas
É tudo bem... estou me sentindo muito bem. Muito bem... muito bem,
não tem nada anormal, tudo normal... , não sinto nada, sem
problema algum. E1
Num tem poblema nenhum. E depois o tempo foi passando, pra mim
a cirurgia em si foi normal. E2
...estou bem, dando conta de tudo. A operação não atrapalhou em
nada. E4
Para mim, foi muito bom a cirurgia, digo até que foi ótimo. E5
E foi tudo muito bem, muito tranqüilo. me incomoda esta coisa da
incisão, está incisão é um ponto que me incomoda, que não me deixa
a vontade. E6
...eu tô bem...depois você volta ao normal, você praticamente quase
que esquece que você fez aquilo ali. E7
Mas depois da cirurgia do útero eu me sinto muito bem. Não tenho
nada graças a Deus, o diagnóstico deu bom. Não tinha ferida e com
a cirurgia foi tudo normal. E8
..“optaram pela histerectomia. Foi a única condição e então
melhorou e não senti mais nada”. E9
...num tenho sentido nada não. E10
Eu ainda sinto dor, continuo sentindo dor. E11
...mas aí continuo sentindo dor, é claro que dor a gente sente, que vai
melhorando a cada dia que passa, mas aí tem que cicatrizá. Ficô
purgando e tal, mas no dia de í lá pra olhá, na minha primeira
consulta, aí a dotora... que era pra passá uma pomada, para
solucioná e aí melhorou. Depois, já fui lá umas duas vezes e estou
com uma vida normal. E12
... a vida continua sem nada diferente. E13
...num senti mais nada. Nada mesmo, foi uma beleza pra mim, uma
coisa muito boa. E14
Mas fora isso...tudo bem, to muito bem Eu só to sintino uma dor aqui,
na barriga, e não sei que dor é essa. E15
Na hora, eu nem liguei pra tirá o útero, pois o que eu queria mesmo
é melhorá e vim pra casa. Depois, eu não sinto diferença de nada
operação . E16
Foi um ano horrível, aí, to nessa. E17
...foi tudo muito bom. E18
Mas agora já ta tudo bem, faço tudo... ta tudo bem, normal. Até pro
sexo melhorou muito. E19
Graças a Deus num sinto nada. E20
Eu estou bem. E21
...foi tudo bem. Tudo tranqüilo. E22
Graças a Deus não tive nada, nem os ponto inflamou. Tudo normal.
Desde que comecei com estes problemas que atrapalhou um pouco,
mas o resto ta tudo bom. E23
Da cirurgia tô bem. E24
Mas felizmente está tudo bem comigo. E25
A atividade sexual foi considerada
Sexo eu não sei. E1
Não tive problema nenhum. Nem na vida sexual E2
...eu falei com ele, você podia, né... ele falou: “você que sabe” Pois
aí no outro dia a noite, ele tentou e nada. Pois aí num deu, pois aí ele
falou: “num vô continuá não por que num está dando. E4
Também voltei a ter sexo tranqüilo... com conforto, pois antes era só
debaixo do chuveiro, em pé. Aí já viu... não era muito bom .E5
Sexualmente estou 100% inativa, né... risos... por causa das
circunstancias e mesmo porque emocionalmente falando eu não to
preparada para me envolver com alguém, por que está muito recente
a morte do meu marido e também por que me incomoda esta coisa da
incisão. E6
na matéria de sexualmente eu num mexo mais, já estava antes,
parada e continuo, sabe. Depois que meu marido morreu eu não me
envolvi com mais ninguém não, sabe. E7
Quanto ao sexo eu não me interesso por sexo. Sou viúva a vinte e
quatro anos. Não tenho namorado e nem pretendo ter, não pretendo
ter mesmo. E8
Pro sexo melhorou muito por que antes eu só sentia dor. Agora nada,
é muito bom, é ótimo. Antes, não tinha nem prazer. E9
Eu não tenho homem a muitos anos, eu fiquei com medo por causa
da AIDS, eles falavam muito dessa coisa de AIDS e esse negócio da
AIDS eu passei a ter medo disso ai. E10
Fiquei seis meses sem ter relações com meu marido, ele está no
CERESP ( presídio), né. Num tem cama, é no chão e agora que voltei
a ter. E11
Sexo normal, não tem nada diferente, é tudo normal... relação sexual
tranqüilo, tudo normal. E12
No momento... é que agora tenho que ficá com o menino. E13
Não tive mais parceiro nenhum depois que meu marido morreu,
nunca tive outro, só ele mesmo. E14
só o relacionamento que muda né, em casa, pro sexo. Eu não tenho
vontade. Eu durmo aqui e ele dorme lá. Ele me procura, mas eu não
tenho vontade. E16
Aí entrei em depressão, num queria cuidar de mais nada, sabe...
ficou horrível Nem tomar sol, nem namorar, transar então... a gente
fica meio esquisita. E17
Relação sexual não tenho. Sinto vontade normal, mas não quero sabe
de homem. E18
Até pro sexo melhorou muito. Aquele desconforto na calcinha até
acabou, pois era um desconforto que a gente tinha, a calcinha
molhava muito, sabe. Melhorou muito. Igual já te falei, eu sentia
envergonhada. E19
Esse negócio de sexo eu num quero nem sabê. Não sinto falta disso
não, entendeu? Meu marido morreu tem 17 anos, arrumei outro que
não deu certo não, então... não quero sabe de ninguém não.E20
Nunca tive namorado e nem sinto falta disso. Alguns rapazes até me
olham, mas não me interesso por eles, pra quê complicar a vid..E21
Tudo normal pra sexo, não faz diferença nenhuma. Tudo tranqüilo.E22
Eu esfriei muito pra relação sexual. O marido cumigo é a mesma
coisa. Eu não sinto vontade mas também não deixo morrer, né.
Sempre compareço quando ele me qué. Desde que comecei com estes
problemas que atrapalhou um pouco, mas o resto ta tudo bom. E23
A gente já num se engraçava fazia tempo, mermo assim antes de
adoecê, ele e eu, era a idade sabe? Mais o quentinho dele me fais
farta. E24
Meus colegas aqui do hospital, alguns que sabem do que passei com
ele, às vezes até dos escândalos que ele vinha fazer aqui,
compreendem por que eu não quis e não quero saber de nada disso.
No início até me recomendavam que eu tinha que sair, conhecer
outros homens, mas depois pararam.... E25
5.2.2 A compreensão das mulheres: o cotidiano após a histerectomia
As mulheres, após histerectomia, ao falarem de seu cotidiano, fazem um
retorno às situações vividas antes da cirurgia. Descrevem os problemas que
vivenciaram, usando particularmente terminologia da área de saúde, falando:
cesariana, útero atrofiado, cisto de ovário, vagina, aderência, endometriose, DIU,
escamação,
mioma,
miomatoses,
trombose,
histerectomia,
laparoscopia,
ginecologista. Então, elas estão repetindo a fala dos profissionais de saúde. Mas, na
expressão do significado delas, revelam que tinham muito sangramento, dores, o
útero exposto ou muito desconforto. Os fatos aconteceram num período de tempo
variado, que se caracteriza como um problema crônico, porque já há algum tempo
estavam nestas situações.
Então o problema que determina a cirurgia é crônico, ligado ao desconforto, à
dor, ao sangramento intenso e que se anuncia como uma ameaça no dizer próprio
dos médicos. Compreenderam que tinham que tirar o útero, que a cirurgia estava
indicada para o caso delas como única solução para o sangramento e a dor.
Algumas consideram que corriam risco de vida antes da cirurgia e, por esse motivo,
se submeteram à histerectomia. Mas hoje se sentem bem, como apontam em seus
relatos: corria risco de vida; muito sangramento; optaram por ela que foi a única
condição.
