Universidade Federal de São João del-Rei
Coordenadoria do Curso de Química
INVESTIGAÇÃO TEÓRICA DO PROCESSO DE
INCLUSÃO DO FLUCONAZOL COM
CICLODEXTRINAS E CALIXARENOS
Mércia Aparecida da Silva Costa
São João del-Rei – 2014
INVESTIGAÇÃO TEÓRICA DO PROCESSO DE INCLUSÃO
DO FLUCONAZOL COM CALIXARENOS E
CICLODEXTRINAS
Monografia de Trabalho de Conclusão de Curso,
apresentado no 1° semestre do ano de 2014 ao Curso
de Química, Grau Acadêmico Bacharelado, da
Universidade Federal de São João del-Rei, como
requisito parcial para obtenção do título Bacharel em
Química.
Autor: Mércia Aparecida da Silva Costa
Docente Orientador: Clebio Soares Nascimento Jr.
Modalidade do Trabalho: Projeto de pesquisa
São João del-Rei – 2014
RESUMO:
No presente trabalho foi realizada uma análise estrutural e energética, por meio do
método semi-empírico PM3 e da Teoria do Funcional de Densidade (DFT), com o funcional
BLYP/6-31G(d,p), para o processo de inclusão envolvendo o fármaco fluconazol, FLU
(hóspede), e quatro moléculas hospedeiras: ácido p-sulfônico calix[4]areno (calix4), ácido psulfônico calix[6]areno (calix6), –ciclodextrina (-CD) e –ciclodextrina (-CD), visando-se
obter parâmetros estruturais e termodinâmicos relevantes para este processo. Os resultados
obtidos no trabalho mostraram que o calix4 não foi viável como hospedeiro para o fluconazol,
pois nesse processo foram formados complexos de associação, os quais são inviáveis do
ponto de vista de sistemas supramoleculares de liberação controlada. Por outro lado, houve
a formação de complexos de inclusão típicos com o calix6, sendo o Modo 1 de inclusão
(inclusão do FLU por meio do anel contendo átomos de flúor), mais favorável energeticamente
em comparação ao Modo 2 (inclusão do FLU por meio do anel contendo átomos de
nitrogênio). Já para a ciclodextrinas (CDs), os resultados evidenciaram que a inclusão do
fluconazol pelo Modo 1, em ambas as CDs ( e ) foram mais estáveis energeticamente. Por
meio deste trabalho pode-se concluir que alguns fatores são essenciais para se explicar a
estabilidade dos diferentes complexos formados com calix[n]arenos e ciclodextrinas: (i) a
presença do anel contendo os átomos de flúor dentro da cavidade contribui de forma relevante
para o que o Modo 1 de inclusão seja mais estável; (ii) as interações intermoleculares
estabelecidas, especialmente as ligações de hidrogênio do tipo F...H, desempenham um
papel importante na estabilidade dos complexos e (iii) a profundidade da inclusão faz com que
as moléculas hóspedes se acomodem de forma mais efetiva dentro da cavidade,
proporcionando maior estabilidade aos complexos formados.
SUMÁRIO
1. Introdução
1
1.1. O Fármaco Fluconazol
1
1.2. Calix[n]arenos e Ciclodextrinas: Sistemas de Liberação Controlada
2
1.3. A Química Computacional no Estudo de Sistemas Supramoleculares
4
2. Objetivos
5
3. Atividades/Metodologia
5
4. Resultados e Discussão
7
4.1. Análise Estrutural das Moléculas Hóspede e Hospedeiras
7
4.2. Análise Estrutural e Energética dos Complexos de Inclusão Formados entre
9
o Fluconazol e os Calix[n]arenos
4.2.1. Análise Estrutural
9
4.2.2. Análise Energética
12
4.3. Análise Estrutural e Energética dos Complexos de Inclusão Formados entre
14
o Fluconazol e as Ciclodextrinas
4.3.1. Análise Estrutural
14
4.3.2. Análise Energética
18
5. Conclusão
19
6. Referências Bibliográficas
20
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
1.
1.1.
INTRODUÇÃO
O FÁRMACO FLUCONAZOL
Sintetizado pela primeira vez em 1982, o fluconazol (Figura 1) é um agente antifúngico
que pertence à classe dos compostos triazólicos, sendo utilizado para tratar infecções
cutâneas causadas por fungos da espécie Candida albicans.1–6 Este antifúngico pode ser
administrado por via oral ou intravenosa, de modo que seu mecanismo de ação consiste na
inibição da enzima C–14 desmetilase, a qual é crucial na biossíntese do ergosterol da
membrana de fungos.1, 3–5, 7
Figura 1. Estrutura química do fluconazol.
