UMA ANÁLISE DOS GÊNEROS TEXTUAIS NO ENEM
Autora(1): Cícera Alves Agostinho de Sá; Coautora(1): Verônica Maria de Araújo
Pontes; Coautora(2): Stênia Costa Dantas Silva; Coautora(3): Zilda Maria Dutra Rocha
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) – [email protected]; Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte (UERN) – [email protected] ; Universidade Regional do Cariri
(URCA) – [email protected] ; Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) –
[email protected]
RESUMO
Esse estudo visa contribuir com a abordagem dos variados e finitos gêneros textuais no contexto
escolar do ensino médio, considerando a relevância da função sobre a forma para a resolução
das questões de língua portuguesa no Exame Nacional do Ensino Médio, em atendimento à
diretriz de contextualização proposta pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio.
Para isso, tomamos por base a matriz de referência da área Linguagens e Códigos e suas
Tecnologias, lançada em 2009, quando o Ministério da Educação reestruturou o Exame
Nacional do Ensino Médio que passou a ser constituída por nove competências e trinta
habilidades, no entanto, somente analisaremos a competência seis e a habilidade dezoito que
estão diretamente relacionadas à abordagem dos gêneros textuais no ensino médio.
Fundamentaremos a análise na proposição dos gêneros do discurso. Conduziremos a nossa
pesquisa por uma abordagem qualitativa em que analisaremos os itens da avaliação do ENEM,
nos quais identificaremos os gêneros textuais contemplados nas questões de língua portuguesa
aplicadas na edição 2014. Verificamos assim que apesar de os professores do Ensino Médio não
concordarem com a abordagem contextualizada dos itens do Exame, essa proposição atende aos
parâmetros legais de educação.
Palavras-chave: gêneros do discurso, gêneros textuais, contextualização, ENEM.
INTRODUÇÃO
O Exame Nacional do Ensino Médio vem contribuindo de maneira significativa
para que as políticas educacionais instituídas a partir da promulgação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394 (1996) sejam implementadas no
ambiente escolar, uma vez que a partir de 2009 a média ponderada obtida a partir dos
resultados das quatro áreas do conhecimento, quais sejam Linguagens e Códigos,
Matemática, Ciências Naturais e Ciências Humanas, aliadas ao resultado da redação
passou a ser critério para ingresso do candidato no ensino superior público, por meio do
Sistema de Seleção Integrada – SISU, como também às faculdades e universidades
particulares, através do Programa Universidade para Todos – Prouni, e ainda por meio
do Fundo de Financiamento Estudantil – FIES.
É oportuno salientarmos os objetivos definidos pelo Ministério da Educação,
através do Portal MEC para o exame, o qual visa democratizar as oportunidades de
acesso às vagas federais de ensino superior, possibilitar a mobilidade acadêmica e
induzir a reestruturação dos currículos de ensino médio. Certamente, a legitimação da
necessidade da escola explorar con(textos) nos diferentes componentes curriculares
contemplados em sua proposta pedagógica, com ênfase em Língua Portuguesa depende
de o professor conhecer os documentos oficiais, para então aliar esse conhecimento à
teorias linguísticas abordadas no âmbito acadêmico, o que contribuirá de forma
significativa para a adequação da práxis pedagógica às novas demandas educacionais.
Considerando essa necessidade, definimos como objetivo geral desta pesquisa:
Analisar a conexão entre os parâmetros legais que fundamentam a abordagem
contextualizada dos conteúdos de Língua Portuguesa no ENEM e as teorias dos gêneros
do discurso e dos gêneros textuais.