Expressam medo, preocupação e insegurança devido a seu estado de saúde
e compreendem que acatar a decisão da cirurgia é resolução para seus problemas.
Fazem comparações com sua atual situação após a histerectomia e então,
expressam que está tudo normal em seu dia-a-dia recente, por não apresentarem
mais os problemas anteriores ou, por estes terem diminuído. Para estas mulheres, o
estado de saúde atual está normal e confortável.
As situações e queixas do período anterior à histerectomia, trouxeram para as
mulheres a aceitação da indicação e da decisão médica do procedimento cirúrgico
como solução de seus problemas de saúde. Aceitaram o procedimento proposto
pelo médico porque já haviam feito tratamento medicamentoso e não houve solução
de sua situação. Compreenderam que esse era o recurso possível para a melhoria
de sua saúde, e a decisão do médico sobre o tratamento foi o que prevaleceu.
Compreenderam que tinham o útero para fora, muito sangramento,
endometriose, mioma, cisto de ovário, dor intensa e que com o tratamento clínico
não estavam melhorando. Assim, atenderam, sem questionamentos, ao tratamento
cirúrgico, aceitando a decisão do médico e até, aguardando a disponibilidade de
vaga para internação.
O interesse pelo controle e acompanhamento de saúde emerge nos
depoimentos como que para atender às recomendações das rotinas de pós
histerectomia, bem como no retorno para avaliação; fui à médica do climatério; ainda
vou de 6 em 6 meses; fiz acompanhamento de pós-operatório; já fui lá duas vezes;
voltei para fazer o controle. No cotidiano, valorizam o cuidar de si mesma, expresso
também na rotina do exame preventivo ginecológico: “quando fui fazê o preventivo”.
Algumas mulheres compreendem que necessitam se cuidar: “vou me cuidar, toda
mulher precisa se cuidar; minha saúde vem complicando; resolvi tratar; voltar no
médico porque minha barriga incha um pouco; mas tô cuidano disso”.
Os depoimentos expressam que as mulheres se ocupam em pensar e em
procurar assistência médica com esta finalidade, fazendo consultas e seguindo as
prescrições e recomendações para se manterem em melhor estado de saúde.
Continuam indo ao serviço, cumprindo uma rotina estabelecida pelo médico para
fazer controle. Então elas se cuidam da maneira que lhes é determinada. Algumas
mulheres não expressaram que estejam se cuidando nem após a histerectomia.
As mulheres relembram que, ao saírem do hospital, foram para os seus lares,
a maioria foi para sua própria casa e lá fizeram repouso, não apenas por que tinham
a recomendação de repouso, nas primeiras semanas, mas por que precisaram ser
ajudadas. Sentiram a necessidade de pessoas se encarregando dos afazeres
domésticos, pois tais tarefas estão sob a sua própria responsabilidade como mulher.
Tinham que fazer repouso, ficando quietinha, nem comida fazendo e sem ter
nenhuma obrigação.
O cotidiano de uma casa, que geralmente fica sobre a responsabilidade da
mulher, que é de lavar, passar, cozinhar, arrumar, limpar e que ela não podia fazer.
Tinha que fazer repouso. Então a mulher após a histerectomia, quando chega do
hospital, precisa de ajuda, de repouso, ficar quieta, não fazer esforço, portanto
precisando de ajuda para manter o andamento da casa e dela mesma. Esses
depoimentos revelam que no dia-a-dia a mulher se encarrega dos afazeres
domésticos que estão sob a sua responsabilidade.
Para o desempenho destas atividades, as mulheres submetidas à
histerectomia tiveram que aceitar ou pedir ajuda de outras pessoas, tais como
familiares, vizinhos, amigos e outros, pois elas não podiam fazer certas tarefas. No
período imediatamente posterior à alta, correspondendo à chegada em sua casa ou
a casa de parentes, não se sentiram, em condições de realizar os afazeres que
sempre vinham desempenhando e que são considerados necessários à rotina de
sua casa. Expressam que dependiam de alguém para ajudá-las, até mesmo para a
alimentação.
Elas não dão conta de realizar o que antes realizavam, o que antes
assumiam, precisaram de ajuda para cuidarem delas e de suas casas. Tendo então
necessidade de se relacionar com outras pessoas, familiares ou não familiares,
homens ou mulheres e de diferentes faixas etárias, enfim todas se relacionaram com
algumas pessoas para delas obterem a ajuda necessária no domicílio.
O retorno às atividades do lar e do trabalho foi gradativo e as mulheres
expressaram o quê fizeram, como fizeram e o comportamento que tiveram ao
retornarem aos domicílios. Seguiram as ordens e as recomendações do médico.
Obedeceram fazendo repouso e não fazendo esforço físico como: pegar peso ou
subir escadas. Algumas foram rigorosas nessa obediência, visto que não
cozinharam e nem varreram a casa ou lavaram roupas. Portanto, por algum tempo,
as tarefas domésticas foram executadas por outras pessoas.
Entretanto, foram aos poucos, reassumindo essas tarefas após cumprirem as
exigências de pós-operatório recomendadas pelos médicos. Então começaram por
tarefas consideradas mais leves, como lavar a louça e, pouco a pouco foram
aumentando o desenvolvimento das atividades, fazendo o que agüentavam dar
conta, bem devagar e dentro das condições de resguardo e de sua recuperação.
Portanto, aos poucos assumiram suas atividades com a responsabilidade de
ocupar seus lugares no lar e no trabalho profissional fora de casa, desenvolvendo
todas as tarefas e dando conta dos afazeres diários. Reassumiram sua casa e seu
trabalho conforme sua condição anterior à cirurgia, por considerarem seu papel e
estarem bem. Compreendem que hoje levam uma vida normal por que fizeram tudo
direitinho: o resguardo e o repouso. Daí foi possível, o retorno às atividades do dia-adia após a histerectomia.
Nos primeiros dias após a alta, já no domicílio, algumas mulheres tiveram
problemas após a histerectomia, evidenciado nos significados por elas atribuídos:
infecção urinária, sangramento, dor na barriga, muita dor, problemas nos pontos
(pontos que abriram), febre, barriga inchada, barriga parece que congelou e pressão
que às vezes sobe (pressão alterada). Desses problemas a dor foi a mais
expressada. Após a histerectomia, sentem dor, entretanto não referem a essa dor
como sendo a mesma anterior à cirurgia.
Expressam a dor como uma possibilidade decorrente de terem feito uma
intervenção cirúrgica, como se a dor fosse inerente ao pós-operatório, por ter feito
uma cirurgia. Todos os problemas que as forçaram a retornar ao hospital foram
relacionados à cirurgia. Dentre esses, o que mais se evidenciou foi a dor como um
desconforto na incisão cirúrgica. Procuram o médico mostrando a possibilidade de
que a cirurgia que era para solucionar um grande problema, ainda assim, está
apresentando probleminhas. Então, aqueles que determinaram idas e vindas ao
hospital, são aceitos, pois têm implicação com a cirurgia e não com a retirada do
útero. Portanto eles são reconhecidos como algo que possibilitou a redução do
problema anterior que era ligado ao útero.
Ocorreram, também, outros problemas que as fizeram procurar ajuda,
tiveram que voltar ao médico, retornar à instituição de saúde, foram procurar quem
poderia ajudá-las, confiando que lá encontrariam a solução para as situações
vivenciadas. Após a histerectomia, aconteceram problemas não esperados,
principalmente a dor, que era contínua, e que não aconteceu num tempo
determinado. Mas, também, ocorreu o sangramento. Algumas tiveram problemas
com a cicatrização que, de início foi “um negócio na barriga” e que começou a
sangrar. Para outras, foi um problema com os pontos: abriu um buraco. Também
teve o problema de febre.