O fluconazol (FLU) surgiu como antifúngico devido a sua eficácia e características
farmacocinéticas, destacando-se por ser um fármaco relativamente estável e com baixa
toxicidade.8,9 Tanto o FLU, quanto os demais azóis, são compostos totalmente sintéticos, cuja
estrutura básica consiste em um anel azólico de cinco membros unidos por uma ligação
nitrogênio-carbono com outros anéis aromáticos.9,10 Com relação às características físicoquímicas, este fármaco é um pó cristalino de cor branca, pouco solúvel em água (8 mg/mL) e
apresenta ponto de fusão entre 138 e 140 °C.11
A atividade antifúngica e a solubilidade do fluconazol em água são aumentadas devido
à presença de um grupo halogênio-fenil, o que também proporciona uma maior
biodisponibilidade da droga. Além do mais, a estabilidade metabólica do fármaco é
consequência da combinação de três elementos estruturais: (i) resistência dos anéis
triazólicos ao ataque oxidativo; (ii) bloqueio da hidroxilação aromática pela presença dos dois
átomos de flúor e (iii) impedimento estérico da hidroxila, um sítio de possível conjugação.2,7
Mesmo tendo um largo espectro de ação antifúngico, a eficácia do FLU tem sido
prejudicada devido ao surgimento de resistência dos fungos. Além disso, outra preocupação
referente ao uso do fármaco é a toxicidade causada em recém-nascidos, quando este é usado
por um longo prazo.1,12 Outra desvantagem está relacionada à sua baixa solubilidade aquosa,
1
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
a qual limita a sua dissolução e, por consequência, também limita a sua eficácia terapêutica.
Assim, uma alternativa para superar esses problemas é o desenvolvimento de sistemas
supramoleculares de liberação controlada por meio de agentes complexantes como
calix[n]arenos e ciclodextrinas, formando complexos de inclusão hidrossolúveis.11
1.2.
CALIX[N]ARENOS E CICLODEXTRINAS: SISTEMAS DE LIBERAÇÃO
CONTROLADA
Calix[n]arenos (CLXs), juntamente com ciclodextrinas (CDs), constituem interessantes
macrociclos orgânicos do ponto de vista da Química Supramolecular.13 Especialmente na área
de biomateriais, as CDs e os CLXs, os quais são considerados importantes blocos
construtores em estruturas supramoleculares, encontram importantes aplicações devido a
suas características multifuncionais, sua capacidade de auto-organização e bioadaptação.14,15
Os CLXs apresentam em sua estrutura unidades fenólicas ligadas por pontes
metilênicas nas posições orto à hidroxila (Figura 2(a)) que combinam uma região polar
(hidrofílica) e uma apolar (hidrofóbica). O nome calix[n]areno (calix = cálice) provém de sua
topografia na forma de um cálice ou cone truncado, que permite a inclusão de vários
substratos de interesse em sua cavidade hidrofóbica (Figura 2(b)), dando origem aos
chamados compostos de inclusão do tipo hóspede–hospedeiro.13 O (n) em sua nomenclatura
representa o número de unidades fenólicas. Os calix[n]arenos mais comuns são o
calix[4]areno, calix[6]areno e o calix[8]areno.14
(a)
(b)
Figura 2. (a) Estrutura geral dos calix[n]arenos; (b) representação esquemática da estrutura
tridimensional dos calix[n]arenos.
As CDs, por sua vez, são oligossacarídeos cíclicos formados por unidades de D–
glicose unidas por ligações covalentes α–(1,4) (Figura 3(a)). A estrutura dessas moléculas
possui a forma de uma seção de cone com as hidroxilas secundárias das posições C2 e C3
2
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
direcionadas para o lado mais largo da seção e as hidroxilas primárias em C6 voltadas para
a parte mais estreita da seção (Figura 3(b)). A estrutura cíclica das CDs cria uma cavidade de
dimensão variada (diâmetro de aproximadamente 5,7 a 9,5 Å) definida pelos oxigênios
glicosídicos e hidrogênios nas posições C3 e C5. A dimensão da cavidade é dependente do
número de unidades de D–glicose na estrutura, sendo que as CDs com 6, 7 e 8 monômeros
de D–glicose são as mais comuns, denominadas α–, β– e –CD, respectivamente.16
(a)
(b)
Figura 3. (a) Estrutura geral das ciclodextrinas: α,  e -–ciclodextrina, com n = 1, 2 e 3, respectivamente;
(b) representação esquemática da estrutura tridimensional de ciclodextrinas.
