Emprego de Extensômetros Elétricos de Resistência para Instrumentação de Estacas Metálicas Paulo José Rocha de Albuquerque Unicamp, Campinas, Brasil, [email protected] Eduardo Oliveira Melo Unicamp, Campinas, Brasil, [email protected] RESUMO: Este trabalho tem como finalidade apresentar os estudos iniciais executados em laboratório com um perfil metálico de 30 cm de comprimento instrumentado na alma e mesa, empregando ligações do tipo ponte completa, 1/2 ponte e 1/4 de ponte. Após a instrumentação o perfil foi carregado axialmente à compressão, obtendo leituras das deformações para cada incremento de carga. Os resultados obtidos indicaram que o posicionamento do strain-gage (mesa ou alma) não influenciou os resultados, porém este fato não foi observado quando se varia o tipo de ligação. Desta forma, entende-se que é de suma importância para um bom funcionamento da instrumentação, que se estude detalhadamente o tipo de ligação a ser empregada, tendo em vista os custos envolvidos neste tipo de trabalho, bem como a mobilização da obra para a realização de uma prova de carga. PALAVRAS-CHAVE: instrumentação, perfil metálico, carregamento à compressão 1 INTRODUÇÃO A engenharia de fundações busca incessantemente conhecer o comportamento de fundações profundas em termos de transferência de carga, para isso, pode-se utilizar dentre várias técnicas, o emprego de extensômetros elétricos de resistência (strain-gage). Quando esta técnica é empregada em estacas de concreto, o processo é simples, pois em geral, instala-se a instrumentação nas fases de pré ou pós concretagem. No caso de estacas metálicas, deve-se executar anteriormente ao processo de cravação, pois não é possível instrumentar após sua cravação, o que torna o processo mais cuidadoso e com maior probabilidade de falhas, devido aos possíveis danos nos sensores que podem ocorrer no processo de execução. No Brasil existem poucos trabalhos foram publicados a respeito da técnica de instrumentar estacas metálicas, alguns datados de meados da década de 1990. Com o aumento do emprego de perfil metálico em fundações, projetistas e consultores tem buscado conhecer o comportamento deste tipo de fundação com o objetivo de otimizar os projetos, tornando-se assim necessário estudar com mais afinco a instrumentação de perfil metálico. Para isso desenvolveu-se este trabalho, que faz um estudo preliminar da instrumentação em uma peça metálica (perfil) fixando extensômetros elétricos em distintos pontos (alma mesa), além de avaliar os tipos de ligação empregados. 2 EXTENSÔMETROS ELÉTRICOS Os extensômetros elétricos, também chamados “Strain Gages” não são dispositivos recentes, têm-se conhecimento de extensômetros desde a década de 30 (Hoffman, 1989). Basicamente os extensômetros são constituídos de uma resistência elétrica tênue, com dois terminais, montados sobre um suporte, que serve como isolante, podendo ser constituído de papel ou de resina plástica, e coberto por uma capa de feltro ou de mesmo material do suporte. Os extensômetros elétricos são instrumentos sensíveis que transformam pequenas deformações sofridas em variações equivalentes de sua resistência elétrica. Sua utilização constitui um meio de se medir e registrar o fenômeno da deformação como sendo uma grandeza elétrica. A partir da deformação longitudinal do strain gage, transforma-se em sinal elétrico, que depois de captado e decodificado é traduzido em deformação linear. Existem vários tipos de extensômetros: de indutância e de capacitância, assim como os piezoelétricos que não tiveram o mesmo sucesso obtido pelos extensômetros de resistência. Estes apresentam a mais considerável contribuição ao desenvolvimento da medida das deformações. Na figura 1 podese observar alguns tipos de strain gages. Figura 1. Tipo de rosetas (Kyowa, 2014). Os extensômetros elétricos de resistência atuais são os de fio e de lâmina. São feitos por um metal condutor de eletricidade, possuindo grande sensibilidade às deformações. Ao contrário do extensômetro de carbono, estes não apresentam sensibilidade às