Há relatos de idas e vindas ao ambulatório do hospital ou outro serviço de
saúde, para serem examinadas com a finalidade de saber se o que estão sentindo é
normal. Algumas mulheres, mesmo após meses da operação, queixam-se de
problemas que ainda não foram sanados.
Explicitam terem sido orientadas quanto ao espaço de tempo determinado
para o controle pós cirurgia, mas em alguns casos tornou-se necessário o retorno,
antes do tempo previsto, para atendimento a necessidades imediatas. Entendeu-se
que a cirurgia resolveu o problema, mas persistem probleminhas.
As mulheres evidenciam a condição de que estão bem, que está tudo normal,
em seus depoimentos, expressam o estado atual com a fala de que, embora ainda
existam incômodos e dores, está tudo normal: “num tem poblema nenhum; a
operação não atrapalhou em nada, foi muito bom e digo até que foi ótimo; eu to
bem; não senti mais nada; a vida continua sem nada diferente; uma coisa muito boa;
eu não sinto diferença de nada; tá tudo normal; tudo tranqüilo”.
Detalham alguns cuidados ligados à incisão cirúrgica que tiveram que tomar.
Consideram que a cirurgia não atrapalhou em nada, foi tudo bem, não sentem
diferença nenhuma e concluem que foi uma beleza quando comparam com o
período que antecedeu à cirurgia. Expressam que, após a intervenção, é possível
dizer que as coisas melhoraram, que estão confortáveis, tranqüilas e bem, mas
ainda têm algumas queixas: me incomoda essa coisa da incisão; mas aí continuo
sentindo dor; foi um ano horrível. Para outras, a condição de se sentirem normais
após a cirurgia é enfatizada, sentem que estão bem e algumas reforçam que estão
melhores que antes da operação.
As mulheres consideraram a atividade sexual expressando-se acerca do
sexo, da relação sexual: sexo tranqüilo, com conforto, antes era só dor; para outras
mulheres de modo normal: não tive problema nenhum; nada diferente, tranqüilo;
algumas outras expressam que não foi possível esta retomada em decorrência de
problemas após a cirurgia como: “aí não deu, incomoda a incisão; aí entrei em
depressão... a gente fica meio esquisita”.
Após a histerectomia, a atividade sexual se mostrou como inerente ao dia-adia dessas mulheres sendo praticada ou não, portanto, foi considerada. Existe,
então, a possibilidade de acontecer ou não acontecer. Neste cotidiano ela vai desde
não retornar por: não ter apetite, não praticá-la antes, não conseguir ter relações,
medo da AIDS, estar viúva ou dor. A retomada também ocorre porque é normal ter
sexo. Assim, a relação sexual após a histerectomia, pode ser melhor do que antes,
pode ser como antes e ser uma obrigação da mulher.
Elas expressaram uma avaliação de bom, ruim, ou melhor, considerando a
relação sexual como sendo possível no dia-a-dia. Cada uma dessas mulheres tem
uma expressão própria e particular, envolvendo o parceiro ou não para à situação
que se refere à atividade sexual.
5.2.3 Fio condutor da interpretação: o conceito de ser mulher após a
histerectomia
Assim sendo, após a compreensão vaga e mediana foi possível elaborar o
conceito de ser, sendo esse conceito o fio condutor para a hermenêutica por que
Heidegger diz que: “É a partir da claridade do conceito e dos modos de
compreensão explícita nela inerentes que se deverá decidir o que significa essa
compreensão do ser obscura e ainda não esclarecida” (1999, p. 31). Acredito que as
Unidades de Significação, a compreensão Vaga e Mediana das mulheres e o
conceito de ser, possibilitaram compreender o sentido do ser-mulher após a
histerectomia em seu cotidiano.
No primeiro fio condutor, foram aparecendo os significados atribuídos pela
mulher ao seu cotidiano, que se ampliou para o segundo, ratificando estes
significados e ajudando a desvelar o sentido, que numa síntese, foi possível elaborar
o terceiro fio condutor. Foi, então, um movimento de ir e vir que permitiu captar o
que é essencial (ontológico) e excluir o ocasional (ôntico).
Portanto, foi possível compreender, após concluir o primeiro momento
metódico de análise, que no cotidiano da mulher após à histerectomia o fio condutor
expressa que:
-
os problemas que determinam a cirurgia são relembrados;
-
a decisão do tratamento é/foi do médico;
-
a rotina do acompanhamento de saúde é obedecida;
-
houve necessidade de ajuda no domicílio;
-
o retorno às atividades do lar e de trabalho foi gradativo;
-
ocorreram probleminhas que determinaram idas e vindas ao hospital;
-
houve melhoras mas ainda há queixas;
-
a atividade sexual foi considerada.
Acredito que este, em Heidegger, é o conceito do vivido da mulher no
cotidiano após a histerectomia, que sustentará a hermenêutica, que é a
interpretação – segundo momento metódico de análise.
5.3 Compreensão interpretativa - 2º momento metódico
Após o primeiro momento metódico que é a compreensão vaga e mediana, foi
possível apreender, na expressão das mulheres, o significado do cotidiano delas
após a realização da histerectomia. Então, passo ao segundo momento metódico
que é a hermenêutica, que consiste na compreensão interpretativa para o desvelar
do sentido velado na compreensão dessas mulheres. Heidegger (1999, p. 208),
considera que é a partir da expressão das mulheres (das vivências e do vivido) que
“algo se torna compreensível”. E, ainda que (1999, p.31), a “compreensão do ser
vaga e mediana é um fato”, construída pelas unidades de significação, e a
interpretação dessa compreensão é obtida a partir “de um fio condutor com a
elaboração do conceito de ser.
Só após a compreensão vaga e mediana é então possível a hermenêutica,
visto que, a partir da compreensão de quem vivenciou/experienciou o fenômeno é
possível elaborar o conceito de ser para então interpretá-lo.
Então, o conceito de ser, que emerge do vivido da mulher após a
histerectomia, indica um cotidiano no qual os problemas que determinam a cirurgia
são relembrados; a decisão do tratamento é/foi do médico; a rotina do
acompanhamento de saúde é obedecida; houve necessidade de ajuda no domicílio;
o retorno às atividades do lar e de trabalho foi gradativo; ocorreram probleminhas
que determinaram idas e vindas ao hospital; houve melhoras mas ainda há queixas;
a atividade sexual foi considerada.
Pode-se compreender que o clareamento do ser para a interpretação surgiu
nas Unidades de Significados e na compreensão vaga e mediana. Nessas o
conceito passa a expressar o movimento que é o movimento do cotidiano do ser-aímulher após a histerectomia. Desse vivido, já se anunciam as possibilidades
inerentes aos modos próprio de ser no cotidiano. Portanto, a hermenêutica desse
estudo está fundamentada no referencial teórico-filosófico de Martin Heidegger
(1999), conforme proposto no objeto e objetivo dessa pesquisa.
Captando a singularidade do ser dessas mulheres, compreendi que o seu
modo de ser corresponde àquele de ser dos entes no cotidiano, partindo do ente que
se expressou num movimento que é ôntico/ontológico. Tal ente, que segundo
Heidegger (1999, p. 32), “é tudo que falamos, tudo que entendemos, com que nos
comportamos dessa ou daquela maneira, ente é também o que e como nós mesmos
somos. Ser está naquilo que é e como é”. Então, interpretei a compreensão vaga e
mediana, na fala/linguagem e expressões considerando as mulheres, como entes,
dotados do ser da pré-sença que expressaram o cotidiano do seu vivido após a
histerectomia.
