PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO
GABINETE DO JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 6658 PB (2005.82.00.009004-5)
APTE
: JOAO BATISTA DE ARAUJO FILHO
ADV/PROC : FÉLIX ARAÚJO FILHO
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM
: 1ª VARA FEDERAL DA PARAÍBA - PB
RELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma
RELATÓRIO
O JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI (RELATOR): O MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL (MPF) ofereceu denúncia contra RUY ELOY, pela prática da conduta
descrita no art. 319 c/c art. 327, § 2o, ambos do Código Penal (CP), e contra JOÃO
BATISTA DE ARAÚJO FILHO, pela prática da conduta descrita no art. 171, § 3o, também
do CP (fls. 1.188/9 e 1.973/80).
Segundo o Parquet, em 11 de janeiro de 1999, no processo de habilitação
para a função de juiz classista representante dos empregadores da antiga Junta de
Conciliação e Julgamento (JCJ) de Picuí (PB), para o triênio de 1999 a 2002, JOÃO
BATISTA DE ARAÚJO FILHO apresentou aditivo a contrato de constituição de firma, que o
declarava sócio da empresa João Araújo e Cia., quando não mais pertencia ao quadro
societário da empresa. A declaração falsa foi utilizada para preencher o requisito
previsto no art. 661, f, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), qual seja “contar
com mais de 2 (dois) anos de efetivo exercício na profissão e ser sindicalizado” e,
assim, obter a nomeação.
O MPF narrou, ainda, que RUY ELOY, presidente do Tribunal Regional
do Trabalho (TRT) da 13a Região, nomeou JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO para o
cargo de juiz classista representante dos empregadores, apesar de o MINISTÉRIO
PÚBLICO DO TRABALHO (MPT) tê-lo advertido que ele não reunia os requisitos para a
investidura no cargo.
O procedimento criminal teve início no Superior Tribunal de Justiça
(STJ), já que RUY ELOY possuía foro privilegiado por prerrogativa de função. Naquela
Corte Superior, a punibilidade de RUY ELOY foi extinta pela ocorrência da prescrição
em abstrato (fls. 2.077/8). Em seguida, os autos foram remetidos à Justiça Federal de 1o
grau, competente para processar o feito em relação a JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO.
A denúncia e seu aditamento foram recebidos em 22 de março de 2007
(fl. 2.120).
JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO foi interrogado nas fls. 2.156/9.
A defesa prévia do réu encontra-se nas fls. 2.161/70.
A testemunha arrolada pela acusação foi ouvida nas fls. 2.172/4 e as
testemunhas arroladas pela defesa, nas fls. 2.182/3 e 2.238/41.
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Na fase do antigo art. 499 do Código de Processo Penal (CPP), o MPF e
a defesa nada requereram (fls. 2.250/1).
Em alegações finais (fls. 2.252/8), o Parquet ratificou os termos da
denúncia e respectivo aditamento, pugnando pela procedência da ação penal. JOÃO
BATISTA DE ARAÚJO, a seu turno, suscitou preliminar de inépcia da denúncia, por falta
de clareza na exposição dos fatos. No mérito, pugnou por absolvição, por insuficiência
probatória e atipicidade da conduta (fls. 2.284/92)
Na sentença (fls. 2.294/301), o Juiz condenou JOÃO BATISTA DE ARAÚJO
FILHO nas penas do art. 171 do CP a 1 ano, 7 meses e 15 dias de reclusão e ao
pagamento de 117 dias-multa. Pela incidência do § 3o do art. 171 do CP, elevou a pena
privativa de liberdade em 1/3, tornando a reprimenda definitiva em 2 anos e 2 meses de
reclusão e no pagamento de 117 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do maior salário
mínimo vigente na época do fato. Por considerar presentes os requisitos do art. 43 e
seguintes, substituiu a pena privativa de liberdade por restritivas de direito.
