PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DE DIREITO PROCESSUAL
CIVIL
(Artigo 16º nº 2 alínea a), da Lei nº 2/2008, de 14 de Janeiro)
2ª Chamada – 8 de Abril de 2008
DURAÇÃO DA PROVA – 03 horas (o tempo de duração da prova conta-se
decorridos trinta minutos após a entrega do enunciado aos candidatos).
COTAÇÃO ATRIBUÍDA A CADA CASO:
Caso I – 7 valores:
1ª questão – 3 valores
2ª questão – 2 valores
3ª questão – 2 valores
Caso II – 7 valores:
1ª questão – 2,5 valores
2ª questão – 3 valores
3ª questão – 1,5 valores
Caso III – 6 valores:
1ª questão – 3 valores
2ª questão – 1,5 valores
3ª questão – 1,5 valores
Ou
Caso IV – 6 valores:
1ª questão – 1 valor
2ª questão – 2 valores
3ª questão – 2 valores
4ª questão – 1 valor
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Caso I
A) Após um curto namoro Pedro e Inês decidem viver juntos num andar, situado
em prédio constituído em propriedade horizontal, que Pedro se dispõe a comprar com o
seu dinheiro.
B) Contudo, como Pedro ainda se encontra casado com Constança, apesar de se
encontrarem separados há algum tempo, combina com Inês que será esta a outorgar a
escritura de compra do andar, transferindo depois para Pedro o respectivo direito de
propriedade, logo que Pedro se divorcie de Constança.
C) Como Pedro não dispõe da totalidade da quantia necessária para a compra do
andar, pede emprestado € 50.000, ficando obrigado a entregar uma prestação mensal para
amortização da quantia emprestada e pagamento de juros.
D) Tendo pago o preço do andar com o dinheiro de Pedro, Inês outorga como
compradora a correspondente escritura de compra e venda do andar, passando ambos aí a
viver como marido e mulher.
E) Acordam que Pedro é responsável pelo pagamento das despesas com a
alimentação e produtos de limpeza para a casa, e Inês é responsável pelo pagamento das
prestações do empréstimo referido em C) e do condomínio, assim como das despesas com
a empregada.
F) Certo dia, Inês esqueceu-se de uma torneira aberta, tendo provocado uma
inundação que danificou o tecto e as paredes do andar inferior pertencente a Joaquim.
G) Após dois anos de vida em comum, devido a incompatibilidade de feitios,
Pedro e Inês resolvem separar-se, tendo Inês regressado a casa dos pais.
H) Decretado o divórcio entre Pedro e Constança e perante a recusa de Inês em
transferir a propriedade do andar para Pedro, este propôs em tribunal uma acção na qual,
invocando a factualidade descrita em A) a D), pediu que fosse proferida sentença que
declarasse transmitido para si o direito de propriedade sobre o referido andar.
I) Inês contestou a acção, opondo-se a esta pretensão e deduzindo reconvenção na
qual, para a hipótese do pedido formulado pelo Autor ser julgado procedente, solicitou que
este fosse condenado a devolver-lhe todas as quantias que ela havia gasto, até à data da
separação, com o pagamento das prestações do empréstimo e do condomínio.
J) O Administrador do Condomínio e Joaquim interpelaram Pedro, pedindo-lhe,
respectivamente, o pagamento das prestações do condomínio vencidas após Inês ter
regressado a casa dos seus pais e que se encontram em dívida, e o custo das reparações dos
estragos causados pela inundação no andar de Joaquim.
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L) Pedro negou-se a pagar estas quantias, alegando que não era ele o proprietário
do andar à data do vencimento daquelas obrigações.
Face aos dados conhecidos:
1ª – Aprecie a viabilidade da pretensão de Pedro referida em H). (3 valores)
2ª – Aprecie a viabilidade do pedido reconvencional referido em I). (2 valores)
3ª – Aprecie a viabilidade das pretensões referidas em J), face à justificação
apresentada por Pedro para não as satisfazer voluntariamente, supondo que na data em que
este foi interpelado já havia sido julgado procedente, com decisão transitada em julgado, o
pedido referido em H). (2 valores)
Caso II
A) Paulo é proprietário de um prédio rústico, com oliveiras, nas imediações de
Sintra, com área inferior à unidade de cultura, inserido em zona de paisagem protegida,
onde é proibida a construção de edificações.
B) Rogério também é proprietário de um prédio rústico, com oliveiras, confinante
com o referido em A), também com área inferior à unidade de cultura, por o ter adquirido
um ano depois de se ter casado com Rita, em 1984, sem convenção antenupcial de bens.
C) Em Dezembro de 2005, Paulo propõe a Saraiva, construtor civil, que lhe havia
emprestado a quantia de € 25.000, proceder à transmissão para este da propriedade sobre o
prédio referido em A), para liquidação da quantia mutuada, com perdão dos juros
entretanto vencidos, no valor de € 1000.
Saraiva, que não era proprietário de qualquer prédio naquela zona, aceita esta
proposta, com a esperança que um dia venha ali a ser permitida a construção de edifícios.