Os problemas que determinaram a cirurgia foram relembrados como um
vivido acerca das condições de sangramento e dor relativas ao período préoperatório. Essas condições determinaram a necessidade da histerectomia, como
forma de redução do adoecimento, do risco de ter um problema mais sério, ou seja,
uma complicação maior ou um agravamento. Emerge a ameaça que acompanha a
perda sanguínea. Se já está sangrando, pode sangrar mais e o que mais pode
acontecer com ela é sempre uma interrogação. Dominada por este temor, por esta
ameaça de um agravamento da sua condição, ela aceita a solução cirúrgica como a
melhor, a que vai resolver o seu problema.
No pensar de Heidegger (1999, p. 227), essa aceitação é um modo de ser do
falatório e ao aceitar a cirurgia ela evidencia o modo de ser do falatório que é “um
fenômeno positivo que constitui o modo de ser da compreensão e interpretação da
presença cotidiana”. No cotidiano está-se dominado pelo falatório, pelo que se diz
sobre. No cotidiano, segundo Heidegger (p. 227), “dentro de certos limites e
imediatamente, a pre-sença está entregue à interpretação, na medida em que essa
regula e distribui as possibilidades da compreensão mediana e de sua disposição”.
Por isso está na compreensão mediana, que dominada pelo falatório, que
não é dela, repete o que se falou sobre, reproduzindo a fala dos médicos. Nesta
repetição, entendeu que a cirurgia era uma necessidade. O médico disse para ela,
que era importante fazer a cirurgia e que, esta podia melhorar a situação dela. A
mulher então, repete isso porque a compreensão que assim já se acha inserida no
pronunciamento refere-se tanto à descoberta dos entes
já estabelecida e herdada (que é a herança da fala autoritária do
domínio do conhecimento da medicina, dos médicos) como a cada
compreensão do ser e as possibilidades de horizontes disponíveis
para novas interpretações e novas articulações conceituais“
(HEIDEGGER,1999, p. 227).
A mulher não evidenciou novas interpretações e novas articulações
conceituais. Ela está no modo de ser próprio do cotidiano expresso pelo falatório de
uma autoridade que ela procurou, já considerando esta pessoa, com autoridade para
cuidar dela. Segundo Hühne:
“a tagarelice, que é falatório, mostra o homem como ser falante,
aberto ao diálogo, todavia, indica que no seu modo de se referir às
coisas de modo superficial – sem se apropriar devidamente da
linguagem reveladora do sentido das coisas – se dá uma inadequada
compreensão” (2006, p. 105).
Elas todas disseram que necessitavam da cirurgia não aparecendo uma fala
que, pelo menos, coloque em dúvida essa necessidade, todas as falas dizem dessa
necessidade. Como a mulher compreende de maneira inadequada, ela compreende
junto com a necessidade, a ameaça de, se não operar, pode acontecer o pior. Por
isso que ela mergulha na ameaça e no medo. Torna-se temerosa. O que acontece
no cotidiano, a tagarelice, o falar por falar, tem o poder de encobrir o sentido das
coisas e esconder significados.
Essa necessidade é uma mensagem que não é clara na fala dos médicos,
que esconde o significado, não fica claro, e na fala autoritária deles, se não operar o
que pode acontecer. Isso é o que fica escondido, e como não está claro, é o que é,
uma ameaça. A mensagem aponta: tem que operar, e a mensagem vela, esconde: o
que acontece se não operar?
Aí essa mulher interroga, responde e conversa
consigo mesma: se eu não operar pode acontecer o pior. E o pior é uma ameaça,
algo desconhecido.
A linguagem é reveladora no sentido das coisas e a língua solta palavras
solenes, expressas em: “tem que operá, a única solução para o seu caso é uma
cirurgia, o seu útero já está para fora agora tem que tirar ele”. Hühne (2006, p. 106),
ainda coloca que estamos no mundo e participamos de muitas representações
“entramos numa roda viva...ficamos presentes a tantos atos, espetáculos e falas
ambíguas”. E nos perguntamos: para que serve a linguagem? Para revelar sentidos
ou se perder no falatório, ou até mesmo no mundo da burocracia. Para as mulheres
houve burocracia expressa em: a vaga, o dia da semana, os exames prontos, uma
consulta. Então, Hühne (2006, p. 106), coloca que na tagarelice ocorre “uma
enxurrada de opiniões de quem nem se importa se as proposições ditas são falsas
ou verdadeiras”. Temos que: “a linguagem como fonte inesgotável de significações é
a grande desconhecida”. E, ainda, a autora esclarece que
o falatório fecha o discurso, [bem como] impede as descobertas do
pensar que surge nas relações de intimidade do homem com as
coisas e com o outro... A palavra se tranca e não passa a clareza
das idéias (2006, p. 107),
e que:
para sair desta situação que se limita a brincar com as aparências e
rege os caminhos da vã curiosidade, seria necessário penetrar fundo
no enigma da linguagem e compreender os limites da
existencialidade (2006, p. 107).
Então tornou-se necessária a histerectomia como forma de manutenção da
vida. E, como ser-no-mundo, sabe-se que a pré-sença é temerosa e que o temor
ocorre frente a uma ameaça. Heidegger (1999, p.197), menciona: “todas as
modificações do temor, enquanto possibilidades da disposição apontam para o fato
de que a pré-sença, como ser-no-mundo, é temerosa”. Assim, entendi que esta
ameaça, que se mostra inicialmente por sintomas de dor e sinal de sangramento, é
que leva a mulher a procurar a instituição de saúde, procurar atendimento, procurar
o médico e acreditar que, através do procedimento cirúrgico, vai estar curada. Então,
a cura está na potencialidade do outro, prometida pelo médico. Ela está temerosa.
Ela se sente ameaçada também pelo sangramento. Heidegger coloca que:
na medida em que uma ameaça, em seu “na verdade ainda não, mas
a qualquer momento sim”, subitamente se abate sobre o ser-nomundo da ocupação, o temor se transforma em pavor. Desse modo,
deve-se distinguir na ameaça: a aproximação mais próxima do que
ameaça e o modo de encontro com a aproximação, o súbito” (1999,
p. 197).
Isso posto, para as mulheres o que ameaça é uma coisa conhecida. Porque
dor para uma mulher adulta, que já teve filhos, que menstrua, que já teve relação
sexual e tem vida sexualmente ativa, é algo conhecido. Ela conhece dor e
sangramento, portanto, está na modalidade do temor, chamada pavor. Heidegger
(1999, p. 197), expõe que “o referente do pavor é, de início, algo conhecido e
familiar” e que quando “ameaça possuir caráter não familiar, este temor transformase em horror”. Ele também esclarece que quando o horror e o pavor surgem de
modo súbito, tornam-se terror. Estar com o útero exteriorizado não é familiar, é algo
totalmente desconhecido e súbito, logo este temor passa a ser horror. Então, essas
mulheres vivenciaram no temor o pavor (dor e sangramento), horror (útero para fora)
e o terror (não sabe quando vai sangrar, que é o súbito).
As mulheres, após a histerectomia, fazem um retorno ao cotidiano anterior à
cirurgia, em que descrevem os problemas que as fizeram procurar o médico e,
então, foi possível desvelar o falatório e o temor pelo seu estado de saúde, que não
se caracteriza por um estado agudo, mas que surgiu a partir da ameaça de que ela
tem medo da morte, pois corria até risco de vida, que não mesmo foi bem
explicitado, mas que está no cotidiano. Isso não ocorre num tempo gradativo, foi-se
agravando. Um sangramento que acarretou uma anemia, uma dor que chegou até a
exteriorização do útero. Considera-se também que todos nós temos medo da morte.