METODOLOGIA
Esta pesquisa será consolidada a partir do levantamento de dados quantitativos e
qualitativos, de forma que realizaremos um levantamento bibliográfico com base nos
autores que tratam dos gêneros discursivos, a partir das proposições de Bakthin, bem
como acerca dos gêneros textuais, considerando os pressupostos teóricos defendidos por
Marcuschi. Abordaremos ainda os documentos legais que tratam das mudanças
propostas para o processo ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa, tomando como
referência a LDB 9.394 (1996) e ainda os Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio (2000). Os aspectos quantitativos e qualitativos serão levantados a partir
da análise das questões concernentes à área Linguagens e Códigos e suas Tecnologias,
no Exame Nacional do Ensino Médio, tendo como foco a Língua Portuguesa. Essa
análise visa evidenciar a presença de diferenças gêneros como fator de contextualização
dos itens, para assim confirmar a importância da função e forma no processo de
resolução dos itens que constituem o exame.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A obrigatoriedade do ensino da Língua Portuguesa foi legalizada pela Lei de
Diretrizes da Educação Nacional 5.692 (1971), no entanto essa disciplina escolar
contemplava apenas os aspectos estruturais e normativos da língua, bem como os
aspectos históricos da literatura. Com o advento da LDB vigente, a abordagem das
diferentes possibilidades de realização da língua foi legitimada, de forma que os estudos
concernentes à linguagem foram introduzidos casualmente no contexto escolar.
A partir de 2009, quando o resultado do ENEM passou a ser considerado como
exigência ou fator contributivo para o acesso do educando ao ensino superior, os
profissionais da educação que atuam no ensino médio reconheceram a necessidade de
introduzir o estudo contextualizado dos conteúdos, de forma a garantir que as
competências e habilidades previstas para a etapa sejam consolidadas, no entanto ainda
se observa resistência a essa prática decorrente do consenso ilegítimo de que o exame é
mais uma política pública que somente mensura dados para garantir a construção de
uma imagem positiva do governo federal no mercado estrangeiro, uma vez que o
educando é também beneficiado com os resultados dessa avaliação externa.
Considerando esse fato, abordaremos os aspectos teóricos relacionados aos
gêneros do discurso e gêneros textuais, que aliados às proposições legais vigentes
citadas na apresentação orientam que o processo ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa se processe com base no uso intermitente de textos de gêneros diversos, a
fim de garantir a contextualização dos conteúdos, fator que garante a compreensão e
apreensão por parte do educando do ensino médio, superando a abordagem de estruturas
e regras descontextualizadas, comum em aulas de Português onde a memorização ocupa
destaque em detrimento da compreensão.
1.Percurso diacrônico dos gêneros
Os gêneros, antes de serem chamados textuais ou discursivos, ou do discurso,
eram na antiga Grécia conhecidos como literários, tendo como precursor Platão, com a
tradição poética, e Aristóteles com a retórica. Diante desse fato podemos perceber que
o conhecimento sobre gênero não é novidade, nem a preocupação de denominá-los.
Partimos de um cerne histórico, onde o discurso era tido mais como oral e se
concentrava em áreas poéticas, políticas e jurídicas, nas quais se buscava a melhor
retórica ou estilo para os atos de persuasão, convencimento e exposição.
Em Aristóteles houve a sistematização dos termos gênero e discurso, em que o
discurso era composto por três elementos: aquele que fala, aquilo sobre o que se fala e
aquele de quem se fala. E, ainda acrescenta: “três tipos de ouvinte que operam: (i) como
espectador que olha o presente; (ii) como assembleia que olha o futuro; (iii) como juiz
que julga sobre coisas passadas.” (MARCUSCHI: 2008, pág. ). Para esse estudioso da
idade média para cada julgamento feito por esses ouvintes havia uma correspondência
de gêneros de discurso retórico.
Hoje os gêneros são conhecidos multidisciplinarmente, revelam-se como um
espaço amplo de análises do texto e do discurso, trazendo à tona assuntos ligados à
língua e a sociedade; então, como afirma Marcuschi (2008, p.149) “O trato dos gêneros
diz respeito ao trato da língua em seu cotidiano nas mais diversas formas”. Essa
afirmação nos faz repensar as ações sociais, os atos de fala, os posicionamentos, enfim,
os artifícios múltiplos da comunicação, as formas múltiplas de se comunicar, tudo o que
constrói de fato, a estrutura viva da língua de uma sociedade. Refletir como tudo isso
acontece é descobrir os diversos gêneros textuais/discursivos.
A comunicação verbal é realizada através dos diversos gêneros e por meio de
textos. Essa é uma constatação que se torna necessária a partir do momento que
assumimos a impossibilidade de nos comunicarmos sem utilizarmos um gênero textual.
