Visconde de Cairu Vida e Obra Visconde de Cairu Vida e Obra E l y s i o d e Ol i v e i r a B e l c h i o r 2a edição Rio de Janeiro 2000 CNC Brasília CNC Rio de Janeiro o SBN Quadra 01 Bloco B - n 14, 15o ao 18 o andar Edifício Confederação Nacional do Comércio CEP 70041-902 PABX (61) 329-9500 / 329-9501 We b s i t e : Avenida General Justo, 307 CEP 20021-130 PABX (21) 804-9200 w w w. c n c . c o m . b r Elaboração: Secretaria Geral/Departamento Econômico Projeto Gráfico: SG - DAD - CAA - SDI/UPV Belchior, Elysio de Oliveira Visconde de Cairu; vida e obra/Elysio de Oliveira Belchior. 2. ed. Rio de Janeiro : Confederação Nacional do Comércio, 2000. 160 p. Inclui bibliografia e Índice I. Lisboa, José da Silva. II. Visconde de Cairu. 1. Título. SUMÁRIO I. Apresentação II. Prefácio 5 7 Introdução I. Tendências liberais de França e Inglaterra II. Adam Smith e Edmund Burke III. José da Silva Lisboa 11 13 15 1a Parte I. As bases de uma grande cultura II. Ouvidor em Ilhéus III. Advocacia e Magistério IV. O cobre de Cachoeira V. De re rústica VI. A Mesa de Inspeção da Bahia VII. Cairu revolucionário? 18 21 24 26 29 31 35 2a Parte I. A Economia Política e o Direito Comercial II. O Liberalismo Econômico III. A Abertura dos Portos do Brasil IV. O Ensino da Economia Política V. Esboço de uma Política Econômica VI. Cairu e a exegese moderna VII. O fim de uma época 40 45 47 55 58 68 84 Adenda à 2a edição 88 3a Parte I. A revolução Constitucionalista do Porto II. O juramento da Constituição pelo Rei III. A volta de D. João VI IV. O “Fico” V. Em defesa da Independência VI. Na Assembléia Constituinte VII. Cairu, Senador do Império VIII. O fim da jornada IX. Bibliografia de José da Silva Lisboa 97 99 104 108 111 115 119 125 126 Anexos I. Cronologia II. Bibliografia III. Índice onomástico 134 138 148 APRESENTAÇÃO E m 16 de julho comemora-se oficialmente, desde 1953, o DIA DO COMERCIANTE. Dia que assinala o nascimento de José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu, patrono do Comércio brasileiro. Cairu não foi um homem de negócios, mas colocou sua imensa cultura jurídica, histórica, econômica e humanística a serviço da construção de uma economia liberal no Brasil, onde não tivessem espaço os monopólios, as proibições contra determinadas atividades da indústria humana, garantidas as condições indispensáveis para os empreendedores exercerem suas atividades promovendo o Bem Comum. Desde seus primeiros livros combateu o grande monopólio, o monopólio colonial que mantinha os portos do Brasil fechados ao comércio mundial, atrelada sua economia aos interesses exclusivos da Metrópole. As idéias que disseminou e a participação que teve na Abertura dos Portos, em 1808, contribuíram para a inserção efetiva do País nos mercados mundiais, sopro inovador que teceu relações econômicas mais complexas e, ao longo do tempo consolidou a consciência nacional de que o Brasil não poderia mais regredir à condição de Colônia. Em 1956, a Confederação Nacional do Comércio e a Administração Nacional do SENAC instituíram concurso para premiar monografias sobre a vida e a obra de José da Silva Lisboa, obtendo o primeiro lugar o trabalho de Elysio de Oliveira Belchior. O autor, que desde então participa como economista da vida desta Entidade, conjugando economia e história procurou traçar o perfil do Visconde de Cairu, ressaltando que embora seja ele até hoje, ao sabor de ideologias, figura polêmica no mundo das idéias e da ação política, não se lhe poderá jamais negar o caráter de defensor de um liberalismo econômico que reconhece a ação do Governo, a exemplo das realizadas para estimular iniciativas, reprimir abu- 5 sos quando a ação dos indivíduos atenta contra a lei ou a moral pública, e promover a defesa, ocupação e subsistência do povo. No ano em que se completam cinco séculos da abertura de um porto seguro para o primeiro encontro de civilizações na Terra de Vera Cruz, vale ressaltar a vida de quem concorreu para a abertura dos portos do Brasil não apenas ao comércio, mas também a novos encontros de civilizações e idéias. A Confederação Nacional do Comércio, por isso, reedita a monografia, que apesar de seus quarenta anos não perdeu a oportunidade, nesta aurora do Terceiro Milênio, época de globalização e de redução dos limites da intervenção do Estado na economia, tendências que suscitam as mesmas discussões e problemas para os quais o Visconde de Cairu procurou soluções há quase duzentos anos. Antônio de Oliveira Santos Presidente da CNC 6 PREFÁCIO À 1ª E D I Ç Ã O C om a edição do presente trabalho traz a Confederação Nacional do Comércio a contribuição da classe que nela se congrega às comemorações do sesquicentenário da abertura dos portos do Brasil, exaltando a figura do artífice máximo desse memorável acontecimento José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu. Levou-nos a esta empresa uma sugestão da Federação do Comércio da Bahia, desde logo acolhida com entusiasmo. Através de concurso público aberto pela Administração Nacional do SENAC, em todo o País, conclamamos os estudiosos à tarefa de elaborar de modo condensado e acessível a biografia do patrono do Comércio, destinada a intensa divulgação entre o povo e nas escolas. Pareceu-nos que nenhuma outra homenagem seria tão oportuna e proveitosa como essa, de mostrar às novas gerações de nossa terra, através da vida exemplar de Cairu a importância do papel do economista e do homem de empresa na vida nacional. A iniciativa foi coroada de êxito. No certame, que teve entre os seus julgadores, além do representante do SENAC, professor Robert N. Dannemann, as figuras ilustres de Augusto Meyer e José Honório Rodrigues, sagrou-se vencedor o jovem economista Elysio Custódio de Oliveira Belchior. No estudo substancioso que elaborou, conjugando com erudição, simplicidade e elegância de forma, a figura de Cairu ressalta, nítida, nos seus múltiplos contornos. Nele encontramos os aspectos essenciais da vida do homem que foi bacharel em Cânones, professor de grego e hebraico, advogado e magistrado, economista, panfletário, parlamentar, homem de Estado, pioneiro dos estudos econômicos e da formulação da política econômica no País, jornalista e tribuno, em que se aliavam a cultura imensa, o espírito prático, o patriotismo e a antevisão quase profética dos destinos futuros da sua terra. 7 O trabalho de Elysio Custódio de Oliveira Belchior inicia agora longa trajetória, sob os auspícios do SENAC, para mostrar aos brasileiros que as páginas da história pátria não se enobrecem apenas com os feitos dos heróis. Nelas têm também o direito de brilhar com destaque as vidas muitas vezes sem espetaculosidade, mas densas de esforço e de conteúdo, dos homens de pensamento e também dos homens práticos. Desejamos que esta biografia do nume tutelar do Comércio tenha o condão de despertar o interesse dos nossos escritores pela vida dos homens de empresa. O assunto não tem parecido até hoje tentador em nosso meio literário, aparentemente mais propenso a cuidar dos dramas e comédias do cotidiano humano ou social do que da vida, paixão e morte dos grandes empreendedores do comércio, da indústria ou agropecuária. Aponta-se a exceção de Mauá, que mereceu estudos de fôlego por parte de escritores eminentes. Mas ainda aí ressalta a preocupação com a obra ou época, ficando o herói relegado a plano secundário no seu aspecto familiar ou de criatura humana. Constitui o homem de negócios espécie de cabeça-de-turco na literatura, responsável por tudo que de ruim ocorre dentro do enredo. Quando não é o vilão declarado, monstro de egoísmo e de cupidez, surge como o “novo-rico” ridículo a dizer parvoíces ou a cometer cincadas. Sua figura jamais é apresentada com simpatia. Mesmo quando lhe mencionam a filantropia é para insinuar a esperteza. Talvez o tema seja realmente difícil. Mário de Andrade já assinalava como mais atraente o romance do “pobre diabo”, oferecendo aos nossos escritores com facilidade frustrações, fracasso e revolta, do que a ação realizadora, otimista, onde os personagens deixam algo de útil e duradouro atrás de si. O fenômeno não é peculiar ao Brasil. Coisa idêntica ocorria até bem pouco na literatura americana. Ali, certos livros como “The Octopus”, de Frank Norris, “Babbitt” de Sinclair Lewis e “The 8 Big Money”, de John Dos Passos, apresentavam o homem de empresa sob o pior aspecto materialista. Mas, tenham mudado os tempos ou os escritores, o fato é que o “businessman” nos Estados Unidos passou a constituir tema de interesse literário e, sobretudo, tema simpático. Até quando é tratado com humorismo, como em “The solid gold Cadillac”, ou na comédia musical “Til Abner”, os arranhões são antes engraçados do que cortantes. Assinala-se que nas novas gerações de escritores americanos muitos deles estiveram ligados a empresas. Por seu conhecimento mais próximo ficaram em condições de melhor julgar os homens de negócios, através de livros como “The great world and Timothy Colt”, de Louis Auchincloss; “7 1/2 cents”, de Richard Bissell; “Nine to Five” de W. H. Prosser; “The quick brown fox”, de Lawrence Schoonover; “Executive suíte”, de Cameron Hawley, também autor de “Cash McCall”. Neste último o herói exprime este pensamento, típico: “Sustentamos que o fundamento básico do nosso sistema de vida é a livre iniciativa – que é o sistema do lucro. Quando, porém, um concidadão mostra espírito de iniciativa capaz de permitir-lhe acumular um pouco desse lucro, todos nos esforçamos a fazê-lo sentir-se envergonhado de si mesmo”... Será que os novos tempos e as novas concepções não alteraram nos escritores brasileiros sua antiga aversão aos homens de empresa, ainda quando estes legam ao país obras meritórias ? Não fornecerão os mortos, antigos ou recentes, ou mesmo os que ainda por aí mourejam nas fábricas, nos escritórios, ou nos campos, mais do que simples “vidas secas”, cheias de algarismos e máquinas, sem qualquer substância humana ou cívica? Eis o desafio, que talvez este trabalho de Elysio Custódio de Oliveira Belchior tenha o mérito de ver respondido pelos homens de letras de nossa terra. Brasílio Machado Neto 9 INTRODUÇÃO I Tendências Liberais de França e Inglaterra Q uando o século XVIII extinguiu-se, o mundo sofria o impacto de duas revoluções de caráter individualista. Se idênticas eram as tendências, suas manifestações, pelo contrário, divergiram profundamente. Na França, o sistema político aluiu através de comoção violenta e o sangue que a guilhotina vertera de Luiz XVI espalhou-se entre monarcas temerosos. A economia francesa abalada em seus fundamentos, depauperada e vacilante, procurava novas condições de equilíbrio, somente encontradas quando germinaram sobre o campo preparado por Quesnay e seus sectários, as sementes lançadas pela revolução que se processava do outro lado da Mancha. Ali, as inovações de Roebuck, Arkwright, Watt e outros, produziam tantas transformações na economia inglesa que se impuseram modificações profundas na política consuetudinária de molde a permitir o livre curso da Revolução Industrial. Mas, ao passo que a Revolução Francesa provocara a destruição do antigo regime, na Inglaterra as idéias revolucionárias que acompanharam o alvorecer do capitalismo inglês deixaram incólume o sistema monárquico vigorante. Esta dualidade entre a evolução do pensamento liberal na França e na Inglaterra parece-nos preciosa para a compreensão das atitudes dos homens que se evidenciaram na época da transferência da família real portuguesa para o Brasil, porquanto as idéias destas revoluções desbordando seus países de origem atingiram Portugal e filtrando-se para a colônia americana aqui chegaram, umas, com o prestígio do mundo oficial, outras, medrosamente, nos “Mer- 11 cúrios e mais papéis vindos de França e vendidos nos cais de desembarque, às escondidas, por marinheiros ingleses’’ 1. As doutrinas francesas, de caráter republicano, conseguiram penetrar, por vezes, em todas as camadas sociais. Encontrando ambiente no florescente sentimento nativista faziam eclodir, de espaço a espaço, movimentos revolucionários durante período que partindo da Colônia entrou pelo Império. Sofrendo repressão sistemática por parte da Corte, vigilante contra a adoção da “Constituição Francesa que varia cada seis meses”, no dizer do Conde de Linhares2, não conseguiram empolgar o País em um movimento geral. Movimentos localizados, restritos a determinadas cidades, apresentavam segundo Capistrano de Abreu, “o caso repetido tantas vezes em nossa história: depois do triunfo, obtido antes por desídia ou pusilanimidade do atacado que por habilidade ou fortaleza do atacante, e só depois do triunfo comprado tão barato, compreende-se que o fato importa conseqüências, e começa-se a indagação de quais poderão ser.”3 Com o decorrer dos anos, este sentimento de nacionalidade de que, entre outras, as revoluções de 1789, 1798, 1817 foram indícios, a consciência de que o Brasil atingia paulatinamente um grau de desenvolvimento econômico superior ao da Metrópole, tornando-a dependente da Colônia, por certo provocariam a independência e vitória imediata das idéias francesas. Em contraste, porém, com o “Jacobinismo”, o pensamento liberal inglês com suas promessas de prosperidade pela franqueza de comércio e de indústria, provindo de país monárquico não inspirava temor à nobreza dirigente. Daí adveio sua preponderância pois, não obstante a sistematização da Economia Política pela Escola Clássica tornar o liberalismo econômico objeto de reflexão científica, mais 1. Otávio Tarquínio de Souza – “História das Idéias Políticas’’ – Digesto Econômico – março de 1950. 2. Carta de D. Rodrigo de Souza Coutinho a D. Fernando José de Portugal transcrita no livro de Affonso Ruy, “A primeira Revolução Social Brasileira”, 1942, p. 79. 3. Capistrano de Abreu – “Capítulos de História Colonial”, 1954, p. 208/209. 12 uma questão de raciocínio do que de sentimento, dificultando a sua difusão entre o povo, as idéias inglesas gozavam do apoio oficial e este bastou para implantá-las no Brasil, quando em circunstâncias especiais aqui chegou D. João garantido pela esquadra britânica.Vencedora na Europa, a França fazia recuar no Brasil o êxito das idéias que espalhava pelo mundo. II Adam Smith e Edmund Burke O liberalismo econômico inglês encontrou seu melhor expositor em Adam Smith, por muitos considerado o verdadeiro fundador da Economia Política, tal a repercussão que obteve sua obra An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations publicada no ano de 1776. Muito embora conhecesse desde os primeiros anos de sua formação os princípios da ciência econômica, Smith dedicou grande parte de sua vida ao estudo e ensino da Filosofia. Somente depois da viagem que realizou em França, onde sofreu forte influência dos Fisiocratas, pois foi aluno do próprio Quesnay, sua atenção voltou-se definitivamente para a ciência que o consagraria. A expansão de suas idéias foi rápida. Ainda em vida do autor surgiram cinco edições da “Riqueza das Nações” que, célere, foi traduzida na Alemanha (1776), França (1779), Dinamarca (1779), Espanha (1794), Holanda (1796), Rússia (1802), Polônia (1812) e no Brasil sua influência reporta-se ao poeta Cláudio Manoel da Costa que em 1780, segundo Joaquim Manoel de Macedo4 “comentou o Tratado da origem das riquezas das Nações de Adão Smith”. Em 1779, Antônio de Moraes Silva conheceu o livro em Londres e dele empreendeu uma tradução apenas conhecida por seus amigos da Bahia, mas que teve o mérito de provocar a partir de 1796 4. Joaquim Manoel de Macedo – “Ano Biográfico Brasileiro”, 1876, 2 o vol., p. 158. 13 verdadeira revolução no pensamento da elite da cidade de Salvador. Por fim, em 1821, veio à luz uma tradução resumida feita por Bento da Silva Lisboa, 2o Barão de Cairu. Para os adeptos das idéias inglesas, ao lado de Adam Smith, e no campo da política, Edmund Burke representou o mesmo papel que para os simpatizantes dos princípios franceses desempenharam Rousseau, Volney, Raynal e outros. Contemporâneo às alterações que se processavam no ambiente europeu, liberal à maneira de Smith, temia o perigo do desmoronamento da ordem social pelo desprestígio da autoridade, de que a Revolução Francesa era terrível exemplo ainda em marcha. Inimigo pertinaz deste movimento, desejava assegurar o bem comum pelo respeito às tradições, pelo culto do passado, que no caso inglês refletia-se de forma categórica no sistema monárquico. A liberdade apregoada pelo “segundo mal francês” não poderia ser erguida sobre os alicerces derruídos da hierarquia social. Pelo contrário, “não há mais certo expediente de perpetuar a nossa liberdade, senão guardando de modo mais sagrado, o direito de sucessão hereditária na Coroa e nas propriedades da Nação... nossa liberdade vem a ser uma nobre franqueza e traz consigo um aspecto majestoso, dando lustre à prosápia de nossos antepassados. Ela apresenta os seus timbres e brasões; ela tem sua galeria de retratos; suas inscrições de monumentos; seus depósitos de títulos de nobreza.”5. É ainda na religião que Burke encontra firme sustentáculo da vida social, tanto mais digna de respeito, quanto em sua concepção, no processo histórico é manifesta a ação da Providência Divina. Não obstante as objurgatórias que seus inimigos lhe dedicaram, com sua concepção orgânica dos Estados estruturados em instituições sujeitas à natural evolução, mas prontas a desmoronar se falseadas por princípios alheios à sua cultura, Burke ainda hoje é considerado uma das grandes individualidades do pensa5. José da Silva Lisboa – “Extratos das Obras Políticas e Econômicas de Edmund Burke, 1812, Parte I, pp. 17 e 22 14 mento político inglês. “Nenhum escritor sentiu e experimentou com maior plenitude que Burke a vida deste país – assegura-nos um autor inglês coevo –, em sua controvérsia com Payne já podemos ver a luta entre a democracia política e os hábitos sociais que perduram ainda na vida inglesa. Para ele a maioria era um conceito fictício e pernicioso já que negava este sistema complexo de “status” e classes sociais dentro do qual encontravam os cidadãos seu verdadeiro bem-estar”.6 Emigradas para país exótico, estas idéias teriam que forçosamente sentir o influxo da experiência brasileira, enfrentar novos problemas, afirmar-se em atitudes que muitas vezes pareciam contraditórias, se para justificá-las não houvesse a clarividência do estadista, capaz de encontrar na trama dos acontecimentos o sentido da evolução histórica. III José da Silva Lisboa Entre aqueles que no Brasil mais se destacaram na aceitação das idéias inglesas, encontra-se sem dúvida José da Silva Lisboa, visconde de Cairu. Expositor lúcido das teorias de Adam Smith, foi também vulgarizador da obra política e econômica do famoso autor das “Reflexões sobre a Revolução Francesa”, mediante tradução dedicada a Percy Clinton Sydney, Lord Strangford e feita a pedido de D. Rodrigo de Souza Coutinho, Conde de Linhares, que também tinha “a mais entusiástica paixão por Burke, considerando-o entre os salvadores da Grã-Bretanha e da Sociedade”.7 Cairu em sua admiração ao político de Dublin não poupa encômios, contrários ao bom gosto do leitor hodierno: “Príncipe dos Oradores Britânicos... nobre padrão da Literatura Britânica mui próprio a 6. R.H.S. Crossmann – “El Pensamiento Politico Inglés en la tradición Europea”, in J. P. Meyer – “Trayetoria del Pensamiento Politico”, 1941, p.178. 7. José da Silva Lisboa, op. cit., Parte I, p. IX. 15 exaltar os sentimentos de Lealdade e Honra Nacional e expelir por toda a parte os falsos princípios da Anarquia e Tirania da França... gênio tão feliz, que doura tudo que toca, e que parece ter concentrado a Sabedoria das Idades”8. Por sua vez, o economista clássico é o “Grande Benfeitor da Terra... Sacerdote da Justiça Civil” 9. É pois dentro da penetrante influência de Adam Smith, no setor econômico, e de Edmund Burke, no terreno da política, que devemos situar a vida e a obra de José da Silva Lisboa. Na imensidade de sua cultura, na importância dos problemas a que foi solicitado apreciar, na celeridade do desenrolar dos acontecimentos que exigiram sua capacidade de político, Cairu revelase uma personalidade multiforme, esquiva à síntese. Cairu é o economista sereno no estudo da ciência nascente, persuasivo e seguro nas asserções, “um dos lutadores mais representativos da emancipação econômica da América”10, mas é também o panfletário violento “fração de gente, charlatão idoso”11, a reclamar mordaz para Manuel de Carvalho “bordoada de cego a eito alçando, trás, zás, pum, tum, bá, bu, porrete em lombo” 12. Cairu é o liberal aludindo “aos séculos da tirania e barbaria que oprimiram e escureceram a Europa até com a perseguição e queima das livrarias públicas e particulares e hórrida intolerância das seitas e opiniões religiosas e políticas”13, mas é também o consti8. Idem, idem – Parte I, p. II, V/VI, XIV. 9. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1804, pp. 8/9. 10. Ricardo Levene – “Ensayo Histórico sobre la Revolución de Mayo y Mariano Moreno”, 1925, vol. I, p. 244. 11. José Bonifácio de Andrade e Silva – in “Anais da Biblioteca Nacional”, vol. XIII, p. 115. 12. José da Silva Lisboa – “História Curiosa do mau fim de Carvalho & Cia. à bordoada de pau-brasil”, 1824. 13. José da Silva Lisboa – “Sabatina Familiar de Amigos do Bem Comum”, apud Hélio Viana, “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1945, p. 377 16 tuinte de 1823 declarando que “achava a expressão liberdade religiosa muito malsoante, escandalizando os ouvidos pios”14. Em suas atitudes e tendências, José da Silva Lisboa é como o diamante lapidado: brilha mais quanto mais facetas possui. 14. José da Silva Lisboa – Discurso pronunciado na Assembléia Legislativa, 1823. 17 1a P A R T E I As bases de uma grande cultura S alvador em meados do século XVIII constituía o centro econômico e administrativo de vasta possessão portuguesa. Seus habitantes, alegres e ordeiros, dependentes em grande parte da exclusiva exportação para o Reino dos produtos que as atividades rurais da Capitania lhes proporcionavam, sentiam de ano para ano aumentar as férreas ordens sob as quais o Brasil vivia em rígido sistema colonial, que não só impedia o surto das atividades econômicas, como tolhia o florescimento de uma cultura superior. O estudo universitário era uma aventura que tinha o Atlântico de permeio. Para a instrução primária, única notada ainda em 1764, por Mrs. Kindersley1, lá estavam os religiosos em seus conventos salvando almas e distribuindo educação: lá estavam os carmelitanos que anos depois receberam em seu colégio, para ensinar-lhe filosofia e primeiras letras, o pequeno José da Silva Lisboa, nascido em 16 de julho de 1756. Procurando concluir seus estudos, o jovem baiano demandou a Metrópole em 1772, onde Pedro José da Fonseca ministrou-lhe aulas de retórica. Logo depois seguiu para a vetusta Universidade Conimbricense, centro de convergência da mocidade brasileira desejosa de se libertar dos entraves impostos à cultura pelo mesquinho ambiente colonial. Em 10 de outubro de 1774 ingressou no Curso de Direito, concluído em 8 de junho de 1779, sendo-lhe outorgada a carta de formatura no dia dez do mesmo mês2. Durante os cinco anos que 1. Pedro Calmon – “História da Literatura Baiana”, 1949, p. 74. 2. Francisco Morais – “Estudantes Brasileiros na Universidade de Coimbra”, in Anais da Biblioteca Nacional, vol. 62. 