Dominada pelo temor a decisão do tratamento é/ou foi do médico. Assim, na
cotidianidade ela não é ela mesma, ela não se assume mesmo. Está lançada na
facticidade, na de-cadência que segundo Heidegger (1999, p. 237), “constitui
justamente um modo especial de ser-no-mundo em que é totalmente absorvido pelo
“mundo” e pela co-pre-sença dos outros no impessoal”. Então ela não chega a
compreender quem ela é, mostra-se na inautenticidade, na impessoalidade.
Nesta impessoalidade ela não assume o cuidar da sua própria saúde, ou até
mesmo, a decisão da cirurgia. Decidem por ela. Hühne (2006, p. 103), expõe que
nessa “situação não se pode deixar de sentir que está diante de uma realidade
que... assombra, sem saber das razões de estar jogado aqui, sem nem poder
enxergar com clareza os acontecimentos do dia-a-dia”. E, Heidegger (1999, p. 179),
coloca que “o impessoal, que não é nada determinado mas que todos são, embora
não como soma, prescreve o modo de ser da cotidianidade” .
A mulher acata a decisão do cirurgião quanto à cirurgia e dia de
internamento. Esta decisão não é a partir de suas queixas, mas sim da vaga, do
cronograma hospitalar, da seriedade do caso. O ser dela não é considerado. A
decisão da cirurgia não implica previamente saber quando ela pode ser operada,
como ela se organiza para a cirurgia, com quem ela conta depois da cirurgia, para
onde irá após, o tipo de trabalho que ela exerce. O que conta para a indicação da
cirurgia é a disponibilidade institucional. E a mulher nem discute, obedece. Torna-se
um objeto, apenas um ente e não é vista e não se vê como ente dotado do ser da
pré-sença. Fica no modo de ser da submissão, acatando a decisão do cirurgião, se
submete ao domínio do manual, como se fosse um instrumento, à disposição da
equipe médica de fazer cirurgia, pois o dia do internamento, dia da cirurgia, a cirurgia
e nem o pós-operatório dependem dela.
Heidegger (1999, p. 237), explicita que “deve-se conceber esse não-ser como
o modo mais próximo de ser da pré-sença em que, na maioria das vezes, ela se
mantém”. O cotidiano nos permite interpretar que ela não é ela própria, dominada
pelo outro, fazendo o que os outros determinam, sendo o que os outros querem. Ela
não discute, não reage, não pensa e não pondera, fica nervosa então obedece,
aceita e cumpre.
Na expressão de Heidegger (1999, p. 179), ”o decisivo é apenas o domínio
dos outros que, sem surpresa, é assumido sem que a pré-sença, enquanto ser-com,
disso se dê conta”. Então, Heidegger (1999, p. 179), coloca ainda que “O impessoal
pertence aos outros e consolida seu poder”. Penso que a mulher nesse momento se
mostra no modo próprio da cotidianidade, ela é ninguém, é todos, ela expressa a
impessoalidade e a inautenticidade. E, como Heidegger (1999, p. 181), explicita que
na cotidianidade “todo mundo é outro e ninguém é si próprio”, essa mulher é outro
para a equipe médica e não ela própria. Assim, é objeto do cuidado médico e de
toda a equipe de saúde. Não é sujeito. Portanto, ela aguarda quando terá uma vaga
e quando a equipe pode. E se chegar o dia e não tiver a vaga ou a cirurgia for
suspensa, ela aceita.
Em sua cotidianidade, a mulher não assume para si o cuidar da própria
saúde, como uma decisão. Ela só procura o socorro porque tem problemas, tem dor,
tem sangramento, o colo uterino e até mesmo o útero está saindo pela vagina e o
sangramento pode ocorrer.
Essa mulher, “de início e na maioria da vezes”, após a histerectomia, ela não
se abre para o modo de ser do ente dotado do ser da pré-sença, ela se mantém no
modo do ente fechando-se para as suas possibilidades, pois ela está na facticidade,
na impessoalidade, na inautenticidade, no falatório, na ambigüidade e na
curiosidade. Isso tudo acontece um pouco antes e no cotidiano após a histerectomia.
Ela se acomoda sob a dependência de outros, não sendo ela própria, porque na
realidade o cotidiano não se inicia após a histerectomia, ele já se expressa num
movimento existencial do antes, durante e após a cirurgia.
O cotidiano da mulher, após histerectomia, se impõe, de modo que a rotina do
acompanhamento de saúde é obedecida. Compreende-se que nessa inautenticidade
(modo próprio se ser do cotidiano), ela é ser-aí-com-os-outros, que vem ao seu
encontro para dela cuidar e assumir os afazeres domésticos. Assim, o cotidiano
após a histerectomia determina à mulher ficar de repouso, descansar, não fazer
esforço físico, precisando de ajuda de outras pessoas para as atividades que ela
mesma fazia anteriormente.
Heidegger (1999, p.164), esclarece o cotidiano na expressão: “modo de ser
em que a pré-sença se mantém, na maioria das vezes e antes de tudo, a pré-sença
é absorvida por seu mundo”. É aqui que nos encontramos, num mundo público, do
lugar de todos e de ninguém, onde está o espaço do “agente”, dos gestos e das
falas. Sendo então, um espaço de todos e de ninguém, onde o cotidiano nos é
familiar e estamos nele, repetindo sempre as mesmas coisas.
Enfim, sendo a maneira de todos, é sendo ninguém, é mostrar-se na
impessoalidade, na inautenticidade. Estamos numa cotidianidade sem nos
percebermos dela. Não percebemos que o cotidiano nos domina, pensamos que a
gente é que organiza o nosso dia-a-dia, mas é o cotidiano que se impõe. Tanto
assim que, pelo fio condutor desse estudo, as mulheres estão no cotidiano, sendono-mundo, são ser-aí dominadas pela cotidianidade. É ser-aí, dominadas pela
cotidianidade.
Heidegger (1999, p. 87), expressa o conceito de cotidianidade colocando que
“cotidianidade é, antes, um modo de ser da pré-sença, justamente e sobretudo,
quando a pré-sença se move numa cultura altamente desenvolvida e diferenciada”
Coloca, também que, “este estar não possui o caráter ontológico de um ser
simplesmente dado em conjunto dentro de um mundo” e que “no encontro com os
outros a pré-sença se mantém empenhada em ocupações guiadas por uma
circunvisão” (1999, p. 170). É a questão do ser e do estar.
Elas falam das coisas de sua casa, da volta à instituição hospitalar ou de
saúde para a revisão. Então, elas estão sendo-com-os-outros no modo em que a
pré-sença se mostra inautêntica, impessoal, num mundo ôntico, em que estamos na
maioria das vezes e quase sempre, e, que mostra o caráter ôntico, não expressa o
mundo próprio – mostrando então, o mundo público e doméstico.
No sendo-com-os-outros houve necessidade de ajuda no domicilio. No
cotidiano, o ente dotado de ser da pré-sença é ser-aí, no modo positivo do cuidado,
sendo ser-aí-com, sendo essa uma possibilidade do ser-aí-com-os-outros, sendo
aquilo que querem que a gente seja, sendo a maneira de todos. A mulher após a
histerectomia é um ser-aí-com, que está precisando de ajuda, compreende-se com
necessidade de ajuda. Ela não consegue se cuidar e nem fazer coisas em sua
própria casa, não consegue fazer nada e nem de se cuidar, depende de outra
pessoa para cozinhar e até se alimentar.
Esse ser-aí-com ainda não é um caráter ontológico, é ôntico. Entretanto, o
caráter relacional mostra o ser-aí em suas possibilidades de ser-aí-com-os-outros.
No encontro com os outros, a pré-sença se mantém empenhada em ocupações, de
um modo próprio do cotidiano. Está no mundo próprio, nas coisas da casa dela.