Em apelação (fls. 2.305 e 2.330/7), JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO
requereu absolvição por inexistência de meio apto à indução a erro e por ausência de
dolo, uma vez que acreditava reunir todas as condições exigidas para concorrer à
investidura no cargo. Em caso de manutenção da condenação, pugnou pela redução da
pena ao patamar mínimo e pela aplicação da atenuante de confissão espontânea.
As contrarrazões pugnam pela manutenção do julgado (fls. 2.350/9).
Em parecer (fls. 2.365/9), a Procuradoria Regional da República da 5a
Região (PRR) opinou pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
Ao eminente revisor.
JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI
Relator
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 6658 PB (2005.82.00.009004-5)
APTE
: JOAO BATISTA DE ARAUJO FILHO
ADV/PROC : FÉLIX ARAÚJO FILHO
APDO
: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM
: 1ª VARA FEDERAL DA PARAÍBA - PB
RELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma
EMENTA: PENAL. ESTELIONATO QUALIFICADO (ART. 171, § 3o,
DO CÓDIGO PENAL). ELEMENTO SUBJETIVO DO DELITO.
PRESENÇA.
1. O acusado, mediante utilização de documento ideologicamente falso
(certidão do Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e
Medicamentos do Estado da Paraíba), com vontade livre e consciente
dirigida para obter nomeação em cargo de juiz classista, que sabia
indevida, induziu em erro o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 13a
Região e causou prejuízo ao erário, uma vez que os vencimentos foram
pagos até a anulação do ato administrativo
2. A certidão atribuía falsamente ao réu um dos requisitos exigidos pela
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pela Instrução Normativa no
12, de 1997, do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
3. O aditivo contratual comprova que o recorrente não integrava o quadro
societário da empresa João Araújo e Cia. na época da seleção.
4. Para a investidura no cargo de juiz classista exigiam-se os requisitos
estabelecidos no art. 661 da CLT e no art. 2o da IN no 12, de 1997, do
TST, na época da seleção (1999). Dessa forma, ao tempo da indicação
em lista tríplice pelo sindicato, o réu deveria estar no pleno exercício da
atividade profissional informada, o que não ocorreu.
5. Presentes os elementos caracterizadores do tipo penal — art. 171, § 3o,
do CP — aí incluído o dolo específico, que é a vontade livre e consciente
dirigida para a obtenção da vantagem ilícita, no caso, a nomeação
indevida em cargo público.
SENTENÇA.
DOSIMETRIA.
PENA-BASE.
EXASPERAÇÃO
DESPROPORCIONAL.
ATENUANTE
DA
CONFISSÃO
ESPONTÂNEA (ART. 65, III, d, DO CP). INAPLICABILIDADE.
6. Deve-se reduzir o quantum da pena-base, uma vez que somente o
exame das circunstâncias judiciais da culpabilidade e dos motivos do
crime (art. 59 do CP) foi desfavorável ao réu.
7. O réu não confessou espontaneamente a prática do crime de
estelionato, o que afasta a incidência da atenuante do art. 65, III, d, do
CP.
8. Apelação parcialmente provida.
VOTO
O JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI (RELATOR): Conheço do
recurso, porque estão presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
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JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO foi condenado por ter obtido, mediante
apresentação de documento ideologicamente falso, nomeação para o cargo de juiz
classista da Junta de Conciliação e Julgamento de Picuí (PB), como representante dos
empregadores, no triênio 1999/2002.
—I—
O réu apelou, alegando ausência do elemento subjetivo do delito, já que
não teria tido a intenção de induzir em erro os membros do Tribunal Regional do
Trabalho da 13a Região, porque acreditava reunir todas as condições exigidas para
concorrer ao cargo (art. 661, f, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e art. 2o, II,
g e h, da Instrução Normativa (IN) no 12, de 1997, do Tribunal Superior do Trabalho TST). Conforme o recurso, o apelante integrou o quadro societário da empresa João
Araújo e Cia. por mais de 2 anos e “mesmo depois de desligar-se do quadro societário
da aludida empresa, não perdeu o vínculo com a atividade comercial (comércio
atacadista de medicamentos), tampouco se afastou da militância sindical, tendo
participado dos quadros do Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e
Medicamentos do Estado da Paraíba, desde a sua criação, participando inclusive, do
Conselho Fiscal da entidade – observe-se – entre os anos de 1997 a 2000, espaço de
tempo que abrange justamente a época em que postulou e obteve a indicação ao cargo
de juiz classista para o triênio 1999/2002” (fl. 2.332)..
