INDUÇÃO MATEMÁTICA Indução Matemática é um método de prova matemática tipicamente usado para estabelecer que um dado enunciado é verdadeiro para todos os números naturais, ou então que é verdadeiro para todos os membros de uma seqüência infinita. Esse método funciona provando que o enunciado é verdadeiro para um valor inicial, e então provando que o processo usado para ir de um valor para o próximo é valido. Se ambas as coisas são provadas, então qualquer valor pode ser obtido através da repetição desse processo. Para entender por que os dois passos são suficientes, é útil pensar no seguinte problema: Você está subindo uma escada infinitamente alta. Como saber que será capaz de chegar a um degrau arbitrariamente alto? Suponha as seguintes hipóteses: 1. Você consegue alcançar o primeiro degrau; 2. Uma vez chegando a um degrau, você sempre é capaz de chegar ao próximo. Pela hipótese 1, você é capaz de chegar ao primeiro degrau; pela hipótese 2, você consegue chegar ao segundo; novamente pela hipótese 2, chega ao terceiro degrau; e assim sucessivamente. Outra questão interessante de se pensar é o efeito dominó: se você tem uma longa fila de dominós em pé e você puder assegurar que: 1. O primeiro dominó cairá. 2. Sempre que um dominó cair, seu próximo vizinho também cairá. Então você pode concluir que todos os dominós cairão. A forma mais simples e mais comum de indução matemática prova que um enunciado vale para todos os números naturais n e consiste do seguinte: 1. Provamos que o número 0 tem a propriedade P: P(0); 2. Supomos que a propriedade P é válida pra qualquer número natural n: P(n); 3. Provamos que, se a propriedade P é válida para qualquer número natural n, então é válida para o próximo natural n+1: P(n)→P(n+1) Primeiro Princípio de Indução Matemática O Primeiro Princípio de Indução Matemática é formulado da seguinte forma: 1. P(0) é verdade; 2. (∀ k)(P(k) é verdade →P(k+1) é verdade). Com isto, provamos que a propriedade é verdadeira para todo o natural n, ou seja, que P(n) é verdade. A tabela abaixo, resume os três passos necessários para uma demonstração que usa o primeiro princípio de indução: Demonstração por Indução Passo 1 Prove a base de indução Passo 2 Suponha P(k) Passo 3 Prove P(k+1) Exemplo 1 Prova formal por indução da seguinte equivalência: 1³ + 2³ +...+ n³ = (1 + 2 +...+ n)² Na prova da igualdade acima, utilizaremos um lema, que diz que a soma de n números naturais vale n.(n + 1)/2, ou seja: 1 + 2 + ... + n = n.(n + 1)/2 Provaremos esse lema também por indução. Prova formal do lema: • Base de indução: Para n = 0, temos que 0 = 0.1/2 = 0, então temos uma base verdadeira. • Hipótese de indução: Suponhamos que, para um k qualquer, valha que 1 + 2 + ... + k = k.(k + 1)/2 • Passo de Indução: Para o sucessor de k, ou seja, para k + 1, desejamos provar que: 1 + 2 + ... + k + (k+1) = (k + 1).[(k + 1) + 1]/2 Partimos de que: 1 + 2 + ... + k + (k+1) = = k.(k + 1)/2 + (k + 1) = = (k + 1).(k/2 + 1) = = (k + 1)(k + 2)/2 = = (k + 1).[(k + 1) + 1]/2 (hipótese de indução) (associatividade) Logo, conseguimos provar o que queríamos, pois supondo que a igualdade vale para k, provase que ela vale para k + 1, e como temos uma base, a igualdade vale para a base e para todos os seus sucessores. Então, para todos os números naturais, a igualdade é válida. Formalizando: 1 + 2 + ... + k = k.(k + 1)/2 → 1 + 2 + ... + k + (k+1) = (k + 1).