AS DIFERENTES ABORDAGENS DA ORALIDADE EM SALA DE AULA DE LÍNGUA ESTRANGEIRA1 Michele Mitsuy TANGI (G-UEM) Teresinha Preis GARCIA (ILG/UEM-USP/PG) ISBN: 978-85-99680-05-6 REFERÊNCIA: TANGI , Michele Mitsuy; GARCIA, Teresinha Preis. As diferentes abordagens da oralidade em sala de aula de língua estrangeira. In: CELLI – COLÓQUIO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS. 3, 2007, Maringá. Anais... Maringá, 2009, p. 1850-1857. 1. INTRODUÇÃO A prática do oral de línguas estrangeiras (doravante LE) nem sempre se realiza em contextos de sala de aula e são muitas as razões / explicações que podemos encontrar para justificar este fato: não há tempo suficiente; não há meios de se ocupar do caráter global da língua; os grupos são numerosos; não há engajamento dos participantes deste contexto; a má formação dos professores; a freqüente timidez dos alunos (o fato de se expor diante do ‘outro’, principalmente em uma língua ainda imperfeita, desconhecida); as atividades propostas (pelo manual, pelo professor) as tornam muitas vezes simples “caricaturas da comunicação” (BERRIER, 1995), pois são apenas situações ritualizadas, estereotipadas. Muitos ainda pensam que o oral, a conversação, as atividades orais, constituem perda de tempo. Como podemos verificar, muitas são as razões encontradas para que a comunicação oral em LE não se realize satisfatoriamente em sala de aula. Além disso, o termo comunicação é ainda uma questão que gera polêmica e ainda não se chegou a articular adequadamente todos os seus componentes por ser um fenômeno de extrema complexidade, quer ela se realize no oral, quer na escrita, ou ainda por outros meios. Ao longo dos anos e nas diferentes metodologias de ensino, a comunicação oral desempenhou diferentes papeis e teve espaços reduzidos ou expansivos, dependendo das crenças daquele momento. Esta pesquisa não pretende ser exaustiva, pois não é nossa intenção fazer aqui um relatório aprofundado das diferentes metodologias e o papel que coube à oralidade em cada contexto. O que pretendemos com este breve levantamento, é apenas tentar mostrar a importância da língua falada nos últimos anos, como ela foi tratada e como isso influencia ainda o ensino de LE em sala de aula, nos dias atuais. 1850 2. A ABORDAGEM TRADICIONAL De uma cultura totalmente oral na Antiguidade greco-romana, na qual a escrita era considerada uma “tecnologia incômoda” (BLANCHE-BENVENISTE, 2000) nos grandes discursos retóricos para uma representação da fala inteiramente modelada pela escrita, na cultura letrada que hoje é a nossa. Segundo Blanche-Benveniste a escrita passou a ter papel importante ainda na Antiguidade, mas apenas para as consideradas “grandes línguas” já que os gramáticos afirmavam ser impossível escrever as línguas vulgares, ou seja, as línguas romanas populares, pois, para eles, as línguas vulgares baseavam-se sobre o uso falado e a escrita era uma arte restrita à estas grandes línguas. Ao longo dos tempos, a escrita foi tomando espaço cada vez maior, havendo uma inversão de valores com a valorização da escrita e conseqüente desvalorização da língua falada. Estes conceitos / preconceitos influenciam diretamente o ensino / aprendizagem de LE nas escolas. No inicio deste século, o ensino de línguas estrangeiras era fortemente influenciado pela Gramática Tradicional (gramática e tradução), abordagem esta utilizada para o ensino de línguas como o latim. O termo “Gramática Tradicional”, utilizado geralmente pelos lingüistas, identifica “um fenômeno gramatical, em que as línguas eram analisadas com referência ao latim” (WEEDWOOD, 2003, p.10). Pode-se constatar, portanto, que a aprendizagem de LE se fazia a partir de textos escritos, isto é, a ênfase era dada à escrita, à gramática normativa, observada principalmente em textos literários e geralmente de autores clássicos. A língua aprendida era a língua literária, clássica, normativa não se aceitando os diferentes falares, as variações lingüísticas. Os erros deveriam ser evitados. A oralidade tinha muito pouco espaço e quando existia, partia de textos escritos. “A língua escrita [é a] verdadeira gramática da