VITÓRIA, ES, SEXTA-FEIRA, 18 DE SETEMBRO DE 2015 ATRIBUNA 25 Economia AGÊNCIA CÂMARA CRISE NO BRASIL Legalização seria aprovada, diz Cunha BRASÍLIA presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDBRJ), ironizou no fim da tarde de ontem a ideia do governo regularizar os jogos de azar, mas admitiu que sua posição não é majoritária na Casa. “Vamos depender da sorte dos outros.” Crítico do plano de ajuste apresentado pelo governo, Cunha voltou a defender que a saída se dê via corte de gastos. “O governo vai buscar toda forma de receita. Eu particularmente sou contrário, mas acho que tem boas chances de aprovar. Não vejo uma posição como a minha ser predominante, mas se dependermos disso para regularizar as contas públicas, estamos de novo tangenciando o problema. O problema é que o governo não corta seus gastos”, avaliou. Na manhã de ontem, a presidente Dilma Rousseff consultou deputados da base aliada sobre a proposta de legalizar os jogos de azar. Até semana que vem, os líderes devem apresentar ao Palácio do Planalto o posicionamento de suas O bancadas. A proposta inicial foi do senador Benedito de Lira (PP-AL), que semana passada apresentou a ideia em reunião com o governo. “O país que depende de um jogo de azar para resolver sua conta, é como o trabalhador que não tem salário e vai para o cassino ganhar o dinheiro para poder pagar sua despesa. Não podemos ir para o cassino para poder pagar nossa despesa”, criticou Cunha. O projeto determina que entre 60% e 70% do arrecadado vá para a premiação, 7% para os estados, 3% para os municípios, e o restante, para a empresa autorizada a explorar a atividade do jogo. Segundo Benedito, a proposta geraria uma arrecadação de R$ 20 bilhões ao ano. Caso o governo encampe a ideia, a tendência é que altere o texto reservando parte da tributação para a União. O senador conta ter entregue uma cópia ao ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, na semana passada, sendo que a própria Dilma também teria solicitado uma na última segunda. Conforme relatos de outro senador, no primeiro momento, a pro- EDUARDO CUNHA criticou ideia de regularizar os jogos de azar, mas admitiu que sua posição não é majoritária posta foi vista com ressalvas pela Presidente, mas “na segunda reunião falou-se com naturalidade”. No início de seu primeiro mandato, o ex-presidente Lula foi favorável à legalização de bingos como forma de arrecadação. O governo acabou recuando após o escândalo Waldomiro Diniz, o ex-assessor da Casa Civil flagrado cobrando propina do empresário dos jogos Carlos Cachoeira. Jogos de azar movimentam 1,8 trilhão DIVULGAÇÃO SÃO PAULO Se você já teve vontade de ir a Las Vegas, nos Estados Unidos, ou a Macau, na China, para fazer uma “fezinha” e, quem sabe, tirar a sorte grande em um jogo de azar, saiba que não está sozinho. Proibida no Brasil, a indústria global de apostas em jogos de azar vem crescendo de forma massiva nos últimos tempos. Somente neste ano, os ganhos brutos com este mercado devem resultar em um total de US$ 488 bilhões (R$ 1,8 trilhão), segundo dados da empresa de pesquisa global em jogos de azar H2 Gambling Capital publicados pela Forbes e pela revista The Economist. A pesquisa mostrou que o mercado de apostas dos Estados Unidos é o maior do mundo. Só em CASSINO: mercado de apostas dos Estados Unidos é o maior do mundo 2014, apostadores gastaram US$ 142,6 bilhões (R$ 553,2 bilhões) em jogos na Terra do Tio Sam. Embora a China tenha apresentado queda após repetidas denún- cias de corrupção, continua em segundo lugar no quesito apostas em jogos de azar: foram US$ 95,4 bilhões (R$ 371,1 bilhões) em 2014. Ainda de acordo com o ranking, PAÍSES EM QUE JOGOS DE AZAR SÃO LIBERADOS Estados Unidos Uruguai Itália China França O mercado de apostas dos Estados Unidos é o maior do mundo. Só em 2014 apostadores investiram US$ 142,6 bilhões (R$ 553,2 bilhões) em jogos