Este se coloca no centro da interação sociolinguística, então, como nos diz Marcuschi
(2008, p.154), “em consequência, estamos submetidos a tal variedade de gênero, a
ponto de sua identificação parecer difusa e aberta...”, porém, são muitos, mas não
infinitos. A fim de esclarecermos os usos que fazemos das denominações em torno dos
gêneros, apresentaremos a seguir definições defendi Marcuschi, 2008, para nos
embasarmos teoricamente sobre o assunto em questão:
a. Tipo textual: designa uma espécie de construção teórica {em geral uma
sequência subjacente aos textos} definida pela natureza linguística de sua
composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações
lógicas, estilo}. Os tipos caracterizam-se muito mais como sequências
linguísticas (sequências retóricas) do que como textos materializados; a
rigor são modos textuais (...).
b. Gênero textual: refere os textos materializados em situações
comunicativas recorrentes. Os gêneros textuais são os textos que
encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões
c.
sociocomunicativos característicos definidos por composições
funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na
integração de forças históricas, sociais, Institucionais e técnicas (...).
Domínio discursivo: constitui muito mais uma “esfera da atividade
humana” no sentido bakhtiniano do termo do que um princípio de
classificação de textos e indica instâncias discursivas (por exemplo:
discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso (...).
Constituem práticas discursivas, nas quais podemos identificar um
conjunto gêneros textuais que às vezes lhe são próprios ou específicos
como rotinas comunicativas institucionalizadas e instauradoras de
relações de poder.
Esses pontos de vista, ou posicionamentos, são reiterados com os estudos de
Bakhtin sobre os gêneros, nos quais ele afirma que toda a atividade humana está
relacionada ao uso da língua (BAKHTIN, 2011). Eis o encontro de uma dicotomia nãoexistente entre gêneros textuais e gêneros do discurso, pois se toda a ação que emerge
do homem está submersa ao uso da língua e consequentemente a um discurso, que traz
em si textos, sejam eles orais ou escritos, então, tratar dos discursos é o mesmo que
tratar dos textos. No âmbito das relações sociais e das atividades humanas não podemos
separar o discurso do texto. Marcuschi (2008, p.155) afirma: “não se pode tratar o
gênero do discurso independentemente de sua realidade social e de sua relação com as
atividades humanas”. Constatamos que este autor não diferencia os termos gêneros
textuais e gêneros do discurso.
Bakhtin e Marcuschi concordam que os gêneros não são formas “estanques”
com estruturas rígidas, bem delimitadas. Ao contrário eles são bem dinâmicos, porém
sem perder o que os identifica, o porquê de serem gêneros e serem institucionalizados e
com certo poder que condiciona o produtor de um texto, ao direcioná-lo a uma escolha.
Como afirma Marcuschi (2008) as escolhas não são totalmente livres nem aleatórias,
elas são condicionadas por características peculiares a situações particulares, que
embora, sejamos movidos pelo uso da língua, estamos ligados às especificidades desse
uso.
Os gêneros discursivos ou textuais são heterogêneos, característica muito
importante para tentarmos compreender a dificuldade em “definir a natureza geral do
enunciado” (BAKHTIN, 2011, p.263). Outro ponto a observar é que existe uma
diferença “essencial” entre os gêneros discursivos primários (simples) e secundários
(complexos), que para Bakthin (2011, pág. 263) “não se trata de uma diferença
funcional”. Estes nascem em meio ao “convívio cultural” (romances, dramas, pesquisas
científicas, grandes gêneros publicísticos, etc), e a predominância é do gênero escrito
(artístico, científico, sociopolítico, etc), ainda, sob esse tipo, durante sua formação eles
“incorporam e reelaboram diversos gêneros primários (simples)”.
Sobre esses gêneros primários, eles são integrantes dos complexos, se
transformam e ganham um “caráter especial”: “perdem o vínculo imediato com a
realidade concreta e os enunciados reais alheios” (BAKHTIN, 2011, p. 263). O autor dá
como exemplo a reprodução de um diálogo cotidiano e uma carta presentes num
romance, que conservam suas formas no plano do conteúdo romanesco, mas apenas aí, e
não como fato da vida cotidiana, representando um “acontecimento artístico-literário”.