Não concordo com a tese. O art. 661 da CLT e o art. 2o da IN no 12, de
1997, do TST, que dispõem sobre o processo de seleção dos juízes classistas, previam
os requisitos para a investidura no cargo (sem grifo no original):
Art. 661. Para o exercício da função de juiz classista da Junta ou
suplente deste são exigido os seguintes requisitos:
a) ser brasileiro;
b) ter reconhecida idoneidade moral;
c) ser maior de 25 (vinte e cinco) anos e ter menos de 70 (setenta) anos;
d estar no gozo dos direitos civis e políticos;
e estar quite com o serviço militar;
f) contar com mais de 2 (dois) anos de efetivo exercício na profissão e
ser sindicalizado.
Parágrafo único. A prova da qualidade profissional a que se refere a
alínea f deste artigo é feita mediante declaração do respectivo
Sindicato.
Art. 2o O processo de apresentação das listas tríplices no TRT deverá ser
instruído pela entidade sindical com o original ou cópia autenticada dos
seguintes documentos:
[...]
II - Em relação a cada um dos integrantes da lista tríplice:
[...]
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e) Certidões Negativas dos distribuidores das Justiças Federal e
Estadual, cíveis, criminais e trabalhista, dos lugares em que haja
residido nos últimos 5 (cinco) anos. Caso a certidão seja positiva,
poderá o candidato apresentar em anexo notícia específica da
ocorrência com os esclarecimentos pertinentes;
f) Declaração, de próprio punho e sob as penas da lei, da qual conste
que nunca foi indiciado em inquérito policial e administrativo, bem como
processado criminalmente ou, em caso contrário, notícia específica da
ocorrência, acompanhada dos esclarecimentos pertinentes;
g) Certidão firmada pelo presidente ou dirigente da entidade sindical,
sob as penas da lei, de ser o candidato sindicalizado e estar no exercício
de atividade profissional ou econômica correspondente à categoria
representada pela entidade certificante;
h) Comprovar mediante traslado da carteira de trabalho, em se tratando
de empregado, ou mediante estatuto ou contrato social da empresa, na
hipótese de o candidato ser empregador, o exercício da atividade
profissional ou econômica por mais de 2 (dois) anos; [...]
No processo de habilitação no 340, de 1999 (fls. 184/267), o recorrente
apresentou ao TRT da 13a Região cópia de aditivo do contrato social da empresa João
Araújo e Cia., de 1o de novembro de 1994 (fls. 114/5), no qual figurava como sócio, e
certidão emitida pelo Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e Medicamentos do
Estado da Paraíba, de 22 de dezembro de 1998 (fl. 113), com o fim de comprovar a
qualidade de empregador e o efetivo exercício de atividade profissional por mais de 2
anos. Ante os documentos, a comissão de análise do TRT da 13a Região considerou-o
apto a participar do processo seletivo (fls. 158 e 162).
Todavia, após diligência do Ministério Público do Trabalho (MPT) na
Junta Comercial do Estado da Paraíba (fl. 24), localizou-se outro aditivo contratual (fls.
24 e 26/7), segundo o qual o recorrente não integrava o quadro societário da empresa
desde 15 de dezembro de 1997. Não obstante a impugnação do MPT à nomeação, em
30 de abril de 1999, o réu foi nomeado juiz classista titular da antiga Junta de
Conciliação e Julgamento (JCJ) de Picuí (PB), fl. 721.