língua” (BLANCHE-BENVENISTE, 2000, p.5) e a língua falada é frequentemente ligada à vertente negativa por haver erros, por ser inacabada, por estar ligada a diferentes grupos sociais, etc. A oralidade adquiriu aspecto científico que não conhecia anteriormente, somente a partir da realização do alfabeto fonético internacional (1880-1890). O trabalho sobre a oralidade se fazia urgente e postulava-se ser indispensável ensinar a língua falada (PUREN, 1988; GUIMBRETIÈRE, 1994). Mas, mesmo assim, o ensino da oralidade não se ampliou, ao contrario, manteve seu espaço reduzido e não contemplava as múltiplas facetas do oral. 3. A ABORDAGEM ESTRUTURAL A partir da década de 40, sob influência da visão estrutural defendida por Ferdinand de Saussure, o desempenho é evidenciado e então, a oralidade toma uma nova importância. “O termo estruturalismo tem sido usado como um rótulo para qualificar certo número de diferentes escolas de pensamento lingüístico” (WEEDWOOD, 2003, p.126) e diferentes denominações como: metodologia áudio-oral, áudio-visual, behaviorismo, entre outras. Entretanto há certas características marcantes que sobressaem dessa abordagem, encontradas nas diferentes escolas: a) comportamento lingüístico: aprendizagem mecânica e condicionamento verbal (behaviorismo). A língua era vista como instrumento de comunicação e era adquirida através de estímulos (o behaviorismo explica a conduta humana (psicologia 1851 condutista) como resultado de um condicionamento: estímulo resposta (correta) recompensa (reforço)); b) ênfase à oralidade: é realizada a descrição da língua falada, em frases ou diálogos-modelos, com um corpus limitado; c) repetição e imitação desses modelos (tanto para a aprendizagem do oral como para a fonética). A audição e depois a imitação de modelos se apóiam na tese segundo a qual a integração das noções é facilitada por uma aprendizagem inconsciente, o que é praticado nos exercícios (ou drills): exercícios estruturais de memorização, repetição, imitação, dramatizações realizados exaustivamente para uma produção correta, pois o erro não era aceito; d) importância dada à forma e não mais ao significado: realizavam-se listas (inventários) de formas, de palavras e de construções; e) descrição do sistema fonológico que serve de base para o ensino sistemático da pronúncia (frases). Tais exercícios ampliaram-se e a metodologia estrutural expandiu-se com o advento de um aparato técnico e das novas tecnologias da época: as gravações que poderiam ser ouvidas e repetidas através das fitas K-7, com gravadores e a criação dos laboratórios de línguas. Fries (1945) e Lado (1957) (apud GARCIA, 2004), juntamente com uma equipe de pesquisadores americanos, afirmavam que a aprendizagem de línguas se fazia por transferências. Para eles, o aluno transferia seus hábitos lingüísticos de sua língua materna (doravante LM) para a aprendizagem de uma LE. Desta forma, as estruturas que se assemelhassem seriam aprendidas sem dificuldade, enquanto que as estruturas diferentes encontradas na LE causariam erros. Por esta razão, estes lingüistas propuseram o contraste sistemático entre as línguas em contato para a previsão dos erros. Desta forma, com as diferenças apontadas, facilitava-se a aprendizagem e não se cometeria erros na produção de LE. 4. A ABORDAGEM COMUNICATIVA Em 1957, Chomsky desenvolveu o conceito de gramática gerativa que se distanciava totalmente do behaviorismo e do estruturalismo das décadas anteriores. A gramática gerativa fornece regras explícitas dos enunciados para a geração de um número infinito de construções gramaticais. O autor postula também os universais lingüísticos e afirma haver analogias entre as línguas, portanto podem-se fazer generalizações uma vez que há regularidades que regem diferentes línguas. Para Chomsky, a aquisição da linguagem não é mecânica, não é aprendida por imitação de modelos; a linguagem é criativa e o indivíduo aprende a partir de hipóteses que faz em relação à língua a ser aprendida. O indivíduo faz hipóteses e as testa: o erro é um indício destas hipóteses. Se o erro aparece é por que o individuo está testando a língua em aprendizagem. O indivíduo também utiliza estratégias de aprendizagem tanto na aquisição de LM como de LE e a transferência de uma língua para outra é uma delas. Neste mesmo período, há o advento da sociolingüística que preconiza o ensino de línguas fundado sobre uma língua viva que reflita a realidade sociocultural de seus usuários e então, “a prioridade era dada ao aprendiz, às suas possibilidades de se exprimir de maneira autônoma e autêntica em situações autênticas, privilegiando menos a forma que a fala” (GUIMBRETIÈRE, 1994, p.49). 