Professor Tom Dantas Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias Língua Portuguesa O PATRIMÔNIO LINGUÍSTICO Saber reconhecer o patrimônio linguístico que envolve a formação de uma língua é fundamental para que se entendam características peculiares desse tipo de código. Vale ressaltar que a formação desse tipo de patrimônio depende de diversos fatores, como o social, o econômico, o geográfico e o cultural. Já as peculiaridades relativas a qualquer idioma podem ocorrer tanto no aspecto afetivo quanto no aspecto social, pois toda língua é um ser “vivo”, sendo, por isso, dinâmica, e toda língua é também coletiva, pois precisa de uma comunidade de usuários para que exista de verdade. Por isso, é preciso compreendê-la em sua grandeza, a fim de que se possa reconhecer a identidade cultural que se forma a partir do patrimônio linguístico de um idioma. Com o intuito de ampliar seus conhecimentos sobre o tema, leia os dois textos selecionados a seguir, pois eles exploram muito bem esse tema. Texto I A IMPORTÂNCIA DA LÍNGUA NO MUNDO SOCIAL E CULTURAL A vida das pessoas está intimamente associada ao processo de comunicação e aprimoramento da capacidade comunicativa que acompanha a própria evolução humana. À medida que amplia seu relacionamento com o mundo, o ser humano aperfeiçoa e multiplica a sua capacidade de comunicação, envolvendo palavras, sons e imagens. Textos verbais e não verbais interagem e contribuem para a representação oral e escrita das sociedades. A língua é um código desenvolvido para a transmissão de pensamentos, ideias e interação entre os indivíduos. Dessa forma, a língua pertence a todos os membro de uma comunidade e a nenhum deles isoladamente. Assim, como a língua é um código aceito, convencionalmente, por toda uma comunidade, um único indivíduo não é capaz de criá-la ou modificá-la. Em razão dos costumes, das gerações, de processos políticos, dos avanços sociais e tecnológicos, uma língua evolui, transformando-se historicamente. Por exemplo, algumas palavras perdem ou ganham fonemas, outras deixam de ser utilizadas, novas palavras surgem, de acordo com as necessidades, sem contar os “empréstimos” de outras línguas com as quais uma dada comunidade mantém contato. Então, a língua constitui, pois, um código mutável que integra as relações humanas e que, ao mesmo tempo em que sofre modificações, participa das mudanças nas sociedades. Esse patrimônio social é responsável pela possibilidade de se preservar o conhecimento e nº 21 de transmiti-lo a outras gerações no correr do tempo. É por meio da linguagem que as sociedades perpetuam suas histórias escritas. Sem a linguagem, o mundo seria um imenso vazio. Observa-se, também, uma estreita relação entre linguagem e cultura. Uma é expressão da outra. Essas duas entidades possuem uma relação tão ampla e complexa, que abrange desde a consideração de que as estruturas linguísticas possam se edificar, a partir de uma situação cultural, até a afirmação, em sentido contrário, de que os costumes linguísticos, de determinados grupos, tenham moldado, fundamentalmente, a cultura desses povos. Ou seja, a linguagem modifica a cultura e esta modifica aquela. No entanto, sendo o ser humano portador da linguagem, ele não é dela possuidor, apenas usuário. E, no uso, modifica a língua, mas não a detém para si como algo seu. Isso acontece porque a língua é um sistema social e não um sistema individual. Ela preexiste às pessoas. Não se pode, em qualquer sentido simples, ser autor. Falar uma língua não significa apenas expressar os pensamentos mais interiores e originais, significa, também, ativar a imensa gama de significados que jão estão embutidos no sistema cultural de dada comunidade, sociedade. Essa relação intrínseca entre língua, cultura, sociedade, constitui arranjo fundamental nas atividades cotidianas de nossas vidas. Dessa forma, as mudanças ocorrem, tanto na cultura quanto na língua, seja por eliminação, acréscimo ou modificação de elementos. Não é uma coisa voluntária, acontece sem que se perceba, de forma ininterrupta. Assim, as pessoas reestruturam aspectos linguísticos e valores morais, por exemplo, muitas vezes, sem perceber. Mas, para tristeza de muitos, ninguém, isoladamente, modifica uma língua. Ela pertence ao conjunto de falantes e responde por seus comportamentos sociais, culturais, morais, éticos. Compreende-se, então, que a linguagem é constituída de três formas: a) representação, “espelho” do mundo e do pensamento; b) instrumento “ferramenta” de comunicação; c) forma “lugar” de ação ou interação entre falantes. Ou seja, a principal concepção do ser humano (ser falante) representa para si o mundo através da linguagem e, assim sendo, a função da língua é representar / refletir seu pensamento e seu conhecimento de mundo. Finalmente, naquilo que diz respeito à sua essência, línguas são fenômenos inerentes ao ser humano e semelhantes a ele próprio: sistemáticos, porém complexos, arbitrários, irregulares, mostrando um acentuado grau de tolerância a variações, repletos de ambiguidades, em constante evolução aleatória e incontrolável. Por isso, a linguagem é espelho fidedigno das pessoas. É como diz Fernão de Oliveira (1536), “cada um fala como quem é”. Postado por Luísa Galvão Lessa à sexta-feira, maio 21, 2010 http://luisalessa.blogspot.com.br/2010/05/importancia-da-lingua-no-contexto-socio_21.html Texto 2 patrimônio linguístico: importância e proteção Temos dado muito pouca atenção a uma de nossas mais importantes riquezas nacionais, trata-se de nosso patrimônio linguístico. Exatamente as línguas ou idiomas e dialetos falados em nosso país. Qual é a sua situação atual e importância? Há proteção legal para eles? É o que tentaremos analisar. Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias Quando falamos em idiomas, logo vem a nossa mente aqueles mais conhecidos como o inglês, o francês, o alemão, o espanhol e o nosso português. Porém, há uma imensidão de idiomas ou línguas e dialetos em todo o planeta. Na verdade, a Terra é um grande mosaico linguístico, com cerca de 6800 línguas atualmente, o que forma hipoteticamente uma verdadeira Torre de Babel, aliás, é praticamente impossível catalogar todos os idiomas e dialetos existentes, tanto que há muitas divergências em relação aos números e estatísticas. Mas muitos deles encontram-se ameaçados de extinção, já que são falados por poucos indivíduos. Isto mesmo, ameaçados de extinção, exatamente como dizemos dos animais e plantas, inclusive seus processos de extinção podem ser parecidos. No Brasil: Por sua vez, o Brasil é o oitavo país com maior diversidade linguística, pois temos 234 idiomas, dos quais mais de 200 são línguas indígenas e inclusive 41 já foram extintas e muitas ameaçadas de extinção, como, por exemplo, o yuruti com cerca de 250 indivíduos que a falam. Aliás, atualmente temos muitas línguas indígenas que possuem pouquíssimas pessoas que as utilizam, sendo 50 no Brasil e o restante na Colômbia. O xipaya no Pará é falada por duas mulheres, o arikapu em Rondônia falada por seis pessoas, o puruborá também em Rondônia falada por duas pessoas e o máku falada apenas por um índio, que contava com 70 anos e vivia em Boa Vista, Roraima e que não está mais sendo localizado (Jornal Correio Braziliense, 03/07/01). Dados sobre o tema no Brasil: – o Brasil é o 8º país do mundo em número de idiomas falados em seu território; – por volta de 234 idiomas falados, sendo que 200 são línguas indígenas; – 41 idiomas estão extintos; – Língua Máku: apenas um indígena de 70 anos (Roraima); – Língua Kuruaya: meia dúzia de índios; – Língua Xypaia: apenas duas senhoras (Pará); – Língua Arikapu: seis pessoas (Rondônia); – Língua Puruborá: duas pessoas (Rondônia). As causas principais da extinção das línguas são: – o extermínio dos povos pelas guerras; – doenças; – desastres naturais que podem extinguir toda uma comunidade e sua cultura; – as pressões para a adoção da língua do povo dominante; – a globalização; e – falta de conscientização da importância da preservação das culturas. A colonização foi também uma das maiores causas de extinção de idiomas; é o caso, por exemplo, da dominação belga no Congo quando foi imposto o francês como língua oficial, em detrimento das mais de 200 línguas e dialetos locais. Também a introdução do cristianismo deu causa ao declínio de idiomas nos países da África e na América do Sul, principalmente. 