[(k + 1) + 1]/2 Agora, podemos usar este lema na prova da igualdade que desejamos provar. Prova formal da igualdade da soma de n cubos de números é igual o quadrado da soma dos n números: • Base de indução : Para n = 0, temos que 0³ = 0 = 0², pois não somamos nenhum termo em ambos os lados. • Hipótese de Indução : Suponhamos que, para um k qualquer, valha que 1³ + 2³ +...+ k³ = (1 + 2 +...+ k)² • Passo de Indução : Para o sucessor de k, ou seja, para k + 1, desejamos provar que: 1³ + 2³ +...+ k³ + (k + 1)³ = [1 + 2 +...+ k + (k + 1)]² Partimos de que: 1³ + 2³ +...+ k³ + (k + 1)³ = = ( 1 + 2 +...+ k )² + ( k + 1 )³ = = [ k.( k + 1 ) / 2 ]² + ( k + 1 )³ = = k².( k + 1 )² / 2² + ( k + 1 )³ = = ( k + 1 )²/2².( k² + 2².k + 2² ) = = ( k + 1 )²/2².( k + 2 )² = = [( k + 1 ).( ( k + 1 ) + 1 ) / 2 ]² = = [ 1 + 2 +...+ k + ( k + 1 ) ]² (hipótese de indução) (lema) (associatividade) (lema) Logo, conseguimos provar o que queríamos, pois supondo que a igualdade vale para k, provase que ela vale para k + 1, e como temos uma base, a igualdade vale para a base e para todos os seus sucessores. Então, para todos os números naturais, a igualdade é válida. Formalizando: 1³ + 2³ + ... + k³ = ( 1 + 2 +...+ k )² → 1³ + 2³ +...+ k³ + (k + 1)³ = [1 + 2 +...+ k + (k + 1)]² Exemplo 2 Prova formal por indução da seguinte desigualdade: n² > 2n , ∀n ≥ 3 Na prova da desigualdade acima, utilizaremos um lema, que diz que a soma de 2n 1 números ímpares vale n², ou seja: 1 + 3 + ... + (2n – 1) = n² Provaremos esse lema também por indução. Prova formal do lema: • Base de indução: Para n = 1, temos que 1 = 1² = 1, então temos uma base verdadeira. • Hipótese de indução: Suponhamos que, para um k qualquer, valha que 1 + 3 + ... + (2k – 1) = k² • Passo de Indução: Para o sucessor de k, ou seja, para k + 1, desejamos provar que: 1 + 3 + ... + (2k – 1) + (2(k + 1) – 1) = (k + 1)² Partimos de que: 1 + 3 + ... + (2k – 1) + (2(k + 1) – 1) = k² + (2(k + 1) – 1) = k² + 2k + 1 = (k + 1)² (hipótese) Logo, conseguimos provar o que queríamos, pois supondo que a igualdade vale para k, provase que ela vale para k + 1, e como temos uma base, a igualdade vale para a base e para todos os seus sucessores. Então, para todos os números naturais a partir de 1, a igualdade é válida. Formalizando: 1 + 3 + ... + (2k – 1) = k² → 1 + 3 + ... + (2k – 1) + (2(k + 1) – 1) = (k + 1)² Agora, podemos usar este lema na prova da desigualdade que desejamos provar. Prova formal da desigualdade do quadrado de um número é maior que seu dobro: • Base de indução : Para n = 3, temos que 3² = 9 > 6 = 2.3. • Hipótese de Indução : Suponhamos que, para um k qualquer, valha que k² > 2k • Passo de Indução : Para o sucessor de k, ou seja, para k + 1, desejamos provar que: (k + 1)² > 2(k + 1) Partimos de que: (k + 1)² = k² + 2k + 1 = (lema) 1 + 3 + ... + (2k – 1) + 2k + 1 = (comutatividade) 2k + 1 + 1 + 3 + ... + (2k – 1) = (2k + 2) + 3 + ... + (2k 1) > 2k + 2 = 2(k + 1) Logo, conseguimos provar o que queríamos, pois supondo que a desigualdade vale para k, provase que ela vale para k + 1, e como temos uma base, a igualdade vale para a base e para todos os seus sucessores. Então, para todos os números naturais maiores ou iguais a 3, a desigualdade é válida. Formalizando: k² > 2k → (k + 1)² > 2(k + 1) SEGUNDO PRINCÍPIO DA INDUÇÃO MATEMÁTICA Normalmente denominada indução forte, essa formulação do princípio da indução matemática (o Segundo Princípio da Indução Matemática.) é geralmente utilizado na definição