1852 Hymes (1974, tradução francesa de 1984) defende a competência comunicativa, e afirma que a comunicação se fará de maneira satisfatória se o indivíduo levar em conta quatro competências: a) psicolingüística (elaboração mental dos enunciados da LE); b) sociolingüística (habilidade para realizar ajustes na linguagem de acordo com o contexto social); c) epistêmica (conhecimento de mundo por parte do estudante) e d) discursiva (construção do texto). É a partir dos anos 80 que os pesquisadores desenvolvem estudos sistemáticos sobre as línguas faladas e se interessam em fazer gravações e transcrições de um corpus significativo, a partir das quais tentavam descrever as gramáticas das línguas2. Para Blanche-Benveniste (2000, p.2), isso ocorreu por várias razões: 1) os meios técnicos permitiam estocar e tornar acessíveis uma grande quantidade de dados de língua falada; 2) isso acarretou uma mudança nas análises (de língua falada e escrita); 3) mudança dos preconceitos clássicos contra a língua falada (que era vista como cheio de erros, popular e vulgar); 4) desenvolvimento de novas áreas da lingüística como, por exemplo, a pragmática, a enunciação ou pesquisas cognitivas. Blanche-Benveniste (2000, p.1) argumenta que “a invenção do gravador portátil [...] em 1985, deveria ser considerado como uma data determinante para o desenvolvimento da lingüística” uma vez que “pela primeira vez, a invenção técnica dava a cada um a possibilidade de estudar amostras de sua própria língua falada, conservando-as tão estáveis quanto se pudera fazê-lo com amostras de língua escrita.” Segundo a autora, a invenção data de 1930, e como já afirmamos acima, essa nova tecnologia realizou uma grande evolução no ensino / aprendizagem de LE, com amostras de frases e diálogos padrões de comunicação3. No ensino, ou seja, nas situações guiadas de sala de aula, esse grande desenvolvimento da oralidade trouxe também grandes alterações. Com tal evolução, os métodos tradicionais de imitação e de repetição que não levavam em conta a situação e o contexto (o que ocorria no estruturalismo) não tinham mais espaço e ocorreu um grande progresso em relação a esse método4. Embora muitos reconheçam que as situações, as simulações oralizadas propostas para o ensino / aprendizagem de LE sejam de alguma maneira falsas (os alunos não estão em contexto real, este é apenas simulado em sala de aula, da mesma forma como as necessidades que são apenas uma desculpa para se utilizar a LE em estudo), não podemos nos esquecer que o espaço da sala de aula, no qual os professores e aprendizes de LE estão inseridos, é um cenário não-natural de fala de LE. Trata-se de um espaço institucionalizado, formal, entretanto é o espaço que os interlocutores possuem para construir “cenários” que remetam às situações típicas de comunicação5. Faz-se então necessário “criar” situações o mais realista possível, mais verdadeira, com atividades mais próximas das autênticas, este sim um grande desafio para a didática (principalmente para os professores de LE). Berrier (1995) recomenda várias situações orais, nas quais os diálogos previsíveis, um tanto estereotipados (jeu de rôles) podem ser substituídos, por exemplo, pelas simulações com atividades baseadas nas diferentes informações ofertadas aos interlocutores, atividades estas que mantém um mínimo de imprevisibilidade na situação6. 