18 freqüentou Coimbra, o futuro Visconde de Cairu não descansou um só momento em sua luta pela sabedoria. Aperfeiçoou Matemática em 1775; sua paixão pelas línguas, que o tornaria mais tarde renomado poliglota, concretizou-se no estudo de dois idiomas clássicos: em um deles Homero cantou as façanhas de Ulisses; noutro, os hebreus, junto aos salgueiros dos rios da Babilônia, choraram as desgraças de Sion. Se os Anais não proclamam o nome de seu professor de grego, sabemos entretanto que no hebraico foi aluno do clérigo da Síria, João Paulo Odar, cujas lições jamais olvidou, tanto assim que meio século depois, na Assembléia Constituinte (1823), relembrava com respeito seus ensinamentos, invocando a autoridade do antigo mestre para defesa dos escravos. Rezam as crônicas, e seus biógrafos não cessam de recordar, que seus pais, Henrique da Silva Lisboa e D. Helena Nunes de Jesus, esperavam que um de seus filhos seguisse a carreira eclesiástica. Falecendo o que a ela se destinava, sentiram as esperanças renascerem pela lembrança da invulgar afeição que José da Silva Lisboa dedicava aos livros: aos oito anos de idade não aprendia o latim, tão útil aos estudos religiosos ? Em seus devaneios viam o filho nos púlpitos das velhas igrejas da Bahia a proclamar a fé e admoestar os espíritos. Mal sabiam, porém, que o Brasil perdia um novo Vieira, mas em compensação, realizar-se-ia o “milagre de erudição, honestidade e equilíbrio do Brasil Colonial”3. De fato, Silva Lisboa não acedeu às instâncias paternas. E foi castigado da forma que a história guardou: não mais recebeu a costumeira ajuda financeira. Premido pelas circunstâncias recorreu ao Monte Socorro para empenhar justamente aquilo que constituía um de seus motivos de ufania: a Carta Régia de Substituto Ordinário Interino das cadeiras de Grego e Hebraico da Universidade de Coimbra, conquistada em concurso, quando ainda estudante, e concedida em 23 de novembro de 1778. Formado em junho, não demoraria o jovem professor muito tem3. José Soares Dutra – “Cairu”, 1943, p. 14. 19 po em terras de Portugal. Fizera sólidas amizades, uma das quais D. Martinho de Mello e Castro, de quem gozaria proteção durante os primeiros anos de sua carreira nas plagas baianas. Efetivamente, em 1o de outubro de 1779, muniu-se José da Silva Lisboa de carta de apresentação dirigida pelo Ministro da Marinha e Ultramar a D. Afonso Miguel de Portugal e Castro, Marquês de Valença, que pouco antes, nomeado governador da Bahia deixara o Reino em busca da Colônia para substituir D. Manuel da Cunha Menezes, Conde de Lumiar, que se encontrava em Salvador desde 1774. Esta carta, divulgada pelo historiador Rodolfo Garcia em suas notas à História Geral do Brasil de Varnhagen4, é deveras singular: apresentava no portador o “Bacharel José da Silva Lisboa, que tendo acabado os seus estudos em Coimbra se recolhe a essa capitania, donde é natural. Os seus desígnios de se aplicar à agricultura o farão sem dúvida recomendável, para que V. Exa. o proteja em tudo quanto for vantajoso para um objeto de tanta utilidade: e espero que ele pela sua útil aplicação, e pelo seu comportamento se mostre digno de todo o favor, com que V. Exa. o tratar”. Era o bacharel em Cânones, o professor de grego e hebraico dirigindo-se ao Brasil para dedicar-se à agricultura! Qual seria a origem deste interesse de José da Silva Lisboa? Observador arguto que era, não deixara de certo passar desapercebida a situação decadente da agricultura em Portugal, informara-se por constantes leituras do progresso deste ramo das atividades humanas em outros países, sentira, enfim, as imensas possibilidades da terra quase virgem que iria encontrar no Brasil. Ademais, quando cursava a Universidade, era professor o renomado botânico paduano Domingos Vandelli, chamado à Lusitânia pelo Marquês de Pombal. É impossível que Silva Lisboa não freqüentasse suas aulas, conversasse longamente sobre assuntos atinentes à agricultura, travando com isto amizade que se traduziria mais tarde em troca de correspondência sobre economia rural. 4. Rodolfo Garcia – Notas à “História Geral do Brasil” de F. A. Varnhagen, 1953, vol. V, p. 15. 20 Durante muitos anos os biógrafos do Visconde de Cairu apenas citavam de suas atividades no Brasil – logo após a sua chegada da Metrópole – o cargo que desempenhara como professor e a advocacia que exercera em Salvador. Os abundantes documentos existentes em arquivos de Portugal contribuíram para revelar outros aspectos interessantes, inclusive esta atenção tributada à agricultura, melhor diríamos, à economia agrícola, porquanto daquela atividade, ironizaria ao Dr. Vandelli: “Este nosso século é o século da agricultura; todo o mundo escreveu sobre isso formando-se planos de gabinetes, talvez sem ter uma só vez remexido a terra. A agricultura porém é mais fácil, é mais bonita de escrever, do que de executar”5. É possível que por isso nunca a tivesse exercido. II Ouvidor em Ilhéus Chegando ao Brasil em fins de 1779 ou início de 1780, pela proteção do Marquês de Valença pouco tempo permaneceu José da Silva Lisboa na cidade de Salvador. Em 10 de março de 1780, o Governador comunicou ao Ministro Martinho de Mello e Castro que “atendendo às repetidas queixas dos povos da Capitania de Ilhéus contra a má administração da Justiça dos Juízes Ordinários que interinamente exerciam os lugares de Ouvidores, demitira deste lugar o Juiz Ordinário da Capitania de Ilhéus e nomeara para o desempenhar o bacharel formado José da Silva Lisboa, que reunia todas as qualidades necessárias para um bom magistrado”6. Dias antes para lá seguira o novel Ouvidor levando a ciência jurídica adquirida em Coimbra e a experiência de apenas 24 anos. 5. Eduardo de Castro e Almeida – “Inventário dos Documentos relativos ao Brasil, existentes nos Arquivos de Marinha e Ultramar” – in Anais da Biblioteca Nacional, vols. 31, 32, 34, 36, 37, 39, 46, 50, 71, Doc. 10.907. 6. Idem, idem, idem, Doc. 10.517. 21 Foi rápida sua estada em Ilhéus e dela o Dr. Francisco Borges de Barros registrou as seguintes ocorrências: 1) “Em 6 de fevereiro de 1780: Devido a grandes escândalos no foro de Ilhéus, o Governador da Bahia determinou a José da Silva Lisboa uma averiguação secreta. Houve denúncias de que vários autos haviam desaparecido dos cartórios de resíduos, capelas e ausentes e vários processos referentes a terras da Coroa se haviam feito falsa fé, dando em resultado grandes usurpações. Nesta data a devassa não havia sido iniciada, porque algumas testemunhas estavam ausentes devido ao tempo festivo. A eleição dos pelouros foi feita com toda a desordem, havendo suborno das autoridades. 2) Em 7 de fevereiro de 1780: O Vigário da Freguesia foi alvo de grande vaia dada por uns cadetes, por querer o mesmo em serviço da religião corrigir um abuso público das “danças de Gonçalo”. 3) Em 24 de fevereiro de 1780: Em quatro editais dessa data o mesmo Ouvidor exige o pagamento de fintas atrasadas, principalmente dos bens que foram seqüestrados aos Jesuítas e obriga o povo a plantar mandioca, por isso que havia abandonado o seu cultivo pelo da cana e arroz. 4) Em 3 de março de 1780: José da Silva Lisboa, ouvidor da comarca de Ilhéus, a requerimento do Senado da Câmara, providencia sobre a crise de farinhas e sobre a expulsão dos malfeitores que infestavam as matas. 5) Em 14 de março de 1780: Nesta data Silva Lisboa representa ao Governador Geral contra o procedimento dos cadetes, chefiados pelo de nome Antônio Rodrigues de Figueiredo, que desrespeitavam a todos. Foi instaurado processo contra os mesmos, sendo dali expulsos e presos no Morro de S. Paulo. 6) Em 28 de abril de 1780: O ouvidor comunica ao Governo o naufrágio do capitão-mor de Ilhéus na barra do Rio das Contas. 7) Em 25 de agosto de 1780: O ouvidor José da Silva Lisboa 22 comunica o mau procedimento do cadete Antônio Rodrigues e as traições do capitão-mor à sua pessoa, apesar dos protestos de amizade que fazia”7. Como se vê, a ação de José da Silva Lisboa foi enérgica, procurando acima de tudo defender os interesses da Coroa e a tranqüilidade pública. Não é estranhável que encontrasse resistência por parte dos moradores da Capitania que, prestes, demonstraram desejos de afastá-lo do cargo, embora o exercesse em caráter interino. No dia 12 de agosto de 1780, em Lisboa, o ex-governador Manuel da Cunha Menezes dirigiu-se ao Ministro da Marinha e Ultramar sobre vários assuntos daquela Capitania, entre os quais o desenvolvimento da agricultura e após notícias de relevância passa a considerar o cultivo do algodão. Declara então com malícia que “os povos: da Capitania de Ilhéus, objeto deste escrito fizeram as suas plantações, mas não se lograram delas, segundo me informaram na já expressa arribada (sic), porque provendo o Marquês Governador no lugar de Ouvidor dela (que estava servindo o Juiz pela lei e eu me dei melhor sempre com juízes leigos do que formados), um advogado rapaz, este logo que chegou ao lugar mandou arrancar todos os algodoeiros, como planta inútil, assim como outras produções, que eu não posso dizer, por não ter visto os editais o que ainda espero, pela promessa, que me fizeram de os mandarem a esta Corte”8. Por mais estranho que se afigure a atitude de Cairu, hoje, duzentos anos depois, não podemos julgar atos explicáveis somente pelas circunstâncias do momento. Não temos dúvidas, porém, de que os editais do Ouvidor prendiam-se a um julgamento sobre o valor relativo das diversas culturas praticáveis (vide editais de 24 de fevereiro de 1780), sendo mesmo verossímil que decorressem de instruções superiores. Reforça esta idéia o fato de ter Francisco Nunes da Costa, que o substituiu na ouvidoria de Ilhéus meses depois, recebido de D. Maria I instruções para desenvolver a plan7. F. Borges Barros – “Anais da Capitania de Ilhéus”, 1917, pp. 36/38. 8. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 10.653. 23 tação do cacau, garantindo até o preço mínimo. Mas a maior parte dos habitantes “tratou de bagatela esta proposta, outros opuseram ao Ministro frívolas razões que os obrigava a não cultivarem este gênero”9. Deixemos, porém, que novos documentos nos ajudem a esclarecer ainda mais os famosos editais de Cairu. E antes que apareçam, não deploremos os incidentes de Ilhéus. Sílvio Romero, em sua História da Literatura Brasileira, viu com a finura que lhe é característica a influência que sobre José da Silva Lisboa desempenhou a escolha de Salvador como base fundamental de sua formação: “não ficou junto à Corte, o que seria um mal, nem foi inutilizar-se nalguma aldeia dos sertões, o que seria mais deplorável”. Ficou num “meio termo útil aos estudiosos” 10. A Cairu, uma das grandes cerebrações da Colônia, um espírito formado no que havia de mais refinado na cultura da época, não ficava bem o cargo que desempenhara: não lhe era destinado proibir que o gado pastasse nas ruas de qualquer lugarejo11. III Advocacia e Magistério Voltando a Salvador. Cairu advoga. Advoga sentindo profunda antipatia pela profissão. É desse tempo (1781) a carta endereçada ao prof. Domingos Vandelli, de quem recebera um pedido de informações sobre as condições econômico-sociais da Bahia. No preâmbulo de sua resposta, Cairu deixa escapar ao antigo colega de Coimbra sentido 9. Manoel Ferreira Câmara – “Ensaio de Descrição Física e Econômica da Comarca de Ilhéus na América”, in Memórias Econômicas da Academia Real de Ciências de Lisboa, 1789, p. 316, I vol. 10. Silvio Romero – “História da Literatura Brasileira”, 1943, vol. 2 o, p. 322. 11. Cf. Edital de 25 de fevereiro de 1780, citado por João da Silva Campos – “Crônica da Capitania de S. Jorge de Ilhéus”, 1947, p. 188. 24 desabafo que provinha do âmago do seu ser e revelava a profunda insatisfação em que vivia: “Eu tenho já mais de uma vez representado V. S. a situação oprimida a que me reduziu nestas terras a dureza minha sorte. Obrigado a ganhar minha subsistência da mendiga advocacia, vida pouco análoga à constituição do meu gênio, era preciso que desamparasse inteiramente os estudos filosóficos para me ir nos profundos abismos das minúcias e formulários das intrigas forenses, e que demandava muitas aplicações e prática dos negócios deste gênero que faziam incompatíveis meditações sobre coisas outro porte.”12 A frustração que empolgou Cairu e da qual nos deu conta o prof. Amoroso Lima em um belo escorço biográfico de José da Silva Lisboa, pensamos que não foi solucionada com a nomeação em 4 de junho de 1783 para o cargo de professor substituto de grego nem tampouco para a cátedra de filosofia, em 29 de novembro de 1782. Em 16 de março de 1786 o professor baiano escreveu a D. Martinho de Mello e Castro agradecendo-lhe esta nomeação e remetendo-lhe a oração proferida em homenagem ao aniversário de D. Maria I13. O eminente historiador e jurista Cândido Mendes de Almeida, em sua notícia biográfica de Silva Lisboa, apensa à edição de 1874 dos “Princípios de Direito Mercantil”, pede a atenção para o fato de não ter aquele professor de grego, hebraico e filosofia deixado à posteridade qualquer obra sobre estes estudos. E acrescenta que eram “singularidades na direção dos estudos desta culminante inteligência cuja origem não podem hoje ser explicadas”14. Não estaria neste sentimento de vocação frustada a explicação destas singularidades? Se na advocacia seu gênio repelia o rito processual, no magistério Cairu forçosamente deveria sentir um 12. Eduardo de Castro e Almeida – op. cit., Doc. 10.907. 13. Idem, idem, Doc. 12.107/8 – É provável que ocorresse engano na cópia da data certa. 14. Cândido Mendes de Almeida – in “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, de José da Silva Lisboa, 1874, 1o vol., p. VII. 25 hiato profundo entre o ambiente reinante na Universidade em que se diplomou e o meio acanhado da Colônia, acentuado pela falta de interesse da mocidade de Salvador pelos estudos que, ultrapassando os bancos escolares, ia estratificar-se em maneiras de pensar da sociedade: “Indizível é, meu caro Amigo, a aversão que nesta cidade há à corporação de Professores, gente de nenhuma entidade na Bahia, membros da sociedade para quem se olha com a maior displicência e indiferença suma”15. Dizia isto Luiz dos Santos Vilhena em 1802. E pesaroso relatava o fato de um estudante ter, certa ocasião, disparado para dentro da sala de aula uma carga de chumbo! Se isto ocorria ao raiar do novo século, que dizer do tempo em que Cairu lecionava, cadeiras recentemente criadas? Desencantado, José da Silva Lisboa redobrou sua atenção à economia rural. Tornou-se, no dizer de Pedro Calmon, um “naturalista amador”. IV O cobre de Cachoeira No dia 11 de março de 1782, Marcelino da Silva Pereira, Juiz de Fora de Cachoeira, enviou ao Governador da Bahia um ofício sobre acontecimento que por muitos anos despertou a diligência das autoridades portuguesas. Dizia que “a não faltarem indícios, grande abundância promete este lugar, que é chamado Mamocabo, na freguesia de S. Tiago, termo desta vila e dela distante duas léguas e meia, mais ou menos, em terras cheias de mata que agora principiam-se a cortar, não tendo sido cultivadas; entre um também novo roçado do Padre João Gonçalves, da parte do Sul, e do Norte nas cabeceiras de um sítio de Manoel Lopes Falcão, em terras do Capitão Antônio Gonçalves de Aguiar e Souza, na baixa 15. Luiz dos Santos Vilhena – “Recopilação de Notícias Soteropolitanas e Brasílicas, 1921, Tomo 1º, p. 287. 26 das quais há um riacho, que do alto corre a meter-se no rio Paraassú (sic), que a esta vila banha, foi achada a porção de cobre que remeto”16. Que surpresa teve o Governador Marquês de Valença, que rebuliço causou na cidade a chegada do bloco de cobre de Cachoeira: pesava cerca de 1.300 quilos! Zeloso, o Governador não demorou a enviá-lo à Metrópole: no dia 4 de junho de 1782, anuncia ao Ministro de Marinha e Ultramar, o aparecimento “duma grande porção de cobre nuns terrenos pertencentes ao termo da Vila de Cachoeira, que remete, juntamente com algumas pedras e terra do lugar em que fora encontrado para serem devidamente examinados e analisados, pois seria da maior utilidade a exploração da mina que porventura se descobrisse”17. Chegando a Lisboa o cobre continua a impressionar e é Domingos Vandelli quem o examina, analisa e descreve em Memória apresentada à Academia Real de Ciências, asseverando que “até agora não se descobriu em parte alguma massa tão grande como esta da Bahia a qual serviria para enriquecer o mais rico museu da Europa”18. Convicto da importância do achado, Vandelli recomenda Antônio Barros da Silva Nogueira a Martinho de Mello e Castro para proceder às pesquisas das minas de cobre “que se supunha existir na serra de Cachoeira”19. Mas quem seguiu para a localidade, quem explorou a região e galgou as grimpas da serrania, foi o professor de grego e filosofia, José da Silva Lisboa! Em junho de 1783, Cairu apenas investiga as faldas da serra de Cachoeira. Em circunstâncias adversas nada consegue: “Desejei subir e penetrar uma alta montanha primigênia, em cuja raiz se achou a massa de cobre, porém tinha um declive tão precipitado e 16. 17. 18. 19. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 11.024. Idem, idem, Doc. 11.023. Idem, idem, Doc. 11.463. Idem, idem, Doc. 11.460. 27 inacessível, que só em tempo de verão poderia dar passagem algum lugar, que se procurasse mais cômodo. Na referida baixa não se acha vestígio algum de mina, mas o novo pedaço de cobre misturado com maior porção de ferro e do qual o Dr. Galvão tirou cobre admirável, nos tem quase decididamente anunciado a existência da mesma mina ou que ela se possa descobrir na referida montanha ou que esteja escondida na plaina debaixo da terra, fazendo-se escavação mais profunda...”20. De fato no verão voltou José da Silva Lisboa a estudar os arredores de Cachoeira com maiores possibilidades de êxito. Em 19 de janeiro de 1784, dá conta a Martinho de Mello e Castro “das pesquisas que procedeu nas serras de Cachoeira para a descoberta da suposta mina de cobre, cuja existência as suas investigações deixaram muito duvidosa”21. Se a Cairu as explorações levaram-no a renunciar a posteriores buscas, pois considerava as minas inexistentes, para os governantes de Portugal era impossível não se encontrar no local os sonhados veios de cobre. Não é destarte surpreendente que três anos depois das averiguações de Cairu chegasse a Salvador Antônio Amorim e Castro e solícito participasse à Metrópole que breve tomaria posse do seu lugar de Juiz de Fora da Vila de Cachoeira “onde desde logo se ocuparia diligentemente da exploração da mina de cobre”22. Os anos passaram-se e o cobre das propaladas minas não apareceu. A razão estava com José da Silva Lisboa. Não existia no local qualquer jazida. Todavia, ficou famosa a descoberta ocorrida na vila de Cachoeira. Anos depois, visitantes ilustres perlustrando a Bahia ainda aludem ao fato. O inglês John Mawe, comerciante, referindo-se às riquezas da Bahia afirma que “sobre a mineralogia desta Capitania, pouco posso dizer. Sabe-se ter produzido a maior peça de cobre nativo 20. Idem, idem, Doc. 11.247. 21. Idem, idem, Doc. 11.472. 22. Idem, idem, Doc. 12.489. 28 que jamais se viu, pesando mais de 2.000 libras. O bloco foi descoberto, há muitos anos, por alguns mineiros que procuravam ouro, mas, em contraposição às leis gerais da natureza, acharam-no inteiramente isolado, e não se descobriu o menor vestígio, nem o mais ligeiro indício de um veio daquele metal”23. Se o comerciante nada poderia adiantar sobre a origem do metal, outros viajantes, Spix e Martius, com a autoridade de renomados naturalistas escreveriam que “cerca de uma hora a leste da vila, foi descoberto o grande bloco de puro cobre pesando 2.666 libras, que se acha guardado, desde 1782, no Real Gabinete de História Natural de Lisboa. Visitamos o lugar e encontramos muito perto do Rio Paraguaçu, uma baixada coberta de capim e capoeira, onde jazem grandes blocos soltos de granito e contornada, ao norte, de um banco da mesma rocha. Apesar de todas as pesquisas, nada encontramos na formação atual que permitisse a hipótese de uma relação genética daquela colossal massa de metal com a formação da montanha. Notamos tão pouco vestígios de uma formação de veeiro ou de depósito metálico, que a origem telúrica do bloco nos pareceu muito duvidosa”24. Estavam, pois, confirmadas as investigações de Cairu: em lugar da mina o que existia era um imenso meteorólito. V De re rústica Silva Lisboa não deixava escapar oportunidade alguma de estudar os mais diversos aspectos da economia agrícola das terras baianas. Agora mesmo, quando perdera seus esforços na descoberta das pretensas minas de Cachoeira, observou o plantio do fumo no Recôncavo baiano. “Por ocasião da viagem que neste verão, fiz à Cachoeira – escreve Cairu em 11 de fevereiro de 1784 23. John Mawe – “Viagens no Interior do Brasil”, 1944, p. 271. 24. Von Spix e von Martius – “Através da Bahia’’, 1938, pp. 231/2. 29 – a respeito da mina de cobre (de que em outra carta dei conta: à V. Exa.), tive meios para me instruir sobre o modo de cultura do tabaco e seu preparo e me pareceu que este artigo era suscetível de muito maior perfeição a respeito do estado atual, que sem dúvida é muito defeituoso, sobre o modo de amanhar as terras e negligência e pouca limpeza, quer já nos laboratórios de enrolamento e imprensa do tabaco. Até observei que de três espécies de tabaco que aqui achei, não se cultiva aquela de que se faz uso na Virgínia, Habana etc., e perguntando-se aos Colonos a razão desta prática e porque não tentam a cultura do chamado tabaco de língua (que eles reconhecem ter maior folha e mais grossa), respondem que não está em uso. Achei um fenômeno singular”25. Nota-se por este trecho que José da Silva Lisboa não era apenas um curioso. Mais do que isto, revelava-se um observador atento, sentindo a importância que o desenvolvimento da agricultura representava para o progresso da Colônia. Se não dedicasse atenção acurada à economia agrícola, como poderia saber, de imediato, que nas variedades de fumo cultivadas em Cachoeira faltava o tabaco de língua? Exatamente para evitar que por ignorância ou incúria permanecesse retardada a evolução agrícola do Brasil, Cairu na mesma carta propõe ainda o “estabelecimento de uma sociedade literária, em que fossem membros todos os proprietários de terras deste país, os mais inteligentes, e além disto todas as pessoas curiosas e amantes do bem público; cujo objeto fosse a melhoração de toda a cultura das terras, principalmente para que o tabaco, açúcar, e anil (que já aqui se começa a cultivar) pudessem receber toda a perfeição possível; depois a amplificação do comércio e boa ordem da economia interior do país, descobrimento de todas as plantas, seus usos para o comércio e artes, sua virtude já conhecida para a medicina. O Exmo Governador aprovou minhas intenções...”26. Não sabemos se esta sociedade literária foi fundada; temos notí25. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 11.475. 26. Idem, idem, Doc. 11.475. 