e na prova de propriedades de expressões, fórmulas, árvores, etc., razão pela qual esse princípio freqüentemente é denominado também de indução em estrutura, indução estruturada, ou ainda, indução estrutural. Definição: Seja p(n) uma proposição sobre M = {n ∈ N | n ≥ m, m ∈ N}. O Segundo Princípio da Indução Matemática pode, equivalentemente, ser definido como segue: a) Primeira Versão a.1) p(m) é verdadeira; a.2) Para qualquer k ∈ M, vale: p(m) ∧ p(m+1) ∧ ... ∧ p(k) ⇒ p(k+1) a.3) Então, para qualquer n ∈ N, p(n) é verdadeira. b) Segunda Versão. Suponha t ∈ N: b.1) p(m), p(m+1), ..., p(m+t), são verdadeiras; b.2) Para qualqur k ∈ M tal que k ≥ m+t, vale: p(m) ∧ p(m+1) ∧ ... ∧ p(k) ⇒ p(k+1) b.3) Então, para qualquer n ∈ N, p(n) é verdadeira. Note que a segunda versão do Segundo Princípio da Indução Matemática tem t casos separados na sua base, ao invés de somente o primeiro. Exemplo 3 Prova formal da fatoração em números primos: Desejamos provar por indução a seguinte afirmativa: Qualquer número natural maior que 1 é primo ou um produto de primos. Prova: m = 2 M = {2,3,4,...} • Base de Indução : 2 é primo. • Hipótese de Indução : p(2) é verdade ∧ p(3) é verdade ∧ p(4) é verdade ∧ ... ∧ p(k) é verdade • Passo de Indução : (mostrar p(k+1) supondo p(2), p(3), p(4), ..., p(k)) 2 possibilidades: 1) k+1 é primo. Como k+1 é primo, p(k+1) é verdade. 2) k+1 é composto. k+1 = a . b , 1<a<k+1, 1<b<k+1, a,b ∈ N = hipótese p(a) é verdade ∧ p(b) é verdade = p(a . b) é verdade = p(k+1) é verdade. Logo, a proposição é verdadeira e foi demonstrada pelo princípio da indução forte. Exemplo 4 Fatoração de números como produtos de 4 e 5: (∀n ∈ N)(n ≥ 12 → n = 4.a + 5.b) Prova: m = 12 M = {12, 13, 14, ...} • Base de Indução : 12 = 3.4 + 0.5 13 = 2.4 + 1.5 14 = 1.4 + 2.5 15 = 0.4 + 3.5 • Hipótese de Indução : p(12) é V ∧ p(13) é V ∧ p(14) é V ∧ ... ∧ p(k) é V • Passo de Indução : (mostrar que p(k+1) é V, supondo p(12), p(13), ..., p(k)) k+1 = (k3 + 3) + 1 = k3 + 4 = subs k3 por u u + 4 = p(u) é V (pela hipótese) p(u+4) é V = p(k3+4) é V = p(k+1) é V. Logo, a proposição é verdadeira e foi demonstrada pelo princípio da indução forte. DEFINIÇÃO INDUTIVA O Princípio da Indução Matemática pode ser usado também em definições. Uma definição de uma construção usando esse princípio é denominada definição indutiva ou definição recursiva. Nesse caso, afirmase que a construção é indutivamente definida ou recursivamente definida. Esse tipo de definição é particularmente útil para definir conjuntos (normalmente infinitos) que seguem uma certa regra para seus elementos. Resumidamente, em uma definição indutiva: • a base de indução mostra os casos elementares; • o passo de indução determina como os demais casos são definidos em termos dos anteriores (em se tratando de conjuntos, dita uma regra para que um elemento pertença ao conjunto). Exemplo 5 Múltiplos de 3 M = {..., 6, 3, 0, 3, 6, ...} 1) 3 ∈ M 2) x ∈ M → x.k ∈ M, k ∈ Z 3) Nada mais pertence ao conjunto M. Exemplo 6 Polinômios P = Conjunto dos Polinômios em x com coeficientes reais e expoentes naturais 1) 0 ∈ P 1 ∈ P x ∈ P 2) y ∈ P → y + axb ∈ P, a ∈ R, b ∈ N 3) Nada mais pertence ao conjunto P Exemplo 7 Linguagem com o dobro de "a" que de "b" P = Conjunto das palavras sobre {a,b} cuja quantidade de “a” é o dobro da quantidade de “b” 1) ε ∈ P 2) x ∈ P → xaab, xaba, xbaa, axab, axba, bxaa, aaxb, abxa, baxa, aabx, abax, baax 3) Nada mais pertence ao conjunto P