Na verdade, o apelante não reunia os requisitos para concorrer ao cargo
de juiz classista representante dos empregadores em 1999, porque participava do quadro
societário da empresa João Araújo e Cia. desde 1997. Na época do processo de
habilitação, o apelante não preenchia os requisitos legais para isso. O próprio réu, ao
contestar impugnação do MPT, reconheceu que não era mais sócio da empresa (fl. 168).
O fato de o réu ter exercido determinada atividade econômica ou
profissional por mais de dois anos, em qualquer época, não o legitimava a concorrer ao
cargo de juiz classista pela categoria profissional a que um dia pertencera. Para a
investidura no cargo de juiz classista exigiam-se os requisitos estabelecidos no art. 661
da CLT e no art. 2o da IN no 12, de 1997, do TST, na época da seleção.
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Ao contrário do que sustenta o recorrente, a participação como membro
no conselho fiscal da entidade não era requisito para a investidura no cargo (vide
transcrição dos dispositivos).
Portanto, JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO, mediante apresentação de
documento que sabia ideologicamente falso (certidão do Sindicato do Comércio
Atacadista de Drogas e Medicamentos do Estado da Paraíba), obteve nomeação
fraudulenta para o cargo de juiz classista e recebeu os respectivos vencimentos,
causando prejuízo ao erário. A certidão influiu diretamente na escolha do réu para o
cargo, uma vez que lhe atribuiu falsamente um dos requisitos aplicáveis.
Não me convence, também, o argumento de que não houve motivação
dolosa à postulação, pois as provas demonstram à saciedade que o réu deliberada e
maliciosamente deixou de apresentar o aditivo contratual por meio do qual se retirou da
empresa.
Não é razoável imaginar que o recorrente, empresário com formação
superior em engenharia civil, não tivesse consciência de que sua pretensão estava
respaldada em documento ideologicamente falso, para cuja confecção contribuiu de
maneira decisiva.
Dessarte, ao contrário do que afirma o apelante, restou cabalmente
demonstrado na instrução criminal que JOÃO BATISTA DE ARAÚJO FILHO, com vontade
livre e consciente, mediante utilização de documento ideologicamente falso (certidão do
Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e Medicamentos do Estado da Paraíba),
induziu em erro os membros do TRT da 13a Região, para obter nomeação em cargo de
juiz classista — que sabia indevido —, causando prejuízo ao erário.
— II —
O recorrente insurgiu-se, também, contra a fixação da pena-base acima
do mínimo legal, porquanto a análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código
Penal (CP) teriam sido favoráveis.
Nesse ponto, assiste razão ao réu. Diz a sentença (fls. 2.300):
31.
A pena-base foi aplicada conforme as circunstâncias judiciais
fixadas pelo CP, art. 59, necessárias ao juízo de reprovação e que são as
seguintes: culpabilidade - o R. tem formação superior em engenharia
civil, o que lhe conferia condições intelectuais para saber que não
poderia utilizar-se de certidão ideologicamente falsa; antecedentes - o R.
é tecnicamente primário; conduta social - inexistem informações a
respeito; personalidade - o R. dificultou o andamento do feito quando
não apresentou alegações finais nem tampouco, quando intimado para
fazê-lo, nomeou novo advogado, obrigando o Juízo a designar defensor
dativo; motivos do crime - o R. teve por motivação auferir remuneração
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de cargo público para cujo exercício tinha consciência de que não
poderia fazê-lo à míngua do preenchimento de todas as condições
necessárias; circunstâncias do crime - o R. utilizou-se de documentação
falsamente ideológica; conseqüências do crime - o R. exerceu
ilegalmente durante 11 meses (cnf. item 5, retro) as funções do cargo de
juiz classista, sendo remunerado para tanto; comportamento da vítima por ter sido ente público o sujeito passivo principal do delito, nada há a
valorar.
32.
A culpabilidade, a personalidade do agente, os motivos do crime,
as circunstâncias do crime e as conseqüências do crime, cinco daquelas
oito circunstâncias judiciais, recomendam a fixação da pena-base, em 1
ano, 7 meses e 15 dias, considerando a pena mínima de 1 ano mais
(cinco oitavos) da pena mínima, em função dessas circunstâncias
judiciais.
