Anais do Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto - GEONORDESTE 2014
Aracaju, Brasil, 18-21 novembro 2014
ANÁLISE EVOLUTIVA DO PONTAL ARENOSO DA MARGEM ESQUERDA DA
DESEMBOCADURA DO RIO VAZA-BARRIS, ARACAJU-SE.
Luana Santos Oliveira1
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Doutoranda em Geografia, Professora, SEED-SE, Aracaju-SE, [email protected]
RESUMO: Os pontais são feições arenosas que podem surgir na linha de costa nas adjacências das
desembocaduras fluviais e, que podem ser erodidos, acrescidos ou mudar de posição em função das
variações na dinâmica costeira ou em razão da influência da ação antrópica. Destaca-se, dentro desse
contexto, o pontal arenoso presente na margem esquerda da desembocadura do rio Vaza-Barris, no
município de Aracaju-SE. Destarte, o presente estudo objetiva desvelar o processo de formação do
referido pontal e sua evolução ao longo dos últimos 40 anos. Os procedimentos metodológicos
utilizados foram: trabalho de campo e mapeamento do pontal, a partir de fotografias aéreas e imagens
de satélites em diferentes anos (1965, 1971, 1978, 1986, 2003 e 2008). Os resultados apontaram que o
pontal arenoso formou-se a partir da década de 1960, em função dos sedimentos trazidos pelas
correntes costeiras, que se acumularam nas adjacências da margem esquerda da desembocadura do rio
Vaza-Barris. A partir da analogia ao modelo evolutivo de pontais, concluiu-se que a referida feição
assemelha-se a formação de pontais complexos (complex spits). Com base nos resultados obtidos nesta
pesquisa, enfatiza-se a importância do estudo da dinâmica das paisagens costeiras a fim de evitar e
minimizar futuros problemas ambientais.
PALAVRAS-CHAVE: paisagem, dinâmica costeira, mapeamento multitemporal.
INTRODUÇÃO: A paisagem costeira constitui uma das paisagens que apresenta maior complexidade
diante da relação estabelecida entre os elementos físicos e antrópicos. Os processos que ocorrem nos
ambientes costeiros são resultados da ação conjunta de agentes como: ondas, correntes litorâneas,
marés, regime de ventos, variação do nível do mar, entre outros (BIRD, 2008, CLAYTON etal, 1992,
MORTON et al, 1983; TERICH et al, 1987; STIVE et al, 2002; ESTEVES, 2003; DAVIS;
FITZGERALD, 2004). Dentro desse contexto, destacam-se as desembocaduras fluviais, áreas
extremante dinâmicas e suscetíveis a diversos agentes da dinâmica costeira. Em função de tal
dinamicidade, nas adjacências destes ambientes, pode existir a formação de feições dos pontais
arenosos. Estes são formados comumente pelos sedimentos trazidos pelas correntes costeiras, em
especial, a deriva litorânea, sendo uma formação mais recente que a parte continental a qual ele está
ligado (DEAN; DALRYMPLE, 2002; BIRD, 2008). No que concerne a classificação destas feições,
autores como Evans (1942) e Dean; Dalrymple (2002) apontam que alguns pontais podem apresentar a
sua porção final recurvada (recurvedspits), indicando que há mais de uma direção de frente de ondas
afetando a área. Vale ressaltar a importância dos estudos dessas feições, uma vez que são responsáveis
por modificações na posição da linha de costa, assim como, pela criação de novas áreas emersas que
resulta, consequentemente, na modificação da paisagem. Dentro deste contexto destaca-se a margem
esquerda da desembocadura do rio Vaza-Barris, na qual é encontrada a supracitada feição costeira.
Destarte, o presente trabalho tem por escopo analisar a evolução do pontal arenoso na margem
esquerda da desembocadura do rio Vaza-Barris, entre o período de 1965 e 2008, a partir da análise de
mapeamentos multitemporais.