variações de temperatura, de umidade e influência do tempo. Os do tipo elétrico são empregados na determinação de diferentes estruturas tais como: pontes, máquinas, aviões, automóveis, locomotivas, navios e associados a transdutores possibilitam a medição de pressão, tensão, força, aceleração e outros instrumentos de medidas, que são usados em campos que vão desde a análise experimental de tensão até a investigação e prática médicas e cirúrgicas. Todos os materiais sofrem deformações quando sujeitos a esforços. O conhecimento dos esforços internos é de grande importância, pois é através deles que se dimensionam as estruturas. A característica tensão vs deformação dos materiais estruturais, tais como o aço, é hoje suficientemente bem compreendida para a maioria das aplicações práticas e pode ser determinada em laboratório com razoável grau de confiança. A deformação depende da tensão aplicada e das limitações do material do corpo solicitado. Características do material como limite de resistência, limite de proporcionalidade, limite de escoamento são representadas por tensões. As deformações, que são causadas pela atuação de cargas ou outras influências externas ou pelo seu peso próprio, podem ser medidas com extensômetros, tais como a distorção, que é uma variação angular, embora com certa complexidade comparando-se com a medida de deformação linear. Como a maior parte dos processos de cálculos baseiam-se nas tensões, torna-se necessário transformar o efeito das deformações, que podem ser medidas, em tensões. A deformação total em qualquer direção é composta por três parcelas: deformação causada pela variação de temperatura; deformação pelo efeito de Poisson e a deformação primária relacionada como a tensão naquela direção. Como o dispositivo é colado na superfície e conforme a peça se deforma, o valor da sua resistência elétrica altera proporcionalmente, então seu maior problema passa a ser a umidade. Porém, as técnicas de colagem e impermeabilização protegem esses extensômetros contra a umidade e garantem a permanência do zero. A sensibilidade à variação de temperatura é um dos mais importantes fatores a serem considerados no uso do strain gage por dois fatores principais: a diferença de alongamento existente entre a peça, o suporte da grade e a grade propriamente dita e a variação de resistividade com a temperatura. À medida que a temperatura varia durante a medição das deformações, variando também os resultados. A variação da temperatura influencia a expansão linear do material e do fio do extensômetro e também a variação da resistência específica do fio. Tem-se a expressão 1: ∆ ∆ (1) Que servirá tanto para a expansão livre do extensômetro quanto para o material. Sendo que: ∆ = variação de comprimento tanto do fio do extensômetro, quanto do corpo de prova; = comprimento inicial; =coeficiente de dilatação do material ou coeficiente de resistividade; ∆ = variação da temperatura. Para minimizar os efeitos da variação da temperatura é possível utilizar dois tipos distintos de montagem dos strain gages nas pontes resistivas: montagem de dois cabos (meia ponte) e a montagem de três cabos (1/4 de ponte). A deformação aplicada ao extensômetro deve ser tanto quanto possível, a mesma que a da peça a ser examinada. Pode-se calcular a deformação da peça sabendo a resistência e o coeficiente de sensibilidade que são dados pelo fabricante. ∆ ∆⁄ Figura 3. Ligação 1/4 de ponte - 3 fios (Paulino, 2011) (2) Primeiro mede-se a resistência inicial do extensômetro, depois se torna a medir essa resistência; a subtração das duas tem-se ∆. Assim, resolvendo a equação 2, obtem-se a deformação. Essas variações de resistência são muito pequenas, não possibilitando a medida com ohmímetro convencional. Contudo, existe um circuito elétrico, conhecido por Ponte de Wheatstone, que pode cumprir essa função. A Ponte de Wheatstone basicamente possui quatro resistores, sendo ligados em série dois a dois e posteriormente ligados em paralelo, que estão conectados a uma bateria ou fonte de corrente e um galvanômetro. Desta