Políticas públicas e água no Semiárido mineiro. O Norte de Minas Gerais, por suas características ambientais e socioeconômicas, é enquadrado como semiárido brasileiro e, a partir da década de sessenta, vem sendo foco de políticas públicas de órgãos de apoio e fomento ao desenvolvimento urbano industrial e agrícola, esse último com enfoque principal na oferta de água para a agricultura (OLIVEIRA, 2000). No contexto do Norte de Minas, a população rural sofre diretamente com a escassez de água e é também de forma direta a beneficiária de programas e de políticas públicas direcionadas à minimizar os problemas relacionados à falta de água. No entanto, muitas vezes, esses programas e políticas não condizem com as reais necessidades locais, podendo não apresentar resultados satisfatórios ou se equivocar na finalidade do processo. Por isso, é importante conhecer e analisar a efetividade dessas políticas, com o intuito de fornecer informações que possam subsidiar o poder público na formulação e no ajuste de políticas públicas direcionadas a água no semiárido mineiro. Assim, o objetivo do presente trabalho é apresentar e analisar as intervenções públicas realizadas na região do Planalto Rural no município de Montes Claros - MG, no que tange ações direcionadas ao uso e conservação dos recursos hídricos. A pesquisa foi realizada em 2008 e partiu da compreensão das políticas públicas direcionadas a água existentes nessa região, tanto na visão dos beneficiários diretos – famílias rurais – como na dos seus gestores. Foram realizadas entrevistas com esses dois atores no contexto do norte de Minas Gerais. A base metodológica foi o estudo de caso, que possibilitou compreender, de forma abrangente, o grupo em estudo e que ao mesmo tempo, possibilitou desenvolver declarações teóricas mais gerais sobre as políticas públicas relacionadas a água no semiárido mineiro (BECKER, 1997). Entrevistou-se 23 famílias de 6 comunidades da zona rural de Montes Claros, no que tange diversos aspectos relacionados a água, dentro deles as ações públicas que visavam os recursos hídricos. Buscou-se compreender como a participação pública vêm atuando para a melhoria na disponibilidade, conservação e abastecimento de água na região. Como resultado constatou-se que as políticas públicas identificadas na pesquisa podem ser classificadas como políticas implementadas a partir de programas (intervenções de médio e longo prazo), de projetos (intervenções de curto e médio prazo) e ações (intervenções pontuais). As mesmas foram enquadradas, a partir de dois objetivos principais: intervenções focadas na busca da melhoria no abastecimento de água, tendo como principal delas a construção de poços artesianos, e intervenções direcionadas ao uso e à conservação de recursos naturais, tendo como a de maior raio de ação a construção de barraginhas de contenção de enxurradas. Como intervenções mais consistentes e efetivas para sanar dificuldades em relação à água, as famílias citaram: o Programa de Poços Artesianos (69,6%), o Programa Barraginhas (65,2%), o Programa Ecocrédito (4,1%) e o Projeto Mandala (26,1%). O programa de perfuração de poços artesianos, gerido pela prefeitura municipal, disponibiliza água de boa qualidade, segundo o seu coordenador, quando comparado a outras fontes de abastecimento, como rios e barragens. Ele alega que a quantidade é suficiente para atender a toda a demanda, mas ainda há famílias que são abastecidas por caminhão-pipa no município. E também a população da zona rural vem aumentando, o que está promovendo o aumento da demanda por novos poços. Porém a perfuração indiscriminada de poços artesianos pode causar impactos ambientais graves. Segundo o próprio coordenador do programa, em 2008, oito poços secaram no município e, atualmente, a profundidade para se encontrar água no lençol freático vem aumentando. Nesse depoimento, ele faz referência à falta de chuva que a região vem sofrendo, e também à perfuração constante de poços, que prejudica o restabelecimento de água nos lençóis freáticos, nos rios e nas nascentes. Ainda disse que o processo acentuado de desmatamento e a exploração dos recursos naturais contribuíram para essa situação. Outro programa gerido pela prefeitura é o Programa Barraginhas que vem mostrando resultados positivos no sentido de desenvolver ações conservacionistas na região e vem tendo uma adesão social muito importante. O Programa Ecocrédito encampa a iniciativa de se estabelecer uma compensação ambiental aos proprietários rurais que preservam áreas naturais. No momento do estudo foi identificado que algumas empresas privadas de médio e grande porte estão sendo as maiores beneficiarias desse programa. O Projeto Mandala, traz consigo princípios da agroecologia, mas apresentou distorções na sua execução. O investimento do projeto que destinava-se a implantação de sistemas de irrigação adaptados a regiões de clima seco, foi aplicado na aquisição de sistemas convencionais de irrigação. No entanto, o projeto trouxe para dentro do contexto social estudado o debate sobre uma agricultura com bases mais sustentáveis. Conclui-se que o poder público municipal vem atuando na região, para sanar problemas de abastecimento rural e na busca da conservação dos recursos naturais. Porém, nota-se que nos programas pesquisados, com exceção do Programa Ecocrédito, não foi encontrado nenhuma contrapartida ambiental por parte dos beneficiários. O que se propõe é que tais ações públicas “estejam integradas a políticas de sustentabilidade sócio-ambiental”, ou seja, os beneficiários de políticas públicas se comprometam a executar ações que favoreçam o uso sustentável da água (MARTINS, 2001, p. 96). Enfim, o que se observa é que existe uma mobilidade pública para sanar problemas relacionados aos recursos hídricos no município de Montes Claros, porém aspectos importantes de ajustamento social e ambiental precisam ser melhores entendidos para a maior eficiência dessas políticas. BECKER, H.S. Métodos de pesquisa em Ciências Sociais. 3. ed. São Paulo, SP: HUCITEC, 1997. 178p. MARTINS, R. C. Agricultura, gestão dos recursos hídricos e desenvolvimento rural: a convergência necessária. In: FELICIDADE, N. et al., Uso e gestão dos recursos hídricos no Brasil. 1. ed. São Carlos, SP: RIMA, 2001. Cap. 6, p. 77-104. OLIVEIRA, M. F. M. O processo de formação e desenvolvimento de Montes Claros e da Área Mineira da SUDENE. In: OLIVEIRA, M. F. M., Formação social e econômica do Norte de Minas. 1. ed. Montes Claros, MG: UNIMONTES, 2000. Cap. 1, p. 13-103.