30 cias porém, de que José da Silva Lisboa por conta própria procurou atingir os objetivos enunciados. Disso dá-nos informação a missiva que o prof. Francisco Ferreira Paes da Silveira dirigiu em 4 de agosto de 1789 a D. Martinho de Mello e Castro: “Tenho a honra de oferecer à curiosidade de V. Exa., nesta pasta, o verdadeiro ‘arapobaca’, erva tão útil como recomendada por Lineo ao nosso Domingos Vandelli e por este a todos, os seus ouvintes por ser muito necessária aos Reinos e por isso de grande, vantagem ao comércio a sua descoberta, o que até o presente se não tinha conseguido; como me asseverou o Exmo Visconde de Barbacena com pesar quando por aqui passou, oferecendo-lhe eu alguns produtos, que conservava. Vindo-me depois à mão uma rara edição do naturalista Jorge Macgrave, holandês, que acompanhou ao Brasil o Conde Maurício de Nassau, o qual a traz bem descrita, e debuxada, com o mesmo nome índico, pude certificar ser esta a própria, o que me ..... (confirmou?) ..... meu companheiro o prof. José da Silva Lisboa, que há muito tempo a procurava....”27. Não foi em vão o desvelo de Cairu pelas coisas agrícolas. No exercício do cargo de Secretário e Deputado da Mesa de Inspeção da Bahia teve oportunidade de dar plena expansão aos conhecimentos que adquirira. VI A Mesa de Inspeção da Bahia Os documentos da época parecem indicar que José da Silva Lisboa, depois de seu regresso ao Brasil em 1779, por três vezes abraçou seus velhos amigos em Portugal. De uma primeira viagem não conhecemos maiores indícios do que o ofício de 14 de agosto de 1787 expedido pelo Governador D. Rodrigo José de Menezes e no qual se refere “ao professor da 27. Idem, idem, Doc. 13.321. Já na carta ao Dr. Vandelli, dizia Cairu: “Tive porém ao mesmo tempo o grande desprazer com o aviso de não ter recebido o caixote de ervas, que com tanto desvelo eu tinha colegiado’’. 31 cadeira de filosofia e grego, José da Silva Lisboa, a quem dera licença para ir ao Reino tratar de seus negócios particulares28. A falta de maiores detalhes nos leva considerar problemática esta viagem, o que não acontece com as outras duas, confirmadas por notícias mais positivas. A última delas realizou-se em 1802, ano em que o Governador Francisco da Cunha e Menezes concedeu ao bacharel José da Silva Lisboa passaporte para seguir com destino ao Reino em gozo de licença. O prof. Pedro Calmon alude a um manuscrito existente em arquivos coloniais, no qual Cairu “em Portugal e em 1802 queixava-se de seus achaques e comunicava estar a concluir os Princípios de Direito Mercantil“29. Mais importante para o futuro de José da Silva Lisboa constituiu a viagem empreendida em 1797, pois no decorrer desta estada em Portugal obteve em 20 de fevereiro o decreto de jubilação do cargo de professor régio da cadeira de filosofia, a única que no momento lecionava, desde que Luiz dos Santos Vilhena o substituiu em 1787 no exercício da cátedra de língua grega. Rezava o diploma que lhe seria concedido o ordenado inteiro enquanto não obtivesse emprego em outro lugar de letras ou ocupações que a Rainha o destinasse. Em 4 de setembro de 1797, D. Maria I o nomeou Deputado e Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia, na qual perceberia o ordenado correspondente ao de inspetor30. As Mesas de Inspeção, existentes na Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco e Maranhão, tinham por objetivo imediato examinar e classificar os açúcares e tabacos, procurando com isso não só facilitar as relações de compra e venda entre Lavradores e Comerciantes, como também evitar a burla das determinações metropolitanas que em relação ao fumo o dividia em três categorias: as de primeira e segunda qualidades, destinadas ao consumo do Reino e ao comércio internacional e a de terceira qualidade, artigo inferior, usado no Brasil e utilizado na compra de escravos na África. 28. Idem, idem, Doc. 12.614. 29. Pedro Calmon, op. cit., p. 84. 30. Idem, idem, p. 82. 32 Estabelecia preços para as diversas produções e tomava todas as medidas necessárias para evitar o contrabando e exportação do produto de uma capitania através dos portos de outra, como se nesta fosse produzido. Ademais, as Mesas de Inspeção procuravam incentivar a produção e defender o comércio. Dos propósitos que lhes eram peculiares e das atividades de José da Silva Lisboa dispomos do testemunho de vários documentos existentes nos antigos arquivos do Conselho Ultramarino, em Portugal. Um deles nos revela que por essa época Cairu já esposava as idéias acerca da outorga de prêmios aos inventores e introdutores de novas máquinas e fábricas, que mais tarde desenvolveria em uma de suas principais obras31. Neste sentido, no ofício datado de 28 de março de 1799 em que informa sobre os engenhos de açúcar e seus maquinismos, propõe seja premiado Joaquim Ignácio da Sequeira Bulcão, mais tarde Barão de São Francisco, por ter sido “o primeiro proprietário que adotara novos processos de moagem de cana”32. A proposta de Cairu foi aceita pelas autoridades portuguesas, tanto assim que em 14 de novembro de 1799, no mesmo ofício em que José da Silva Lisboa foi louvado pelo zelo que dedicava ao cargo, D. Rodrigo de Souza Coutinho comunicou-lhe a concessão do Hábito de Cristo ao inovador da indústria do açúcar. Mais tarde, Cairu foi de novo elogiado porque promoveu, juntamente com o presidente e demais membros da Mesa de Inspeção, uma subscrição voluntária de 24.000 cruzados “destinada ao pagamento de um prêmio pela construção de uma máquina de moer cana de açúcar”33. Em fevereiro José da Silva Lisboa já se dirigira ao futuro Conde de Linhares dando-lhe diversas notícias sobre a Mesa de Inspeção; em 29 de março volta à presença de D. Rodrigo de Souza 31. Observações sobre a Franqueza da Indústria e o Estabelecimento de Fábricas no Brasil, 1810. 32. Eduardo de Castro e Almeida, op. cit., Doc. 19.693. 33. Idem, idem, Doc. 26.054. 33 Coutinho propondo a compra pela Real Fazenda dos prédios onde estavam estabelecidos os trapiches da repartição e, continuando em suas informações, no dia seguinte a Mesa de Inspeção responde uma Carta Régia que lhe solicitara informações sobre “a cultura e manipulação dos gêneros que se exportavam e os diferentes maquinismos que se usavam para limpar e descascar o algodão, o arroz e o café e os que se empregavam no “fabrico do tabaco e açúcar” 34. Maior dificuldade apresentou a satisfação das pretensões do comércio e lavoura da Bahia, ansiosos de que os navios empregados no comércio com a Costa d’África não fizessem escala obrigatória na ilha de S. Tomé, conforme determinava a Provisão do Real Erário de 18 de outubro de 1773. Este desejo, manifestado pela Mesa de Inspeção em 30 de maio de 1800, baseava-se, segundo se depreende dos argumentos de João Rodrigues de Brito, na periculosidade que a navegação apresentava para os navios, sujeitos a serem levados pelas correntes marítimas para a Costa do Gabão, onde as tripulações talvez fossem devoradas pelos bárbaros. Além do mais, a demora na viagem aumentava o vulto das despesas e o risco das perdas, elevando em conseqüência o preço dos escravos de que a lavoura necessitava35. Somente quando D. João já se encontrava no Brasil, essa obrigatoriedade foi revogada pela Carta Régia de 13 de abril de 1808. O cargo de Secretário e Deputado da Mesa de Inspeção da Bahia foi exercido por Silva Lisboa até 1808. Embora a ele tivesse emprestado “o ardor extremo que sempre, em toda a sua vida dedicou a todas as tarefas que empreendeu”36, é de se presumir que no final de sua carreira na Bahia, quando já esposava os princípios do liberalismo econômico, não mais depositasse confiança nas van34. Idem, idem, Docs. 19.684 e 19.692. 35. J. Rodrigues de Brito – “A Economia Brasileira no Alvorecer do Século XIX”, s/data, p. 72. 36. Alceu de Amoroso Lima – “Época, Vida e Obra de Cairu’’, in Princípios de Economia Política, de José da Silva Lisboa, 1956, p. 22. 34 tagens e justiça das atividades daquelas repartições, pois na sessão do Senado de 10 de maio de 1827, declarou que a situação desoladora em que outrora decaíra a agricultura no, Brasil, “induziu El-Rei Dom José, no Ministério do célebre Carvalho, a criar Mesas de Inspeção nos portos principais deste Estado, cuidando que assim repararia os danos, impondo taxas e sancionando abusos”. VII Cairu revolucionário? Episódio controvertido na vida de José da Silva Lisboa prende-se à sua possível participação na “conjura dos alfaiates”, ocorrida na cidade de Salvador no ano de 1798. Segundo a portaria que ordenou a devassa 37, subscrita por D. Fernando José de Portugal, Governador da Bahia na ocasião, as primeiras manifestações concretas da trama revolucionária surgiram no dia 12 de agosto, com a fixação em diversos locais, inclusive igrejas, de boletins subversivos. Em dias posteriores, novas proclamações ao Povo Bahiense davam ciência dos objetivos da pretendida revolução, ameaçavam de morte os padres que dos púlpitos e confessionários se opusessem à conjura, aludiam, por fim, aos lineamentos da nova organização republicana a ser instalada. A fúria da Justiça portuguesa não tardou cair sobre “os indivíduos malévolos”, que procuraram atrair “alguns desgraçados (sic) pela permitida licença de costumes; outros pela elevação das futuras dignidades; e outros finalmente pelos ricos despojos do projetado saque da cidade; adotando indistintamente os mais bárbaros e perniciosos expedientes de incendiar a Cidade, assassinar o Governo, e mais Autoridades, revoltar a tropa e conseguir assim a permanência e estabilidade de tão abominável trama”38. Quatro 37. Biblioteca Nacional – “A Inconfidência da Bahia”, 1931, p. 5. 38. Idem, idem, p. 167. 35 dos conjurados, os soldados Lucas Dantas de Amorim Torres e Luiz Gonzaga das Virgens, os alfaiates João de Deus do Nascimento e Manuel Faustino dos Santos foram condenados à morte, enforcados e, segundo a execrável tradição estabelecida em tais casos, esquartejados para que a exposição de seus despojos em logradouros públicos servisse de exemplo aos colonos recalcitrantes. F. Borges de Barros afirma incisivamente que “na Bahia chegamos à conclusão de que três homens dirigiram o movimento: José da Silva Lisboa, Cipriano Barata de Almeida e Agostinho Gomes atribuindo ao futuro Visconde de Cairu o papel de “organizador calmo, meditado e prudente”39, encarnando “na agitação do momento um daqueles líderes da Revolução Francesa, pondo sua filosofia e os seus altos conhecimentos econômicos ao serviço da democracia que anelava”40. Fazendo alarde de sua índole revolucionária, pois por onde andava uma revolução surgia, Cipriano Barata de Almeida era o agitador das ruas. Em defesa de sua tese, o historiador aduz o depoimento, prestado pelo soldado Ignácio Pimentel, o qual afirma que João de Deus lhe dissera estarem a favor da conjura o “Padre Agostinho Gomes e Silva Lisboa, que ambos como ricos os poderosos seriam os que haviam de sustentar a força do levantamento” 41. Acrescenta ainda F. Borges de Barros uma carta escrita por Silva Lisboa a Cipriano Barata participando diversas providência atinentes à conspiração42 . Na transcrição feita por Afonso Ruy43 do depoimento do soldado Ignácio nota-se que o Silva Lisboa mencionado não se tratava de Cairu e sim de Antônio da Silva Lisboa, ficando portanto tais declarações sem qualquer validade como prova da participação do Visconde de Cairu no movimento, tanto mais que não nos 39. 40. 41. 42. 43. 36 F. Borges Barros – “Os Confederados do Partido da Liberdade”, 1922, p. 21. Idem, idem, p. 11. Idem, idem, p. 25. Idem, idem, p. 22. Afonso Ruy – “A Primeira Revolução Social Brasileira”, 1942, p. 118. consta fosse ele rico e poderoso, o que é certo, aliás, em relação ao comerciante implicado no movimento. Outrossim, Hélio Viana declara que o Silva Lisboa, autor da carta ao “Dr. Baratinha” chamava-se Domingos da Silva Lisboa44. Contrário à alegada atitude de Cairu manifesta-se Otávio Tarquínio de Souza, argumentando com a incerteza de sua presença em Salvador na época do levante e sua reconhecida aversão aos “revolucionários de França, novos canibais e parricidas”... horrorizado sempre com a “desenfreada libertinagem e sanguinária carreira da nação francesa”45. Se a presença na cidade de Salvador é-nos certificada pela data de sua posse no cargo de Secretário e Deputado da Mesa de Inspeção da Bahia, 27 de julho de 1798 – seja, dezesseis dias antes dos primeiros boletins subversivos – as tendências francófobas de Cairu são de certo forte argumento contra sua pretendida adesão à inconfidência, se bem que, importa notar, em seus trabalhos da época ainda não se percebe a aquele ódio à França, patenteado nos escritos publicados depois da chegada ao Brasil de D. João. É ainda com este fundamento que Pedro Calmon mostra que “absurdamente se tem escrito que um dos indiciados foi José da Silva Lisboa (Cairu), que, não somente se ausentou da ‘francesia’, aliás em desacordo com os seus princípios: de liberal à inglesa, reacionário como os economistas da City, eleitor de Burke, como por esse tempo, vivia em intimidade com o governo colonial dele respeitado e ouvido. O futuro visconde de Cairu, não figurou na inconfidência dos alfaiates”46. Outro argumento contra a intervenção de José da Silva Lisboa decorre do caráter geral do movimento, quer em seus aspectos doutrinários, quer na parte referente à ação, revolucionária propriamente dita. 44. Hélio Viana – “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1942, p. 452. 45. Otávio Tarquínio de Souza – “Franceses na Bahia” – Digesto Econômico – outubro de 1949. 46. Pedro Calmon – “A Bala de Ouro”, 1947, p. 35 (nota). 37 Os papéis sediciosos revelavam apenas um conhecimento superficial das doutrinas da Revolução Francesa, de que é exemplo a definição de Liberdade: – “Estado feliz, estado livre de abatimento; a Liberdade é a doçura da vida, o descanso do homem com igual paralelo de uns para outros, finalmente a Liberdade é o repouso, a bem-aventurança do mundo” 47 . Conceito estranho, alheio por completo ao pensamento enunciado na Declaração dos Direitos do Homem, mais parecendo um convite à mandriice. A reunião dos conspiradores no campo do dique do Desterro, para a qual João de Deus contava com duzentos e oitenta adeptos, fracassou e somente apareceram alguns conjurados que, na impossibilidade de iniciar o levante, ficaram “a beber, a fazer saúdes no botequim que fica por detrás do muro das Freiras”, o que indica uma ausência de plano preconcebido e ajustado, não obstante uma testemunha fizesse alusão ao fato de que “estes ajuntamentos já os havia de tempos antes, com muita repetição e freqüência, havendo muitos comes e bebes, saúdes, recíprocas e congratulações” 48. A sedição assemelha-se, a nosso ver, ao fruto de reuniões entusiasmadas pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, mas sem aquela organização calma e meditada que F. Borges Barros atribuiu ao Visconde de Cairu. O seu aspecto de uma explosão momentânea e irrefletida do sentimento nativista, fermentado por desigualdades de raça e de posição econômica, indica incompatibilidade entre a desorganização do movimento e o nível cultural de José da Silva Lisboa e corrobora para encarar com ceticismo a participação na conjura do Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia, conquanto, se, verídica, não representasse desdouro algum ao grande baiano, antes o integraria em uma das manifestações do sentimento nativista que se ia formando na Colônia. Se alguma influência houve, foi simplesmente episódica e indireta, 47. Afonso Ruy, op. cit., pp. 81/82. 48. Biblioteca Nacional, op. cit., pp. 20/21. 38 como, por exemplo, naquela alusão de um dos boletins revolucionários à abertura dos portos aos Estrangeiros, principalmente à nação francesa. 39 2a P A R T E I A Economia Política e o Direito Comercial O ano de 1796 constituiu um dos marcos mais importantes na formação intelectual de José da Silva Lisboa. Foi neste ano que seu antigo colega de Coimbra, Antônio de Morais Silva, ao visitá-lo em Salvador dispunha da tradução que fizera da obra de Adam Smith publicada em 1776. O futuro senhor de engenho em Muribeca, quando residia temporariamente em Londres, leu no original o mencionado livro e desde então continuou dedicandose à Economia Política. Anos mais tarde (1813), escreveria ao próprio Cairu anunciando que no seu “mato apareceu um Smith inglês, um Say, seu bom discípulo e comentador, o Canard e outros da mesma seita, que é desgraça não haja feito mais fortuna entre gente que trata de legislação”1. Prevendo a importância que o futuro reservaria à nova ciência, sentiu-se obrigado a exibir ao seu amigo a tradução do livro do genial escocês. Não se enganou. A impressão que a leitura da obra deixou em Cairu foi duradoura provocou verdadeira metamorfose no curso de seus estudos e atividades. O primeiro resultado da nova orientação, observa-se no livro “Princípios de Direito Mercantil, e Leis de Marinha”, editado em Lisboa, no ano de 1798. Que o trabalho foi produzido depois do conhecimento de Adam Smith, e não antes segundo afirmam alguns autores, assegura-nos a alusão que na página 79, tomo I, Cairu faz “às teorias do célebre autor das Riquezas das Nações” e mais adiante, na página 221, às 1. A. J. Mello Moraes, “História da Transladação da Corte Portuguesa para o Brasil”, 1872, pp. 67/71. Também F. A. Pereira da Costa – “Noticia Biográfica do Dr. Antônio de Morais e Silva, 1910, pp. 111/115. 40 observações judiciosas do “célebre Adam Smith em sua Economia Política”. Que é posterior a 1796, garante-nos ainda a legislação comentada na obra, máxime as palavras do autor citando o alvará de 12 de agosto promulgado no “presente ano de 1797”2, quando, aliás, já se encontrava em Portugal. O conhecimento amplo dos usos e costumes da praça de Lisboa, a ausência de qualquer menção ao Brasil, o que não se verifica na segunda parte do livro, e os dizeres textuais de Cairu, no opúsculo “Regras da Praça”: – “comecei a dar à luz a parte 1 dos Seguros Marítimos em Lisboa no ano de 1798 e fui sucessivamente publicando as mais partes que arranjei na Bahia”3, sugere-nos a hipótese de que José da Silva Lisboa escreveu na capital de Portugal, e não em Salvador, a primeira parte do seu primeiro livro. Na edição inicial, o autor anunciou a obra dividida em oito tratados: 1o do Seguro Marítimo; 2o do Câmbio Marítimo; 3 o das Avarias; 4o das Letras, de Câmbio; 5o dos Contratos; 6o da Polícia dos Portos e Alfândegas; 7o dos Juízes e Tribunais do Comércio; 8o da Economia Política. Este último, porém, não chegou, a ser publicado, muito embora Cairu houvesse em seu livro combatido “a legislação feita no Ministério do célebre Marquês de Pombal, que estava imbuído dos erros do Sistema Mercantil de Colbert e outros Corifeus de Panegiristas das restrições do comércio”, augurando que a mesma “não pode ter lugar depois das luzes econômicas que, tanto se espalham na obra do grande Mestre Smith sobre as Riquezas das Nações e que exponho no meu Tratado 8, parte 4”4. Não obstante estruturado em suas linhas fundamentais, José da Silva Lisboa, aprofundando seus estudos, verificou a impossibilidade de oferecer uma perfeita exposição da Ciência Econômica nos moldes em que delineara, daí ter publicado os “Princípios de Economia Política” em substituição ao oitavo tratado. 2. José da Silva Lisboa – “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, 1798, Tomo II, pp. 20/21. 3. Idem – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 951. 4. Idem – “Princípios de Direito Mercantil etc.”, 1874, p. 236. 41 Não pretendeu Cairu fazer obra de profunda Ciência do Direito. A preocupação, que o incitou escrever o livro, era de caráter econômico. Convicto da necessidade de provocar o desenvolvimento do comércio português, tencionou apenas oferecer à “Mocidade que se habilita à profissão do comércio”, um “sistema de Jurisprudência marítima, própria para engrandecer a esfera das especulações de tão útil classe de Cidadãos”. Não é destarte um trabalho “destinados sábios, que consultam as fontes originais; é só dirigido à generosa Mocidade Portuguesa que cultiva o comércio”. Pretendia com isto propiciar aos capitalistas garantias necessárias à aplicação de capitais, evitando que os mesmos permanecessem inativos, quando podiam empregá-los em frutíferas especulações. Somente na medida em que o conhecimento das regras, jurisprudência, usos e costumes contribuísse para cercar de garantias as operações dos indivíduos que se dedicavam ao comércio é que se deve encarar o objetivo do livro de Cairu5. Uma obra com estes propósitos e publicada há tantos anos deveria sofrer, como sofreu, o embate da evolução econômica dos povos. Essencialmente dinâmico, o direito mercantil amiúde transforma-se incorporando em seus dispositivos aspectos inesperados da vida comercial e relegando outros ao natural esquecimento. A discussão da conveniência ou não do seguro de vida está alheia às cogitações do legislador moderno; os seguros sobre escravos e bestas, sobre a liberdade (resgate dos piratas), são fatos do passado. As operações de câmbio marítimo desapareceram. Porém, o que o tempo não lhe tirou foi o merecimento de ser “prole criada sem mãe: não teve protótipo, nem modelo e auxílio”6. Elogiado na opinião de seus contemporâneos, na interpretação dos maiores juristas atuais o livro de Cairu, em seus aspectos fundamentais, permanece de valor inalterável: grande como foi, maior será o transcurso do tempo, por isso que os anos se encarregam de conceder às obras pioneiras aquela preeminência que, imediata5. Idem – idem – Introdução. 6. Idem – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 946. 42 mente surge quando comparamos os conhecimentos científicos de que hoje dispomos com os limitados recursos da época em que foram concebidas. Dentre os autores modernos que abordaram a obra de Silva Lisboa, o peso da autoridade de Clóvis Beviláqua é suficiente para oferecer-nos a medida exata da importância dos “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha. Diz o notável jurista que “José da Silva Lisboa é o vulto que pode servir de ponto de partida a quem procura acompanhar o desenvolvimento da nossa literatura jurídica. Blindado com os princípios da Economia Política, que ainda era quase uma novidade em seu tempo, e que fora tão amorosamente cultivada pelo bispo Azeredo Coutinho; influenciado pelas idéias de Burke e Bentham, estimulado pelo sentimento de que internava por terrenos mal explorados, conseguiu Lisboa fundar, em Portugal e na sua colônia brasileira, o direito mercantil, dando-lhe sistematização e cunho científico, muito para admirar-se em época tão pouco propícia a semelhante orientação. Porém se foi um jurista que compreendeu o proveito a tirar das ciências sociais, ou, mais exatamente da economia política, para elucidação do direito, não possuía o seu engenho essa nobre saliência que conduz às abstrações da filosofia e as construções que sintetizam as idéias”7. José da Silva Lisboa, já notamos, não procurou em sua obra nada mais fazer do que oferecer regras de utilidade imediata no desempenho das funções comerciais. Assim, parece-nos não ser lícito procurar dentro da obra jurídica de Cairu, as abstrações filosóficas a que alude o eminente Beviláqua. Mais tarde, no Congresso Internacional de História da América, o mesmo jurisconsulto voltou a se referir ao Visconde de Cairu, acentuando sobremaneira seus reconhecidos méritos: “Colocado há mais de um século de distância, podemos, desassombradamente confirmar todos os encarecimentos feitos a esse livro, que, apoiando-se na economia política, na história e na legislação comparada, 7. Clovis Beviláqua – “Juristas Filósofos” – Revista Brasileira, 1897, vol. 9, p. 145. 