forma, fazendo-se a conexão do extensômetro na Ponte de Wheatstone pode-se medir com grande precisão pequenas variações em sua resistência elétrica. Nas figuras 2 a 6 observa-se alguns tipos de ligações que podem ser efetuadas. Figura 4. Ligação 1/2 de ponte - ativo / passivo (Paulino, 2011) Figura 5. Ligação 1/2 de ponte - ativo / ativo (Paulino, 2011) Figura 6. Ligação ponte completa (Paulino, 2011) Figura 2. Ligação 1/4 de ponte - 2 fios (Paulino, 2011) A partir dos variados tipos de ligações que se podem fazer, sua escolha dependerá do tipo de sinal que se deseja obter. Dependendo do tipo de ligação que se faz, obtem-se esforços axiais, momento, torção e temperatura. Porém, se houver falha no esquema de ligação, corre-se o risco de se obter uma somatória de sinais, como por exemplo: axial e momento ou axial e temperatura. Sendo assim, a leitura obtida não representará as deformações que estão sendo submetidas à peça. De uma forma geral, podese dizer que uma ligação em 1/4 de ponte obtem-se uma somatória de esforços axiais, momento e temperatura, este último pode ser corrigido se utilizar a técnica de três fios. No caso de 1/2 ponte pode-se obter a soma de momento e axial, eliminando neste caso o efeito de temperatura. Porém, no caso de ponte completa, eliminam-se os efeitos advindos do momento e temperatura. Outro fator que deve avaliar quando se utiliza 1/4 de ponte é a questão do desvio de linearidade (figura 7). 8). Figura 8. Posicionamento dos strain-gages. 3 MATERIAL E MÉTODO 3.1 Instrumentação +100 +80 +60 UA / UB (mV/V) +40 +20 0 -20 -40 -60 -80 Desvio Linear -100 -0,3 -0,2 -0,1 0 +0,1 +0,2 +0,3 ∆R / R 0 (Ω / Ω) Figura 7. Posicionamento dos strain-gages. Hoffman (1989) mostra que neste tipo de ligação existe um desvio de linearidade no trecho inicial e final de um ciclo de carregamento. Este fator é importante e deve ser considerado em consideração no planejamento do processo de instrumentação A histerese também deve ser avaliada no processo de instrumentação. Ela é caracterizada pelo erro de um transdutor que surge quando se faz leituras de carga e descarga. Geralmente uma mesma carga lida no sentido descendente (descarregamento) é maior que a sua equivalente no sentido do carregamento (Figura Neste trabalho utilizaram as ligações em ¼ de ponte, meia ponte e ponte completa, em que se fixaram os strain-gages nas abas e alma do perfil, sempre em sua meia-altura. No caso da ligação em meia ponte, fixou-se dois extensômetros, sendo um externo ativo e outro compensador (sem carga). Na fixação em ponte completa, fez-se uma perfuração na alma do perfil (φ = 3 mm) para a passagem da fiação e montagem da ponte. Este tipo de ligação foi executado somente na alma do perfil. Utilizouse um perfil W 150 x 22,5 (H) com 30 cm de comprimento. Para as ligações em meia ponte e 1/4 de ponte (três fios) utilizou strain-gages uniaxiais de 10 mm de comprimento de grade e para a ponte completa strain-gages do tipo roseta 90º com comprimento de grade de 5 mm. Na Figura 9 pode-se observar a posição em que foram colados os sensores. 1/4 PONTE MEIA PONTE risco de carregamento excentrico. Na figura 10 pode-se observar a peça posionada no eixo da máquina. PONTE COMPLETA MEIA PONTE Figura 9. Posicionamento dos strain-gages. Anteriormente a fixação dos strain-gages na peça procedeu-se a preparação da superfície de colagem com a retirada de irregularidades por meio de lixas Nº 80, 120 e 180, até que se obtivesse uma região apropriada. Em seguida foi feita a marcação dos eixos de posicionamento e em seguida a limpeza da área por meio de acetona PA com auxílio de gaze, limpando várias vezes o mesmo local para desengordurar e eliminar qualquer resíduo. Em seguida, procedeu-se o posicionamento do strain-gage com o auxílio de uma pinça, que em seguida foi fixado à peça com uma fita adesiva transparente. Após esta etapa, adicionou-se uma gota de cola (cianocrilato) na base do extensômetro para assim fixá-lo na posição desejada. Depois da secagem da cola, a fita adesiva foi retirada com cuidado, sempre a favor dos filamentos para não danificá-los. Em seguida, mediu-se a resistência elétrica do strain gage para verificar se não foi danificado durante a colagem. Na parte inferior dos fios de ligação foi colocada fita isolante para proteção quanto à interferência elétrica. Mesmo procedimento foi executado na peça externa metálica (compensadora) para a conexão em meia ponte. Para a ligação dos strain gages utilizaram-se cabos AWG 26. Esse cabo foi ligado aos gages por meio de solda de estanho e fixado no perfil por meio de cola e fita isolante para que não houvesse risco de dano no manuseio. 