Do ponto de vista de aplicação, tanto as CDs quanto os CLXs têm sido utilizados com
sucesso no encapsulamento de moléculas bioativas e compostos de interesse com objetivos
que vão desde a facilitação do reconhecimento de macromoléculas até a promoção do
transporte ativo de substâncias para liberação controlada.14,17,18
No que se refere à formação de compostos de inclusão do tipo hóspede–hospedeiro,
as formulações com CLXs e CDs podem acarretar em novos sistemas com propriedades
físicas, químicas e biológicas melhoradas em comparação aos já existentes devido,
especialmente, à proteção molecular adquirida pelo princípio ativo, que está inserido no
sistema macromolecular.17 Dentre estas propriedades destacam-se: (i) aumento da
estabilidade das moléculas hóspedes inclusas contra hidrólise, oxidação e fotodecomposição;
(ii) aumento da solubilidade das moléculas inclusas em água; (iii) liberação melhorada; (iv)
aumento da biodisponibilidade; (v) prevenção da evaporação.
No processo de inclusão molecular envolvendo moléculas de interesse, como CLXs e
CDs, o principal requisito para que ocorra efetivamente a formação de um complexo de
3
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
inclusão, é que, a princípio, a molécula hóspede se adapte à cavidade da molécula
hospedeira, parcial ou totalmente.12 A estabilidade dos complexos de inclusão é decorrente
da formação de interações intermoleculares não-covalentes, como ligações de hidrogênio,
interações eletrostáticas, forças de van der Waals, interações dipolo-dipolo, interações –
stacking.13–18
1.3.
A
QUÍMICA
COMPUTACIONAL
NO
ESTUDO
DE
SISTEMAS
SUPRAMOLECULARES
Nos últimos anos, com o surgimento e aprimoramento de computadores de grande
capacidade de cálculo numérico, o uso de métodos computacionais tem se revelado uma
ferramenta poderosa na resolução de problemas de interesse geral em química.19 Os desafios
da Química Computacional estão em caracterizar e predizer a estrutura e estabilidade de
sistemas químicos, calcular energia e diferença de energia entre estados diferentes, e explicar
mecanismos de reação no nível atômico e molecular.19
A Química Computacional vem contribuindo de forma relevante na busca do
entendimento
estrutural,
dinâmico
e
do
comportamento
químico
das
espécies
supramoleculares formadas a base de CLXs e CDs. Há um número significativo de trabalhos
na literatura utilizando metodologias teóricas e computacionais direcionados ao estudo de
CLXs, CDs e seus complexos de inclusão.19–28 A maioria destes fornece informações a
respeito de estrutura e dinâmica dessas moléculas. Do ponto de vista da química teórica, os
resultados destes estudos têm contribuído para o desenvolvimento e generalização dos
métodos de cálculo, permitindo estabelecer metodologias adequadas para o estudo de tais
compostos supramoleculares.19–28
Neste contexto, é importante ressaltar que a adequação física e química da teoria na
descrição de um tipo de interação não é suficiente para a definição da metodologia teórica,
sendo a dimensão do sistema um fator importante. Na química de CDs, os sistemas são
supramoleculares e nano-estruturados, portanto, a metodologia adequada deve ter o
compromisso de fornecer resultados quimicamente precisos e permitir estudos sistemáticos
em um tempo relativamente pequeno.20
A descrição exata das propriedades moleculares de interesse, sobretudo as interações
intermoleculares, necessita de níveis de teoria ab initio sofisticados, considerados hoje como
o estado da arte em cálculos de estrutura eletrônica. Entretanto, cálculos nesses níveis para
sistemas supramoleculares de grandes dimensões (mais de 100 átomos) não são viáveis com
os recursos computacionais disponíveis no LQTC (Laboratório de Química Teórica e
Computacional da UFSJ). Sendo assim, existem métodos e metodologias alternativas
utilizados na tentativa de se manter um compromisso entre qualidade dos resultados e o custo
4
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
computacional. Metodologias sequenciais têm sido utilizadas nos últimos anos pelo Prof.