43 nos dá a impressão de se ter antecipado, muitos anos, ao pensamento jurídico do mundo; e na essência de suas idéias capitais, como pelo caráter científico de que se revestiu, é, ainda um livro moderno”8. As atividades de Cairu neste setor continuaram fecundas por muitos anos: em 1809 apresentou a D. João um plano do Código Comercial, do qual principiou a redigir um projeto em 1826. Tais documentos que por mais de um século permaneceram no Arquivo Nacional, recentemente vieram à luz graças ao historiador E. Vilhena de Morais e ao Jornal do Commercio, que abriu suas páginas para publicá-los. Não caberia, porém, a Cairu libertar “a Nação Brasileira da necessidade e indecência de mendigar a Lei de Viver, e a decisão de seus pleitos de Códigos Estrangeiros” 9. Conta-nos Djalma Forjaz 10 que por considerações de ordem política, Silva Lisboa não foi convidado para integrar a comissão de doutos no assunto incumbida em 1832 de organizar o projeto do Código Comercial. A omissão cometida pelo Governo deu margem a protestos pela imprensa, aparecendo no periódico A Verdade de 31 de março de 1832, veementes críticas à atitude da Regência. Esta, premida pelos protestos, viu-se, embora sem êxito, na contingência de convidar o valetudinário comercialista para colaborar nos trabalhos da comissão. Era redigido nos seguintes termos o elogioso ofício que lhe foi enviado: “Ilmo. Sr. A Regência em nome do Imperador há por bem significar a V. Exa. que, tendo sido criada uma comissão de homens probos e inteligentes para organizar o Projeto de um Código Mercantil, de que tanto se precisa, deixou V. Exa. de ser convidado 8. Idem – “A Cultura Jurídica no Brasil” – Rev. Inst. Hist. Geog. Bras. 1922 – Tomo Esp., vol. 9, pp. 320/321. 9. José da Silva Lisboa – “Projeto do Código Comercial’ – apud E. Vilhena de Morais “No Bicentenário de José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu – Jornal do Commercio, 15/7/1956. 10. Djalma Forjaz – “Origem do Código Comercial” – O Estado de São Paulo, 15/4/1927. 44 para ela, não por quebra de consideração devida à sua grande reputação literária, principalmente em semelhantes matérias como o Mundo sabe, mas porque oprimido de suas habituais enfermidades receasse a mesma Regência incomodar ainda V. Exa. com a acréscimo de novos trabalhos, além dos de sua ordinária obrigação. Hoje, porém, certo de que V. Exa. gozando de melhor saúde e tendo mesmo já preparado alguns trabalhos sobre semelhante código se não esquivará de concorrer com suas luzes para obra de tão geral utilidade e da qual muito dependerá a prosperidade do Brasil, me Ordena que convide V. Exa. para que, unido a dita comissão a coadjuve como bem permitirem suas forças físicas, no referido serviço, de que se acha encarregada. Deus guarde V. Exa. Paço, 11 de abril de 1832 a) José Lino Coutinho”. José da Silva Lisboa, ainda sobre Direito Mercantil, publicou em 1832 um opúsculo intitulado Regra da Praça ou Bases do regulamento comercial, conforme os novos códigos do comércio da França e Espanha e legislação pátria, e, relator da Junta de Comércio, auxiliou a elaboração do Regimento dos Cônsules. II O Liberalismo Econômico O primeiro dos livros que José da Silva Lisboa dedicou à Ciência Econômica, os Princípios de Economia Política, publicado em Lisboa no ano de 1804 constitui uma exposição da doutrina de Adam Smith, o “sacerdote da justiça civil” que lhe desvendou novos horizontes científicos. No tratamento dispensado à novel ciência, Cairu imprimiu o caráter pragmático que em geral se nota nos trabalhos dos primeiros: economistas. Não existia ainda a concepção de uma economia pura, de uma ciência exclusivamente teórica, idêntica à que se observa no Manuel d’Economie Politique de Vilfredo Pareto, onde o autor propôs “unicamente procurar às uniformidades que apre45 sentam os fenômenos, isto é, suas leis, sem ter em vista qualquer utilidade prática direta, sem preocupar-se de qualquer maneira em dar receitas ou preceitos, sem procurar mesmo a felicidade, a utilidade ou bem-estar da humanidade ou de uma de suas partes”11. A Economia Matemática, dotada do rigor que possibilitou as criações abstratas de Pareto, Walras, Jevons, ou mais recentemente, a construção dos modelos dinâmicos de Tinbergen, Klein, Koopmans e tantos outros, ainda estava em sua infância e de suas obras precursoras, Cairu certamente só conheceu os Principes d’Economie Politique de Nicolau Canard (citado por seu filho Bento da Silva Lisboa na tradução resumida da obra de Smith), mas que não era de molde a criar entusiasmo pelo emprego da matemática na Economia. Exemplo do espírito prático de que se revestiam os estudos econômicos de Cairu, constituem, conforme dissemos, os Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha, fruto da simbiose fecunda que o autor soube fazer entre a Economia e o Direito, e que o levou a considerar, de início, a ciência das riquezas uma seção da jurisprudência. Não obstante esta afirmativa, a nosso economista jamais negou a existência de uma ciência econômica contando, com um campo de pesquisas perfeitamente delimitado e ocupando-se dos fenômenos que surgem das ações e reações provocadas pelos indivíduos em suas atividades tendentes à satisfação das necessidades econômicas: “o mundo físico rege-se por leis simples e fecundas, que lhe dão ordem, harmonia, beleza e perpetuidade. Alguma daquelas leis são conhecidas pelos homens e segundo as mesmas eles regulam suas ações, previnem danos e adquirem muitos bens de vida. Reunidos em sociedades constituem um mundo moral, que parece também dever ser regido por leis de igual simplicidade e fecundidade, para viverem em paz e abastança”12. Cairu não concebia, porém, que a determinação das leis naturais não servisse para o promoção do bem-estar da sociedade; 11. Vilfredo Pareto – “Manuel d´Economie Politique”, 1927, pp. 2/3 12. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 111. 46 constatadas pela ciência, serviriam de paradigma às leis civis promulgadas pelo Soberano, que em suas funções era de mister usar de “perfeita imparcialidade e justiça”, utilizando-se dos conselhos dos economistas ortodoxos, cujo “patriotismo e sagacidade... deve consistir em bem ver e indicar quais sejam as leis econômicas opressivas, inúteis, antiquadas e inexeqüíveis”13. O critério adequado à determinação das leis econômicas indesejáveis à sociedade – lei no sentido jurídico – encontra-se no livre jogo da oferta e procura, pois, fazendo suas as idéias de Adam Smith, Cairu considera “evidente e óbvio a todos os espíritos a iniqüidade e insolência de pôr taxa no alheio, quando todo o mundo justamente reclama isenção ao que lhe é próprio e quaisquer transações da vida se conformam por livre ajuste às circunstâncias da demanda e concorrência”14. Adepto estrênuo da livre iniciativa, sempre manifestou através de suas obras um ódio constante e entranhado aos monopólios criados pelos indivíduos dentro de um país. Se lhe desgostavam estes entraves à concorrência, que não dizer do grande monopólio, daquele monopólio único, ferrenho e vexatório que empolgava há tantos anos, uma nação inteira? Foi precisamente o combate ao sistema colonial o fim precípuo dos Princípios de Economia Política de José da Silva Lisboa. Quatro anos depois da publicação do livro, seu autor teve a grande oportunidade de contribuir para a efetivação das idéias econômicas que propugnava. III A abertura dos portos do Brasil Relembrando o processo histórico do qual decorreram os ponderáveis eventos causadores da desintegração do sistema do 13. Idem, idem, p 289. 14. Idem, idem, p. 222. 47 monopólio colonial e que mais tarde constituiriam o fundamento da própria independência brasileira, constatamos que o Brasil não foi para Portugal apenas uma colônia de onde provinham o ouro, e os diamantes que a corte portuguesa espalhava com mãos pródigas pela Europa. Não era apenas um Estado imenso, estuante de energias, pleno de riquezas, no qual a Metrópole encontrava o sangue novo capaz de sustentar uma economia em constante decadência. O Brasil era também uma esperança, uma nova Canaã para onde a nobreza volvia os olhos quando, através das vicissitudes da política européia, sentia perigar a segurança da dinastia reinante. A História registra diversas oportunidades em que foi cogitada a transferência do Rei de Portugal para o Brasil, a primeira das quais se perde nos primórdios da colonização, visto que, em 1550, Martim Afonso de Souza recomendou a D. João III situar a sede do seu governo nas terras recém-descobertas. A mesma medida foi alvitrada ainda, e por diferentes motivos, nos reinados de D. João IV, D. José I e, finalmente, tomou incremento, a ponto de concretizar-se, na época em que o futuro D. João VI exercia o poder em nome de D. Maria I. Dentre as opiniões que prepararam o 29 de novembro de 1807, destaca-se a do Marquês de Alorna que, seis anos antes e com visão profética, encarava o futuro sombrio da monarquia portuguesa, sujeita a ter nas mãos de Napoleão o destino “de todas as coroas de Segunda ordem na Europa” 15 . Foi Silvestre Pinheiro Ferreira que em 1803, por sua vez, abalançou-se “ a representar perante o régio trono, em competente ofício pela respectiva repartição, que à Lusitana monarquia nenhum outro recurso restava, senão o de procurar quanto antes na sua colônia um asilo contra a hidra então nascente”16. O próprio D. Rodrigo de Souza Coutinho, a quem José da Silva Lisboa atribuiu o “conselho em ocasião oportuna de salvar a casa e a dinastia de Bragança, transportando-se a 15. Luiz Norton – “A Corte de Portugal no Brasil”, 1938, p. 15. 16. Idem, idem, p. 21. 48 real família para os Estados Ultramarinos”17, também, em 1803, dizia que Portugal “não é a melhor, a mais essencial parte da Monarquia” e no caso de uma guerra restava ao “soberano e aos seus Povos o irem criar um poderoso Império no Brasil”18. A idéia da transladação da corte, face às ameaças francesas, não era esposada e defendida apenas em Portugal: encontramo-la encarecida na Inglaterra onde Pitt, em célebre e contestado discurso, propôs a instalação da monarquia portuguesa na América para formar um novo Império, indestrutível devido à íntima colaboração inglesa. Para não faltar o elemento tradicional, a capital denominar-se-ia Nova Lisboa e o rio que dela mais próximo corresse, chamar-se-ia Novo Tejo. Mas se Portugal não acedesse às instâncias britânicas, tropas desembarcariam na vasta possessão portuguesa... Mesmo diante destas claras manifestações da política inglesa, com sombrios prognósticos para suas colônias, Portugal durante certo tempo conseguiu tergiversar perante as cortes de França e Inglaterra. Finalmente ficou diante de fatos concretos e irremovíveis: no momento em que medidas contrárias à Grã-Bretanha foram postas em execução, no momento preciso em que alienava a simpatia de sua antiga aliada, a França, por seu turno, riscava do mapa europeu aquela nação diminuta que outrora encontrara no mar o complemento exato de sua grandeza. E mais uma vez Portugal seguiu o rumo do Oceano que lhe dera imorredouras glórias. Voltando à amizade da Inglaterra, aceitaria implicitamente sua tutela e seus ministros teriam que ouvir à bordo da nau Medusa as impertinências de Lord Strangford exigindo a abertura dos portos do Brasil ao comércio inglês, mas que, repelidas com hombridade por Antônio de Araújo terminaram sem que fosse alterado o antigo projeto de abrir um porto, o da ilha de Santa Catarina, conforme ficara estabelecido caso para o Brasil viesse o futuro D. Pedro I. 17. José da Silva Lisboa – “Elogio do Conde de Linhares” – publicado segundo A. J. Melo Moraes – “História do Brasil Reino e Brasil Império”, 1871, pp.134/135, no “Investigador Português (Londres). 18. Oliveira Lima – “D. João VI no Brasil”, 1945, p.54. 49 Sob a proteção da bandeira inglesa, o Príncipe Regente e sua comitiva deixaram Portugal para enfrentar os azares do Oceano, aturando os vermes que pululavam na água de beber, o odor das carnes que apodreciam nos depósitos, o incômodo dos insetos que enxameavam nos próprios camarotes reais. Depois de quase dois meses de viagem, as naus que transportavam a parte mais luzidia da nobreza aportaram em Salvador e somente então os espíritos serenaram-se das amarguras da travessia ingrata, os ânimos envaideceram-se pelas homenagens tributadas na antiga Capital da Colônia, e mais do que isto, no ambiente festivo de uma população exultante em conhecer Suas Majestades, receberam consagração definitiva as idéias inglesas que Adam Smith e Edmundo Burke compendiaram e espalharam pelo mundo. * * * Quais os sucessos ocorridos nos dias que mediaram entre a chegada de D. João à Bahia e a promulgação da Carta Régia de 28 de janeiro de 1808, que abriu os portos do Brasil às nações amigas? J. M. Pereira da Silva assegura-nos que, imediatamente à chegada, o Príncipe Regente reuniu um conselho composto de várias pessoas gradas, inclusive José da Silva Lisboa, para discutir a importante medida; F. M. Góes, por sua vez, diz-nos que o Conde da Ponte enviou ao príncipe a obra que José da Silva Lisboa lhe oferecera e intitulada “Observações sobre a abertura dos portos do Brasil”. Heitor Moniz, afirma porém, que o futuro Visconde de Cairu foi uma das pessoas encarregadas de saudar Suas Majestades e o fez com tanta eloqüência que conseguiu inspirar o ato primordial da libertação econômica do Brasil19. Diante deste desacordo generalizado, sublinhemos a exposição de Alexandre José de Melo Moraes, que tem a seu crédito a particularidade de representar uma tradição de família, porquanto lhe foi transmitida em conversas 19. J. M. Pereira da Silva – “História da Fundação do Império Brasileiro”, 1877, p. 10; F. M. Góes Calmon – prefácio de Rodrigues de Brito “A Economia Brasileira no Alvorecer do Século XIX” – p. 10; Heitor Moniz – “Episódios da História do Brasil”, p. 36. 50 por Bento da Silva Lisboa, filho do Visconde de Cairu. Conta-nos o historiador alagoano, que José da Silva Lisboa tomou conhecimento dos desejos inglêses de comerciar diretamente com o Brasil, através de um dos opositores da partida do Príncipe Regente para o Brasil, o Marquês de Bellas. Ciente dos sucessos que precederam a saída precipitada de D. João, Cairu percebeu que em favor das teorias econômicas que desde muito proclamava na cidade de Salvador, surgia uma série de acontecimentos que tornavam o liberalismo econômico um imperativo inadiável para o Brasil. Procurou por isso influir no ânimo de D. João, não diretamente, mas por intermédio de D. Fernando José de Portugal, e, se conseguiu convencer o Marquês de Aguiar dos benefícios da medida, não o persuadiu da urgência que julgava indispensável, desde que D. Fernando pretendia, por compreensíveis escrúpulos, fosse ouvido com antecedência o Conselho de Estado. Neste transe, “José da Silva Lisboa vendo quase baldados seus esforços, recorreu à lisonja e disse: “V. Exa. que é tão ilustrado, sabe que os grandes homens, não podem fazer grandes benefícios ao seu país, por não lhe serem favoráveis as circunstâncias. Ora parece, que presentemente Deus quer proporcionar a V. Exa. o ensejo de fazer um assinalado serviço, não só à sua pátria, mas aumentar ainda mais o esplendor de sua ilustre família. Não deixe esta glória para outro” 20. Ao lado desta variedade de narrativa, o excepcional concurso de circunstâncias que tomou realidade os reclamos coloniais de liberdade de comércio, permitiu no julgamento da atuação que nele desempenhou José da Silva Lisboa opiniões extremas muito divergentes: umas, admitiram sua preponderante e exclusiva influência, imputando o decreto de D. João à força de seus argumentos; outras, pelo contrário, fazendo ênfase na política inglesa, resumiram o papel do Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia à redação de um simples parecer burocrático ou apenas à formulação jurídica de um pensamento que o regente esposava desde sua retirada de Portugal. 20. A. J. Melo Moraes – “História da Transladação etc.”, p. 71. 51 O próprio Visconde de Cairu declarou que o “liberal Sistema de Comércio e Indústria... se havia adotado no Brasil, desde o princípio do ano de 1808, pela inevitável força das coisas”21. Tal asserção, pelo seu cunho de sinceridade leva-nos supor que mesmo se a fortuna do mar não conspirasse para que D. João antes de atingir o Rio de Janeiro aportasse à Bahia, o liberalismo seria implantado independentemente das instâncias de José da Silva Lisboa. Aceitando-se a hipótese da viagem direta ao Rio, resta-nos perguntar se o merecimento do ilustre baiano ficaria de alguma forma diminuído. Devemos ter em conta que as grandes ações que enobreceram a humanidade, nem sempre foram executadas pelos que mais sentiram, preconizaram e muitas vezes até morreram pelos ideais que os norteavam. Tiradentes não viu realizados os ideais que sublimou e nem por isso seu valor diminuiu: continuará sempre com a glória de intimorato precursor da autonomia brasileira. Assim, Cairu também sobressairia sempre pelas idéias sustentadas, tivesse ou não participação no decreto que libertou o Brasil do jugo econômico de Portugal. Basta-nos acentuar que desde 1804, quando na Europa, Portugal ainda podia oscilar entre as tendências políticas de Rodrigo de Souza Coutinho e Antônio de Araújo, favoráveis à Inglaterra e França, respectivamente; quando eram remotos os acontecimentos que determinaram a mudança urgente da corte para o Brasil, conclamava o economista brasileiro ao Príncipe do Brasil: “Será de eterna Glória ao Augusto João VI dar primeiro exemplo de um Império, em que a Razão e a Justiça triunfem dos prejuízos e atentados com que até o presente se acham manietados a Indústria e Comércio do Gênero Humano. E se eu, que mal sou um átomo do Universo, entrar para a imensidade desse benefício, ajuntando, algum grão à seara social, não almejo mais, fortuna que o ser útil. . .”22. Mas os fatos não quiseram que este átomo do Universo, que na grandiosidade de sua cultura cresceu até atingir as dimensões imen21. José da Silva Lisboa – “Reflexões sobre o Comércio de Seguros”, 1874, p. 946. 22. Idem, idem, “Princípios de Economia Política’’, 1804, pp. 32/33. 52 sas de um planeta permanecesse alheio à realização de suas idéias econômicas. Corroborando com a narrativa de A. J. Melo Moraes, que nos adianta uma participação ativa de José da Silva Lisboa, dispomos de um documento da época, de autoria de Tomaz Antônio Vilanova Portugal, transcrito no Jornal do Commercio de 28 de janeiro de 1908, em artigo anônimo comemorativo do centenário da grande efeméride nacional, posteriormente identificado como de autoria de Capistrano de Abreu. Disse o Ministro: “Neste ano chegou Sua Majestade à Bahia a 22 de janeiro; esteve servindo de Ministro de Estado D. Fernando José de Portugal, porque este e o Marquês de Bellas, José de Vasconcelos e Souza e o Marquês de Angeja, D. José de Noronha que tinham impugnado a jornada, é que foram com Sua Majestade na nau Príncipe Real; e os dois Ministros que havia Antônio de Araújo e Visconde de Anadia, João Rodrigues de Sá, aquele foi na nau Medusa e este na fragata... e os mais conselheiros de Estado Marquês de Pombal, D. Rodrigo de Souza Coutinho e o Mordomo Mor, o Duque de Cadaval foram nas mais e como se dispersou a esquadra com a tormenta, na altura da Madeira, foram a diversos portos.” Neste intervalo, até que Sua Majestade chegasse ao porto do Rio de Janeiro, a 7 de março, D. Fernando foi capacitado por José da Silva Lisboa, a quem o Marquês fez nomear lente de economia política e por Antônio da Silva Lisboa, que aí estava administrando o contrato de João Ferreira, o Solla, para fazer assinar por El Rei o decreto para abrir todos os portos do Brasil às nações estrangeiras. Antônio de Araújo “tinha falado com o Ministro inglês, Lord Strangford, que se havia de abrir algum porto; mas, em conseqüência disto, não houve ocasião nem de negociar, nem de compensação inglesa e ficava aberta a porta. Parece que o Marquês de Bellas se capacitou também e conveio; porque ele é que tinha sido incumbido de redigir o decreto e instruções que El Rei deixou em Lisboa para os governadores do Reino”23. 23. Reproduzido em “Ensaios e Estudos” – 2ª Série, 1932, p. 73. 53 Confirmada a participação de Cairu nas ocorrências de Salvador, cabe-nos determinar a natureza de sua intervenção. D. João ao sair de Portugal conhecia sobejamente os desejos ingleses; durante a viagem, refletiu com os conselheiros presentes nas vantagens e inconvenientes da pretenção britânica e, segundo acabamos de ver, concluiu pensando usar o privilégio a ser outorgado como base de futuras negociações. Mesmo se estas negociações fossem possíveis, o que aliás não se afigura plausível, mercê da posição difícil em que se encontrava Portugal perante a Inglaterra, a medida possuiria um cunho nitidamente político, uma concessão feita diante de forças superiores, sendo as considerações de ordem econômica de caráter secundário. Parece-nos que uma das virtudes de José da Silva Lisboa foi, de início, transformar aquele ato político em uma decisão de natureza econômica, mostrando que a abertura dos portos não era apenas de interesse da Inglaterra, mas que, antes de tudo, representava um ato de transcendental importância para o futuro do novo Império que ia ser fundado na América. Cairu, portanto, deu a D. Fernando José de Portugal e, posteriormente, a D. João convicção das benéficas conseqüências da atitude que seria tomada pelos dirigentes portugueses. Mais do que isto, porém, Cairu no desempenho das funções específicas do economista, conseguiu modificar os próprios planos do Príncipe Regente. Foi Tobias Monteiro quem, utilizandose do manuscrito apresentado por Capistrano de Abreu, indicou o verdadeiro resultado dos raciocínios desenvolvidos por José da Silva Lisboa junto ao Marquês de Aguiar para convencê-lo da utilidade da medida proposta. Sublinhou o autor de “A Elaboração da Independência” aquela parte do texto na qual Tomás Antônio Vilanova Portugal deixou consignado que, muito embora pelas conversações mantidas na Europa, “se havia de abrir algum porto”, o regente foi por fim “capacitado” para “abrir todos os portos do Brasil”.24 24. Tobias Monteiro – “A Elaboração da Independência”, 1927, pp. 63 e segs. 54 Pelo papel desempenhado na abertura dos portos do Brasil, não se afigura demasiado considerar Cairu o economista profissional que, na qualidade de conselheiro econômico, maior influência teve sobre os destinos do Brasil, tornando-o digno de ser respeitado como o inconteste patrono desta profissão liberal. IV O Ensino da Economia Política Nos “Princípios de Economia Política”, Silva Lisboa manifestou dois grandes desejos: ansiava pelo sistema: de franquia do comércio e não menos anelava implantação do ensino da Economia. Confiante nos benefícios que adviriam da vulgarização dos preceitos estabelecidos pela ciência de Adam Smith, Cairu lamentava que “erigindo-se todas as nações iluminadas tantas cadeiras de instrução do povo e ainda estabelecimentos de mero luxo literário; distinguindo-se, além disto, várias escolas em desperdício de tempo, cabedal, e trabalho, para doutrinarem inépcias, futilidades, erros, coisas dignas de se ignorar e até o que todo o mundo sabe, ou que facilmente se aprende e não se tenha com tudo ainda afamado, algum protetor das Ciências para honrar e universalizar o ensino da Economia Política, fazendo-o entrar na Educação Nacional” 25. O economista brasileiro, no entretanto, percebia com júbilo que não estava, apregoando em vão as idéias econômicas que encontrava nos mais recentes livros saídos dos prelos do velho mundo: conseguia aos poucos criar um clima de curiosidade pela ciência que se constituía. Dos livros, as idéias passavam para as discussões públicas, para os debates em tertúlias que reuniam os elementos mais progressistas da cidade. Exemplo marcante encontra-se no inquérito sobre a situação econômica da Capitania, procedido em 1807 pela Câmara da Cidade de Salvador no qual com25. José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1804, p. 18. 