5. A COMUNICAÇÃO ORAL EM SALA DE AULA “As línguas tornaram-se bens funcionais, utilizáveis no dia a dia e que constituem um instrumento de comunicação indispensável no plano profissional, ou para o lazer [...] As competências orais adquiriram uma importância decisiva uma vez que um grande número de 1853 comunicações em LE se efetua no plano oral” (GUIMBRETIÈRE, 1994, p.87) Como constatamos acima, a partir dos anos 80 deu-se maior ênfase à comunicação oral e isso fez ocorrer um grande desenvolvimento da compreensão oral e do trabalho sobre a qualidade sonora do enunciado global, dos esquemas melódicos. Inicialmente houve uma preocupação maior com a competência de compreensão para que pudesse acontecer a competência da produção. Os novos métodos preocuparam-se principalmente com os interlocutores e se interessaram “às competências sociolingüísticas, discursivas e estratégicas” (BERRIER, 1995, p.5) uma vez que uma conversação se faz entre interlocutores entre os quais deve haver um mínimo de compreensão, pois nas interlocuções ocorre sempre a recepção e interpretação e a produção (auditor/produtor). “Seria necessário [...] que todo ato comunicativo seja totalmente límpido e apresente uma adequação incontestável entre a intenção de um aluno e a interpretação de um outro aluno. Isso parece difícil não somente por causa do implícito e do não-dito inerente à toda situação de comunicação, mas também porque o aluno não está engajado socialmente nem afetivamente, nem mesmo (muitas vezes) cognitivamente.” (BERRIER, 1995, p.6-7). O não-engajamento na interação social em uma situação de sala de aula é evidente, e é um problema que o professor deve tentar contornar, se quer que seus alunos produzam na LE ensinada. Por isso o professor deve privilegiar e favorecer as relações entre os alunos para que ocorra um engajamento entre eles. Visar, sobretudo a vivência deles, fazê-los falarem à partir de suas próprias experiências, de seus conhecimentos, das suas opiniões – o aluno deve ser ele mesmo nas interações com seus interlocutores. Isso não quer dizer absolutamente que se deve ficar somente nisso, senão não ocorre um crescimento e avanço na aprendizagem da LE: o que se deve fazer é partir desses conhecimentos para avançar em direção à novos conhecimentos, inclusive com amostragens das diferenças culturais existentes entre a LM do aluno e a LE em aprendizagem. No ensino de LE, dois códigos culturais entram em contato – a LM e a LE – e estes códigos estão inseridos na conversação de maneira implícita ou inconsciente para os locutores. A LM (sua cultura, seu código nos quais muitas vezes o interlocutor jamais tenha refletido antes) tornou-se natural para ele. Essa cultura, essa visão de mundo, seus conhecimentos ele os carrega consigo e de alguma forma os projeta na aprendizagem de uma nova LE. Entretanto, esses fatores nem sempre são levados em conta pelos interlocutores da sala de aula, conforme constatação de Berrier. “Graças ao método comunicativo, parece que, na sala de aula de LE, tenha se aplicado alguns princípios apresentando os atos [de fala] de saudar, convidar, se desculpar, cumprimentar, oferecer. O que se deve ainda levar em conta é o lugar destes atos de fala na cultura ensinada.” (BERRIER, 1995, p.12) 1854 Nas interações em sala de aula de LE muitas são as relações que ocorrem: entre os interlocutores (professor – aluno, aluno – aluno), mas também e, sobretudo as relações entre as línguas em contato. Quanto às relações entre os interlocutores, acreditamos que se tenham alterado, nos últimos anos. Nas abordagens anteriores (tradicional e estrutural) privilegiou-se principalmente o esquema de Sinclair e Coulthard (1975, apud BERRIER, 1995, p.17) para descrever o que se passava em uma sala de aula de LE entre o professor e os alunos: a) a iniciativa (do professor) com uma pergunta ou uma ordem; b) a reação do aluno (ou resposta); c) a retroação do professor (feedback). Neste esquema o professor tem papel central: tudo passa por ele e retorna a ele. Este é um modelo que deve ser evitado se queremos levar o aluno a ter iniciativas na fala, levá-lo a autonomia. Quanto ao professor, ele terá um papel mais de observador discreto das interações entre os alunos, o papel de orientador, de “ajudador”. 