2 Dados no mundo: – 6809 idiomas conhecidos; – Entre 50% e 90% desses idiomas devem desaparecer; – Quase 2 mil línguas já não são mais transmitidas (ONU); – Apenas 36% dos idiomas são repassados entre as gerações. Os dez idiomas mais falados como língua materna: 1. Mandarim (China) 2. Espanhol 3. Inglês 4. Árabe 5. Bengali (Índia) 6. Hindi (Índia) 7. Português (Portugal e Brasil) 8. Russo 9. Japonês 10. Alemão Aspecto Jurídicos: Em termos jurídicos, o nosso patrimônio linguístico está tutelado pelos artigos 215 e 216 da Constituição Federal, onde consta que cabe ao Estado garantir o pleno exercício dos direitos culturais e apoiar e incentivar a valoração e a difusão das manifestações culturais. O Estado deve garantir também a todos o pleno exercício dos direitos culturais, bem como acesso às fontes e manifestações neste sentido. Estas fontes e manifestações culturais que podem se expressar em bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, que portam referências à identidade, ação ou memória dos grupos que formam a sociedade, constituem o patrimônio cultural brasileiro. Incluem-se entre estes bens: as formas de expressão. Assim, o patrimônio linguístico está inserido nesta proteção legal. O idioma, como uma das formas de expressão de uma cultura, constitui-se em um bem cultural e como tal tem caráter difuso, ou seja, é de uso comum do povo e seus titulares são pessoas indeterminadas (art. 81, Lei 8.079/90, Código do Consumidor). Assim, um idioma ou língua e um dialeto podem ser protegidos mediante ação civil pública, nos termos da Lei 7.347/85. Exemplo disso seria o caso de obrigar o Poder Público, por uma ação deste tipo, a realizar uma obrigação de fazer que seria instituir escola que ensine o idioma ou forneça condições para estudos linguísticos de preservação, ou mesmo que forneça habitação e garanta os direitos sociais dos últimos representantes de uma comunidade onde se fala uma língua em extinção. Conclusão: O patrimônio linguístico de um país é um dos seus maiores bens, além de seu maior legado às gerações futuras, pois, com a transmissão dos idiomas, transferem-se milhares de características, fatores e costumes especiais e únicos. Por consequência, a morte de um idioma implica a perda imensurável a um país e, inclusive, à humanidade, pois perde-se, além da forma básica de comunicação, uma cultura com todas as suas expressões como folclore, história, musicalidade, religião etc. Portanto, a manutenção de um idioma é um fator importantíssimo para a identidade de um povo, por se constituir em um de seus principais suportes culturais, além de ser uma expressão preservadora de sua dignidade e orgulho. Daí, a necessidade de conhecermos nosso riquíssimo patrimônio linguístico, de nos conscientizarmos de sua importância e da necessidade de protegê-lo, inclusive com uma efetiva aplicação da legislação, se for preciso. FB NO ENEM por Antonio Silveira Disponível em: http://www.aultimaarcadenoe.com.br/patrimonio-linguistico Acesso em: 28/12/2012. Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias Exercícios 1. O Patrimônio Linguístico de um idioma se manifesta em diferentes situações de comunicação, como, por exemplo, numa conversa informal, numa notícia jornalística ou mesmo num poema, que pode ser guardião de diversos aspectos linguísticos de uma língua. A ONDA a onda anda aonde anda a onda? Na letra da canção “Cintura Fina”, de Zé Dantas e Luiz Gonzaga, é possível perceber certo descuido em relação ao uso da norma padrão da língua portuguesa. Isso ocorre porque, na composição da canção, os autores A) utilizam expressões coloquiais, como para e cangote, que não podiam ser usadas na composição de uma canção. B) desrespeitam a flexão de pessoa, pois nota-se a alternância inadequada entre a segunda e a terceira pessoa discursiva. C) utilizam de metáfora descabida em cintura de pilão, a fim de criar a imagem do corpo feminino perfeito. D) usam ecos indesejados aos ouvidos ao usar rimas pobres nos pares pilão-coração e pilão-paixão. E) recorrem a expressões regionalistas do idioma, o que caracteriza perda de padronização da norma culta. 3. a onda ainda ainda onda ainda anda aonde? aonde? a onda a onda Cabelo Cabelo, cabeleira Cabeluda, descabela Cabelo, cabeleira Cabeluda, descabelada Quem disse que o cabelo Não sente (...) BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro. Aguilar, 1996. p. 354. No poema “A onda”, de Manuel Bandeira, a identidade linguística da língua portuguesa acentua-se, sobretudo, na exploração de recursos A) fonológicos, pois o autor explora recursos sonoros que nos faz lembrar as ações de uma onda. B) morfológicos, já que a disposição das palavras no poema cria a imagem de uma onda em movimento contínuo. C) sintáticos, uma vez que o uso de aonde está condicionado à regência do verbo andar, que é transitivo direto. D) semânticos, pois o poeta explora todos os sentidos possíveis que se pode dar à palavra onda dentro do poema. E) lexicais, porque o autor, no poema, recorre a diferentes palavras que se reportam a um mesmo significado. 