Clebio Soares Nascimento Júnior. Nestes trabalhos as geometrias e contribuições térmicas
para as propriedades termodinâmicas são calculadas utilizando métodos semi-empíricos e a
energia eletrônica obtida de cálculos utilizando a Teoria do Funcional de Densidade (DFT). 29–
41
2.
OBJETIVOS
Partindo-se da hipótese de que a administração de fluconazol na forma de compostos
de inclusão com calix[n]arenos e/ou ciclodextrinas possa facilitar o transporte e liberação da
droga no organismo, melhorando, consequentemente, sua solubilidade e biodisponibilidade
no meio biológico, o presente trabalho teve por objetivo a realização de uma investigação
teórica do processo de inclusão do fluconazol (molécula hóspede) em diferentes
calix[n]arenos
e
ciclodextrinas
(moléculas
hospedeiras),
visando
estabelecer,
essencialmente, como o tipo de molécula hospedeira pode influenciar na estabilidade do
fármaco incluso levando a complexos de inclusão mais estáveis energeticamente.
Nesse sentido, a principal contribuição da teoria é possibilitar uma análise no nível
molecular das diferentes formas de inclusão possíveis, fornecendo estruturas e propriedades
moleculares importantes para a identificação do modo de inclusão e da termodinâmica de
inclusão.
3.
METODOLOGIA
Todas as moléculas hospedeiras (ácido p–sulfônico calix[4]areno, ácido p–sulfônico
calix[6]areno, –ciclodextina e –ciclodextrina), cujas estruturas estão apresentadas na Figura
4; a molécula hóspede, fluconazol (ver Figura 1), bem como os respectivos complexos de
inclusão formados na estequiometria 1:1 (Figura 5) foram completamente otimizados, no
vácuo, por meio do método semi-empírico PM3. Todas as estruturas foram caracterizadas, na
fase gasosa, como mínimos verdadeiros na Superfície de Energia Potencial (PES) por meio
da análise das frequências harmônicas.
Os cálculos de frequências harmônicas PM3 foram também realizados com o intuito
de se obter as correções térmicas para as energias e, consequentemente, as propriedades
termodinâmicas do processo, tais como a variação da energia livre de Gibbs (G) à 1 atm e
298 K. Além disso, foram feitos cálculos no ponto utilizando a Teoria do Funcional de
Densidade (DFT) por meio do funcional BLYP, com o conjunto de base 6–31G(d,p), contendo
funções de polarização em todos os átomos (BLYP/6-31G(d,p)//PM3). A escolha do funcional
BLYP deve-se à nossa experiência com DFT, a qual tem mostrado que esse tipo de funcional
5
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
descreve de forma razoável sistemas que possuem interações eletrostáticas fortes. Todos os
cálculos foram realizados utilizando-se o pacote computacional Gaussian 2009.42
Figura 4. Estruturas das moléculas hospedeiras: ácido p–sulfônico calix[4]areno (Calix4), ácido p–sulfônico
calix[6]areno (Calix6), –ciclodextina (–CD) e –ciclodextrina (–CD).
CLXs ou CDs
FLU
Complexo de inclusão
Figura 5. Representação esquemática da formação dos complexos de inclusão formados entre a molécula
hóspede (fluconazol) e as moléculas hospedeiras (calix[n]arenos ou ciclodextrinas).
6
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
Dois modos de inclusão foram propostos: (i) Modo 1: inclusão do hóspede na cavidade
das moléculas hospedeiras por meio do anel contendo os átomos de flúor e (ii) Modo 2:
inclusão do hóspede por meio do anel contendo o átomos de nitrogênio, conforme
esquematizado na Figura 6.
Figura 6. Modos de inclusão propostos.
Os resultados fornecidos pelos cálculos PM3 e DFT permitiram a obtenção da variação
da energia de interação (Eelet-nuc) e da variação da energia livre de Gibbs (G), que foram
utilizadas para determinar como parâmetros para determinar a estabilidade dos complexos
formados. A variação da energia de interação foi calculada utilizando-se a Equação 1:
∆𝐄𝐢𝐧𝐜𝐥𝐮𝐬ã𝐨 = Ecomplexo (FLU…CLX) − (Ehóspede (FLU) + Ehospedeira (CLX) )
(1)
De forma análoga, a variação da energia livre de Gibbs foi estimada por meio da Equação 2:
∆𝐆𝐢𝐧𝐜𝐥𝐮𝐬ã𝐨 = Gcomplexo (FLU…CLX) − (Ghóspede (FLU) + Ghospedeira (CLX) )
4.