55 pareceram com suas respostas João Rodrigues de Brito, Manoel Ferreira da Câmara, José Diogo Ferraz de Castelo Branco e Joaquim Inácio de Sequeira Bulcão, aquele senhor de engenho que anos antes, por iniciativa de José da Silva Lisboa, recebera o Hábito de Cristo. Neste clima de renovação intelectual J. Rodrigues de Brito reuniu sua voz à do futuro Visconde de Cairu, deplorando que “a ciência econômica sendo a mais importante, é a mais ignorada. Deviam criar-se Cadeiras para ela em todas as partes, onde houvesse suficiente número de alunos para freqüentá-las; sem este preparatório ninguém devera matricular-se na Universidade, nem ser admitido a servir empregos públicos de qualquer natureza que fosse”26. Um ano após o inquérito, à satisfação de ver realizado o sonho do liberalismo econômico, juntou-se em Cairu a alegria de conhecer o decreto de 23 de fevereiro, que não só criava na cidade do Rio de Janeiro a cadeira de Economia Política, como também o nomeava para regê-la. Diz o decreto, verdadeira síntese do apreço que já naquele tempo gozavam os estudos econômicos: “Sendo absolutamente necessário o estudo da ciência econômica na presente conjuntura, em que o Brasil oferece a melhor ocasião de se pôr em prática muitos dos seus princípios, para que os meus vassalos, sendo melhor instruídos neles, me possam servir com mais vantagem; e por me constar que José da Silva Lisboa, Deputado e Secretário da Mesa de Inspeção da Agricultura e Comércio da Cidade da Bahia, tem dado todas as provas de ser muito hábil para o ensino daquela ciência, sem a qual se caminha às cegas e com passos muito lentos e às vezes contrários na matéria de Governo, lhe faço mercê da propriedade e regência de uma cadeira e Aula Pública que por este mesmo decreto sou servido criar no Rio de Janeiro.” Dias depois da nomeação, Cairu, acompanhado de sua família, 26. J. Rodrigues de Brito, op. cit., p. 132. 56 embarcou em um dos navios que em 26 de fevereiro de 1808 suspendiam âncoras com destino ao Rio de Janeiro, onde chegaram em 7 de março. Não teve início venturoso, a moradia de José da Silva Lisboa na Capital do Brasil. Acometido de grave doença foi obrigado a guardar o leito por muito tempo. Os parcos vencimentos que percebia eram insuficientes para manter uma família numerosa; valeu-se então da amizade de D. Rodrigo de Souza Coutinho para obter que seu filho Bento da Silva Lisboa, mais tarde renomado membro do nosso Corpo Diplomático, fosse nomeado em 22 de agosto de 1809, oficial da Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra e Estrangeiros. Pouco depois, em 1811, perdeu o convívio da filha de D. Isabel Antônia de Figueiredo e do advogado Antônio Alvares de Figueiredo, D. Ana Francisca Benedita de Figueiredo, com quem se consorciara em 19 de abril de 1784. A todas estas preocupações somou-se a decepção que lhe proporcionou o ensino da Economia Política, seu ideal acalentado por tantos anos. Adianta-nos I. A. F. Benevides, em 1821, que no Rio de Janeiro, “tal parede lhe fizeram os inimigos da luz, que inda não deu a primeira lição”27. Por fim, em 1830, foram desvanecidas suas últimas esperanças, pois deixou de figurar no orçamento a dotação correspondente aos vencimentos do prof. José da Silva Lisboa, por não haver alunos na cadeira de Economia Política. 28 Terminava de forma melancólica a experiência brasileira precursora do ensino da Ciência Econômica. Implantado, segundo nos afirma o mesmo I. A. F. Benevides, pelos passos que neste particular empreendeu João Rodrigues de Brito, representava verdadeira glória para o ensino no Brasil, pois fora obtido com notável antecedência sobre a criação de cátedras da mesma disciplina em outros centros do mundo civilizado. 27. Idem, idem, p. 126. 28. A. J. Melo Moraes – “História da Transladação etc.”, p. 72, nota. 57 V Esboço de uma Política Econômica A despeito de todas as adversidades que o afligiram, Silva Lisboa manteve seu espírito imune ao desânimo. Avolumando-se contra a abertura dos portos às nações amigas a “notória indecente oposição”29 dos que viram seus interesses postergados e dos reinóis que sentiram o profundo significado que ela representava para as futuras relações entre a Metrópole e a Colônia, Cairu ainda doente foi obrigado a entrar em liça defendendo a medida de D. João e, para não perder a oportunidade do debate, ditava da cama ao seu filho Bento as páginas do livro “Observações sobre o Comércio Franco do Brasil”, no dizer de Moses Bensabat Amzalak30 “um dos mais curiosos e interessantes da extensa e valiosa bibliografia de José da Silva Lisboa”, devido principalmente “à grande cópia de argumentos de ordem teórica e prática, às referências a fatos seus contemporâneos, de política nacional e internacional, ao profundo conhecimento das necessidades econômicas e financeiras do Brasil e à coragem, firmeza e desassombro da opinião do Autor”. Não era apenas contra os interesses feridos a luta de Cairu; a inveja, a incompetência, a mediocridade eram tantos outros obstáculos difíceis de vencer: “Deus abençoe os seus trabalhos e lhe dê a consolação de os ver aproveitados – foram os votos de seu fiel amigo Antônio de Morais Silva31 – apesar das contrariedades da ignorância e da emulação, porque ouvi dizer dessa um caso que me amargurou, tanto por quem figura nela, quanto me enchi de prazer pela energia da repulsão, com que Vmc. confundiu a temeridade do mal iniciado nestas coisas.” E assim, na defesa do liberalismo econômico, incompatibilizando-se com uns, convencendo outros; prejudicando alguns, mas 29. José da Silva Lisboa – “Espírito de Vieira”, 1821, p. IX. 30. Moses Bensabat Amzalak – “José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu” em Brasília, 1943, vol. II, p. 318. 31. F. A. Pereira da Costa, op. cit., pp. 111/115. 58 beneficiando a imensidade dos habitantes do Brasil, Cairu, com a modéstia de opinião que caracteriza o verdadeiro cientista, mas ao mesmo tempo certificando a firmeza de suas convicções, protestava não intentar “deprimir o patriotismo e mérito dos que discordam de mim em tal assunto. Respeito o juízo de todos – não presumo que o meu seja a medida da verdade: só desejo que prevaleça o que for realmente útil ao Estado”. Não obstante, estava convencido “que a franqueza de comércio regulada pela moral, retidão e bem comum é o princípio vivificante da ordem social e o mais natural e seguro meio de prosperidade das nações”32. Se não bastassem as celeumas provocadas pelo “Filantrópico Diploma, e, se é permitido dizer o Mandado Novo e Civil Evangelho de Paz, e Boa Vontade a todos os homens, que respeitam o Direito das Gentes” concedido por D. João, “cuja Glória há de sobressair no Templo da Memória, ereto pela Verdade e Filantropia, quando nele reluzir em Tábua Diamantina, a Nova Legislação, que aboliu o velho Sistema Mercantil para substituir-lhe o da Leal Correspondência, Livre Ajuste e Imparcial Proteção a toda Indústria honesta”33, em 1810, foram concluídos por intermédio dos plenipotenciários Conde de Linhares e Lord Strangford os famigerados tratados de Amizade e Comércio e Navegação, passíveis de tantas críticas e que, em 1820, na cidade de Lisboa, eram tachados de desastrosos “pela conseqüente, decadência das fábricas e manufaturas nacionais” 34. Os favores concedidos à Inglaterra estimularam um fluxo considerável de mercadorias de produção britânica e a imediata instalação nas principais cidades do País de casas comerciais de súditos ingleses que, não se limitando a negociar nos centros de maior atividades de negócios, aos poucos estenderam através de todo o 32. José da Silva Lisboa – “Observações sobre o Comércio Franco do Brasil”, 1808, Introdução. 33. Idem, “Observações sobre a Prosperidade do Estado pelos Liberais Princípios da Nova Legislação do Brasil”, 1810, pp. 4/6. 34. Manifesto à Nação Portuguesa, de 15/12/1820 – em A. J. Melo Moraes – “História do Brasil-Reino etc.”, p. 82. 59 território brasileiro uma poderosa rede de agentes, capaz de quebrar para sempre o monopólio dos antigos comerciantes portugueses. Cairu, amigo impertérrito do príncipe real e panegirista dos atos econômicos promulgados, não poderia, deixar de defender a repudiada interferência do comércio inglês, de vez que sua paixão pelas idéias de Edmund Burke levaram-no também a uma admiração incontrolável por tudo quanto era inglês: “Ser intimamente unido com o Governo Britânico é entrar em companhia com a Verdade, Honra, Independência, Sabedoria, Riqueza e Invencibilidade, isto é, com tudo que dá força, grandeza e duração aos Impérios”35. Porque rejeitar então a colaboração daqueles que ajudaram a construir o Império Britânico? Porque reclamar contra atividades que se prenunciavam tão benéficas ao país? “Consta replicou Cairu – que várias pessoas estranharam muito aos ingleses o mandarem seus agentes pelas Fazendas aos Lavradores a comprar Tabaco, Café e outros gêneros da terra, pagando bem com dinheiro na mão e por isso alguns apelidavam atravessadores, que faziam encarecer os gêneros e não deixavam aos comerciantes Nacionais a facilidade de comprá-los para os remeterem por sua conta, ou para encherem de comissões os Comerciantes do Reino. Tanto podem erros e prejuízos inveterados. Inveja-se aos Lavradores o benefício da extração e boa venda dos frutos de seus suores? Não se quer concorrência que force aos inertes à indústria, atividade e moderação?”36. Nesta viril virtude da concorrência encontrava Silva Lisboa o verdadeiro fundamento da abertura dos portos e sua grande utilidade para o desenvolvimento econômico do país. A implantação do sistema de comércio franco, possibilitando a entrada de capitais, técnica e empresários provenientes de países com evolução econômica mais acentuada, era de molde a provocar um daqueles casos típicos de inovação, descritos pelo economista austríaco Schumpeter e decorrente da anulação de uma posição de mono35. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a prosperidade etc”, pp. 9/10. 36. Idem, idem, p. 23, nota. 60 pólio. Exatamente como acentua o autor da “Teoria do Desenvolvimento Econômico”, os novos capitais trazidos pelos ingleses para emprego no comércio e na incipiente indústria forçavam a elevação dos preços dos escassos fatores de produção pelos quais lutavam: “as terras não têm descido de valor; a notória alta de preços dos braços necessários à lavoura é evidente sintoma da demanda de trabalho e conseqüentemente do racionável proveito no emprego dos fundos. Já vários artigos novos começam a ser objeto de exportação. Os Comerciantes Nacionais, a custo e com estímulo da atividade dos comerciantes estrangeiros, vão deixando a velha rotina e tirando-se do torpor e letargo, em que a tibieza e o acanhamento do anterior Sistema Colonial os tinham paralisado e adormecido”37. Foi esta perfeita compreensão da eficácia revolucionária do empresário inovador que induziu Cairu comparar “a franqueza do Comércio com a virtude do Sol: pois mal se abre uma porta em vasta casa, de muito tempo fechada, entrando qualquer raio de luz logo tudo de repente se ilumina, descobrindo-se coisas antes não vistas em estado de confusão, que depois se põe na devida ordem”38. Não apenas nas atividades mercantis fazia-se sentir a necessidade de contar o país com um número crescente de empresários aptos para promover o seu progresso: a Indústria nacional, já liberta, em 1o de abril de 1808, do Alvará de 5 de janeiro de 1785, que proibia na América qualquer fábrica, exceto as de tecido grosseiro, constituía um campo aberto à introdução de novas combinações de fatores da produção. Retomando as idéias que outrora colocara em prática, quando exercendo o cargo de Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia conseguira recompensa não só para o autor do aperfeiçoamento das máquinas de moer cana, como também para o inovador dos engenhos de açúcar, Cairu no livro publicado em 1810, sobre a “Franqueza de Indústria e Estabelecimento de Fábricas no Brasil”, considerou um dos requisitos essenciais para 37. Idem, idem, p. 21. 38. Idem, idem, p. 21. 61 que fossem instaladas “grandes máquinas e manufaturas de muito dispêndio”39, a concessão de privilégios, honras e benefícios aos seus introdutores, desde que os privilégios concedidos não importassem em virtual monopólio. Permanecendo dentro da linha doutrinária fundamental que defendia, detestando os estancos e crendo com firmeza nas vantagens do liberalismo econômico, o professor baiano dizia que “o Princípio da Franqueza de Indústria sendo conseqüente ao da Franqueza de Comércio, é o meio mais eficaz de fazer introduzir e aperfeiçoar os mais úteis Estabelecimentos, com maior rapidez e incessantemente progressiva energia pública para opulência e população do Brasil”40. O acolhimento destes princípios implicava na imediata recusa de qualquer tentativa do governo visando programar a implantação de fábricas pois José da Silva Lisboa, baseando-se em Lauderdale, admitia que somente a demanda efetiva era capaz de indicar as indústrias que se tornassem necessárias à população do Brasil. A procura efetiva, segundo nos adianta Cairu, “supõe não um desejo vago e ainda real carência de quaisquer indivíduos a respeito de uma coisa, mas a faculdade de pagar o seu preço natural; e se falta esta faculdade, ninguém trabalhará, nem empregará fundo para satisfazer de mero obséquio, os gostos, os desejos e ainda as precisões dos que demandam qualquer produção da Natureza e Arte”41. Por isso, mal saído do Sistema Colonial, o Brasil não podia contar com “as Fábricas refinadas e de luxo que distinguem a Europa”42, por muitos desejadas, mas que teriam, se introduzidas, existência precária por não atender à maior parte de uma população dotada de renda “per capita” insignificante e sem possibilidades de propiciar uma apreciável demanda efetiva aos bens produzidos. Era forçoso, desta forma, que certas necessidades continuassem a ser satisfeitas recorrendo-se à importação de artigos manu39. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a Franqueza de Indústria e Estabelecimento de Fábricas no Brasil”, 1810, pp. VI/VII. 40. Idem, idem, p. VIL 41. Idem, idem, pp. 40/41. 42. Idem, idem, p. VI. 62 faturados. Chegava Silva Lisboa a outro ponto diversas vezes salientado e para o qual encontrava justificativa no exemplo da política norte-americana, exposta mediante longas citações das obras de Benjamin Franklin: apenas eram vantajosas as indústrias capazes de produzir incorrendo em custos inferiores aos das mercadorias, estrangeiras. Tornava-se preciso, nesta conformidade, repelir a idéia de se estabelecer fábricas “por espírito de rivalidade e açambarcamento, no desígnio de diminuir a importação de fazendas estrangeiras”43 desde que as conseqüências seriam desastrosas, diminuindo inclusive as próprias exportações: afigurava-se, pois, “pernicioso precipitar as épocas dos possíveis melhoramentos do Brasil no que respeita a fábricas e é evidentemente absurdo pretendermos rivalizar e já competir com os países populosos e adiantados em estabelecimentos desta natureza e até com o risco de distrair braços e fundos dos mais convenientes canais de Riqueza” 44 . Acentuava ainda José da Silva Lisboa como requisitos à introdução de Fábricas, a existência de capitais disponíveis, a presença de população numerosa, a abundância de matérias-primas e produtos de subsistência e por fim, a difusão da inteligência. No parecer de Cairu, não possuindo o Brasil, Nação que ainda se encontrava “de machado e enxada na mão, lutando contra desertos e matos”45, uma estrutura, econômica que facilitasse no momento o estabelecimento de certas fábricas, ficava mais restrita do que se poderia supor à primeira vista, a ação dos empresários que, nestas condições, precisavam voltar-se para a agricultura, única indústria em situação de concorrer, com as similares do estrangeiro, tanto mais que não são as fábricas as únicas fontes, de riqueza46. Portanto “por ora no Brasil e ainda por longo tempo 43. Idem, idem, p. VII. 44. Idem, idem, p. V. 45. Idem, idem, p. 10. 46. “Que a agricultura não se associa necessariamente à pobreza, é óbvio quando se considera os casos, da Austrália, Nova Zelândia, da Dinamarca, de Iowa ou de Nebraska” – J. Viner – Rev. Bras. de Economia – ano 5, n. 2, p. 83. 63 a agricultura deve ser a nossa Grande e Principal Manufatura”47. Tais considerações, porém, não eliminavam a possibilidade da criação de indústrias fabris diretamente relacionadas, com as atividades agrícolas. Dez anos mais tarde, o panorama geral da economia brasileira não sofrera modificações de relevo e Cairu, ainda que perfeito conhecedor das vantagens da organização de fábricas, nos “Estudos do Bem Comum e Economia Política”, apenas ampliou a maneira de exprimir seu pensamento, asseverando que “por ora no Brasil são prematuros os projetos de ativos especuladores, até intentando, alguns, aliás bons servidores do Estado, fazer, por assim dizer, invasão de fábricas neste Continente, ainda tão despovoado e fértil. Só podem prosperar as Fábricas auxiliares da Agricultura e Marinha, que por ora devem ser (e não podem deixar de ser) os nossos principais Laboratórios, e Oficinas de Trabalho produtivos, sendo sem efeito (e só desvio de capital) todas as tentativas de precipitar com força as épocas de ulteriores melhoramentos convindo ainda por longo tempo, contentar-nos com as preciosas plantações nas margens das grandes costas, e rios, e com as Minerações e Pastarias no Interior”48. A predominância da agricultura no Brasil não decorria de qualquer julgamento sobre um maior valor deste ramo das indústrias: anos mais tarde Cairu afirmaria no Senado do Império: “Não inculquei a preferência da agricultura no Brasil aos mais ramos de indústria. Não considero a agricultura como uma divindade caída do Céu, solitária”49. Era tão-somente “uma necessidade das coisas”, decorrente em grande parte de motivo que constituiu perpétuo objeto de repúdio de José da Silva Lisboa: a escravidão. Sempre que possível, não deixava Cairu de profligar com ardor a infamante nódoa do cativeiro. A repugnância que lhe causava o trabalho servil nota-se no seu excessivo e talvez injusto comentá47. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a prosperidade etc.” p. 60. 48. Idem – Estudos do Bem Comum e Economia Política, 1819/20, p. 271. 49. Idem – Anais do Senado do Império – sessão de 14/5/1827. 64 rio de um trecho do “Traité d’Economie Politique” de J. B. Say 50, explicável em seus termos, porque escrito em livro de combate às idéias francesas e exaltação do pensamento britânico. Estudando qual seria o trabalho mais lucrativo nas colônias, se o trabalho livre ou servil, Say conclui a favor do último, sem contudo aprovar a escravidão, julgada contrária à moral. Refutando, esta opinião, lança o economista brasileiro a seguinte diatribe: “Já ele [Napoleão] está preparando a opinião pública pela diabólica doutrina de seu mais acreditado Escritor de Economia Política, Mr. Say, o qual, sem vergonha, nem reverência à Humanidade esforça-se ainda que ridiculamente, em provar contra Turgot, Stewart e Smith, que o trabalho do escravo é mais produtivo que o do homem livre. Se isso for convencido no juízo dos violentos, será simples o expediente para haver maior riqueza na sociedade, isto é, fazer de toda a terra uma universal cafraria”51. O desagrado que lhe causava a escravidão fizeram-no emitir palavras tão candentes contra a utilização dos escravos, que muitas vezes nelas procuram surpreender resquícios de racismo. Porém, em 1823, tornando claras suas idéias sobre o tema, considerava que as cores da pele eram apenas “fenômenos físicos que variam segundo os graus do Equador, influxos de sol e disposições geológicas”52. O que o preocupava e, em conseqüência, não podia admitir que os escravos vindos da África, onde mantinham civilização rudimentar, pudessem substituir os imigrantes brancos, provenientes de países civilizados e que, portanto, estavam em melhores condições de empregar a inteligência na indústria. Tratava-se apenas de uma questão de grau de cultura: os negros 50. J. B. Say – Traité d’Economie Politique”, 1876, p. 240. 51. José da Silva Lisboa – “Extratos da Obra Política e Econômica de Edmund Burke”, 1812, p. 10. 52. José da Silva Lisboa – Anais da Assembléia Legislativa e Constituinte – 1823 – sessão de 30/9/1823. “Boas Instituições com a reta educação são as que firmam os homens para terem à dignidade de sua espécie quaisquer que sejam as suas cores. O doutor Botado em Lisboa foi clérigo e letrado, que (perdoe-se-me dizer) valia por cem brancos”, idem, idem. 65 aqui chegavam “bárbaros, de entendimentos broncos e braços repugnantes aos trabalhos necessários”53, sem que estas características constituíssem um atributo racial dos africanos, porquanto existiam casos como o daquele clérigo negro, que outrora Cairu conhecera em Lisboa e que, na sua opinião, valia por cem brancos. No caso inverso, acentuemos por curiosidade, “mais valem mil industriosos das Nações civis do que dez mil Africanos”54. Era precisamente a qualidade da mão-de-obra existente no momento que fazia Cairu duvidar da possibilidade de introduzir as grandes indústrias no Brasil: “convém-lhe pois, pela necessidade das coisas, o trabalho dos campos e das artes comuns, visto que a óbvia e fácil colheita dos produtos rudes da terra, e o simples fabrico e transporte de obras grosseiras ou ordinárias, está mais na possibilidade e esfera da parte principal do povo”55. Este perigo que corria o Brasil de ver “diminuída à atividade da Indústria Inteligente, pela má qualidade da povoação, que resulta da incessante importação da cafraria”56, implicava em urgentes providências que pudessem impedir que o Brasil naufragasse nos escolhos que a escravidão escondia, tanto mais que o Tratado de Amizade concluído com a Inglaterra em 1810, ficara expressamente estipulada a supressão do tráfico negreiro. Para tanto, Cairu acenava outra vez com o exemplo dos ingleses que procuraram na Ásia, entre os chineses, os povoadores de suas Colônias do Cabo da Boa Esperança, mostrando assim “quanto mais sensato e filantrópico este projeto do que foi o do piedoso Espanhol, Bispo de las Casas, que, por compaixão pelos índios da América, aconselhou a introdução de escravos d´África, fazendo arraigar o terrível cancro do Cativeiro no Corpo Político e que tende a impedir o crescimento da raça dos brancos e por assim dizer, africanizar o Novo Mundo”57. Por facilitar a imigração do Velho Mundo, rece53. 54. 55. 56. 57. 