Segundo Heidegger (1999, p.105), “mundo ora indica o mundo “público” do nós, ora
o mundo circundante mais próximo (doméstico) e “próprio”.
É oportuno dizer que a mulher expressou que a possibilidade do retorno às
atividades do lar e do trabalho foi gradativo. Dessa forma, estas mulheres estão na
impessoalidade, confirmando o caráter da inautenticidade. Heidegger (1999, p. 182),
menciona que “o impessoal é um existencial e, enquanto fenômeno originário,
pertence à constituição positiva da pré-sença”.
Mostrou-se a propriedade de voltar a fazer suas atividades domésticas e de
trabalho anteriores à cirurgia, de forma adequada, ou seja, gradativamente, aos
poucos e não de imediato.
No
cotidiano,
após
a
histerectomia,
ocorreram
probleminhas
que
determinaram idas e vindas ao hospital. Se não fosse esse fato, não estariam se
cuidando, tendo em vista que retornaram à instituição para saná-los e que, algumas,
mesmo após meses, ainda estão com complicações ou situações não resolvidas.
As mulheres iniciam um movimento de propriedade e impropriedade ao
voltarem à instituição, procurando soluções para os problemas que surgiram em
decorrência da cirurgia e até mesmo, anteriores a ela. Iniciam, então, uma abertura
de seu ser-próprio e Heidegger (1999, p. 255), se refere à que “só na angústia
subsiste a possibilidade de uma abertura privilegiada na medida em que ela
singulariza, retira a pré-sença da decadência e lhe revela a propriedade e
impropriedade como possibilidades de seu ser”. As mulheres se anunciaram,
mostrando-se como ser de possibilidades, revelando propriedades e impropriedades
como possibilidades de seu ser. Ocorreu, assim, a propriedade de melhorar, mas a
impropriedade de ter problemas em decorrência da cirurgia.
Também houve melhoras mas ainda há queixas, ou seja, a propriedade de
melhorar e a impropriedade de ter queixas.
As mulheres não desenvolveram o movimento da angústia, mas anunciaram
tal
movimento,
mostrando-se,
revelando-se
através
da
propriedade
e
da
impropriedade que elas são ser-aí, seres de possibilidades. Elas não mostraram só
as propriedades, apareceram impropriedades, o não esperado. Houve melhora mas
ainda há queixas, a intervenção cirúrgica não resolveu todos os problemas, deixou
algumas seqüelas, que são as impropriedades. Mas todo sim contém a possibilidade
do não. Ser de possibilidades é se compreender sendo, é estar aberto às
possibilidades que não são aquelas que se quer ou que se precisa, é o que vem ao
encontro. Portanto, houve mulheres que não tinham queixas e outras que as
apresentaram, informando que ainda não estão bem e que tiveram que voltar ao
hospital. Percebe-se a propriedade, a possibilidade de que a cirurgia não resolveu
todos os problemas e a impropriedade é de que se limita com a cirurgia porque ela
decai para o médico.
Houve uma abertura para expor a propriedade e a
impropriedade.
E a atividade sexual foi considerada, revelando propriedade de considerar
a relação sexual, a vida sexual e o sexo, embora algumas tenham expressado a
possibilidade de não retomar essa relação após a cirurgia, revelando a
impropriedade.
Quando as mulheres expressam sobre a atividade sexual, apreende-se que
ela está na cotidianidade, é dizer da convivência com outro ser, ou seja, um
relacionamento com o marido, ou companheiro, ou parceiro, alguém com quem ela
se relaciona intimamente. Então, dessa forma a mulher é ser-aí-com num modo de
estar-no-mundo. Heidegger (1999) coloca que somos seres relacionais e estamos
sempre em interação com outros seres e conosco mesmo.
Manifestam algumas que estão tendo relações sexuais com maior intensidade
e prazer do que antes da histerectomia e que, na cotidianidade estão se realizando
como mulher. Estão sendo ser de possibilidades, estão falando de si próprias. E,
considerando os dizeres de Heidegger (1999, p. 178), “o ser-com é um constitutivo
existencial do ser-no-mundo. A co-pre-sença se comprova como modo de ser
próprio dos entes que vêm ao encontro dentro do mundo”. Elas são ser-aí e ser-aícom, sendo então no cotidiano ser de
possibilidades.
Ele mesmo prossegue
colocando (1999, p. 178), “a própria pré-sença, bem como a co-pre-sença dos
outros, vem ao encontro, antes de tudo e na maioria das vezes, a partir do mundo
compartilhado nas ocupações”.
Mas, algumas mulheres expressaram que não estão tendo relações sexuais,
o que leva a pensar que não está sendo-com-o-outro. Mas, é ser de possibilidades.
Expressa que não está tendo atividade sexual porque não quer, porque está viúva
ou porque nunca teve relação sexual. Ela assume a decisão em relação à atividade
sexual.
A mulher não desenvolveu o movimento da angústia, anunciando esse
movimento, mediante a possibilidade da decisão em relação à atividade sexual.
Mostrando, revelando através da propriedade e da impropriedade que é ser-aí ou ser
de possibilidades.
Ser de possibilidades é se compreender sendo, é estar aberto às
possibilidades que não são aquelas que se quer ou que se precisa, é o que vem ao
encontro. Assim, houve mulheres que não tinham queixas, outras as apresentaram,
informaramm que ainda não estão bem e que tiveram, por conta de probleminhas,
que voltar ao hospital. Outras que tinham dificuldade na relação sexual, agora já não
tem. Percebe-se a possibilidade da cirurgia não resolver todos os problemas. Houve
uma abertura para expor a propriedade e a impropriedade.
“Se não puder fazer tudo,
faça tudo que puder”.
CNBB
CONSIDERAÇÔES FINAIS
Partindo de inquietações, surgidas no meu cotidiano de docente em atividade
em centro cirúrgico, ao receber mulheres para serem submetidas à cirurgia
ginecológica, especialmente a histerectomia, desenvolvi esta pesquisa para desvelar
o cotidiano da mulher após este procedimento cirúrgico. Compreendi que para
responder às minhas questões de estudo deveria “ir às coisas nelas mesmas”, pois
só a mulher que vivenciou a intervenção cirúrgica de retirada do útero poderia
clarear esse fenômeno do vivido.
Então, para apreender o significado do cotidiano da mulher após a
histerectomia à luz do referencial teórico metodológico e fenomenológico de Martin
Heidegger, realizei análises acerca das expressões do cotidiano das próprias
mulheres que tinham sido submetidas, num intervalo de quatro a dezenove meses
antes, a este procedimento.
Nessa trajetória, fui em busca do quem eu investigaria para captar o sentido
do cotidiano após a histerectomia. Interroguei o ente, a mulher que na sua dimensão
ôntica respondeu, estabelecendo a questão do ser-aí-mulher, sendo à maneira de
todas, na maioria das vezes e quase sempre. Esta expressão é a referência direta
de Heidegger para o fenômeno do cotidiano.
De início tive que reduzir meus preconceitos e meus julgamentos prévios
sobre o assunto, pois muitos deles estavam embasados nas minhas percepções de
mulher, bem como em minha formação técnica e científica. Tais conceitos prévios
foram sendo adquiridos ao longo da trajetória acadêmica e profissional, na
experiência do dia-a-dia de sala de cirurgia e nos contatos com as mulheres
internadas em pré e pós-operatório imediato.
Considerando que, em minhas preocupações e ocupações profissionais em
relação à assistência à mulher, o foco da subjetividade foi sendo fortalecido busquei
o suporte teórico metodológico da abordagem fenomenológica de pesquisa. Esta
posição investigativa valoriza a mulher como um ser único e singular, portanto é um
dos caminhos possíveis para contemplá-la em suas necessidades individuais.