4.1.
(2)
RESULTADOS E DISCUSSÃO
ESTRUTURA DAS MOLÉCULAS HÓSPEDE E HOSPEDEIRAS
Inicialmente, todas as moléculas hospedeiras (CLXs e CDs) e a molécula hóspede
(FLU) foram otimizadas, na fase gasosa, por meio do método semiempírico PM3. As
estruturas otimizadas para essas espécies são mostradas nas Figuras 7, 8 e 9.
7
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
Figura 7. Estrutura do fluconazol otimizada pelo método semi-empírico PM3 apresentada
em duas visões espaciais.
(a)
(b)
Figura 8. Estruturas otimizadas pelo método semi-empírico PM3 com seus respectivos diâmetros de cavidade:
(a) ácido p-sulfônico calix[4]areno e (b) ácido p-sulfônico calix[6]areno.
8
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
(a)
(b)
Figura 9. Estruturas otimizadas pelo método semi-empírico PM3 com seus respectivos diâmetros de cavidade:
(a) –ciclodextrina e (b) –ciclodextrina.
Como pode ser observado nas Figuras 8 e 9, as moléculas hospedeiras apresentam
geometrias espaciais bem favoráveis para acomodação da molécula hóspede em seu interior.
Para os CLXs nota-se claramente a estrutura tridimensional na forma cônica. Já para as CDs,
essa estrutura na forma de cone não é tão aparente visualmente, porém, é possível perceber
por meio da análise dos diâmetros que os lados menor e maior da cavidade são distintos
(Figura 9).
4.2.
ANÁLISE
ESTRUTURAL
E
ENERGÉTICA
DOS
COMPLEXOS
DE
INCLUSÃO FORMADOS ENTRE O FLUCONAZOL E OS CALIX[n]ARENOS
4.2.1. ANÁLISE ESTRUTURAL
As estruturas otimizadas dos complexos de inclusão envolvendo o ácido p-sulfônico
calix[4]areno e o fluconazol, considerando os dois modos de inclusão propostos, são
mostradas na Figura 10.
9
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
(a)
(b)
Figura 10. Estruturas otimizadas dos complexos [calix4...FLU] considerando os dois modos de inclusão:
(a) Modo 1 e (b) Modo 2
Geometricamente pode-se admitir que há três maneiras de se analisar a inclusão da
molécula hóspede na hospedeira: (i) não inclusão: quando os anéis da molécula hóspede
estão completamente fora da cavidade do hospedeira; (ii) inclusão parcial: quando apenas
uma parte de um dos anéis do hóspede encontra-se incluso na cavidade do hospedeiro; e (iii)
inclusão total: quando um dos anéis do hóspede está totalmente incluso na cavidade do
hospedeiro. Sendo assim, observando-se as estruturas dos complexos [calix4...FLU] na
10
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
Figura 10, percebe-se claramente que em ambos os modos propostos (Modo 1 e Modo 2) não
há formação de um complexo de inclusão típico, mas sim de um tipo de complexo de
associação, no qual a molécula hóspede se “liga” à hospedeira via interação intermolecular,
permanecendo fora da cavidade. Inicialmente, é possível incluir o FLU na cavidade do calix4,
porém, após a otimização do complexo, o fármaco é “expulso” de dentro da cavidade, não
havendo, assim, formação de complexo de inclusão típico. Isso se justifica porque a molécula
hóspede não se adequa espacialmente dentro da cavidade da molécula hospedeira, devido
ao impedimento estérico por ela encontrado. Além disso, a repulsão eletrônica dentro da
cavidade entre os átomos de hidrogênio do FLU e do calix4 também contribui para que o FLU
não permaneça incluso no calix4. Sendo assim, é quimicamente preferível ao fármaco
permanecer fora da cavidade e, portanto, a inclusão do FLU no calix4 torna-se inviável. Como
também pode ser verificado na Figura 10, os complexos formados, nos dois modos distintos
de inclusão, apresentam uma ligação de hidrogênio intermolecular do tipo N...H, a qual
contribui para estabilidade dos mesmos.
Na Figura 11, são mostradas as estruturas otimizadas dos complexos de inclusão
envolvendo o ácido p-sulfônico calix[6]areno e o fluconazol, considerando os dois modos de
inclusão propostos. Percebe-se que neste caso há formação de complexo de inclusão típico,
uma vez que há a inserção da molécula hóspede na cavidade da hospedeira.