66 Idem, Idem, Idem, Idem, Idem, Estudos do Bem Comum e Economia Política”, 1819, p. 329. idem, p. 329. Observações sobre a franqueza etc.”, 1808, p. 10 Estudos do Bem Comum e Economia Política”, 1819, p. 330. “Observações sobre a prosperidade etc.”, pp. 15/16. beu de Cairu os maiores elogios o decreto de D. João que permitiu a concessão de sesmarias aos estrangeiros, porque lhe dava esperança de ver cessada ou diminuída a entrada de escravos. Mas, se no comércio, indústria manufatureira e agricultura, Cairu era propagandista ardente da liberdade econômica, certa atividade produtiva existia na qual julgou indispensável uma política de controle governamental: não que fosse extinta por completo a livre iniciativa, mas, neste ramo, as atividades dependeriam de licença das autoridades públicas. Tratava-se da mineração. Em 1827, quando Senador do Império, ao discutir a proposição de Manoel Ferreira Câmara, de que era “patrimônio da Nação tudo quanto a terra encerra de precioso e ninguém o poderá extrair sem seu expresso assentimento e debaixo das condições que a lei determinar”, Cairu teve ocasião de defendê-la encarniçadamente, mostrando as impropriedades da preconizada livre exploração de metais preciosos, a fim de que o Brasil não ficasse “reduzido a montões de cascalho, quais se acham e horrorizam os Distritos Mineiros”. Se as demais indústrias exigem trabalho perseverante, aplicação continuada de energia e inteligência na direção dos negócios, a mineração, pelo contrário, constitui uma atividade aleatória, suscetível de transformar a mentalidade dos indivíduos, imprimindo-lhes a “execrável sede de ouro, dando-lhes ilusões de boa fortuna, que na maior parte não conseguem”. Falando aos baixos instintos do jogo, pelas promessas de fortuna rápida e fácil, a mineração apresenta o grande defeito de prejudicar as demais atividades econômicas, principalmente a agricultura, o que aliás já ocorrera em épocas passadas, quando “muito povo do litoral correu ao centro; abandonara-se muito as lavouras das canasde-açúcar e este precioso ramo da agricultura e do tabaco decaiu por extremos. O mal depois se agravou pela concorrência de outras nações, que estabeleceram iguais culturas em suas colônias da América”. José da Silva Lisboa, que sempre colocou a liberdade econômica sob a égide da “moral, retidão e bem comum” quando chegou a 67 ocasião de mostrar os pontos que o “espírito de liberdade extrema é não menos nocivo que o da restrição extrema”, soube valer-se de sua habitual convicção. Se os estudos revelaram-lhe que a “nação onde predomina a indústria da mineração de metais preciosos é necessariamente, pobre, escrava e fraca”, preciso era impedir chegasse o Brasil a este extremo. Por isso recebeu altivo as ironias e sarcasmos dos partidários da absoluta liberdade de mineração e, sentindo os seus cabelos brancos desrespeitados, proclamou com dignidade da tribuna do Senado: “Quase não me considero entre os vivos, mas não quero com o meu voto ser cúmplice dos crimes que hão de resultar verossimilhante da indefinida liberdade proposta”58. O Senado, porém, não lhe deu razão. VI Cairu e a exegese moderna A análise dos trabalhos jurídicos de José da Silva Lisboa e os esclarecimentos de sua verdadeira contribuição para a abertura dos portos do Brasil às nações amigas, constituíram, por muitos anos, os pontos de atenção dos que procuravam salientar sua figura na História Pátria. A sólida cultura demostrada nos “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, e o oportunismo do decreto de 28 de janeiro, davam, de fato, importantes razões para enobrecêlo e recomendá-lo à gratidão de seus compatriotas. Mas esta exaltação não lhe fez inteira justiça: paradoxalmente concorreu para deixar no olvido as idéias do economista. As meditações científicas, as teorias defendidas, os conceitos estabelecidos, os pontos de contato com o pensamento alienígena, a confiança no valor social dos princípios da Economia Política, tudo, enfim, que vivificou a obra de Cairu, caiu em imerecido esquecimento. Tomemos, por exemplo, o célebre artigo, de Eunápio Deiró, 58. Idem, “Anais do Senado do Império”, sessões de 10 a 14 14/5/1827. 68 publicado no “Jornal do Brasil”, no qual o autor transforma em lenda a atuação de Cairu junto a D. João VI. Diz o escritor em certa passagem, que a idéia da abertura portos “todo o mundo a tinha; não é criação privilegiada de ninguém. Já D. João IV falava nela, já os economistas do século XVIII a ensinavam e entre eles Adam Smith”59. Resulta desta afirmativa a convicção de que Deiró discutiu a ação de José da Silva Lisboa sem amplos conhecimentos de seus escritos de economia, porque, do contrário, jamais teria insinuado estivessem todos os que admitiram uma influência de Cairu no decreto do Príncipe Regente atribuindo-lhe uma concepção teórica original, tanto mais que ele sempre confirmou a inconteste influência do grande economista britânico em seu pensamento. Outro ponto que convém ser mencionado, em relação ao desinteresse que cercou os estudos econômicos de Cairu, prende-se às reedições mais recentes de suas obras. O Senador Cândido Mendes de Almeida, reconhecendo o valor de parte jurídica dos trabalhos de José da Silva Lisboa, ausente dos prelos desde 1828, publicou em 1874 a sexta edição dos “Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha”, na qual incluiu os opúsculos “Regras da Praça” e “Reflexões sobre o comércio de seguro”. Ficou assim a cultura brasileira habilitada a julgar estes escritos e na mesma ocasião, teve o ensejo de apreciar uma “obra admirável, sem igual na língua portuguesa e das melhores na literatura jurídica mundial”, constituída, no dizer de Manoel Álvares de Souza Sá Viana60, pela introdução acrescentada pelo ilustre maranhense à edição que promoveu. Sessenta e seis anos foram necessários, depois, para que aparecesse outro livro, de Cairu. Desta feita foi o historiador que ficou acessível aos estudiosos, graças à edição “fac-símile” da “Memória dos benefícios políticos do governo d´El Rei, Nosso Senhor, D. João VI” prefaciada e comentada pelo historiador Eugênio Vilhena de Morais. 59. Eunápio Deiró – “Há Cem anos” – Jornal do Brasil, 28/1/1908. 60. Manuel Alvares de Souza Sá Viana – Rev. I. H. G. B. – Tomo 83, 1918, p. 524. 69 Mas o desconhecimento do Cairu economista ainda perdurou por muitos anos. Quando Cândido Mendes de Almeida apresentou a bibliografia do Visconde de Cairu, referindo-se aos “Princípios de Economia Política”, anotou que se tratava de uma obra muito rara e da qual não tivera oportunidade de ver sequer um exemplar. Este compêndio, escrito em colônia dotada de limitados recursos materiais e científicos e de instrução geral praticamente nula, antecedeu em vários anos muitos dos mais conhecidos tratados expositivos da ciência econômica, assegurando-lhe com isto, consagradora primazia. Não obstante, a repercussão dos trabalhos de Cairu fora dos limites da língua materna foi muito reduzida e, deixando-se em suspenso até ulterior confirmação a argüida influência sobre David Ricardo não conhecemos outra referência à sua obra, senão em Ricardo Levene e Luigi Cossa, este em sua “Histoire des Doctrines Économiques” 61 , onde refere-se que “o excelente jurisconsulto e economista José da Silva Lisboa (1756-1835), teve o mérito de tornar conhecidas em Portugal e no Brasil as teorias de Smith; ele resumiu suas idéias nos “Estudos do Bem Comum e Economia Política”. Até mesmo a desenvolvida e moderna “Encyclopaedia of Social Science” é muda neste particular, muito embora se refira a outros economistas portugueses de menor nomeada. Que a obra de José da Silva Lisboa ficasse sepulta na língua portuguesa é compreensível. Mas que seus patrícios tivessem que esperar cento e cinqüenta e dois anos pela reedição de um de seus livros de economia, é fato inconcebível e para que não dizer, lamentável. Face ao adiantamento prodigioso com que se tem beneficiado a ciência econômica, e à guiza de explicação, poder-se-ia argumentar, consoante conhecido dito, que, é preciso sejam abandonados para sempre os erros e deficiências que marcaram as teorias econômicas do passado. Mas, mesmo sem aceitar o conceito spenceriano de que existe sempre uma alma de verdade nas coisas errôneas, importa salientar que o estudo minucioso da obra de 61. Luigi Cossa – Histoire des Doctrines Économiques, 1899, p. 443. 70 Cairu, ainda que lhe faltassem outros merecimentos, justificar seria plenamente devido a preponderante influência do autor na política econômica de D. João VI, servindo destarte para esclarecer muitos fatos daquela época, inclusive a penetração dos ingleses na vida econômica do Brasil. Estimando, precisamente, que “Cairu é o economista brasileiro mais citado, mais discutido, e mais comentado, porém, é o menos lido e o menos compreendido, pela simples razão de que as suas obras são inacessíveis ao grande público”62, o prof. Luiz Nogueira de Paula acrescentou à sua já grande soma de serviços prestados Ciência Econômica no Brasil, o mérito de uma primorosa edição os “Princípios de Economia Política”. Perdidos os contatos com as obras de José da Silva Lisboa, seu pensamento econômico tornou-se difícil de ser apreendido, e, hoje, quando se voltando para o grande vulto do passado procura-se inventariar suas antecipações científicas; situar suas idéias em relação às condições socioeconômicas da época em que viveu; estabelecer a orientação da política econômica preconizada, suas opiniões e conceitos parecem rebeldes a um esforço de interpretação autêntica. Recente e interessante contribuição deu-nos o prof. Nogueira de Paula no prefácio aos “Princípios de Economia Política” salientando novos aspectos importantes da obra de Cairu, além dos que já havia exposto em estudo dedicado à síntese do pensamento econômico no Brasil. São ao todo assinaladas quarenta e duas contribuições à teoria econômica, embora não tenham recebido desenvolvimento que as fizessem assemelhar-se ao tratamento que hoje lhes é dispensado. Seria, aliás, impossível vê-las em toda sua plenitude, de vez que as grandes, concepções científicas nunca são o fruto espontâneo de algum cérebro privilegiado, mas sim o resultado de um desenvolvimento lento, em que diversos precursores durante anos colocam suas parcelas de esforços e que, por fim, são sintetizadas por alguém que lhes empresta em definitivo o 62. Em José da Silva Lisboa – Princípios de Economia Política, 1956., p. 11. 71 nome. Portanto, não se pode pretender que José da Silva Lisboa imprimisse à noção da mútua dependência o aperfeiçoamento que lhe deu Pareto, nem tão pouco, em uma obra do início do século passado, será lícito procurar todas as inferências que do conceito do pleno emprego tirou Keynes. Apenas em esboço podemos encontrar a idéia do equilíbrio econômico, muito diferente da que Walras concebeu cem anos depois e não encontraremos na idéia do ciclo econômico o tratamento de um Hicks, Hayek ou Aftalion. Além destas antecipações, Cairu agrega outras, que não se referindo exclusivamente a determinada ciência, indicam noções metodológicas aplicáveis ao estudo dos fenômenos econômicos: tais as noções de lei natural, do emprego dos métodos indutivos e dedutivos etc. O ponto capital do trabalho do prof. Nogueira de Paula prende-se, porém, à relação que o autor estabeleceu entre os pensamentos de Cairu e de David Ricardo, levando-o “a crer que, de fato, Ricardo se inspirou também na obra de Cairu”. Esta idéia, por sua originalidade e transcendência, constitui um verdadeiro, desafio aos economistas e, em particular, aos cultores da História das Doutrinas Econômicas. O prof. Djacir Menezes, pronunciando-se sobre a questão, acentua não ter encontrado “nas citações e transcrições de documentos feitos por Dobb e Sraffa, qualquer pista que denunciasse contato com fontes portuguesas’’ pelo que, não acredita “que Ricardo tenha tido conhecimento da existência de Cairu”63. Afirmou, entretanto, com inteira propriedade, a importância que para vitalizar a obra de Cairu representam estas indagações, estas tentativas de interpretações que exigem discussões e, o que é mais importante, pesquisas às fontes originais, representadas pelos documentos da época e pela enorme bibliografia que nos deixou o ilustre baiano. Dos benefícios que surgem de tais discussões, temos o exemplo daquela que se estabeleceu em torno da afirmativa de que José da Silva Lisboa considerava a inteligência um fator da produ63. Djacir Menezes – “Cairu” – O Jornal 22/7/1956. 72 ção. Autorizou esta opinião, compartilhada pelos profs. Nogueira de PauIa e Amoroso Lima, o conhecido trecho do prefácio dos “Estudos do Bem Comum e Economia Política” no qual o autor, analisando a obra de Smith, dispõe-se a determinar “se para a riqueza e prosperidade das nações mais contribui e em que proporções, a quantidade de trabalho, ou a quantidade de inteligência na animação e direção geral da indústria”... “Intento mostrar – continua Cairu – que o ofício do economista deve ser, não o carregar a sociedade de trabalhos mecânicos, braçais e penosos; mas inquirir os eficazes meios de aliviar indefinidamente pelo estudo das leis e obras do Criador, substituindo o trabalho da natureza ao trabalho da humanidade... a fim de terem os homens a maior riqueza possível com o menor trabalho possível”64. Criticando estas idéias, o prof. Sérgio Buarque de Holanda65 procurou integrar o vulto de José da Silva Lisboa dentro da realidade do seu tempo, apresentando-o como expressão típica das novas formas sociais que se constituíam no início do século XIX. Assim “a importância de Cairu parece relacionar-se com o surto pela primeira vez no Brasil, ao tempo em que redigiu sua obra, de uma classe média, de formação puramente urbana” o que, na falta de valores decorrentes do seu próprio status, adotava certos modos de pensar da classe agrícola, inclusive aquela relevância concedida ao talento, ao anel de grau, símbolo da superioridade social que desfrutava. Cairu, expressão lídima da classe citadina, não, poderia deixar de atribuir papel de primazia na produção à inteligência, isto é, àquele “tipo de talento ornamental e declamatório que Cairu parecia admirar entre os brasileiros” caracterizado pelo “amor à frase sonora, ao verbo espontâneo e fácil, à erudição ostentosa, à expressão rara... ornato e prenda e não instrumento de conhecimento e ação”. O sociólogo brasileiro, nas idéias de Cairu sobre a necessidade de o economista promover a diminuição das ativida64. José da Silva Lisboa – Estudos do Bem Comum e Economia Política – Introdução. 65. Sérgio Buarque de Holanda – “Inatualidade de Cairu” – Correio da Manhã, 17/3/1946. 73 des corporais, encontra motivos para reforço de sua tese, pois as considera derivadas das condições econômicas vigorantes na época, ou seja, uma economia escravocrata onde os senhores; de engenho tinham por degradantes os trabalhos manuais e concediam extraordinária importância às profissões de cunho nitidamente intelectual. Estas críticas, porém, parecem-nos injustas, pois nada mais alheio ao pensamento de José da Silva Lisboa do que imputar à inteligência qualidades vazias de conteúdo: muito ao contrário, nela destacava atributos que a tornavam “instrumento de conhecimento e ação”. No livro “Observações sobre a Franqueza da Indústria e o Estabelecimento de Fábricas no Brasil”, Cairu colocou, já verificamos, entre os requisitos indispensáveis à instalação de fábricas, a difusão da inteligência. Mas seria esta inteligência caracterizada pelas qualidades puramente literárias que o prof. Sérgio Buarque de Holanda acentua? Certamente não. “A difusão da inteligência em Artes e Ciências – proclama Cairu – é que multiplica as facilidades para a introdução e prosperidade de todos os Estabelecimentos úteis em geral, com especialidade das Fábricas... A Física e Química têm neste século prestado os maiores socorros e serviços ao melhoramento de todas as Artes e Manufaturas... Portanto é insensato estabelecer Fábricas, refinadas em país não iluminado pelas Ciências”66. O economista baiano, retomava idéias já expostas nos “Princípios de Economia Política” e mais tarde desenvolvidas, seja nos “Estudos do Bem Comum e Economia Política” seja no “Ensaio Econômico sobre o influxo da inteligência humana na riqueza e prosperidade das nações”. No seu primeiro livro de economia, diz que “convém que se protejam e se facilitem as Ciências e Artes que versam sobre os objetos do interesse comum da vida social; premeie-se com especialidade as invenções das máquinas, que, abreviando e aperfeiçoando os trabalhos não só aliviam todos os operários das manobras rudes e molestas, com a necessária conservação e prolonga66. José da Silva Lisboa – “Observações sobre a franqueza etc., p. 43. 74 ção de sua existência”67. Em 1851, no importante ensaio póstumo a que nos referimos, o autor reforça suas idéias, estimando que “se os governos se convencessem, que da superioridade da inteligência é que vem a progressiva riqueza e prosperidade das nações... reconheceriam que era do seu interesse promover, pelos mais eficazes meios, a instrução todas as classes em artes e ciências” 68 . Em qualquer escrito de Cairu, é constante a ênfase na expansão das Artes e Ciências, consideradas indispensáveis à promoção da riqueza e prosperidade das Nações. Os dicionários modernos, registram o vocábulo “técnico” referindo-se a tudo que é próprio de uma Arte ou Ciência. Nestas condições, é importante ser averiguado se na época em que José da Silva Lisboa escreveu, já era corrente ou não no Brasil o emprego daquele adjetivo. Pode-se ponderar, em favor da negativa, que o dicionário de Antônio de Morais Silva, cuja segunda edição é de 1813, não registra a palavra. Julgamos, pois, que na falta de termo correntio, Cairu empregou a expressão inteligência no sentido de conhecimento essencialmente técnico. Não foi outra a intenção de Cairu sublinhando o papel da inteligência na diminuição do trabalho corporal mediante o estudo das obras do Criador, ou seja, o estudo da Natureza, através de suas leis, para colocá-la ao serviço do bem-estar humano. “Pretendo provar – disse Cairu – que o trabalho corpóreo será usado o menos possível, como de pouco efeito e valor, e para obras de pouca importância e fadiga; empregando-se para as grandes coisas, sempre com preferência o trabalho da natureza, isto é, os agentes físicos, animais e materiais”69. Portanto, era preciso contar-se com “o progresso da inteligência (que provém principalmente do 67. Idem – “Princípios de Economia Política’’, 1956, p. 128. 68. Idem – “Ensaio Econômico sobre o Influxo da Inteligência Humana na riqueza e prosperidade das Nações” – Rev. Guanabara, 1851, Tomo I, pp. 41/51. 69. Idem, idem. 75 Pai das Luzes – assinalou piedosamente Cairu) donde resulta a invenção de máquinas”70. Estas idéias, não cremos fossem conseqüentes das condições da sociedade brasileira, aludidas pelo prof. Sérgio Buarque de Holanda, e reconhecidas também por José da Silva Lisboa quando prescreve o trabalho livre: “O homem livre jamais se põe a par do escravo; e a infinita distância dos Estados os repulsa de toda a racionável aliança e parceria. Por isso, onde se acha estabelecida a escravidão, o trabalho da agricultura e artes fica desonrado, como sendo a única e principal ocupação dos cativos”71. Cairu, em seu estilo muito ao gosto da época, enunciou duas idéias que no século XX, isto é, cem anos depois, em estrutura econômica diversa, André Fourgeaud colocaria na base de todo o progresso econômico e que, utilizando-se de termos sem dúvida mais elegantes as apresentaria sob a denominação de “Lei do Menor Esforço” e “Lei da Intelectualização do Esforço ou Lei da Invenção Técnica”. De acordo com estas leis, “todo, esforço físico do homem tende a obrigar o cérebro à transformação do esforço físico em esforço intelectual. Por esta operação, o cérebro inventa um utensílio que multiplica a força do homem, ou, o que vem a ser o mesmo, procura utilizar uma energia tomada na natureza animada ou inanimada... Devido a este mecanismo, o progresso técnico avança sem cessar porque o organismo, procurando poupar sua pena no trabalho, exige sempre do cérebro a intelectualização do esforço. . . “72. É mais uma vez o sentido técnico que se vislumbra nas considerações de José da Silva Lisboa sobre a inteligência, quer promovendo a invenção de novas máquinas, quer propiciando a introdução de novos métodos de organização e administração pública ou privada 73. 70. 71. 72. 73. 76 Idem, “Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos” – Tomo III, 1825, p. 73. Idem, “Da Liberdade do Trabalho” – Rev. Guanabara, Tomo I, 1851. pp. 91/98. André Fourgeaud – “L’Homme devant le Capitalisme” – 1936, pp. 227 e 228. José da Silva Lisboa – “Ensaio Econômico etc.”. O artigo que analisamos, teve o mérito de chamar a atenção para a confusão que se estabeleceu colocando a inteligência como fator da produção. Ao estudar seu influxo sobre a riqueza e prosperidade das nações, Cairu, a nosso ver, o fez sob o ponto de vista dinâmico, porquanto aqueles termos implicam na comparação entre diferentes níveis de renda nacional. Colocando qualquer teoria do crescimento econômico como variável fundamental a técnica, parece-nos que é justamente sob este aspecto que se deve considerar o importante papel que José da Silva Lisboa atribuiu à inteligência na produção, tornando suas idéias de grande atualidade, pois considera um dos elementos que caracterizam as modernas teorias do crescimento econômico: “O crescimento, de uma economia desenvolvida é ... principalmente um problema de acumulação de novos conhecimentos científicos e de progressos na aplicação desses conhecimentos. O crescimento das economias subdesenvolvidas é, sobretudo, um processo de assimilação da técnica prevalecente na época” 74. Se ao espírito inventivo, Cairu concedeu importância capital como elemento do progresso econômico das nações, não menos considerável foi, conforme tivemos ocasião de mostrar, a relevância atribuída à franqueza do comércio. Por isso torna-se também valiosa para o esclarecimento das idéias econômicas de José da Silva Lisboa, a interpretação do seu liberalismo oferecida pela prof. D. Zênith Mendes da Silveira75, que, após salientar as concordâncias existentes entre o pensamento do economista brasileiro e do seu mestre escocês, inquire quais as diferenças que marcaram a passagem do liberalismo econômico para o Brasil. A conclusão a que chega a autora é inédita e estimulante, porque encontra o caráter distintivo exatamente no fato de ter Cairu, antecipado idéias que anos depois seriam defendidas pelo corifeu de uma das escolas que se opuseram às doutrinas de Adam Smith: Frederico List, o renomado autor do Sistema Nacional de Economia Política. 74. Celso Furtado – “A Economia Brasileira”, 1954, p. 194, 75. Zênith Mendes da Silveira – “Originalidade do Liberalismo Econômico Brasileiro” O Estado de São Paulo, 8/7/1950. 77 Um dos pontos criticados pelo economista alemão, constituía o “cosmopolitismo” das teorias de Smith, isto é, a hipótese implícita de que a humanidade era um todo coerente, entabolando-se relações econômicas exclusivamente entre indivíduos, e por isso, os clássicos de tradição smithiana, “à força de exaltar a iniciativa dos indivíduos, terminaram por negligenciar um dos caracteres da economia contemporânea: a divisão do mundo em nações independentes”76. As doutrinas de List, como se sabe, surgiram na Alemanha, na época fracionada por barreiras alfandegárias interiores, verdadeiros entraves à formação de uma unidade econômica nacional, fim a que se propunha o citado autor. Acentua a professora paulista, que a necessidade de integração econômica não se apresentava ao liberalismo inglês, porquanto a Grã-Bretanha já era um país há muito unificado, apenas desejando libertar-se do intervencionismo estatal. O problema, patente na Alemanha e resolvido na Inglaterra, surgiu também para o Brasil, quando conseguiu livrar-se do sistema colonial que o abatera por trezentos anos. Cairu, sentindo a questão, ao preconizar o liberalismo de Smith, nele introduziu feição peculiar: “O caráter mais original desse liberalismo é ser nacional e não cosmopolita, como o liberalismo inglês. A reação liberal no Brasil lutava, antes de tudo, contra o regime colonial do sistema mercantilista... A Nação deve tornar-se um organismo econômico unificado, no qual as diversas formas de atividades econômicas se desenvolvam de maneira harmoniosa e solidária. Esse é o cuidado constante de Cairu. Em todas as suas obras seu pensamento liberal acha-se estritamente ligado com a preocupação da economia Nacional.” Segundo a autora, não era apenas esta idéia que, aproximando Cairu de List, o afastava de Smith. As considerações sobre o valor relativo das diferentes atividades econômicas sendo o brasileiro adverso à agricultura, simpático à indústria e extremamente favorável ao comércio destoavam por completo de Smith e refletiam a preponderância que o comércio possuía na economia portuguesa. 