Para desenvolver este estudo, precisei realizar leituras sobre o tema e refletir
sobre o cotidiano de quem já se submeteu a uma cirurgia. Tinha em mente que esta
cliente do serviço de saúde é mulher, esposa, mãe, filha, tem atividades domésticas
e, por vezes, é uma profissional inserida no mundo do trabalho. Tudo que é inerente
e próprio ao ex-sistir dos entes dotados do ser da pré-sença. Assim, a
fenomenologia de Martin Heidegger possibilitou o caminho para a aproximação
compreensiva ao cotidiano da mulher após a histerectomia. E, nesse olhar à luz do
pensamento heideggeriano, pude penetrar na singularidade de cada mulher e
perceber que cada uma e todas, no movimento desvelado neste estudo, vivem um
dia-a-dia determinado pela inautenticidade, que é o modo próprio de ser dos entes
no cotidiano, sendo ser-aí com possibilidades para a autenticidade.
Assim fui movida não apenas pelo desejo de prestar uma assistência de
saúde de qualidade ou de contribuir no cenário dos serviços de saúde com uma
atenção efetiva de enfermagem. Recorri aos depoimentos de quem vivenciou esta
situação, de quem teve a experiência do cotidiano após a histerectomia, a instância
fundante que permite ultrapassar explicações que culpabilizam a mulher por seus
problemas de saúde para alcançar a compreensão de suas possibilidades e
responsabilidades.
Então, a partir dos depoimentos de mulheres, acerca da sua condição no
cotidiano após a histerectomia, foi que realizei a análise compreensiva. E a
interpretação foi possível acontecer depois que compreendi o significado expresso
pelas mulheres, pois como coloca Heidegger (1999), só é possível interpretar o já
compreendido que se mostra na medianidade da presença indicada como
compreensão vaga e mediana.
A metodologia do estudo e o Filósofo que fundamentaram a etapa de
interpretação não são prescritivos. Assim, nesta etapa final, à guisa de conclusão,
procuro considerar as implicações da compreensão interpretativa não apenas para o
cotidiano da mulher após a histerectomia, mas para as questões de saúde da mulher
de modo abrangente e geral. Compreendo que o estudo focou o “após a
histerectomia”, porém a mulher descreveu o cotidiano do pré, do trans e do pósoperatório desta cirurgia.
Entendi que esta descrição feita pela mulher parece necessária para que se
compreenda que para ela, existencialmente, é um processo. Há uma interligação
mediante a qual seu movimento e seus modos de ser, no cotidiano, puderam ser
captados porque ela os significou. A partir destes significados, foi possível desvelar
sentidos por eles, (os significados), encobertos no dia-a-dia assistencial pela rotina
dos serviços e pela atitude dos profissionais de saúde. Conforme explicitado que:
“o modelo predominante de assistência médica se fundamenta na
pauta cultural das desigualdades entre homens e mulheres. Isto
aparece claramente tanto nas pessoas que trabalham na área da
saúde quanto nas formas em que os serviços são organizados e
oferecidos” (REDE NACIONAL FEMINISTA DE SAÚDE E DIREITOS
REPRODUTIVOS, s/d, pág 37).
Há, dentre os sentidos desvelados na análise hermenêutica, pelo menos três
que considero devam ser abordados porque revelam um conhecimento novo. Com
isso estou me referindo a que não são conhecimentos prévios a este estudo. Nesta
ótica, não representam pressupostos e apontam para alguns descompassos do atual
modelo assistencial, cuja correção este estudo pretende contribuir.
Este modelo, a partir da Constituição Federal de 1988, da implantação do
Sistema Único de Saúde e das políticas públicas de saúde em prol da mulher,
explicita que:
“a mudança do modelo médico e da concepção de saúde exige,
portanto, que a comunidade se envolva com o cuidado de sua saúde,
exige também que o conhecimento e as práticas populares sejam
reconhecidos e que as decisões sejam tomadas a partir dos desejos e
das necessidades da coletividade, fazendo da saúde um bem social e
uma produção coletiva” (REDE NACIONAL FEMINISTA DE SAÚDE E
DIREITOS REPRODUTIVOS, s/d, pág 13).
Esse conhecimento novo revelou-se em três momentos da dinâmica
assistencial: nas condições de busca da mulher pelo serviço de saúde, no preparo
para a alta hospitalar e na alta propriamente dita, e ainda, nas rotineiras orientações
de abstinência sexual determinada pelo pós-operatório.
As políticas públicas, Programa de Assistência Integral em Saúde da Mulher,
(PAISM, 1984) e a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher 20042007 tratam, inicialmente, de um clínico-ginecológico e revelam, na atualidade, que:
“Os indicadores epidemiológicos do Brasil mostram uma realidade na
qual convivem doenças dos países desenvolvidos (cardiovasculares e
crônico-degenerativas) com aquelas típicas do mundo subdesenvolvido (mortalidade materna e desnutrição). Os padrões de morbimortalidade encontrados nas mulheres revelam também essa mistura de
doenças, que seguem as diferenças de desenvolvimento regional e de
classe social”. (BRASIL,2004, p.37 )
Então a esta densidade de informações e complexidade da atenção de saúde,
a mulher no cotidiano após a histerectomia indica que, dentre os sinais e sintomas
clínicos a serem considerados quando ela procura o serviço, há o sentimento de
medo e não o de descuido e negligência. Ela mostra-se sofrida, sente-se insegura e
ameaçada por aquilo que pode vir a ser mais grave do que a dor e o sangramento
que a trouxe à procura de um médico.
É assim que esta mulher que tomou a iniciativa ou aceitou o conselho de
outras mulheres e até de outros profissionais da área da saúde, procura os serviços
ambulatoriais ou hospitalares. Dominada pelo medo, sob a ótica do pensamento
heideggeriano temor em suas três modalidades, a mulher com queixas ginecológicas
torna-se submissa, passiva e objeto do cuidar que será decidido pelos médicos,
prioritariamente no caso de indicação cirúrgica, e seguido pelos demais
profissionais, na maioria das vezes e quase sempre.
Confirma-se assim a fragmentação do modelo curativo, ainda uma herança
danosa do nosso sistema de saúde no qual os profissionais, geralmente, decidem
por intervenções, sejam medicamentosas ou cirúrgicas, ou por especialidades cujas
ações assistenciais não levam em conta a pessoa. Isso determina um
distanciamento de práticas de prevenção de doença e de promoção da saúde.
Nesse sentido, a Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos (s/d,
p.13), defende que “por esta razão é importante que as mulheres... possam tomar
decisões e influenciar as tomadas de decisões que lhes sejam mais benéficas” Este
é um caminho para a necessária construção da cidadania das mulheres.
Ao compreender, na dinâmica assistencial, aquilo que denomino de segundo
momento de contribuição da hermenêutica para um conhecimento novo, desvelo o
preparo para a alta e a alta propriamente dita. Portanto, o que se mostrou é a mulher
(no cotidiano após a histerectomia) necessitando de ajuda. E, essa ajuda pode ser
de qualquer pessoa. Ao sair do hospital, ou seja, após a alta, ela irá para sua casa
ou para uma outra casa, que pode ser de um familiar ou amigo, e ela necessitará ou
terá que contar com ajuda para se cuidar e/ou para cuidar dos afazeres domésticos.
Ela ficará de repouso, cumprindo as orientações médicas. E, não poderá nem
cozinhar para se alimentar. Por isso, contam com a mãe, filhos, marido, irmã, nora,
vizinha, amiga, vizinhos ou contratam alguém para ajudá-las.