33.
Agravantes ou atenuantes ausentes.
34.
Causa de aumento presente em razão de o crime ter sido
cometido em detrimento de entidade de direito público, conforme o § 3º,
art. 171, do mesmo CP, a pena privativa de liberdade, considerada a
pena-base e a inexistência de circunstâncias legais, fica majorada em
(um terço) e definitivada em 2 anos, 2 meses e 0 dia de reclusão.
Para mim, a ponderação em relação à personalidade e às circunstâncias e
consequências do crime não deve ser desfavorável ao réu. Não considero que os
fundamentos da sentença relativos ao comportamento processual do recorrente,
desabonem a circunstância judicial da personalidade, pois não dizem respeito às
características pessoais do agente ou a seus aspectos negativos. Na verdade, constatei
não existir nos autos informação de fatores negativos da personalidade do réu.
Conforme lição de Guilherme de Souza Nucci: “maldade, agressividade (hostil ou
destrutiva), impaciência, rispidez, hostilidade, imaturidade, irresponsabilidade, mauhumor, covardia, frieza, insensibilidade, intolerância (racismo, homofobia, xenofobia),
desonestidade, soberba, inveja, cobiça, egoísmo.”1
De igual modo, reputo que a análise das circunstâncias e das
conseqüências do crime deve ser revista. No que tange à primeira, porque a sentença
fundamentou-se em elementar constitutiva do delito de estelionato para considerá-la
desfavorável, o que é vedado pela cabeça do art. 61 do CP (vide transcrição da
sentença). Quanto à segunda, porque a ponderação desfavorável foi a mesma
apreendida na análise dos motivos do crime (vide transcrição da sentença).
1
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 8a ed., rev., atual. e ampliada. São
Paulo:RT, 2008. p. 391.
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Desse modo, na linha da sentença, reputo que a pena-base deva ser
exacerbada em 2/8, apenas.
— III—
Por fim, sustenta o recorrente que o Juiz, indevidamente, deixou de
aplicar a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, d, do CP).
A irresignação não merece acolhida, porque não considero que o apelante
tenha confessado a prática do crime de estelionato. Nesse ponto, estou de acordo com
os argumentos do Procurador da República na Paraíba, Rodolfo Alves da Silva, nas
contrarrazões (fls. 2.350/9), os quais adoto como razões adicionais desse julgamento:
Nada obstante, verifica-se que, em seu interrogatório, o recorrente
só aparentemente confessou a prática do crime em apreço, pois embora
tenha declarada que o fato narrado na denúncia realmente aconteceu,
negou, logo em seguida, ter praticado qualquer fraude para ser investido
no cargo de juiz classista, nos seguintes termos:
“que ao examinar a instrução normativa pertinente , de número
12, que regia o processo de indicação de juiz classista, constatou
que se enquadrava nos pré-requisitos e que dispunha de todos os
documentos necessários; que entendeu que como já tinha mais de 2
anos de empregador no ramos do comércio atacadista de drogas
estava habilitado a concorrer à indicação do cargo de juiz
classista.”
O apelante, portanto, claramente intentou afastar o animus
fraudandi de sua conduta, elementar do crime de estelionato (art. 171,
CP), pelo qual restou condenado. Observe-se que o cerne da denúncia é
exatamente a utilização, pelo recorrente, de certidão ideologicamente
falsa, com o fito de ser investido no cargo de juiz classista. Como ele
negou, quando interrogado, ter se valido de qualquer meio escuso para
obter a mencionada vantagem indevida, não há como vislumbrar uma
verdadeira confissão em suas declarações.
Segundo o magistério de Guilherme de Souza Nucci, “não é
possível que o réu se beneficie de uma circunstância legal para amenizar
sua pena se houver agido sem qualquer espontaneidade, apenas para
locupletar-se de algum benefício legal” (Código Penal Comentado, 7ª
ed., p.398).