Sendo assim, como os dois (diálogo e carta), o romance também é um enunciado, mas
um enunciado secundário (complexo). Por isso é que Bakhtin (2011) ressalta a
importância de se saber a natureza do enunciado, pois podemos ter aí, mais de um
sentido, então, para que se possa compreender o gênero do enunciado é preciso saber
sobre que situação comunicativa estamos falando, quem está falando e para quem.
Neste trabalho nos referimos às questões/itens do ENEM, no que tange a área de
língua portuguesa, que são enunciados. Portanto, nosso foco recai sobre o gênero de
cada enunciado, de forma que a análise está sob uma relação empírica de como foram
elaboradas essas questões e se elas correspondem à situação e aos seus enunciados, em
que os gêneros textuais/discursivos foram abordados.
2 Proposição legal para o ensino de Língua Portuguesa
O Ministério da Educação, em 1.996 instituiu a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional vigente, a qual defende mudanças significativas no contexto de
organização e abordagem da língua portuguesa no ensino médio. O parágrafo primeiro,
do Artigo 36 da LDB vigente, que trata da organização do currículo e estabelece as
diretrizes a serem contempladas no ensino médio, define “I – (...) a língua portuguesa
como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania;”.
Diante dessa proposição, a cidadania contempla o uso social da língua, compreendido
como conhecimento de mundo em interação. Por sua vez, o segundo parágrafo, do
inciso primeiro, também do citado artigo, que trata dos conteúdos, metodologias e
formas de avaliação para a etapa, estabelece que ao final do ensino médio o aluno
demonstre “II – conhecimento das formas contemporâneas de linguagem;”. O termo
linguagem contempla a língua em uso, forma de manifestação excluída do contexto
estruturalista e normativo proposto pela LDB anterior, mas contemplado pela LDB atual
que legitima a importância de a escola contemplar as variedades linguísticas no
processo ensino-aprendizagem da língua portuguesa.
No entanto, é pertinente salientar o caráter genérico da LDB vigente em relação
ao ensino de língua portuguesa, de forma que o Ministério da Educação instituiu os
Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio como instrumento legal que
orienta a prática de cada disciplina do currículo. O ensino-aprendizagem da mencionada
disciplina nesse contexto deve propiciar ao aluno autonomia no uso da linguagem, sem
prendê-lo a regras impostas, que nem sempre contemplam a realidade da língua, de
forma que conforme proposto pelos Parâmetros é pertinente nos atentarmos ao caráter
dialógico e social da língua, uma vez que ela é considerada “Base de todos os saberes e
dos pensamentos pessoais, seu estudo impõe uma abordagem transdisciplinar no
currículo.” (BRASIL, 2000, pág. 17)
Em razão desse fato, o ensino de língua portuguesa deve ser articulado aos
pressupostos da área Linguagens e Códigos e suas Tecnologias, em função da
concepção a respeito da linguagem verbal, que se caracteriza como construção humana
e histórica de um sistema linguístico e comunicativo adequado aos diversos contextos,
sendo que na gênese da linguagem está o ser humano e suas manifestações
comunicativas, já que as expressões humanas incorporam todas as linguagens. Para
efeitos didáticos a linguagem verbal será adotada como objeto de estudo e reflexão, uma
vez que é considerada como instrumento prioritário de trabalho para o professor da
disciplina no contexto escolar.
Há de se considerar que o objetivo primordial da linguagem é a interação, que se
materializa por meio da comunicação com o outro, de modo que “A unidade básica da
linguagem verbal é o texto, compreendido como a fala e o discurso que se produz, e a
função comunicativa, o eixo principal de sua atualização e a razão do ato linguístico.”
(BRASIL, 2000, pág.18) Assim sendo, o educando do ensino médio deve ser
considerado como produtor de textos, produto de histórias sociais e culturais que
marcam seu contexto. Para que uma abordagem efetiva e produtiva da língua
portuguesa se materialize na etapa final da educação básica, o texto deve ser
considerado como um enunciado singular no processo de construção e apreensão de
significados, constituindo ainda um objeto diferenciado para análises e sínteses,
superando a visão limitada decorrente do trabalho com frases justapostas, deslocadas do
texto.