MATERIAL E MÉTODOS: Os procedimentos metodológicos utilizados na elaboração deste
trabalho englobaram as etapas do levantamento bibliográfico, do trabalho de campo e da confecção e
análise de mapas multitemporais do pontal arenoso. Tais mapas foram elaborados sobre uma base
cartográfica composta por fotografias aéreas de 1965, 1971, 1978, 1986 e 2004, ortofotos de 2004 e
2008 e, imagens de satélite QuickBird de 2003 e 2008. As fotografias aéreas foram georeferenciadas
com auxílio do programa GLOBAL MAPPER 11, tomando por base as ortofotos de 2004. Foi
utilizado o sistema de projeção UTM e o datum SIRGAS BRASIL 2000 para o georreferenciamento e
confecção dos referidos mapas. Com auxílio do programa ARC GIS 9, foram extraídos os dados do
posicionamento da linha de costa para cada ano mencionado, a partir da interpretação visual das
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fotografias e imagens de satélite, tendo por indicador de posicionamento da linha de costa, a linha de
preamar máxima. Para o cálculo da extensão do pontal para os diferentes anos, também utilizou-se da
ferramenta measure do ARC GIS 9. O trabalho de campo foi realizado no ano de 2012, em que foram
observados e fotografados os indicadores de indícios de erosão ou progradação da linha de costa na
porção do pontal arenoso. Os dados levantados a partir do mapeamento foram analisados tendo em
vista as considerações feitas pelos autores Dean; Dalrymple (2002), no que concerne ao modelo de
evolução de pontais arenosos complexos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: A partir da análise multitemporal observou-se que na margem
esquerda do rio Vaza-Barris ocorreu um processo de acresção sedimentar contínuo, a partir de meados
da década de 1960. A continuação deste processo de sedimentação deu origem, na década de 1970, a
um pontal arenoso, o qual teve sua origem associada à retenção de sedimentos trazidos pela corrente
costeira da deriva litorânea, que segundo Oliveira (2003), apresenta sentido preferencial de NE para
SW. As principais fases do desenvolvimento do pontal arenoso compreenderam (Figura 1): (A e B)
processo inicial de retenção dos sedimentos; (C e D) formação e inflexão do pontal com o isolamento
da antepraia e; (E e F) desenvolvimento de uma planície de maré na retaguarda do pontal.
Figura 1: Evolução do pontal arenoso na margem esquerda do rio Vaza-Barris entre 1965 e 2008.
Fonte: Elaboração da autora.
No ano de 1965 não existia evidências da formação de um pontal arenoso. Já no ano de 1971, ocorreu
um grande acúmulo de sedimentos na linha de costa que resultou na progradação desta. Este ano ainda
não apresentava indícios de formação de um pontal arenoso, apenas o processo inicial de retenção de
sedimentos.
A formação do pontal arenoso ocorreu entre 1971 e 1978, provavelmente a partir dos sedimentos
disponibilizados pela praia recém-progradada de 1971. No ano de 1978, o pontal possuía cerca de 2,3
km de extensão. Neste ano, o pontal já se apresentava recurvado. Houve continuidade do processo de
acresção e, em 1986, o pontal apresentava cerca de 2,9 km de extensão. A influência do
retrabalhamento eólico na parte emersa do pontal foi identificada nas fotografias aéreas devido à
presença de pequenas dunas frontais. No período de 1986 a 2003, o pontal continuou ampliando-se
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para SW, enquanto a linha de costa recuou. Possivelmente os sedimentos erodidos migraram para a
SW, alongando o pontal e, posteriormente, para o interior da desembocadura. No ano de 2003, o
pontal apresentava uma extensão de cerca de 4,3 km.
Com o crescimento do pontal arenoso, durante o período de 1978 a 1986, iniciou-se um processo de
isolamento da antepraia que resultou na criação de uma zona protegida das ondas caracterizada por um
ambiente aquoso de baixa energia. Na área isolada, a dinâmica das marés passou a predominar. Esta
condição favoreceu a ocorrência do processo de colmatação, no qual os sedimentos finos (silte e
argila), em suspensão na lâmina d’água, foram depositados preenchendo parcialmente o ambiente
aquoso. Este processo deu origem a uma planície de maré na retaguarda do pontal arenoso. A Planície
de Maré originada pelo processo descrito é alimentada por um canal de maré, de aproximadamente
50m de largura, que serve de conduto para a entrada e saída da maré (Figura 2). No período de 2003 a
2008, a parte S do pontal foi erodida, diminuindo sua extensão para 3,6 km.
A Figura 3 destaca a sobreposição dos pontais ao longo dos anos, evidenciando a grande variabilidade
natural das desembocaduras fluviais, e mostrando a tendência geral de acresção do pontal arenoso,
simultâneo à ocorrência de processos erosivos na linha de costa.
Planície de maré
rio Vaza-Barris
Planície de maré
Porção final do pontal arenoso
Conduto de entrada e saída da maré
Figura 2: Planície de Maré na retaguarda do pontal arenoso.
Fonte: Arquivos da autora.