Como pode ser visto na Figura 11 (a), para o complexo de inclusão [calix6...FLU],
considerando o Modo 1 de inclusão, o anel contendo os átomos de flúor fica completamente
incluso na cavidade do calix6. Além disso, percebe-se que há também uma inclusão parcial
de um dos anéis que contém átomos de nitrogênios. Esse complexo de inclusão apresenta
uma ligação de hidrogênio intermolecular do tipo N...H, a qual contribui para a sua estabilidade
energética.
Observando–se a Figura 11 (b), para o complexo de inclusão [calix6...FLU] no Modo
2 de inclusão, nota-se que o anel contendo átomos de nitrogênio incluso se adequa
espacialmente dentro cavidade do calix6. Este complexo apresenta uma ligação de hidrogênio
intermolecular, do tipo O...H, a qual contribui para sua estabilidade energética.
11
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
(a)
(b)
Figura 11. Estruturas otimizadas dos complexos [calix6...FLU] considerando os dois modos de inclusão:
(a) Modo 1 (b) Modo 2.
12
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
4.2.2. ANÁLISE ENERGÉTICA
Até o momento, os complexos foram descritos com base apenas em seus aspectos
estruturais. Porém, uma análise focando em valores energéticos, referentes ao processo de
formação dos complexos, envolvendo as moléculas hóspedes e hospedeiras, torna-se
importante para inferirmos sobre a estabilidade destes. Neste contexto, as energias de
interação no vácuo (Eele-nuc) e as propriedades termodinâmicas na fase gasosa (1 atm e 298
K), tais como as energias livre de Gibbs (G), foram calculadas para o processo de inclusão
do FLU com os dois tipos de CLXs.
A Tabela 1 mostra as energias de interação relativas (E) e as energias livre de Gibbs
relativas (G) dos complexos de inclusão considerando os CLXs como moléculas
hospedeiras. Por meio dos dados energéticos expressos na Tabela 1, é notável que para o
Modo 1 de inclusão o complexo [calix6...FLU] é energeticamente mais estável por cerca de
6,0 kcal.mol-1. A justificativa para a maior estabilidade desse complexo, em detrimento ao
complexo [calix4...FLU], é devido ao fato de que no complexo [calix6...FLU] o anel contendo
os átomos de flúor encontra-se incluso na cavidade do calix6, proporcionando assim, o
estabelecimento de interações intermoleculares dentro e fora da cavidade entre as moléculas
hóspede e hospedeira. Verifica-se uma ligação de hidrogênio do tipo N...H e interações –
stacking observadas entre os anéis benzênicos, as quais estabilizam mais esse complexo (ver
Figura 11 (a)). Já no complexo [calix4...FLU], percebe-se que a molécula hóspede encontrase fora da cavidade formando uma ligação de hidrogênio com a molécula hospedeira, gerando
um tipo de complexo de associação (ver Figura 10 (a)).
Tabela 1. Energias de interação relativas (E) e energias livre de Gibbs relativas
(G) calculadas para os complexos de inclusão do FLU em CLXs, em função do
modo de inclusão.
Modo de
Fluconazol com ácido
ΔΔEelet-nuc (rel.) /
ΔΔG(rel.) /
inclusão
p-sulfônico
kcal.mol-1
kcal.mol-1
calix[4]areno
8,711
6,277
calix[6]areno
0
0
calix[4]areno
0
0
calix[6]areno
9,212
10,516
1
2
Por outro lado, analisando-se os resultados energéticos referentes ao Modo 2 de
inclusão, percebe-se uma maior estabilidade (cerca de 10 kcal.mol-1) para o complexo
13
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
[calix4...FLU]. Embora este não seja um complexo de inclusão típico, e sim um complexo de
associação (ver Figura 10 (b)), há neste complexo a formação de uma forte ligação de
hidrogênio do tipo N...H (1,77 Å), a qual contribui muito mais para estabilidade deste complexo
em comparação às forças intermoleculares existentes no complexo [calix6...FLU] (ver Figura
11(b)).