Na mesma obra, o renomado autor também transcreve decisão do
TJSP, através da qual este assentou que “a confissão espontânea a que
alude o art. 65 do Código Penal, como circunstância determinante de
alguma redução de pena é aquela sem ressalvas, sem desculpas para o
gesto criminoso (...)” (Rer. 246.421-3/7, Bauru, 1º Grupo de Câmaras
Criminais, rel. Canguçu de Almeida, v.u., 15.03.1999).
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— IV —
Ante todo o exposto, dou parcial provimento à apelação, apenas, para,
mantida a condenação, reduzir o quantum da pena-base pelo exame das circunstâncias
judiciais do art. 59 do CP.
Desse modo, considerando que das 8 circunstâncias judiciais do art. 59
do CP, apenas o exame de duas delas foi desfavorável ao réu (culpabilidade e motivos
do crime), exaspero a pena-base na razão de 2/8, isto é, em 3 meses, alcançando a penabase 1 ano e 3 meses de reclusão. Constato a ausência de circunstâncias atenuantes e
agravantes. Pela qualificadora do § 3o do art. 171 do CP, elevo a pena (como fez a
sentença) em 1/3, isto é, em 5 meses, perfazendo a pena definitiva 1 ano e 8 meses de
reclusão, a ser cumprida em regime aberto (art. 33, § 1o, c, § 2o, c, do CP).
Mantenho os demais termos da sentença, relativos à pena de multa e às
penas restritivas de direitos.
É como voto.
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: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ORIGEM
: 1ª VARA FEDERAL DA PARAÍBA - PB
RELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma
EMENTA: PENAL. ESTELIONATO QUALIFICADO (ART. 171, § 3o, DO
CÓDIGO PENAL). ELEMENTO SUBJETIVO DO DELITO. PRESENÇA.
1. O acusado, mediante utilização de documento ideologicamente falso (certidão
do Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e Medicamentos do Estado da
Paraíba), com vontade livre e consciente dirigida para obter nomeação em cargo
de juiz classista, que sabia indevida, induziu em erro o Tribunal Regional do
Trabalho (TRT) da 13a Região e causou prejuízo ao erário, uma vez que os
vencimentos foram pagos até a anulação do ato administrativo
2. A certidão atribuía falsamente ao réu um dos requisitos exigidos pela
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pela Instrução Normativa no 12, de
1997, do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
3. O aditivo contratual comprova que o recorrente não integrava o quadro
societário da empresa João Araújo e Cia. na época da seleção.
4. Para a investidura no cargo de juiz classista exigiam-se os requisitos
estabelecidos no art. 661 da CLT e no art. 2o da IN no 12, de 1997, do TST, na
época da seleção (1999). Dessa forma, ao tempo da indicação em lista tríplice
pelo sindicato, o réu deveria estar no pleno exercício da atividade profissional
informada, o que não ocorreu.
5. Presentes os elementos caracterizadores do tipo penal — art. 171, § 3o, do CP
— aí incluído o dolo específico, que é a vontade livre e consciente dirigida para a
obtenção da vantagem ilícita, no caso, a nomeação indevida em cargo público.
SENTENÇA.
DOSIMETRIA.
PENA-BASE.
EXASPERAÇÃO
DESPROPORCIONAL. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA
(ART. 65, III, d, DO CP). INAPLICABILIDADE.
6. Deve-se reduzir o quantum da pena-base, uma vez que somente o exame das
circunstâncias judiciais da culpabilidade e dos motivos do crime (art. 59 do CP)
foi desfavorável ao réu.
7. O réu não confessou espontaneamente a prática do crime de estelionato, o que
afasta a incidência da atenuante do art. 65, III, d, do CP.
8. Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados os presentes autos, DECIDE a Primeira Turma do Tribunal
Regional Federal da 5a Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos
do relatório e voto anexos, que passam a integrar o presente julgamento.
Recife (PE), 3 de dezembro de 2009 (Data do julgamento)
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