76. Emile James – “Histoire des Theories Économiques”, 1950, p. 115. 78 Semelhante a List para Cairu, o desenvolvimento econômico dos países efetuava-se através de várias etapas, até atingir a fase da “economia complexa”, na qual “a agricultura, a indústria e o comércio, foram desenvolvidos de modo harmonioso”. Conclui D. Zênith Mendes da Silveira acentuando “que Cairu realizou a síntese entre o nacionalismo mercantilista e o liberalismo econômico. Completando Smith dele se separa, prolonga o mercantilismo e anuncia List”. A esta conclusão, poder-se-á contrapor a ausência de elementos que possam autorizar incluir o pensamento de Cairu dentro de qualquer uma das formas que, segundo Renê Gonnard, diferenciaram o mercantilismo. Falta em Cairu, de início, a preocupação constante com o metal precioso, que levada ao extremo constituiu o ponto capital da fase bulionista, característica do mercantilismo espanhol. O próprio José da Silva Lisboa, combatendo a necessidade de circulação metálica, concluiu que “a real riqueza do País, essencialmente consiste na abundância de todas as coisas necessárias, úteis e deliciosas à vida, e que para as mútuas transações, trespasses, compras e vendas, basta que haja alguma quantidade de ouro, prata ou cobre” 77. Carece ainda na política preconizada pelo economista brasileiro o complexo de regulamentação das indústrias que assinalou o mercantilismo francês, dito industrial: o próprio Cairu prescreveu a liberdade de indústria e o afastamento da idéia de competir com nações industriais mais adiantadas. De igual forma, o mercantilismo comercial inglês, baseado no emprego do comércio exterior para promover o afluxo de ouro, está fora das cogitações de Cairu que em sua defesa da liberdade do comércio, deseja apenas que o Brasil goze das vantagens da divisão internacional de trabalho. Acresce salientar que Cairu diverge profundamente de List quanto aos meios apropriados para conseguir o ideal da economia complexa, porque, se o autor alemão preconiza o emprego de um sistema protecionista educativo para que as nações ultrapassem a 77. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 16/6/1827. 79 fase agrícola e atinjam a industrial, Cairu, pelo contrário, não fazia distinção entre a política necessária às diversas etapas, permanecendo fiel aos princípios do liberalismo econômico que sempre ensinou. Esta doutrina, integrada por José da Silva Lisboa em um programa de política nacional, no fim de sua vida, assinalam alguns autores, não se apresentava em toda a sua plenitude, uma vez que em conceitos por ele emitidos, encontraram motivos para colocálo entre os adeptos do dirigismo econômico. A vitória de Roosevelt nas eleições americanas de 1936, por exemplo, foi saudada pelo prof. Amoroso Lima, que salienta ser “grato aos brasileiros, lembrar, na hora em que a economia dirigida se beneficia de tão grandioso plebiscito popular, após uma experiência de 4 anos, que temos em nossa história cultural um precursor na pessoa desse vulto extraordinário da nossa história que foi José da Silva Lisboa”78. Deu margem a esta interpretação79, o trecho do livro Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos, no qual, entre outros, Cairu estabelece como objetivo do Estado: “Dirigir com circunspeção a indústria Nacional para aqueles ramos que são evidentemente de maior e constante interesse do Estado, com especialidade para o que mais contribuir à sua Segurança, a fim de que o interesse egoístico ou imoral dos indivíduos não prevaleça à causa pública”. Igual tendência manifestou o biógrafo de Cairu, José Soares Dutra que, baseando-se na definição de propriedade dada no Senado em 1826 coloca Cairu, numa “posição, razoável entre o capitalismo e o socialismo, entre o individualismo e o coletivismo extremados”. A definição de propriedade dada por Cairu “é tão visceralmente cristã e ortodoxa, que, se a conhecera, Leão XIII, te-la-ia quem sabe? citado na Rerum Novarum. É tão fundamentalmente humana, que Marx e Engels te-la-iam, possivelmente, acatado, se não tivesse esquecida nos velhos “anais do senado”80. 78. Alceu Amoroso Lima – “Cairu e Roosevelt” – O Jornal, 8/11/1936. 79. Idem, em José da Silva Lisboa – “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 28. 80. José Soares Dutra – “Cairu”, 1943, p. 75. 80 Teria havido, é lícito perguntar, um rompimento flagrante com o liberalismo econômico de Adam, Smith? Não nos parece que tal ocorresse, porque, no “Suplemento à Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos”, Cairu continua a proclamar a eficiência da política liberal para promover a prosperidade nacional e, até mesmo, a mais justa distribuição da riqueza: – “Sem perfeita Imunidade de Indústria, e completa Abolição dos Estancos da Coroa, e Monopólios de qualquer sorte, não pode haver a possível animação do Povo e energia do Geral Trabalho, nem a maior produção e melhor distribuição dos bens, para todos os indivíduos terem a justa partida dos necessários e cômodos da existência, proporcional à quota de sua cooperação no Monte Mor da Riqueza Nacional”81. A modificação notada nas idéias de Cairu, porém, longe de indicar uma fuga, revela maior aproximação com aspectos menos lembrados do pensamento de seu mestre escocês. De fato, José da Silva Lisboa nos primeiros livros demonstrava ingênua confiança no valor educativo da liberdade econômica. Nos “Princípios de Economia Política” podemos observar quais seriam os resultados da reforma moral que nos indivíduos causaria a adoção do liberalismo econômico: – “A moralidade e sabedoria com que se dirigirá o trabalho e a disposição dos seus produtos farão que os dons celestes circulem, as fortunas se aproximem, os incentivos da inveja cessem, as causas das misérias e das tentações para os crimes se removam, a facilidade de mútuos socorros se aumentam e os estímulos para fraudes, rapacidades e desatinos não existam. Nessa hipótese, será a preguiça impossível e a emulação remunerada, o favor impertinente, a má-fé rara, os privilégios odiosos, a sinceridade necessária, a justiça infalível, a coação deslocada, os delitos poucos, as sanções brandas, as censuras úteis, o rigor supérfluo, as penas corretórias, a filantropia comum, a verdade o geral caráter, o polimento trivial e a opulência a mais universal e acumuladamente esparzida”82. Estas loas ao liberalismo, explicam-se per81. José da Silva Lisboa – “Suplemento à Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos”, 1825, p. 83. 82. Idem, idem, “Princípios de Economia Política”, 1956, p. 174. 81 feitamente se levarmos em consideração os objetivos imediatos do trabalho de Cairu: o rompimento do sistema de monopólio colonial e a instauração do regime liberal. Não é de se estranhar que através de suas páginas amiúde se encontre panegíricos à política preconizada, e, portanto, fossem relegadas a plano secundário certas passagens do livro de Adam Smith, curiosamente em contradição com a intervenção benéfica da Mão Invisível. Se José da Silva Lisboa não perdeu toda a confiança no valor o liberalismo para aprimoramento dos costumes da sociedade, pois não deixa de assegurar que “o liberal Economista (depois dos Ministros da Religião é o melhor auxiliar do Moralista)”83, porque “impossível que no Corpo dos povos haja reforma de costumes que os Governos estudem e admitam o liberal Sistema Econômico”84, não é menos verdade que, passada a primeira hora de entusiasmo, verificasse que nem todos os indivíduos faziam da liberdade econômica, uso adequado. Por isso, da mesma forma que Smith notou que “as pessoas do mesmo negócio, raramente se reúnem, mesmo para alegria e divertimento, sem que a conversa termine em uma conspiração contra o público ou algum conluio para aumentar os preços”85, Cairu passou a considerar com mais cuidado o “lado escuro” da profissão de Homem de Negócios. É, então, contra as conseqüências do “espírito de Monopólio; do Tráfico de sangue Humano d’África; das Bancarrotas de má-fé; das faturas falsificadas”; da perversidade dos Taverneiros “cuja regra é faltar à minha palavra por amor à minha conveniência – e fazer toda espécie de adulteração e fraudes das mercadorias”86; da introdução de “quadros e livros corruptores dos costumes e até coleções de estampas as mais impúdicas”87 , que os interesses da Religião, Humanidade e Moral pública reclamam a Inspeção, Direção e Proteção do Governo”88. 83. 84. 85. 86. 87. 88. 82 Idem, “Suplemento à Constituição Moral etc.”, p. 42. Idem, idem, p. 41. Adam Smith – “The Wealth of Nations”, Ed. 1937, p. 128. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 125. Idem, “Suplemento à Constituição Moral etc.”, p. 66. Idem, “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 30. Não se pode, entretanto, considerar intervenções do governo contra estes fatos quebra dos princípios da liberdade econômica, pois nada mais são do que, medidas contra aquela liberdade diabólica de que nos fala Voltaire, isto é, a liberdade de acabar com a própria liberdade, ou medidas corriqueiras de polícia ou higiene, segundo Smith, possíveis em qualquer Estado, “desde o mais liberal até o mais despótico”89. Foi ainda em Smith, no capítulo 11 do livro IV das Riquezas das Nações, onde, ao nosso ver, encontrou José da Silva Lisboa o fundamento das restrições ao liberalismo econômico que “plausível em teoria, é ilusório na prática, sendo levado ao excesso”90. Naquele capítulo, o autor acentua o caráter teórico do liberalismo quando declara que a introdução de um completo sistema de liberdade no comércio internacional na Grã-Bretanha, é “tão absurdo quanto pretender que uma Oceana ou Utopia nela pudessem ser estabelecidas”91. Igualmente, Smith mostrando as exceções à liberdade econômica, afirma que elas são justificáveis quando “algum ramo particular da indústria é necessário à defesa do país”, como foi o caso do Ato de Navegação, ou quando sua adoção priva “milhares de pessoas de sua ocupação ordinária e meios de subsistência”92. Cairu, por seu turno, reclamou a “Superintendência e Direção do Governo...’’ para os “Grandes Ramos da Indústria, que se entrelaçam com muitos outros subalternos, de que sobremaneira depende a segurança da subsistência, defesa e ocupação do povo” 93. Outrossim, não é de se desprezar a semelhança de expressões entre Cairu, que impôs ao Estado o dever de dirigir a indústria com circunspeção, e Smith que alude àqueles, casos em que a introdução do liberalismo exige “reserva e circunspeção”94. Assim, é pela aceitação do pensamento de Smith em todos os 89. 90. 91. 92. 93. 94. Adam Smith, op. cit., p. 308. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, Tomo III, p. 29. Adam Smith, op. cit., p. 437, Idem, idem, pp. 429 e 435. José da Silva Lisboa – “Constituição Moral etc.”, p. 30. Idem, idem, p. 24 – Adam Smith, op. cit., p. 438. 83 seus matizes, que José da Silva Lisboa surgiu paradoxalmente como precursor do intervencionismo estatal e isto ocorreu somente porque “o liberalismo de Smith é acomodatício e realista; marca mais uma orientação do que se afirma como princípio absoluto. Smith nada definiu rigorosamente, mas tudo sugeriu, inclusive o rigor do raciocínio econômico. Sem dúvida confundia, de alguma forma, o ponto de vista normativo e o ponto de vista especulativo, a doutrina e a teoria; e na sua teoria pode-se encontrar o anúncio de teses que mais tarde mutuamente opor-se-iam”95. Deste bosquejo feito através da exegese moderna do pensamento econômico de Cairu, que nos aparece como precursor de Keynes, Pareto, Roosevelt, List, Marx, Engels e muitos outros, resta-nos a convicção de que suas obras constituem e por muitos anos continuarão a ser uma inesgotável fonte de pesquisas e debates, sem que o economista brasileiro possa perder jamais o caráter, tão próprio de Smith, de “defensor da libertação econômica do indivíduo”96. VII O fim de uma época Ao terminar o segundo decênio do século XIX, o Império que D. João VI veio criar na América parecia definitivamente consolidado. O surto de progresso cultural que modificou a fisionomia da cidade do Rio de Janeiro, com a fundação do Jardim Botânico, da Biblioteca Real, das Escolas de Medicina e Belas Artes, da Academia de Marinha etc., reuniu-se à prosperidade econômica decorrente de uma legislação liberal que, no dizer de Cairu, compensava “os danos da Administração, de que o povo se queixava com motivos justificados ou não”97. Talvez por isso os fluminenses 95. Daniel Villey – “Petit Histoire des Grandes Doctrines Économiques”, 1946, p. 65 96. Ch. Gide e Ch. Rist – “História das Doutrinas Econômicas”, 1941, p. 122. 97. José da Silva Lisboa – “História dos Principais Sucessos Políticos do Império do Brasil”, Tomo X, p. 7. 84 não se mostrassem rebeldes e preferissem glosar os deslizes administrativos em versos facetos: Furta Azevedo no Paço Targini rouba no Erário E o Povo aflito carrega Pesada cruz ao Calvário...98 Quem furta pouco é ladrão Quem furta muito é barão Quem mais furta e esconde Passa de barão a visconde... 99 A elevação do Brasil à categoria de Reino extinguiu os últimos lampejos do sistema colonial e nenhum brasileiro, de sã consciência, admitiria que o Brasil pudesse voltar algum dia à sua antiga condição de colônia. O próprio D. João VI, depois de doze anos de estada, já se identificara com a terra que tão bem o acolhera, e, não obstante Portugal já se encontrar livre das tropas invasoras, parecia disposto a não mais deixar o País, para isto concorrendo as opiniões de seus ministros e conselheiros, entre os quais se encontrava José da Silva Lisboa. A confiança que desde a Bahia o professor de Economia Política inspirou ao Rei, propiciou-lhe sucessivas nomeações para os cargos de Desembargador da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, em 22 de abril de 1808; Membro da Junta Diretora da Impressão Régia, em 13 de maio de 1808; Deputado à Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegações, do Estado do Brasil, em 23 de julho de 1808; Desembargador da Relação da Bahia, com exercício de Deputado da Real Junta do Comércio, em 16 de novembro de 1808; Censor Régio, em 10 de outubro de 1814; Desembargador da Casa de Suplicação, em 6 de agosto de 1818, obtendo o título do Conselho de Sua Majestade Fidelíssima em 3 de maio de 1819. As funções exercidas tiravam-lhe grande parte do tempo que podia reservar ao estudo de sua querida Economia Política e talvez disto até se lamentasse a Antônio de Morais Silva, pois este o consolaria mostrando-lhe que “o nosso aleijão é ainda sobrecarre98. Luiz Joaquim dos Santos Marrocos – “Cartas”, 1939, p. 64. 99. Tobias Monteiro – “A Elaboração da Independência”, 1927, p. 282. 85 gar os homens de raro merecimento, para com muitos abanicos (sic) (que o desviam do seu grande alvo e cortam ou afracam as asas do seu gênio) lhe darem algum vintém, de que vivam sem se nausearem das coisas, e isto quando já as cãs, e as penas da velhice deixam mal respirar desafogado um ânimo liberal, mas aguilhoado às coisas, para que bem pode servir um desembargador enjeitado e vomitado para criminalista ou fazendista”100. De 1812 a 1819, José da Silva Lisboa interrompeu a série de livros dedicados à defesa da política econômica de D. João VI, em favor de obras de cunho político. Uma delas, os, Extratos das Obras Políticas e Econômicas de Edmund Burke, serviu de livro de instrução ao herdeiro do trono português. A vitória das tropas aliadas contra os invasores de Portugal, deu margem às Memórias da Vida Pública do Lord Wellington e finalmente comemorando a ascenção ao trono de D. João, publicou a Memória dos Benefícios Políticos do Governo d’El Rei, Nosso Senhor, D. João VI e a Sinopse da Legislação Principal do Sr. D. João VI, pela ordem dos Ramos da Economia do Estado. Somente em 1819, retomou Cairu a publicação de obras de Ciência Econômica, certamente porque julgava bastante atenuada a oposição ao sistema liberal estabelecido no Brasil, tanto assim que já não se nota nos Estudos do Bem Comum e Economia Política o sentido panegirista dos Princípios de Economia Política. Não sabia, porém, o que a evolução longínqua dos acontecimentos estava reservando-lhe para um futuro muito próximo. A hostilidade que tanto contribuiria para afastar voltaria com ímpeto avassalador. Ímpeto tão grande que José da Silva Lisboa logo compreendeu que as armas que outrora usara não mais teriam eficiência. O estudo sereno era precário em ambiente convulsionado pelas paixões. Os livros doutrinários não mais poderiam suster o sistema liberal. Cairu então saiu às ruas levando como armas os panfletos, e periódicos; como ideal a manutenção da Independência eco100. F. A. Pereira da Costa – “Notícia Biográfica do Dr. Antônio de Morais e Silva”, pp. 111/115. 86 nômica do Brasil. Seu bálsamo no aceso da luta seria a certeza de que “quem bem serve ao público expõe-se a juízo temerário, a calúnias e às inventivas dos maus e néscios, mas quem tem a consciência da própria integridade, consola-se com o desempenho do seu dever”101. 101. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 15/5/1829. 87 ADENDA N À 2a E D I Ç Ã O esta segunda edição da monografia sobre a vida e a obra de José da Silva Lisboa, Visconde de Cairu, pareceu-nos correto respeitar o texto original julgado em concurso instituído em 1956, exceto no que se refere às habituais e tópicas revisões, entre elas atualização ortográfica, decorrente da Lei no 5.765, de 1971, e inclusão de outras fontes de consulta. Todavia é impossível desconsiderar o fato de que mais de quarenta anos já se passaram desde sua elaboração, condicionada pelos limites máximos de tempo e dimensão estabelecidos no regulamento do concurso. A releitura dos trabalhos econômicos de quem, no dizer de San Tiago Dantas, foi “o espírito mais consciente dos problemas de seu tempo”, sugere sempre novas reflexões, sobre matéria contida nesta parte da monografia. Não cessou, também, a publicação de obras, segmentos de livros e artigos que enriquecem e estimulam o conhecimento do biografado em sua época, através de interpretações, documentos e debates sobre as atitudes assumidas e tendências políticas evidenciadas. Com a vinda de D. João para o Brasil, o País atravessou período em que os responsáveis pela coisa pública, nativos ou reinóis transplantados para terras americanas, em meio à efervescência de idéias sócio-políticas e de pressões internacionais, enfrentaram em apenas 14 anos todos os problemas da transformação de secular Colônia em Metrópole, depois, Império Constitucional. É indiscutível que as vicissitudes econômicas e políticas sofridas pelo País refletiram-se no pensamento de Cairu e, por vezes, condicionaram-lhe a ação. José da Silva Lisboa viveu crucial época da História do Brasil escudado nas doutrinas de Adam Smith, mas o contato com a realidade mutante o levou a admitir que “o Teórico Economista faz o seu ofício formando as suas regras gerais, que se aplicam à maioridade dos casos, deixando à sagacidade do Administrador o modificá- 88 las, segundo convenha aos casos individuais”1. Deve entender-se aceitar o autor, e até preconizar, que a prática possa diferir da teoria, por força de circunstâncias, apesar de nela alicerçada. Repudia, porém, a ação que resulta exclusivamente da prática, haja vista que a “verdadeira teoria supõe a coleção de princípios deduzidos de fatos gerais, longamente experimentados por Sábios indagadores; e a nua prática freqüentemente é deduzida de fatos particulares malvistos em limitadas experiências de empíricos e interesseiros”2. Esta dualidade teoria x prática, outrossim explica a razão de ser de muitas recomendações de política econômica não conciliáveis com ensinamentos recebidos de Smith, sem que, todavia, isto signifique abandono dos fundamentos do liberal sistema proposto para o Brasil. Além do mais, reconhecia Cairu, que “entre as muitas excelências” de seu mestre “se acham imperfeições e erros, e até notórias incoerências difíceis de se conciliarem”3, não sendo assim um seguidor acrítico de Smith. O conhecimento da Adam Smith foi marcante na vida de Cairu. Sabe-se que ao regressar de Portugal, veio disposto a dedicar-se à agricultura, propósito não condizente com sua formação acadêmica em cânones e docência de línguas. Esta decisão tem causado estranheza a seus biógrafos. Percebe-se, todavia, na raiz de seu desejo de promover o desenvolvimento da agricultura, tão florescente em outros países, tão decadente em Portugal, mas com promissoras perspectivas em terras virgens do Brasil, a adesão aos princípios da Escola Fisiocrata, de François Quesnay, para a qual teria concorrido, ainda em Coimbra, a influência de seu amigo Domingos Vandelli. A vinda de Portugal de um José da Silva Lisboa fisiocrata, ajusta-se à sua posterior declaração de que Adam Smith o fizera abandonar as idéias dos economistas de França. A mudança de orientação do pensamento econômico de Cairu, por ele mesmo reconhecida, confirma que já se dedicara à Economia Política antes do encontro com a Riqueza das Nações de Smith, 1. José da Silva Lisboa, Leituras de Economia Política, p. 138. 2. José da Silva Lisboa, Estudos do Bem Comum e Economia Política, p. 123. 3. José da Silva Lisboa, idem, idem, p. 71. 89 em 1796. Embora o notável Princípios de Direito Mercantil e Leis de Marinha (1798), contenha referências e elogios ao economista escocês, deve admitir-se não tivesse ainda seu autor estudado em detalhes todas as idéias de Smith, tal como já se nota, no Princípios de Economia Política (1804). A doutrina de Quesnay adotava como máxima básica para condução da política econômica, o “laissez faire, laissez aller, laissez passer”, que Silva Lisboa transforma em “deixai fazer, deixai passar, deixai comprar, deixai vender”. Ao mesmo tempo, para os fisiocratas era a agricultura o único setor produtivo da economia de onde provinha toda a renda nacional, ao contrário do comércio e a indústria, estéreis por natureza. José da Silva Lisboa aceita em teoria a liberdade recomendada no lema fisiocrático, mas discorda da última tese, impugnando, com ásperas palavras, a superioridade intrínseca da Agricultura sobre os demais setores econômicos da sociedade, e defendendo Smith da crítica de ter “cometido o sacrilégio de comunicar às manufaturas e ao comércio essa honra”, isto é, a mesma capacidade que tinha a agricultura. E acrescentou que um dos autores que mais se sobressaíram entre os fisiocratas, “teve a simplicidade de aconselhar aos Anglo-Americanos que não estabelecessem fábricas no seu país, para não se arruinarem e enfraquecerem”4. Disse mais, sublinhando a importância da indústria manufatureira: “o Sistema Colonial (felizmente cessado no Brasil) |....| obriga os colonos a dirigirem seus capitais e braços para o cultivo das terras, impedindo o estabelecimento de manufaturas superiores, mal permitindo as outras inferiores, sem o que não pode existir povoação civil. Naturalmente a agricultura é o principal emprego de Colônias em países férteis e despovoados, mas é injusto obstar nelas ao natural progresso da indústria fabril”5. A discordância acerca da concepção fisiocrática da esterilidade do comércio e da indústria, e da crítica à aludida prática do Sistema Colonial, não se coadunam com as freqüentes críticas fei4. José da Silva Lisboa, Princípios de Economia Política, 2. ed., p. 236. 