3.2 Carregamento Finalizadas as etapas, a peça foi levada a uma prensa para carregamento axial à compressão. Tomou-se o cuidado para que não houvesse Figura 10. Carregamento do perfil. Os carregamentos foram executados de tal forma que o aço mantivesse em seu regime elástico. A carga máxima do ensaio foi de 300kN, com incrementos de carga de 30kN. Para carga estágio de carga foram realizadas leituras de deformação, inclusive no descarregamento, para verificação da histerese. Foram realizados cinco ciclos de carga e descarga. Utilizou-se o sistema de leitura QUANTUM 840X-HBM que permitiu fazer a coleta simultânea das leituras (Figura 11). Figura 11. Equipamentos do sistema de aquisição de dados 4 RESULTADOS E ANÁLISES A partir dos dados coletados pelo sistema de aquisição de dados, foi possível obter os gráficos tensão vs deformação (médios) para todos os tipos de instrumentação (Figura 12). Na tabela 1 são apresentados os valores dos módulos de elasticidade, desvio padrão e coeficiente de variação. 90 80 TENSÃO (MPa) 70 60 50 40 30 20 10 0 0,000% 0,005% 0,010% 0,015% 0,020% 0,025% 0,030% 0,035% 0,040% DEFORMAÇÃO PONTE COMPLETA_PERFIL MEIA PONTE_MESA 1/4 PONTE - MESA MEIA PONTE_ALMA 1/4 PONTE - ALMA Figura 12. Gráficos tensão vs deformação. Tabela 1. Parâmetros obtidos em cada tipo de ligação. E Sd CV Tipo ligação (GPa) (GPa) (%) Ponte completa 217,3 7,81 3,6 1/2 ponte (alma) 223,2 14,8 6,6 1/2 ponte (mesa) 226,8 15,2 6,7 1/4 ponte (alma) 259,4 49,7 19,1 1/4 ponte (mesa) 272,3 61,7 22,7 E = módulo de elasticidade (média), Sd = desvio padrão, CV = coeficiente de variação A partir dos resultados apresentados na tabela 1 verificou-se que a ligação que apresentou melhor resposta foi a ponte completa, seguida da meia ponte. Estes resultados são corroborados por meio da análise dos valores dos módulos de elasticidade, bem como pela variabilidade dos resultados. Pode-se observar também que o posicionamento dos strain-gages na alma ou na mesa não alteram os resultados das deformações. Cabe ressaltar que as ligações e colagem foram realizadas em laboratório, com o máximo controle no processo de instrumentação. 5 CONCLUSÃO Esta pesquisa teve a finalidade de avaliar os tipos de ligações e o posicionamento dos straingages em um perfil metálico. A partir dos resultados conclue-se que: - O tipo de ligação que se executa neste tipo de elemento estrutural é de suma importância ao funcionamento da instrumentação; - O posicionamento do strain-gage na peça não influencia os resultados; - O processo de colagem deve ser cuidadodo para que evite ao máximo a perda do sinal; - Anteriormente ao início de qualquer processo de instrumentação, deve-se fazer um planejamento do processo, o que inclui o tipo de ligação mais adequada ao tipo de sinal que se deseja obter. A negligência desta etapa pode incorrer em erros irreparáveis nos sinais de leitura, que não poderão ser corrigidos ou ajustados após ensaio. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem às agências FAPESP e FAEPEX (Unicamp) pelo financiamento e apoio a essa pesquisa, e da Gerdau Açominas pelo apoio à pesquisa. REFERÊNCIAS Hoffmann, K. (1989). An introduction to measurements using strain gages. HBM editor. Alsbach, Germany. 273 p. Kyowa (2014). Strain Gages - Virtual Catalogue. <https://www.kyowaei.co.jp/en/download/detail?id=1 864. Acesso em: 23 jun. 2014. Paulino, H. L (2011). Aplicação de strain gages rosetas na análise experimental de tensões. Campinas. 80 p.