2. CINTURA FINA Minha morena, venha pra cá Pra dançar xote, se deita em meu cangote E pode cochilar Tu és mulher pra homem nenhum Botar defeito, por isso satisfeito Com você eu vou dançar Jorge Bem Jor e Arnaldo Antunes. Disponível em: www.jorgebenjor.com.br Acesso em: 11 de junho de 2013. A construção da letra da canção “Cabelo”, de Jorge Bem Jor e Arnaldo Antunes, revela que a carga semântica do texto recai no uso de A) neologismo, como ocorre com a palavra “descabela”, que não faz parte do patrimônio vocabular do idioma português. B) sufixos, que são morfemas, como – eira, – uda e – elada, que são usados, após o radical, na criação de palavras novas. C) cognatos, que são palavras que fazem uso de radicais idênticos, sem que haja mudança do sentido original. D) prosopopeia, que consiste na exploração estilística de um elemento inanimado que passa a ter ações animadas em um texto. E) arcaísmo, que se constata no uso de “Cabelo” para o título da canção, já que é a palavra-base das derivadas cabeleira, cabeluda e descabelada. 4. Quando fazemos uso da língua, lidamos com os recursos de que ela dispõe. Nesse tocante, passamos a ter contato com os aspectos afetivos, linguísticos, sociais, culturais, humorísticos ou mesmo ríspidos de uma língua. PAPAL, POR QUE VOCÊ NÃO COLOCA MEU MARIDO NO LUGAR DO SEU SÓCIO QUE ACABA DE FALECER? Vem cá, cintura fina, cintura de pilão Cintura de menina, vem cá meu coração CONVERSA COM O PESSOAL DA FUNERÁRIA. POR MIM TUDO BEM. Quando eu abraço essa cintura de pilão Fico frio, arrepiado, quase morro de paixão E fecho os olhos quando sinto o teu calor Pois teu corpo só foi feito pros cochilos do amor Zé Dantas e Luiz Gonzaga. In: GONZAGA, Luiz. Luiz Gonzaga: 50 anos de chão. CD BMG, 2002, V. 1, faixa 11. Disponível em: www.luizluagonzaga.com.br Acesso em: 11 de junho de 2013. FB NO ENEM Disponível em: http://www.google.com.br/search? Acesso em: 15/06/2013. 3 Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias Nessa tirinha, por exemplo, ao patrimônio linguístico, acrescenta-se um recurso, que é a (o) A) humor, responsável pela tonalidade que envolve o discurso que há entre pai e filha. B) afetividade, que se justifica no carinho demonstrado pelo pai em relação ao genro. C) neologismo, que ocorre no uso da palavra “funerária” expressa na fala do pai. D) hibridismo, que se dá no uso de palavras com radicais de línguas diferentes. E) rispidez, responsável pelo tom áspero do discurso usado pelo pai da mulher. Anotações 5. Sabendo que a língua apresenta variações sistêmicas quando entra num discurso, imagine a seguinte situação: a presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Rousseff, irá fazer a abertura da Copa do Mundo de 2014 e terá de fazer uso de um discurso oral em língua portuguesa na ocasião. Como se trata de uma situação formal, a norma padrão deve sobrepor às demais variações da língua portuguesa. Por isso, fará “bonito” a Presidente ao usar o seguinte discurso: A) Chegou o momento de mostrarmos ao mundo que somos capaz de realizar um evento dessa magnitude, por isso declaro iniciada a Copa do Mundo de Futebol do Brasil. Me orgulho de aqui estar representando todos os brasileiros. B) Chegou o momento de mostrarmos ao mundo que a capacidade do brasileiro na realização de um evento como este, posto que declaro iniciada a Copa do Mundo de Futebol do Brasil. Me orgulho de aqui estar representando todos os brasileiros. C) Chegou-se ao momento de mostrarmos ao mundo que somos capaz de realizar um evento dessa magnitude, por isso declaro iniciada a Copa do Mundo de Futebol do Brasil. Orgulho-me de aqui estar representando todos os brasileiros. D) Chegou-se a esse momento de mostrarmos ao mundo que somos capazes de realizar um evento dessa magnitude, no entanto declaro iniciada a Copa de Futebol do Brasil. Me orgulho de aqui estar representando todos os brasileiros. E) Chegou o momento de mostrarmos ao mundo que somos capazes de realizar um evento dessa magnitude, por isso declaro iniciada a Copa do Mundo de Futebol do Brasil. Orgulho-me de aqui estar representando todos os brasileiros. FB no Enem – Nº 20 – Professor: Sousa Nunes 1 2 3 4 5 A C A D E OSG.: 72311/13 - 24/07/13 André / Rev.: EC 4 FB NO ENEM