É importante ressaltar que como a inclusão do FLU no calix4 forma um complexo de
associação, este processo se torna inviável do ponto de vista de proposição de um sistema
carreador de liberação controlada, uma vez que o FLU não estará inserido dentro da cavidade,
e continuará, portanto, não encapsulado e com características apolares. Assim, analisando
apenas os dois modos de inclusão para o complexo [calix6...FLU] (Tabela 2 e Figura 11)
conclui-se que a inclusão do FLU pelo Modo 1 é mais favorável que pelo Modo 2, uma vez
que este complexo é estabilizado por distintas forças intermoleculares, as quais se tornam
mais intensas devido à presença dos átomos de flúor, que é altamente eletronegativo, dentro
da cavidade. Além disso, a profundidade de inclusão também contribui significativamente para
a maior estabilidade do complexo formado pelo Modo 1.
Tabela 2. Energias de interação relativas (E) e energias livre de Gibbs relativas
(G) calculadas para os complexos de inclusão do FLU em ácido p–sulfônico
calix[6]areno.
Fluconazol com
ácido p-sulfônico
Modo de
ANÁLISE
-1
ΔΔG(rel.) /
inclusão
kcal.mol
1
0
0
2
7,201
10,241
calix[6]areno
4.3.
ΔΔEelet-nuc (rel.) /
ESTRUTURAL
E
ENERGÉTICA
kcal.mol-1
DOS
COMPLEXOS
DE
INCLUSÃO FORMADOS ENTRE O FLUCONAZOL E AS CICLODEXTRINAS
4.3.1. ANÁLISE ESTRUTURAL
As estruturas otimizadas dos complexos de inclusão envolvendo a –CD,
considerando os dois modos de inclusão propostos, são mostradas na Figura 12.
14
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
(a)
(b)
Figura 12. Estruturas otimizadas dos complexos [–CD...FLU] considerando os dois modos de inclusão:
(a) Modo 1: visões lateral e frontal e (b) Modo 2: visões lateral e frontal.
Como pode ser observado na Figura 12 (a) o complexo [–CD...FLU], considerando o
Modo 1, mostra que o anel contendo átomos de flúor encontra-se parcialmente incluso na
15
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
cavidade da CD. Verifica-se a formação de um complexo de inclusão típico, com 3 ligações
de hidrogênio intermoleculares estabelecidas entre a –CD e o FLU para a inclusão no Modo
1, e 2 ligações para a inclusão no Modo 2.
A Figura 13, mostra as estruturas otimizadas dos complexos de inclusão envolvendo
a –CD ciclodextrina, considerando os dois modos de inclusão propostos.
Analisando o complexo [–CD...FLU] pelo Modo 1 (Figura 13(a)), fica evidente a
formação de um complexo de inclusão típico contendo 1 ligação de hidrogênio intermolecular
do tipo O...H. Percebe-se ainda que o anel contendo os átomos de flúor está completamente
incluso na cavidade e há uma inclusão parcial de um dos anéis contendo átomos de
nitrogênio.
Já o complexo [–CD...FLU] com inclusão pelo Modo 2 (Figura 13(b)), apresenta uma
inclusão profunda de um dos anéis contendo átomos de nitrogênio da molécula hóspede e
uma inclusão parcial do anel que contém os átomos de flúor. Este complexo possui 3 ligações
de hidrogênio intermoleculares, do tipo F...H e O...H.
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Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
(a)
(b)
Figura 13. Estruturas otimizadas dos complexos [–CD...FLU] considerando os dois modos de inclusão:
(a) Modo 1: visões lateral e frontal e (b) Modo 2: visões lateral e frontal.
17
Monografia de TCC – Química – Bacharelado – UFSJ - 2014
4.3.2. ANÁLISE ENERGÉTICA
A mesma análise energética feita para os complexos com CLXs, também foi feita para
os complexos envolvendo CDs como moléculas hospedeiras e os dados energéticos
encontram-se sumarizados na Tabela 3.
Tabela 3. Energias de interação relativas (E) e energias livre de Gibbs relativas
(G) calculadas para os complexos de inclusão do FLU em CDs, em função do
modo de inclusão.
Modo de
ΔΔEelet-nuc (rel.) /
ΔΔG(rel.) /
kcal.mol-1
kcal.mol-1
–ciclodextrina
0
0
–ciclodextrina
2,921
5,174
–ciclodextrina
11,182
10,574
–ciclodextrina
0
0
Fluconazol com
inclusão
1
2
De acordo com a Tabela 3, pode-se notar que para a inclusão do FLU, considerando
o Modo1, o complexo mais estável é o [–CD...FLU] por cerca de 5,0 kcal.mol-1. Isso se deve
ao fato de haver um maior número de ligações de hidrogênio (3 ligações de hidrogênio dos
tipos F...H e N...H) estabelecidas entre o FLU e a –CD (ver Figura 12(a)), as quais contribuem
para uma maior estabilidade deste complexo em comparação ao complexo [–CD...FLU], o
qual apresenta apenas uma ligação de hidrogênio do tipo O...H (ver Figura 13 (a)).