No contexto de proposição dos PCN, os gêneros discursivos propostos por
Bakthin (2011) estão relacionados à natureza social da língua. Assim sendo, a
linguagem verbal, que é dialógica, deve ser analisada em funcionamento, no ato
comunicativo. Em razão desse caráter, “Toda e qualquer análise gramatical, estilística,
textual deve considerar a dimensão dialógica da linguagem como ponto de
partida.”(BRASIL, 2000, pág. 21) Assim sendo, o contexto, os interlocutores, os
gêneros discursivos, os recursos utilizados pelos envolvidos no ato comunicativo,
aliados aos significados sociais, à função social, aos valores e pontos de vista
determinam as formas de falar e escrever.
Diante do propósito em sistematizar as múltiplas possibilidades de apreensão e
compreensão da linguagem, os PCN instituíram nove competências a serem
desenvolvidas em língua portuguesa, sem jamais reduzir os conhecimentos previstos
para a etapa. Em razão do nosso foco de análise constituir-se da abordagem dos gêneros,
adotaremos como basilar a competência 6, bem como a habilidade de nº 18 da Matriz de
Referência para o Exame Nacional do Ensino Médio (2009), da área Linguagens e
Códigos e Suas Tecnologias:
Competência de área 6 – Compreender e usar os sistemas
simbólicos das diferentes linguagens como meio de
organização cognitiva da realidade pela constituição de
significados, expressão, comunicação e informação.
H18 – Identificar os elementos que
concorrem para a progressão temática e
para a organização e estruturação de
textos de diferentes gêneros e tipos.
Por conseguinte, é pertinente evidenciarmos a relevância da função sobre a
forma nos textos produzidos no contexto social, nos quais os aspectos emotivos, as
relações de autoridade, o dialogismo entre textos e o diálogo constituem o contexto no
qual a língua se destaca como o elemento principal da interlocução.
3 Utilidade dos gêneros no ENEM
A diretriz de contextualização, defendida pelos PCN para o ensino médio, a qual
defende o tratamento contextualizado do conhecimento como premissa para se ofertar
uma educação de qualidade fundamenta a construção dos itens utilizados anualmente no
Exame Nacional do Ensino Médio, que teve início em 1.998, tendo sido reestruturado
em 2.009, na oportunidade em que foi apresentada a Matriz de Referência para o ENEM
organizando as disciplinas da base nacional comum em quatro áreas do conhecimento,
sendo que a Língua Portuguesa é um dos componentes curriculares da área Linguagens
e Códigos e suas Tecnologias. Em 2014, das quarenta e cinco questões propostas no
intervalo do exame correspondente a essa área, compreendido entre as questões de
número 91 a 135, levantamos os dados concernentes à proporcionalidade de questões
para os componentes curriculares que a constituem, de forma que os resultados serão
apresentados no seguinte quadro:
DISCIPLINA
NÚMERO DE QUESTÕES
PERCENTUAL
Língua Portuguesa
34
75,56%
Língua Estrangeira (Inglês ou
05
11,12%
Artes
04
8,88%
Educação Física
02
4,44%
Espanhol)
Dos quarenta e cinco itens propostos, os cinco iniciais estão voltados à avaliação
das competências e habilidades referentes à competência dois que avalia o nível de
conhecimento e possibilidade de utilização das línguas estrangeiras modernas como
instrumento de acesso a informações de outras culturas, bem como grupos sociais
diversos, de forma que o candidato faz opção pro Inglês ou Espanhol já na inscrição.
Já no caso de Artes e Educação Física, o número de questões no exame é
variável, de forma que na edição em análise o número respectivo de itens foi de quatro e
duas questões. O componente curricular Artes é contemplado na citada Matriz na
competência de área 4 “Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de
significação e integrador da organização do mundo e da própria identidade.” (BRASIL,
2009, pág. 3), de forma que estão relacionadas à essa competência as habilidades de nº
12, 13 e 14. As questões aplicadas em 2014 que contemplam esse componente foram as
de número 111, 112, 129 e 134 da prova amarela. Já a Educação Física, que está
comtemplada na Matriz na competência de área 4 “Compreender e usar a linguagem
corporal como relevante para a própria vida, integradora social e formadora da
identidade” (et all), a qual estão relacionadas as habilidades de número 9, 10 e 11
constituiu base para a formulação dos itens 103 e 104.