Figura 3: Configuração do pontal arenoso na Zona de Expansão de Aracaju em 1965, 1971, 1978,
1986, 2003 e 2008. Fonte: Arquivos da autora.
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A análise multitemporal a partir das fotografias aéreas e das imagens de satélite restringiu-se até o ano
de 2008. No entanto, com base no campo realizado no ano de 2012, foi possível identificar que o
pontal arenoso ainda mantém uma tendência erosiva, tal como observado entre 2003 e 2008, uma vez
que foi identificado em campo indicadores de que a linha de costa estava em erosão, a exemplo de:
lama de mangue aflorando na face de praia, vegetação de mangue soterrada e escarpas ativas.
É importante frisar que o regime de marés da referida área é do tipo meso-maré de caráter semidiurno, com amplitude máxima de 2,0m e mínima de -0,1m. As maiores amplitudes ocorrem nas
marés de sizígia, principalmente nos meses de março, abril, agosto, setembro e outubro (Diretoria de
Hidrografia e Navegação, 2014). Não obstante, o estudo realizado apontou que o regime de marés não
tem uma influência direta nas modificações na morfologia do pontal.
A partir das análises, conclui-se que o pontal analisado segue o modelo de formação de pontais
complexos elaborado por Dean; Dalrymple (2002), uma vez que passou por todas as fases descritas:
crescimento do pontal e inflexão da porção final para dentro da embocadura (Figura 3). Este fato pode
indicar que durante o período de formação do pontal houve a atuação de diferentes direções de frentes
de ondas.
Ondas
Ondas Primárias
1978
1986
2003
Figura: Comparação da morfologia do pontal arenoso com o modelo proposto por Dean; Dalrymple
(2002).
Fonte: Elaboração da autora.
CONCLUSÕES: O estudo evolutivo da margem esquerda da desembocadura do rio Vaza-Barris, com
base na escala temporal estabelecida, revelou a formação de um pontal arenoso, no qual se verificou a
tendência geral de acresção para SW, com aumento da extensão do pontal simultâneo à ocorrência de
recuo da linha de costa. Conclui-se que tal área possui grande variabilidade morfodinâmica, o que a
torna uma paisagem sujeita a alterações constantes. Por todo o exposto, urge que sejam adotadas
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medidas preventivas no que concerne a futuras ocupações, uma vez que se trata de um ambiente frágil,
composto por unidades geomorfológicas extremamente suscetíveis, tanto a eventos de ordem natural,
quanto de ordem antrópica.
REFERÊNCIAS BILBIOGRÁFICAS:
BIRD, E. Coastal Geomorphology: an introduction. Second Edition, p. cm. Jonh Wiley & Sons,
Ltd. Geostudies.2008.
CLAYTON, T.D.; TAYLOR, JR. L.A.; CLEARY, W.J.; HOSIER, P.E.; GRABER, P.H.F.; NEAL,
W.J.; PILKEY, O.H. Living With the Georgia Shore. Duke University Press. 1992.
DAVIS, R.; FITZGERALD, D. Beach and Coasts.Blackwell Science Ltd. Austrália.2004.
DEAN, R.G; DALRYMPLE, R.A. Coastal Process.CAMBRIDGE UNIVERSITY PRESS. 2002.
DHN. Tábuas de maré. Marinha do Brasil, Diretoria de Hidrografia e navegação. Disponível em
http://www.dhn.br. Acesso em 06 de junho de 2014.
ESTEVES, S. L. Estado-da-arte dos métodos de mapeamento da linha de costa. Instituto de
Geociências, UFRS, 2003.
EVANS, O.F.; The Origin of Spits, Bars and Related Structures. Journal Of Coastal Research.
Vol.50. n.7.p. 846, 1942.
MORTON, R.A.; PILKEY, O.R.JR; PILKEY O.H.SR.; NEAL, W.J. Living with the Texas
shore.Duke University Press, Durham, North Carolina. 1983.
OLIVEIRA, M.B. Caracterização integrada da linha de costa do Estado de Sergipe – Brasil.
Dissertação (Mestrado) - Cursos de Pós-graduação em Geologia, Igeo, UFBA, 2003.
STIVE, M.J.F.; AARNINKHOF , S.G.J. , HAMM, J, HANSON, H.; LARSON, M.; WIJNBERG,
M.K. NICHOLLS, R.J.; CAPOBIANCO, M. Variability of shore and shoreline evolution. Coastal
Engineering 47, 211– 235, 2002.
TERICH, T.A. Living with the Shore of Puget Sound and the Georgia Strait. Duke University
Press. Durham, 1987.
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