Ao se analisar os dados energéticos para Modo 2 de inclusão (Tabela 3), percebe-se
que há agora uma maior estabilidade energética para o complexo [–CD...FLU] por cerca de
10,0 kcal.mol-1. Este complexo apresenta mais ligações de hidrogênio intermoleculares que o
complexo [–CD...FLU]. Além disso, para o complexo [–CD...FLU] verificam-se duas ligações
de hidrogênio fortes do tipo F...H (ver Figura 13 (b)), enquanto que no complexo [–CD...FLU]
há apenas uma (ver Figura 12 (b)). Outro fator que contribui para a diferença em estabilidade
entre os dois complexos é a profundidade de inclusão do FLU na –CD. Nitidamente, no
complexo [–CD...FLU] nota-se uma profunda inclusão de um dos anéis contendo átomos de
nitrogênio da molécula hóspede, o que proporciona um maior número de interações
intermoleculares estabelecidas dentro da cavidade (ver Figura 13 (b)).
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Por fim, quando são analisados os dois modos de inclusão do FLU na – e –CD, por
meio dos dados expressos na Tabela 4, verifica-se que a inclusão pelo Modo1, na –CD é
mais favorável energeticamente. A explicação para isso reside no fato de que as interações
intermoleculares estabelecidas entre o FLU e a –CD, pelo Modo 1 de inclusão, além de
serem mais numerosas, são também mais fortes e mais eletrostáticas, uma vez que os átomos
de flúor, altamente eletronegativos, presentes dentro da cavidade, contribuem sensivelmente
para tornar tais interações intermoleculares mais intensas, estabilizando assim, os complexos
formados.
Tabela 4. Energias de interação relativas (E) e energias livre de Gibbs relativas
(G) calculadas para os complexos de inclusão do FLU em CDs.
Modo de
ΔΔEelet-nuc (rel.) /
ΔΔG(rel.) /
kcal.mol-1
kcal.mol-1
–ciclodextrina
0
0
–ciclodextrina
2,921
5,174
–ciclodextrina
18,718
22,942
–ciclodextrina
7,536
12,369
Fluconazol com
inclusão
1
2
5.
CONCLUSÃO
Os cálculos PM3 e DFT/BLYP/6-31G(d,p) descreveram satisfatoriamente o processo
de inclusão do fluconazol nos calix[n]arenos e nas ciclodextrinas, em ambos os modos de
inclusão. Os resultados mostraram que na inclusão do FLU no calix4 há a formação de
complexos de associação, devido a impedimento estérico e também devido às repulsões
eletrônicas encontradas pelo FLU dentro da cavidade do calix4. Já para os complexos do FLU
com calix6, formam-se complexos de inclusão típicos com a molécula hóspede, a qual
encontra-se inserida parcialmente dentro da cavidade, sendo o complexo [FLU...calix6], pelo
Modo1 de inclusão, o mais favorável energeticamente.
O processo de inclusão considerando as moléculas hospedeiras  e –CDs, por outro
lado, mostrou-se bastante efetivo. Por meio dos resultados obtidos foi possível mostrar que
tanto para os complexos formados com –CD, quanto para os complexos formados com –
CD o Modo 1 de inclusão é energeticamente mais estável.
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Um fato importante que deve ser ressaltado é que a presença do anel, contendo os
átomos de flúor dentro da cavidade, contribui significativamente para que o Modo 1 de
inclusão seja mais estável para os complexos de inclusão envolvendo as duas moléculas
hospedeiras (CLXs e CDs). Além disso, as interações intermoleculares estabelecidas,
especialmente as ligações de hidrogênio do tipo F...H, desempenharam um papel
fundamental na estabilidade dos complexos formados. E, finalmente, observa-se que quanto
maior a cavidade da molécula hospedeira mais efetiva é a inclusão, e melhor a acomodação
do hóspede em seu interior, o que também proporciona estabilidade ao complexo.
Como perspectiva uma análise incluindo-se o efeito solvente torna-se necessária para
uma descrição mais realista do processo.
6.
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INVESTIGAÇÃO TEÓRICA DO PROCESSO DE INCLUSÃO