Foram aplicadas em 2014 trinta e quatro questões que contemplaram as seis
competências e vinte habilidades da disciplina Língua Portuguesa, de forma que todas
as questões da área, de um total de quarenta e cinco itens foram contextualizadas. Em
razão do foco da nossa análise constituir a abordagem dos gêneros textuais no exame,
constatamos que desse total, treze itens dependem diretamente do domínio da função do
gênero para que o gabarito seja identificado pelo candidato, sendo que os demais
contextualizam a proposição das questões. Observe os gêneros presentes nessa edição:
GÊNERO(S)
NÚMERO DE QUESTÕES
NÚMERO DA(S) QUESTÃO(ÕES)
Argumentativo
3
100, 123 e 135
Blog
1
125
Charge
3
98, 99 e 106
Crônica
2
114, 117, 119 e 133
Dito popular/ narração
1
128
Editorial
1
118
Informativo
5
108, 109, 110, 120 e 130
Narrativo
2
105 e 134
Notícia / cartaz
1
96
Poema
6
98, 107, 113, 115,122 e 126
Propaganda
2
101 e 131
Relato de experiência pessoal
1
102
Reportagem
1
121
Rubricas
1
115
Texto publicitário
1
124
Trecho de romance
2
127 e 132
Utilizamos a legenda em negrito para identificar os gêneros e questões que
dependem diretamente da identificação do gênero ou tipologia textual para que o
gabarito seja identificado. Apresentaremos a seguir o item 134 como exemplo, no qual o
domínio dos gêneros textuais contribui de forma direta com a identificação do gabarito:
No caso específico desse item observamos uma cobrança ímpar na edição em
análise, uma vez que se trata do trecho do romance Grande sertão: veredas, de autoria
do Guimarães Rosa, uma obra literária, cuja abordagem foge do propósito a que se
propõe a literatura, uma vez que é utilizada como elemento contextual à identificação
das características dos gêneros: diário, fábula, notícia, aforismo e crônica.Esse item
evidencia que o conhecimento acerca da forma é insuficiente para que o gabarito seja
identificado de forma coerente. Assim sendo, tomaremos como segundo e último
exemplo o item de número 96 da prova amarela, que também contempla os gêneros
textuais, no entanto em uma perspectiva divergente da anterior.
Observamos uma complementaridade entre os gêneros notícia e cartaz
abordados de forma intertextual nesse item, cuja resolução proficiente depende do
conhecimento do candidato em relação à função dos citados gêneros, já que o texto I
evidencia o aumento da doação de órgãos e o texto II solicita novas doações.
CONCLUSÃO
A breve análise dos itens, aliada à discussão das proposições legais que norteiam
o ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, bem como à teoria dos gêneros textuais e
do discurso evidencia a contribuição que o ENEM vem propiciando à reconfiguração da
disciplina no ensino médio, uma vez que a LDB vigente, bem como PCN foram
propostos há quase duas décadas, no entanto o impacto das diretrizes propostas vem aos
poucos se efetivando na escola a partir de 2009, quando boa parte dos docentes
compreendeu a importância em adequar sua práxis às novas políticas educacionais,
como premissa para garantir o acesso do aluno ao ensino superior.
REFERÊNCIAS
BAKTHIN, M. Os gêneros do discurso. In BAKTHIN, M. Estética da criação
verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.
BRASIL. Ministério da Educação. ENEM – Exame Nacional do Ensino MédioDocumento Básico 2000. Brasília: Ministério da Educação, 2000.
________ Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96. Brasília:
Ministério da Educação, 1996.
________ Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio. Brasília: Ministério da
Educação, 2000.
http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=310+enen.br
http://portal.inep.gov.br/web/enem/sobre-o-enem
MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São
Paulo: Parábola Editorial, 2008.
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