Nesse estudo, evidenciou-se que a mulher, talvez por não saber ou não se
lembrar mais de suas outras cirurgias, não se preocupou com esta situação, visto
que não expressou tal preocupação antes da cirurgia. Por isso, também não
expressou um planejamento para esse aspecto do cotidiano. Precisar de ajuda da
maneira como elas descreveram evidenciou que de início e na maior parte das
vezes e quase sempre não contavam com tal situação que se mostra como
possibilidade. Foi necessário, mas também foi possível contar com a ajuda das
pessoas, de diferentes formas e, a partir de pessoas próximas ou não, se revelou
como possibilidade do ser-aí-mulher que se mostrou como ser-aí-com-os-outros.
Desta análise, emergem duas considerações importantes. Uma centrada na
assistência de saúde na qual os profissionais de saúde pouco valorizam conhecer o
dia-a-dia da cliente que será submetida à histerectomia e que, por um curto espaço
de tempo, vive a oportunidade de consulta médica ou de enfermagem. Este é um
tempo cronológico curto e quase nada explorado no contexto das possibilidades de
com-viver para melhor ajudar a mulher a planejar a sua cirurgia em função apenas
do seu retorno para casa, mas, principalmente face ao fenômeno do ser-aí-com, pois
observei que a mulher, mesmo morando sozinha, não esteve só e desamparada
após a cirurgia. Esteve com alguém que a ajudou.
Neste sentido, em relação ao tempo da consulta médica, analisa-se que
“é geralmente tão rápida que nem dá tempo para a mulher colocar
tudo o que está sentindo. O profissional, por sua vez, não procura
investigar para obter uma visão mais abrangente de sua saúde,
limitando-se quase sempre a realizar uma rotina mecânica” ( REDE
NACIONAL FEMINISTA DE SAÚDE E DIREITOS REPRODUTIVOS,
s/d, p. 37)
Esta ajuda não foi discutida no preparo para a intervenção, nem durante a
internação hospitalar e, menos ainda, após a histerectomia, entretanto a equipe de
saúde tem conhecimento dessa necessidade. Conhece as limitações inerentes ao
pós-operatório e as divulga no momento da alta como recomendações a serem
obrigatoriamente seguidas. Fazem parte do pós-operatório mediato, incluindo-se
nele o retorno para a retirada dos pontos.
A outra consideração importante está relacionada com a mulher que, ao
receber ajuda, sendo-aí-com-os-outros após a histerectomia, compreendeu-se como
ser de possibilidades e anunciou um movimento em direção à autenticidade, que
permite a tomada de decisão. A partir daí foram identificando suas possibilidades de,
aos poucos, irem retornando para as suas atividades e suas tarefas domésticas. Não
foi apontado em seus depoimentos e nem em nossas conversas, uma organização
prévia ou um planejamento para atender no domicílio às suas necessidades após a
histerectomia.
Assim, previamente isso não era certo e determinado por ela, mas a equipe
de saúde tinha conhecimento do que se mostrou para ela possibilidade.
O terceiro sentido que, de certo modo, desvela um descompasso assistencial
refere-se às rotineiras orientações de abstinência sexual determinada pelo médico e
ratificada por outros membros da equipe de saúde no período pós-operatório.
Assim sendo,, a atividade sexual própria ao humano e inerente ao ser do
humano, mostrou-se como possibilidade e não como certeza. Algumas mulheres
retomaram e outras não, sendo que o conhecimento biológico do modelo biomédico
de assistência de saúde às mulheres, que estabelece um prazo de retomada, não foi
explicitada pelas mulheres após a intervenção cirúrgica.
Para aquelas que retomaram a atividade sexual houve a possibilidade de até
avaliarem que podia ser melhor do que antes, quando ocorria muito desconforto ou
normal. Tal compreensão é imanente, da própria mulher que se revela não apenas
como ser de possibilidades, mas como alguém que, com ajuda de outros, decide
acerca da satisfação de sua sexualidade, tratando a atividade sexual como relação
sexual, sexo e vida sexual.
Parece que a orientação para a relação sexual e a recomendação para o
retorno deve ser dada de modo a não inibir a atividade sexual, pois a retomada
ocorre por decisão delas mesmas. A determinação médica a partir de quando pode
inibir as mulheres, porém pode ser também uma ajuda considerando que detalhes
da cirurgia como amputação de colo que pode trazer implicações para o contato
sexual, pode e deve ser discutido. Então, as informações, as orientações e
sugestões devem ser a partir da mulher, de sua singularidade e não a partir das
rotinas biológicas. Abordar as questões voltadas para a sexualidade antes da
cirurgia faz com que já se saiba de algumas de suas situações em relação à
sexualidade como uma que não pretende retomar mesmo ou até uma outra mulher
que quer retomar após sanados os problemas
pela cirurgia e que pode não
conseguir retomar de maneira melhor ou do modo que gostaria. Essas são as
possibilidades.
Acredito que as mulheres precisam ser vistas como ser de possibilidades e
não só como problemas no útero; com características singulares e não de modo
geral. Portanto, entendo que este estudo traz uma contribuição especial e
primeiramente para a enfermagem ginecológica, que é dominada pela ginecologia e
pelas ginecopatias mais prevalentes. A ginecologia preventiva não existe como
política pública, o que existe é doença ginecológica que faz a mulher procurar
tratamento e, então, ela é tratada como doença ginecológica e não como mulher.
Hoje, no Brasil, o modelo para cuidar da saúde, colocado pelo Ministério da
Saúde, é o Programa de Saúde da Família, visando o olhar para a saúde e para a
doença a partir de uma base epidemiológica. Assim, busca-se contabilizar
cesarianas, laqueaduras e abortos, mas não se controla o quantitativo de
histerectomia nem mesmo são analisados seus determinantes. E, menos ainda no
cotidiano das mulheres, após a histerectomia há significação de seguimento
ambulatorial ou de outras ações que reflitam acompanhamento e cuidado de
prevenção de saúde.
Neste estudo, tais mulheres evidenciaram o quanto o cuidar da saúde é
pontual e não integral. É um cuidar a partir dos sintomas que é a pressão, o
preventivo, o controle e também o medo de dar problemas mais tarde, de dar
complicações. Essa clientela revelou, entretanto, o quanto as mulheres podem ainda
estar distantes ou já próximas de se compreenderem como ser de possibilidades.
Ora elas ainda se vêm como objeto para a equipe de saúde, ora acreditam nas
possibilidades de serem sujeitos do cuidado da sua saúde. Para exigirem uma
assistência integral, elas precisam de ajuda para decidirem e não apenas que se
trate ou se extirpe a parte do seu corpo que está com problemas.
Evidenciou-se que a equipe assistencial se pre-ocupa com as orientações
para alta mas não se ocupa em considerar o ser existencial da mulher. O estudo nos
instiga à reflexão do quanto necessitamos rever nossa forma de cuidar, ampliando
as
reflexões
e
fomentando
discussões
interdisciplinares,
despertando
nos
profissionais de saúde a sensibilidade para valorizar a fala e a escuta da mulher. E,
que o relacionamento com a mulher seja de forma empática a partir do momento
que ela procura o serviço de saúde.
E, acredito que as universidades, através de suas funções pautadas no tripé
ensino/pesquisa/extensão possam oportunizar intervenções capazes de mobilizar os
futuros profissionais em sua formação considerando o ser-com-os-outros, a
intersubjetividade, a autenticidade, a solicitude e o desvelo, para que as decisões
sejam tomadas com a mulher e por ela.
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ANEXOS
Declaração chefe de Departamento de Ginecologia
Declaração Diretor Geral HU/UFJF
Sisnep 0024.0.180.000-6
Parecer Comitê de Ética
Ficha de atendimento ambulatorial
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
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