no país. A cidade de Las Vegas, no estado de Nevada, é a “Meca” dos jogos de azar. Em 2014, os cassinos do Uruguai movimentaram cerca de US$ 235 milhões (R$ 911,8 milhões), além de terem empregado mais de 1.200 funcionários, segundo o Casinos del Estado Uruguay, órgão ligado ao Ministério de Economia do país. Em 2004, os legisladores tornaram a regulamentação da indústria do jogo significativamente menos rígida. Desde então, a Itália se tornou o maior mercado de jogos de azar na Europa e o quarto maior do mundo. Embora o forte mercado chinês neste segmento tenha apresentado queda, o país continua em segundo lugar no planeta no quesito apostas em jogos de azar. No ano passado, foram movimentados US$ 95,4 bilhões (R$ 370 bi). Embora permita apostas em corridas de cavalo, pôquer e em esportes desde 2010, a lei é nebulosa em relação a outros tipos de apostas. Já a Bélgica apenas permite sites de apostas licenciados pela comissão de jogos do governo. Fonte: Forbes, Associação Brasileira de Empresas de Eventos, Gambling Compliance. os apostadores brasileiros perderam US$ 4,1 bi (R$ 15,9 bi) em 2014, segundo a revista Época. Já os australianos são os que mais apostam (e perdem): aproximadamente US$ 1.130 (R$ 4.384) para cada adulto no país. A compulsão é explicada pela enorme quantidade de casas de apostas para os mais variados esportes e fins (como corrida de baratas). É possível apostar em lojas, pela internet e até pelo telefone. A maior parte do dinheiro se perde em caça-níqueis: o país tem a maior concentração dessas máquinas em todo o mundo e uma pessoa pode perder até US$ 1.500 (R$ 5.820) em uma hora – ainda que as leis tenham regulado o mercado a ponto de fazer com que o país caísse para a sexta posição no ranking geral. Já nos Estados Unidos, em Cingapura e em outros países onde o jogo é oficializado, os cassinos são os maiores culpados pela lamentação dos apostadores. Na Finlândia, Irlanda e Noruega, os sites de apostas são os mais populares. APOSTAS Os Estados Unidos continuam sendo o maior mercado de jogos de azar, mas sua fatia está caindo justamente devido ao crescimento das chamadas apostas interativas (cassinos on-line e sites). Apesar da regulamentação em Macau, o mercado chinês continua crescendo, a ponto de saltar da décima para a segunda posição em dez anos. Mesmo com a alta no mercado, a indústria de apostas e loterias deve faturar 2,6% menos em 2015 – caindo para US$ 488 bi (R$ 1,8 trilhão), segundo a H2 Gambling Capital. ANÁLISE Arilda Teixeira, economista e professora da Fucape Objetivo do governo é onerar a sociedade “Não vejo problema e nem preocupação na proposta do governo federal de legalizar os jogos de azar como forma de arrecadar dinheiro, como fonte de receita. Na verdade, o governo só vai tirar da ilegalidade uma prática que já é bastante comum no País, que movimenta dinheiro porém sem impostos, pois está camuflada. Acho que é uma atividade como qualquer outra e que pode ser taxada com impostos. Porém, vejo que essa proposta só ressalta, ainda mais, que o governo não quer cortar gastos, só quer aumentar a receita, tributar a economia. Legalizar os cassinos e bingos não vai gerar empregos, não é pelo bem do País e da sociedade, apenas é uma fonte de receita. Não se vê, em nenhum momento, o governo conversar ou propor algo que diminua o tamanho da máquina estatal. Isso sim é negativo e vejo com preocupação. O governo está resistente e o que deve ser ressaltado dessa ação é o objetivo de só querer onerar a sociedade. Seguindo essa lógica, o que se espera é que cada dia o governo federal apresente uma nova forma de tributar. Se essa proposta de fato vai passar, se será aceita pelos deputados, ainda é cedo para saber. O governo ainda está sondando alguns aliados. Mesmo no caso de ser legalizado, não é suficiente para equacionar o déficit público, uma vez que os gastos não param de crescer”.