D) Combinam os dois que será Saraiva que, em nome de Paulo, comunicará a
Rogério este acordo, a fim de prevenir o exercício de um eventual direito de preferência
deste último na aquisição do prédio referido em A).
E) Saraiva envia uma carta registada a Rogério, em 12 de Janeiro de 2006, com o
seguinte teor:
“A pedido de Paulo, venho comunicar-lhe que este vai transmitir-me a
propriedade do prédio rústico (identifica o prédio referido em A)) para pagamento duma
dívida da qual sou credor.
Na eventualidade de poder preferir nesta transmissão, concedo-lhe o prazo de 8
dias para declarar se o pretende fazer, sob pena de nada dizendo neste prazo se entender
que renuncia ao respectivo direito”.
F) Rogério não responde a esta carta no prazo marcado, pelo que Paulo e Saraiva,
por escritura pública, realizada em 1 de Abril de 2006, concretizam o negócio combinado,
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sem declararem na escritura a finalidade que o transmissário pretende dar ao prédio
transmitido.
G) Saraiva pagou € 200 de despesas com a escritura e € 250 com a inscrição da
aquisição do prédio referido em A) a seu favor na Conservatória do Registo Predial.
H) Em 1 de Setembro de 2006, Rogério e Rita propõem acção de preferência
contra Paulo e Saraiva, pedindo que se declare transmitido para eles o direito de
propriedade sobre o prédio referido em A).
I) Saraiva contesta a acção, alegando que Rogério e Rita não são titulares de
qualquer direito de preferência, porque ele adquiriu o prédio em causa com a finalidade de
nele proceder à construção de edifícios.
Face aos dados conhecidos:
1ª – Analise a eficácia da comunicação referida em E), tendo em consideração o
seu emitente, o seu destinatário e o seu conteúdo. (2,5 valores)
2ª – Aprecie a viabilidade da acção referida em H), ponderando, nomeadamente, a
defesa apresentada por Saraiva. (3 valores)
3ª – Indique, fundamentando, qual o montante que Rogério e Rita devem
depositar, nos termos do artigo 1410.º, n.º 1, do Código Civil. (1,5 valores)
Responda apenas a um – e só a um – dos dois Casos que a seguir se
indicam:
Caso III ou Caso IV.
Nota:
No caso de o candidato responder aos dois Casos, apenas será considerada a primeira
das respostas contida na prova.
Caso III
A) António e Luís, ambos mecânicos e amigos de longa data, acordaram em
constituir uma sociedade comercial por quotas, Auto António & Luís Lda., cujo objecto
social integraria o comércio de peças e a reparação de viaturas automóveis, a qual
funcionaria numa oficina do ramo automóvel, situada na periferia de Faro, pertencente ao
avô de Luís, que estava então encerrada.
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O avô de Luís acordou em ceder as instalações gratuitamente, e António e Luís
iniciaram a actividade na citada oficina.
B) Tratando-se de um local ermo, as instalações da oficina foram alvo de vários
assaltos, cometidos após o seu encerramento, no decurso dos quais foram furtadas peças de
dois automóveis e diverso equipamento oficinal.
As instalações estavam protegidas por alarme, mas, apesar deste ter sido accionado,
quando as autoridades chegavam ao local, já nada podiam fazer.
C) Aborrecidos com a situação, António e Luís resolveram pedir emprestado um
cão de guarda a um amigo, Joaquim Perestrello, conhecido criador de cães de guarda e
dono do Canil da Boa Esperança, para ficar a guardar a oficina após o seu encerramento.
Este acedeu, tendo-lhes emprestado um cão raça pitbull.
D) António e Luís foram buscar o cão na tarde de sábado, dia 15 de Janeiro de
2005.
O cão foi logo levado para a oficina, que estava encerrada, só reabrindo na
segunda-feira subsequente, e deixado solto no interior da mesma.
E) No dia seguinte, domingo, o carro de serviço da empresa, que estava estacionado
no centro da cidade de Faro, não pegou.
F) António e Luís telefonaram então a Soares, um amigo de ambos, enfermeiro na
Clínica da Rocha, morador na vizinhança da oficina, que estava em casa, a quem, tempos
antes, tinham confiado uma chave dos portões da oficina, pedindo-lhe para ir lá buscar um
cabo eléctrico e uma bateria, que traria no seu carro, para se tentar pôr a trabalhar a viatura
da empresa, que estava avariada.
G) Soares aceitou fazer esse favor, e deslocou-se à oficina.
Quando abriu o portão, ouviu uma ruído surdo, vindo do interior das instalações, e
foi imediatamente atacado pelo pitbull, que lhe mordeu a mão direita, repetidamente,
atacando-o ainda nas pernas e nos braços, só o largando quando Soares conseguiu fugir.
H) Ao tempo, Soares auferia na Clínica da Rocha o ordenado mensal de € 1.100 e
prestava ainda serviços em dois Centros de Enfermagem, recebendo por estes € 980
mensais.
I) Em virtude das dentadas do cão, Soares sofreu ferimentos graves, que
implicaram a sua condução ao Hospital, onde esteve internado durante dois meses, tendo
sofrido três intervenções cirúrgicas.