6. A COMPREENSÃO E A PRODUÇÃO ORAL Para que haja a compreensão e a produção em LE é preciso que se pense no indivíduo antes como um auditor. Para Guimbretière (1994, p.55) antes de chegar ao estágio da compreensão, algumas etapas são necessárias: a audição e a percepção (escuta, recepção). Segundo a autora, é preciso considerar estas diferentes etapas: primeiro o intake (apreensão, em francês saisie), a observação e depois a extração da informação na variedade de estímulos auditivos e visuais que chegam incansavelmente ao cérebro, em seguida a análise e o tratamento desta informação a fim de estocar (apreender / adquirir) enquanto elemento significativo nesta aprendizagem para o aluno. “Há uma “relação de polaridade” entre o que percebemos e o que produzimos: sem aprendizagem específica nós só podemos perceber o que nós somos capazes de produzir. Os processos de “emissão” e de “recepção” da fala não são da mesma “natureza”: recebemos muita informação, mas a “capacidade de tratamento” é bem inferior ao que nos é enviado, consequentemente nosso ouvido deve fazer uma seleção” (GUIMBRETIÈRE, 1994, p.58). No processo de compreensão oral, o indivíduo procura reconstruir o sentido da mensagem ouvida. Um dos processos utilizados pelo auditor é o que chamamos de antecipação e a construção de hipóteses (processos esses, parecidos com os que fazemos nossos alunos utilizarem na leitura de textos escritos). As hipóteses podem ser construídas a partir de vários meios, como por exemplo, os meios sonoros (barulhos inseridos na mensagem) a partir dos quais, o aprendiz pode inferir o lugar no qual está inserida a mensagem. Ele pode fazer uso também das lembranças que possui na mente ou observações diversas. Isso tudo permite ao auditor, confirmar ou rejeitar as hipóteses elaboradas no decorrer da mensagem, segundo os resultados obtidos. Para Guimbretière (1994, p.67) nesse processo devemos levar em conta que o que é “inato” para um nativo, deve ser “aprendido” ou “transferido” pelo aprendiz de LE. O professor pode ajudar o aprendiz fazendo com que ele se dê conta das estratégias de escuta e fazer com que ele transfira alguns hábitos de escuta da LM para a LE, tentando assim facilitar sua aprendizagem. 1855 A transferência dos hábitos lingüísticos da LM para a LE e as estratégias de aprendizagem e de comunicação, já foram bastante discutidas e é geralmente aceita a idéia de que o aluno se utiliza destes meios quando aprende uma nova LE e quando tenta se comunicar na língua alvo, mesmo que inconscientemente (CYR, 1998). O uso de estratégias de escuta, portanto, podem ser também desenvolvidas no aprendiz e isso pode ser intermediado pelo professor: é possível propor atividades variadas que tenham por objetivo desenvolver no aprendiz a aptidão de pré-construir, a construir ou reconstruir uma mensagem utilizando o seu conhecimento anterior (da língua alvo, de outras LE ou da LM)7. “Compreender é construir sentido, não formas lingüísticas. Compreender bem depende de conhecimentos variados entre os quais, o conhecimento das formas lingüísticas que não estão sozinhas.” (GREMMO e HOLEC, apud GUIMBRETIÈRE, 1994, p. 76). Segundo Guimbretière (1994, p.76-8), as etapas da escuta devem seguir as seguintes fases: 1) atividades de escuta: devem permitir ao aluno desenvolver estratégias de recuperação, de observação de elementos a partir de instruções, visando a discriminação destes elementos ou o seu reconhecimento; 2) atividades de apropriação da língua: esta etapa permite aprofundar a primeira fase e chega a verdadeira compreensão (aquisição, apropriação, incorporação). Esta é a fase de apropriação e tratamento da informação: é preciso propor atividades de “procura de informações” a partir de suportes e instruções variadas; 3) atividades de produção (relação dinâmica dos saberes e do saber-fazer (savoir-faire) linguageiro). Para verificar a eficiência das fases descritas, é necessário propor ao aprendiz a produção “em situação”, isto é, ativar os saberes e fazer com estes entrem em ação em interações, para que o aprendiz possa testar, ou adquirir, o domínio do saber-fazer. Estas situações podem ser vistas como objetivo de auto-avaliação para o aluno uma vez que ele poderá testar seus conhecimentos na língua alvo. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS A comunicação oral desperta controvérsia entre pesquisadores, professores e aprendizes de LE. Ora rejeitada como sendo “popular e vulgar” e não merecedora de estudos, ora vista como a “expressão natural da linguagem” e, portanto, merecedora de estudos aprofundados para a compreensão da linguagem humana. Estas diferentes formas de valorização da língua falada influenciaram e influenciam diretamente o espaço institucionalizado: o ensino de LE na sala de aula. Como pudemos observar ao longo deste texto a oralidade passou por diferentes fases. Antes, a oralidade aparecia apenas em comentários de textos escritos, forma valorizada, para ocupar hoje um espaço que lhe é devido e reconhecidamente importante. As quatro habilidades sempre tão propagadas no ensino e na aprendizagem de LE - compreensão e produção oral; compreensão e produção escrita – ocupam o mesmo espaço de importância no Quadro Comum Europeu de Referência para as línguas estrangeiras (2000) na qual a interação entre os locutores, seja ela oral ou escrita, culmina na comunicação efetiva. 1 As traduções contidas neste trabalho são de responsabilidades das autoras. 1856 2 Interessamos-nos principalmente por dados da língua francesa, nosso objeto de estudo, por esta razão, nos referimos principalmente a autores e datas importantes em trabalhos franceses, embora todos eles tenham interesse à todo estudo de línguas estrangeiras. 3 Concordamos com a evolução que tais equipamentos impulsionaram naquele período embora tenhamos consciência de que o uso deles tenha sido majoritariamente para a imitação de modelos e não dava muita abertura para o ensino/aprendizagem de LE de forma criativa. 4 Quando afirmamos que atividades estruturais não têm mais espaço na nova abordagem, temos consciência que podemos encontrar resquícios das diversas abordagens em sala de aula, convivendo umas com as outras. Mas temos consciência também do grande impacto que as novas abordagens causam no ensino em que acontecem as grandes rupturas com as abordagens utilizadas anteriormente, pelo menos em um primeiro momento. 5 Situações típicas e estereotipadas como, por exemplo: na loja, no museu, ao telefone, etc, são criticadas por muitos, pois estas não são necessidades reais dos nossos alunos em LE em uma sala de aula, mas defendidas por outros que argumentam que mesmo sendo “estereotipadas”, é importante que os aprendizes tenham o máximo de contato com a língua em aprendizagem e tentem produzir sempre que possível. 6 Berrier (1995),oferece uma série de simulações que tentam aproximar os alunos o máximo possível das situações reais de uso do francês. Para maiores esclarecimentos, consultar nossa bibliografia. 7 Os teóricos da Interlíngua postulam que o aprendiz faz uso de todo seu conhecimento anterior na aprendizagem de uma nova LE: conhecimento de sua LM, de outras LE e da própria língua em aprendizagem. Para maiores informações: KLEIN, Wolfgang. L’acquisition de langue étrangère. Trad de Colette Noyau. Paris : Armand Colin, 1989. REFERÊNCIAS BERRIER, Astrid. Approches de la langue parlée. Québec : Editions du Trécarré, 1995. BLANCHE-BENVENISTE, Claire. Approches de la langue parlée en français. Paris: OPHRYS, 2000. CADRE COMMUM DE RÉFÉRENCE POUR LES LANGUES, Conseil de l’Europe Conseil de la coopération culturelle. Strasbourg: Didier, 2000. CYR, Paul. Les stratégies d’apprentissage. Paris: CLE International, 1998. GARCIA, Teresinha Preis. Interferências da lingua portuguesa na aprendizagem da lingual francesa: enfoque sobre os adjetivos possessivos. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem). Universidade Estadual de Londrina, 2004. GUIMBRETIÈRE, Élisabeth. Didier/Hatier, 1994. Phonétique et enseignement de l’oral. Paris: HYMES, Dell H. Vers la compétence de communication. Trad. De France Mugler, Paris : Hatier-Credif, 1984. PUREN, Crhistian. Histoire des méthodologies de l’enseignement des langues. Paris: CLE International, 1988. WEEDWOOD, Barbara. História concisa da lingüística. Tradução de Marcos Bagno. São Paulo : Parábola, 2003. 1857