Sofreu dores e angústia.
Suporta, agora, limitações permanentes a nível motor, na mão direita, e ficou com
cicatrizes de 15 e 20 centímetros nas pernas direita e esquerda, respectivamente, e marcas
nos braços.
Padece de uma incapacidade permanente geral de 35% e de igual incapacidade para
o exercício da sua profissão.
Prevê-se que tenha, ainda, de ser submetido a tratamentos de fisioterapia.
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J) No dia seguinte a ter sido hospitalizado, Soares foi visitado pelos dois sócios da
oficina, que se prontificaram a suportar todas as despesas e a indemnizá-lo.
Confiando nesse propósito, Soares nunca formalizou qualquer queixa.
L) Porém, nada tendo recebido até ao final do mês de Dezembro de 2007, Soares
fez notificar judicialmente António e Luís, em 7 de Janeiro de 2008, interpelando-os para
que cumprissem o prometido.
M) Já em Fevereiro de 2008, António e Luís disseram a Soares que não eram
responsáveis pelo sucedido, já que o cão não era deles, e que, afinal, toda a culpa era de
Soares, que não tivera cuidado, já que, pelo barulho, devia ter-se apercebido que estava um
cão dentro da oficina, e, consequentemente, não devia ter aberto a porta.
António e Luís disseram ainda a Soares que, em virtude de diversos atrasos na
obtenção da documentação necessária, a constituição da sociedade Auto António & Luís
Lda. só foi formalizada em 10 de Janeiro de 2008, pelo que a sociedade, de que eram
sócios e gerentes, também nada tinha a ver com o assunto.
Responda às seguintes questões:
1ª – Pretendendo Soares ser indemnizado, que procedimento adequado, em termos
processuais, deverá adoptar, que fundamentos deve apresentar para alicerçar a sua
pretensão e contra quem deve dirigir o seu pedido? (3 valores)
2ª – Indique e caracterize, fundamentadamente, os danos suportados por Soares que
sejam passíveis de serem indemnizados. (1,5 valores)
3ª – Atendendo à data do dia de hoje – 29 de Março de 2008 –, avalie a
tempestividade do pedido indemnizatório de Soares (1,5 valores)
Caso IV
A) Em 11 de Maio de 2006 Afonso intentou, no competente Tribunal, acção
declarativa, com processo ordinário, contra Berta, Camilo e Diana, pedindo a declaração
de nulidade da compra e venda da “Quinta da Cepa”, feita pela Ré Berta ao Réu Camilo,
através de escritura pública, celebrada no dia 5 de Maio de 2005.
Para fundamentar a pretensão, alegou os seguintes factos:
• Afonso e Diana são ambos filhos de Berta;
• Diana celebrou casamento com Camilo em 1 de Janeiro de 2005, sem
convenção antenupcial;
• Por escritura pública, outorgada no competente cartório notarial, em 5 de Maio
de 2005, Berta declarou transmitir, por venda, a Camilo, a “Quinta de Cepa”,
sua propriedade situada no Alentejo, pelo preço de € 250.000, tendo Camilo
declarado, no mesmo acto, aceitar a compra e o preço indicados;
• Afonso jamais consentiu este negócio.
B) Berta não apresentou contestação.
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C) Camilo e Diana contestaram, em prazo, alegando o seguinte:
• O negócio de compra e venda da “Quinta da Cepa” é perfeitamente válido e
não enferma de qualquer vício, porquanto o comprador Camilo não é filho ou
neto da vendedora Berta, como exige o art. 877º nº 1, do Código Civil;
• Diana não outorgou na escritura pública, não se percebendo porque é que foi
demandada na acção;
• O direito de Afonso extinguiu-se pelo decurso de mais de um ano entre a data
da escritura e a data da propositura da acção;
• Ainda que algum vício houvesse, nunca seria o de nulidade do negócio, mas o
de simples anulabilidade (art. 877º nº 2, do Código Civil) e, por isso, a acção
jamais poderia proceder, por estar vedado ao tribunal condenar em objecto
diverso do que se pedir (art. 661º nº 1, do Código de Processo Civil).
D) Não foram apresentados outros articulados.
Face aos dados conhecidos:
1ª - Indique qual a consequência jurídico-processual que reconhece à circunstância
de Berta não ter apresentado contestação. (1 valor)
2ª - Pronuncie-se sobre se será de considerar procedente alguma das excepções
invocadas, na contestação, por Camilo e Diana. (2 valores)
3ª - Aprecie a viabilidade do pedido formulado por Afonso, na acção judicial que
interpôs. (2 valores)
4ª - Suponha que, por apenso à acção ordinária, Afonso requer ao tribunal a
providência cautelar de arresto, pedindo a apreensão judicial da “Quinta da Cepa”.
Alega, para tanto, que Camilo e Diana vêm publicitando, em jornais de muita
divulgação, a vontade de vender essa “Quinta”, assim o prejudicando, como herdeiro de
Berta, sua mãe.
Pronuncie-se sobre a adequação deste comportamento jurídico-processual de
Afonso. (1 valor)
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2ª Chamada