5. José da Silva Lisboa, Estudos do Bem Comum e Economia Política, p. 15. 90 tas a um Cairu entranhadamente inimigo da indústria fabril, ou que seu pensamento sobre a matéria demonstrasse movimento pendular entre os setores primário e secundário. Cairu tão-somente condicionou o processo de desenvolvimento industrial manufatureiro à necessidade da existência de pré-requisitos indispensáveis para o sucesso de qualquer investimento fabril, especialmente os de grande escala, tal como os economistas, historiadores e empresários ainda hoje procuram determinar em nível macro ou microeconômico. Neste particular as idéias e as recomendações de José da Silva Lisboa costumam ser desfavoravelmente cotejadas com as de Alexander Hamilton, Secretário do Tesouro norte-americano, que por determinação da Câmara de Representantes elaborou e apresentou em 1791 o célebre Report on the subject of Manufactures, no qual propõe elenco de medidas para estimular as manufaturas em seu país, de modo a torná-lo independente das importações de produtos para uso militar e outros fins essenciais. Hamilton no Relatório, tal como José da Silva Lisboa fizera em seus livros, aceita idéias contidas na Riqueza das Nações, e defendendo a indústria manufatureira, também refuta as idéias dos fisiocratas sobre a produtividade dos setores da economia. Vale notar que seu país já tinha um setor agrícola, altamente desenvolvido, capaz de não só atender o mercado interno, como propiciar excedentes exportáveis, como no caso do algodão, cujo suprimento à indústria inglesa, segundo Celso Furtado, foi fator dinâmico fundamental para o desenvolvimento da economia norte-americana 6. Quando D. Maria I baixou o Alvará de 5 de janeiro de 1785 determinando a supressão das manufaturas já existentes no Brasil e a proibição da instalação de outras, exceto as de produto grosseiros, de uso comum e de escravos, as antigas colônias britânicas, independentes havia nove anos, experimentavam forte processo de expansão industrial, mais por força de subsídios, concessão de terrenos, empréstimos estaduais e municipais, do que em 6. Celso Furtado, A Formação Econômica do Brasil, p. 127. 91 resposta à proteção aduaneira7. Kirkland aduz neste sentido, que a primeira tarifa alfandegária dos Estados Unidos, em 1789, fixara impostos de importação excessivamente moderados que a tornaram ineficaz8. Contando já com economia dotada de setores agrícola e manufatureiro em expansão, Hamilton propôs medidas de protecionismo abrangendo direitos aduaneiros sobre produtos rivais estrangeiros nos setores que interessavam ao país encorajar; proibição (ou direitos proibitivos) de importações de determinados produtos similares; proibição de exportação de matérias-primas de interesse das indústrias locais; subsídios pecuniários; prêmios; isenção de direitos para insumos; drawbacks; estímulo às invenções; regulamentação judiciosa para a inspeção de bens manufaturados; facilidades para transferência bancária de fundos entre os Estados, e melhoria dos transportes. Vê-se que a proteção aduaneira não seria por si mesma suficiente, se não acompanhada de medidas estruturais capazes de permitir a formação de externalidades que facilitassem o crescimento das manufaturas. Apesar da argumentação de Hamilton em favor da política aduaneira protecionista, esta só foi realmente adotada em 18169, isto é, 25 anos depois de expostas suas idéias (1791) e 40 anos depois da independência norte-americana. Para Schumpeter, “o progresso já se tinha espalhado sobre extensa variedade de indústrias e estava em plena força no tempo em que Hamilton apresentou o seu famoso Relatório”10 . O secretário do Tesouro dos Estados Unidos não era, contudo, infenso à liberdade do comércio internacional, tanto assim que afirmou: “se o sistema da perfeita liberdade de indústria e comércio prevalecesse entre as nações, os argumentos que procuram dissuadir uma nação do porte dos Estados Unidos de realizar entusiásticos esforços em favor das manufaturas, teriam sem dúvi7. Joseph A. Schumpeter, Business Cycles, 1o v., p. 287. 8. Edward C. Kirkland, História Económica de Estados Unidos, p. 297. 9. E.C. Kirkland, op. cit., p. 297. 10. J. A. Schumpeter, op. cit., p. 287. 92 da grande força |....| Com poucas exceções, poderia ele servir de regra para a indústria nacional”11, mas nem todas as nações se comportavam segundo estas normas; portanto, os Estados Unidos deveriam seguir o exemplo. Quando os portos do Brasil foram abertos às nações amigas, a indústria manufatureira estagnara depois do alvará de 1785. Mesmo reconhecendo as precárias condições prévias para o desenvolvimento industrial, mas certo de que a liberdade de comércio e indústria estimularia a implantação de manufaturas, José da Silva Lisboa propôs, tal como Hamilton para os Estados Unidos, as linhas de uma política em favor das manufaturas no Brasil, de modo a estimular empreendimentos que objetivassem entre outros benefícios, impedir o “prejuízo de vender os nossos produtos rudes por pouco preço, para depois os tornar a receber importados em fazendas de incomparavelmente superior valor”12. Não se deveria recorrer ao “miserável expediente de dar monopólios”, mas poder-se-ia atingir o fim proposto “proibindo-se a importação de iguais artigos estrangeiros que se fabricassem no país, para terem os fabricantes a certeza da venda dentro da Nação, removidos os competidores estranhos, como é do patriotismo, e da prática de todas as Nações iluminadas da Europa, e em que a Inglaterra constantemente insiste. Deviam-se também conceder extraordinários favores, e donativos do Governo, e ainda adiantamentos por empréstimo de fundos, aos industriais que os não tivessem e intentassem estabelecer fábricas as mais necessárias ou úteis|...| Não é necessário estabelecer já Fábricas em grande. Com tentativas moderadas, e principalmente por meio de sociedades livres, segundo o estilo da Inglaterra, se podem introduzir neste Estado manufaturas as mais convinháveis”13. Quem recomenda tais diretrizes de fomento não deve ser censurado como inimigo da indústria manufatureira. Nem tampouco 11. Alexander Hamilton, Industrial and Commercial Correspondence, p. 264. 12. José da Silva Lisboa, apud Prefeitura do Distrito Federal, Notícia sobre o desenvolvimento da indústria fabril no Distrito Federal e sua situação atual, p. 12. 13. Prefeitura do Distrito Federal, op. cit., p. 11. 93 por afirmar que o Brasil, experimentando ainda os primeiros efeitos inovadores da abertura dos portos, não tivesse ainda condições para a instalação de empreendimentos fabris em grande. Na verdade desde seus primeiros trabalhos, realizou José da Silva Lisboa uma obra engajada, comprometida com o fim do Sistema Colonial, com o fim dos monopólios que cerceavam a liberdade de trabalhar e empreender. O marquês de Pombal sintetizou em poucas palavras o que significava este Sistema, quando disse, em 1772, ao embaixador inglês em Lisboa, referindo-se a fato ocorrido no Brasil, que “o comércio e a agricultura da colônia deviam reger-se exclusivamente pelas necessidades da Metrópole” e que “o produto da agricultura, comércio e navegação da colônia constituía propriedade exclusiva da Metrópole”14. Todavia, Cairu tinha consciência de que mesmo extintos o direito e o poder de explorar a colônia, perduraria ainda a estrutura socioeconômica formada ao longo dos séculos, espólio deixado pelo colonialismo, de transformação lenta no tempo e no espaço. Em suas obras registra entre outras dificuldades para a expansão da indústria manufatureira no Brasil: arraigados costumes alheios à razão; interesses consolidados; carência de mão-de-obra qualificada e livre, com predominância do improdutivo trabalho escravo; reduzida demanda efetiva; insuficiente formação de capitais; falta de aplicação da inteligência nas artes e ciências, indispensável para surgimento de invenções e inovações; grupos populacionais rarefeitos em vasta extensão geográfica, precariamente ligados por vias e meios de transporte primitivos: ausência de espírito empresarial, maneiras de pensar próprias de um Estado patrimonial, e muitas outras desvantagens. Toda esta constelação de fatores fundamentavam a idéia de que as manufaturas viriam através de “tentativas moderadas”, por meio de “sociedades livres”. Aliás, nos Estados Unidos, a grande Society for Establishing Useful Manufactures, fundada em 1791 por iniciativa do próprio Hamilton, com o capital de um milhão de dólares, fracassou cinco anos depois15. 14. Fritz Hoppe, A África Oriental Portuguesa no tempo do Marquês de Pombal, p. 281. 15. E. C. Kirkland, op. cit., pp. 295-6. 94 Todo o debate em torno da política econômica preconizada por José da Silva Lisboa, decorre da decisão de o Príncipe Regente abrir os portos do Brasil às nações amigas. Quanto ao ato em si, não há, por parte dos historiadores e economistas quem discorde de seu transcendental alcance para o futuro da antiga colônia. Divergências de todos os matizes surgem quanto à participação de Cairu no ato. A opinião mais radical nega qualquer interferência, certamente por não admitir pudesse ter o ato que pôs fim ao pacto colonial e abriu caminho para a independência, a participação de um economista liberal. Segundo o próprio Cairu, a Carta Régia de 28 de janeiro de 1808 foi de exclusiva iniciativa de D. João, o que seria auto-reconhecimento de que não participara da elaboração do ato. Mas esta declaração feita em livro escrito para perpetuar a memória da presença de D. João VI no Brasil, revela apenas a opinião do súdito, defensor sistemático da monarquia constitucional, que não impedira na Inglaterra o sucesso do liberalismo econômico. Cairu, procurou dizer exatamente o que antes já afirmara: o Príncipe Regente tomara a decisão sobre assunto que “ainda a bons estadistas, parecia quase impossível ou de muito problemático e impolítico efeito”. A intervenção de Cairu, qualquer que fosse, é indubitável, pois em seu tempo poderia ser desmentido por adversários a qualquer momento, quando afirmou ter “participado da honra de concorrer para a dita resolução soberana, sendo ouvido na qualidade de meu emprego.....”. Emprego de membro e secretário da Mesa de Inspeção da Bahia. Cairu sabia muito bem que a abertura dos portos do Brasil, diante da conjuntura política européia e a vinda de D. João, resultara da “inevitável força das coisas”, isto é, impossibilidade de manter fechado o Brasil tanto à importação quanto à exportação, o que facilitou conseguir o fim do monopólio colonial. Wanderley Pinho em estudo sobre a abertura dos portos do Brasil16, tendo entre as fontes de informação documentos da chancelaria britânica, deixa evidente que o ato de D. João desgostou a 16. Wanderley Pinto, A Abertura dos Portos na Bahia. 95 Inglaterra, porque esta não queria a abertura dos portos às nações amigas, mas a abertura dos portos à nação mais amiga, ou seja, aquela que estava protegendo Portugal na guerra contra a França, e que desejava em cláusula do Tratado secreto de 22 de outubro de 1807, não ratificada, lhe fosse concedido um porto franco na ilha de Santa Catarina (eventualmente Cabo Frio), de onde poderia internar suas mercadorias no território brasileiro, ou contrabandeálas para Buenos Aires, vedado o acesso a outros países. Diante deste quadro e da comprovada intervenção de Cairu no caso, é certo ter sido ele quem com suas idéias de fim do monopólio colonial pelo livre comércio exterior, justificou as vantagens da modificação que não agradou os ingleses. Na impossibilidade de conseguir este intento, logo depois a diplomacia inglesa alcançou, pelo Tratado de 1810 tratamento aduaneiro mais favorável, sem cláusula da nação mais favorecida, além do porto franco na Ilha de Santa Catarina. Por isso, Wanderley Pinho, conclui que na universalidade e amplitude de países e mercadorias previstas da Carta Régia da abertura dos portos, e no liberalismo que a motivou sente-se “a garra do brasileiro Cairu; do economista e do político, do cientista e estudioso da economia política – a aplicar e realizar suas largas idéias antigas”17. 17. Wanderley Pinho, op. cit., p. 39. 96 3a PARTE I A revolução Constitucionalista do Porto Q uando defendia das críticas formuladas, a resposta à Fala do Trono, com a qual D. Pedro I abriu a sessão legislativa extraordinária de 1829, José da Silva Lisboa pronunciou uma frase que constitui perfeita definição das tendências políticas que demonstrou no agitado período que, a partir da Revolução Portuense de 1820, caracterizou a vida pública do Brasil. Disse o velho senador: “Na Universidade aprendi a não argumentar para a cadeira, e por educação conservo o ditame de que, em via de regra, o filho, discípulo e súdito, nunca tem razão contra o pai, mestre e soberano”1. É no respeito quase religioso às figuras de D. João VI e de seu filho, que depois foi imperador, no acatamento irrestrito às prerrogativas inerentes ao trono, que se deve procurar à origem das atitudes que lhe valeram os apodos de seus adversários da época e o severo julgamento dos pósteros, que o colocaram dentro dos quadros de um reacionarismo político, em flagrante, contraste com as idéias do liberalismo econômico que sempre defendeu. Contra aqueles que o combatiam, Cairu replicava indiferente às censuras: “Sendo velho, só adotarei inovações e mudanças, cedendo à evidência, experiência e força das coisas”2. E uma das evidências que encontrou, como resultado das idéias políticas que lhe repugnavam, foi a Revolução Francesa, com o seu cortejo de ultrajes à nobreza até mesmo com a morte dos soberanos. Por isso, Cairu identificava no mesmo ódio, princípios franceses, federalismo, jacobinismo, Democracia, e neles vendo os gérmens da revolução 1. José da Silva Lisboa – Anais do Senado do Império, sessão de 7.4.1829. 2. Idem, idem, sessão de 15.6.1829. 97 e anarquia, alertava temeroso que “o espírito da Democracia, foragido da Europa, cerca este Império e avança com passos de Gigante” 3. Não é, pois, de se admirar que ao atingirem o Rio de Janeiro as primeiras notícias da Revolução de 24 de agosto de 1820, Cairu fremisse de indignação ao ver vilipendiados os privilégios reais e subvertida a hierarquia social pela “terrível metamorfose e monstruosidade política de se transformar a Tropa em Corpo Deliberativo, devendo ser essencialmente Corpo Obediente ao Governo Estabelecido”4. Mas nos meandros da Revolução, algo mais havia do que as aspirações constitucionais e disto Cairu, mais tarde confessou, não se apercebeu na ocasião. De fato, se antes da partida de D. João para a América, a Metrópole vivia praticamente às expensas do Brasil, depois da abertura dos portos a situação econômica declinou de ano para ano, causando mal-estar, agravado pela prolongada ausência do Rei que, ferindo o amor próprio dos portugueses, colocava a antiga sede da Monarquia em situação de inferioridade perante a colônia que outrora tanto martirizara. Diante desta situação, em que os habitantes de Portugal sentiam-se “reduzidos ao mísero e triste estado de Colônia do Brasil”5, qualquer mercê do Rei em favor de seus vassalos da América, inclusive a outorga de condecorações, motivava ressentimentos, tanto assim que se tornou voz corrente em Portugal “que a maior parte dos habitantes do Rio de Janeiro eram tabuletas de medalhas”6. Seja no manifesto dirigido em 24 de agosto de 1820 aos portugueses, onde já se vislumbra profundas queixas, sob a alegação de que “estancadas as fontes, da prosperidade nacional, devia ser, e foi, uma conseqüência necessária a perdição de nossos mais caros 3. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 7.8.1827. 4. Idem, “História dos Principais Sucessos Políticos do Brasil”, 1827, p. 15. 5. José Antônio Miranda – “Memória Constitucional e Política sobre o Estado Presente de Portugal e do Brasil”, 1821, p. 38. 6. Idem, idem, p. 32. 98 interesses, e, por cúmulo da desventura deixou de viver entre nós o nosso adorado soberano”7, seja no manifesto de 15 de dezembro de 1820, no qual as reclamações são mais definidas, com o desabafo de que “o comércio e a indústria que nunca podem devidamente prosperar senão à sombra benéfica da paz, da segurança e da tranqüilidade pública, tinham sido não só desprezadas, mas até parece que de todo destruídas pela franqueza concedida aos vasos estrangeiros em todos os portos do Brasil”8, observa-se de maneira evidente o profundo choque de interesses econômicos existente dentro do Reino Unido. Esta antinomia, amortecida por muito tempo, finalmente apareceu em toda a sua evidência e dada a natureza dela, não era possível ser resolvida de forma diferente da que realmente o foi: pela decomposição da unidade estabelecida em 1815. Sintetizando o sentido econômico do movimento, Oliveira Lima nos apresenta uma revolução com seus adeptos “apregoando a Constituição como panacéia para todos os males e dela fazendo manto para restabelecerem seu monopólio, representando o seu constitucionalismo bom emprego de capital, pois se baseava na recolonização”9. A influência de uma revolução com este objetivo, como não podia deixar de ser, foi profunda para os destinos do Brasil, dela decorrendo importantes acontecimentos que aceleraram o processo da independência brasileira e dos quais participou José da Silva Lisboa. II O juramento da Constituição pelo Rei Pará e Bahia foram os primeiros pontos do território brasileiro atingidos pela onda revolucionária que se extravasara de Portugal. 7. José da Silva Lisboa, op. cit., p. 17. 8. A. J. Melo Moraes – “História do Brasil Reino e Brasil Império”, 1871, p. 82. 9. Oliveira Lima – “O Movimento da Independência”, 1922, p. 13. 99 Depostas as autoridades constituídas, logo foram criadas juntas governativas que, protestando obediência às Cortes de Portugal, juraram a Constituição que nelas fosse aprovada. No Rio de Janeiro, as notícias procedentes de Lisboa e as informações chegadas das Capitanias revoltadas, terminaram com o ambiente tranquilo até então reinante e motivaram o decreto de 18 de fevereiro de 1821, no qual D. João VI procurando atender, pelo menos em parte, as reivindicações portuguesas, estabelecia a partida de D. Pedro para a Europa; convocava procuradores das cidades e principais vilas do Brasil, ilhas da Madeira, Açores e Cabo Verde e criava uma comissão para preparar a reunião destes procuradores. Ilustres servidores e conselheiros da Coroa foram nomeados por decreto de 23 de fevereiro para integrar esta comissão da qual, salientando o prestígio que desfrutava, fazia parte José da Silva Lisboa. Muito embora o último decreto indicasse o Marquês de Alegrete para presidente da Junta, foi sob a direção do Conde de Palmela e em sua residência na atual rua Frei Caneca que se efetuou das 11 às 18 horas do dia 25 de fevereiro a única reunião da comissão e dela Silvestre Pinheiro Ferreira deixou consignado que “foram tais e tão disparatados os discursos e pareceres remetidos pelos diferentes Conselheiros que todos saíram plenamente convencidos da inutilidade de semelhantes conferências”, não obstante a Junta reunisse “homens pela maior parte na verdade doutos e animados de patrióticos sentimentos”10. O decreto de 18 de fevereiro, porém, demorou a ser publicado e quando o foi, o fermento revolucionário já atingira o Rio de Janeiro preconizando medidas de força para obrigar o Rei a jurar a futura Constituição portuguesa. Motivaram esta dilação as marchas e contra-marchas dos pareceres dos ministros e conselheiros, as opiniões sempre opostas de Tomaz Pompeu Vilanova Portugal e do Conde de Palmela, acrescidas da indecisão de D. João VI, 10. Biblioteca Nacional – “Documentos para a História da Independência”, 1923, p. 232. 100 parecendo até que já se tornara vezo na corte de Portugal as intermináveis divergências entre os ministros, cantadas outrora nos conhecidos versos do Marquês de Penalva: O negócio se propõe, Duvida el-rei nosso senhor, Atrapalha o confessor, Angeja a pagar se opõe, Nada a Rainha dispõe, Martinho narra esturrado, Alves não passa de honrado E o Visconde, em conclusão Pede nova informação, Fica o negócio empatado.11 No Brasil, porém, D. Pedro desempatou a questão. Efetivamente, no dia 26 de fevereiro, as tropas portuguesas saíram às ruas e o príncipe herdeiro tomando parte saliente nos acontecimentos, porque, segundo nos diz Cairu, cedo compreendeu o espírito do século, conseguiu depois de várias viagens entre o Rocio e a Quinta da Boa Vista que D. João VI jurasse a Constituição tal qual viesse de Lisboa, isto é, sem qualquer modificação que a tornasse adaptável ao Brasil. Mais do que isto, as tropas exigiram fosse modificado o Ministério com as nomeações de pessoas cujos nomes foram enviados ao Rei por intermédio de seu filho. Quando apresentados ao monarca, na presença do ministro Tomaz Pompeu Vilanova Portugal, este, no primeiro impulso, insinuou mandar prender todos os indicados como coniventes com a revolução, mas depois, retomando o sangue frio, concordou com a exigência e foi mostrando ao Rei os nomes daqueles que possuíam aptidões para o desempenho de cada um dos cargos: – Quintela, para o Ministério do Reino; Monteiro Torres, da Marinha; Silvestre Pinheiro, da Guerra e do Exterior, e, por fim, “faltando 11. F. A. Varnhagen – “História Geral do Brasil”, vol. V, 1954, p. 4. 101 com que contemplar a José da Silva Lisboa improvisou ele o emprego de diretor dos estudos e museus para este varão, que o entusiasmo pelo aperfeiçoamento e pela novidade ali o havia posto”12. O decreto de nomeação indicava que a Cairu cabia o cargo de Inspetor Geral dos Estabelecimentos Literários e ele próprio refere-se indiferentemente a qualquer uma destas designações quando se reporta à principal atribuição que lhe foi imposta pelo decreto de 2 de março de 1821, isto é, a censura dos livros e escritos, no desempenho da qual incorreu “no ódio popular por ter obstado quanto lhe foi possível na qualidade de Diretor dos Estudos a Impressão de escritos incendiários”13. Este cargo e as idéias que em torno dele desenvolveu, constituem uma das pechas que freqüentemente lhe são atiradas, nisto salientando-se Manuel Bomfim, quando afirmou que José da Silva Lisboa “vivia na carapaça de idéias atrasadas de um século, isto é, num absolutismo irritante e violento. Combateu a liberdade de imprensa, contra Bernardo de Vasconcelos, e afirmava na sua veemência de decrépito – a imprensa faz mais mal do que bem...”14. Trata-se, porém, de um daqueles casos em que é “inútil e indecente fazer-se agora a censura do passado”15, pois as idéias de Cairu neste particular não deixam dúvidas de que não só admirava as vantagens da liberdade de comunicação de pensamento, como também evoluíram no sentido de apenas responsabilizar aqueles que dela abusassem. Das vantagens desta liberdade, diria Cairu, referindo-se à Grã-Bretanha, que “nenhum Estado pode contender com ela em estudos da Dinâmica Civil, em que, pela Liberdade de Imprensa (ainda que cheia de abusos) se tem aí desenvolvido prodigiosamente as forças da inteligência a um grau desconhecido nos antigos e modernos tempos”16. Deve-se, portanto, ponderar que o Diretor dos Estudos discutiu o assunto em 12. 13. 14. 15. 16. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 255. Idem, idem, p. 290. Manuel Bomfim – “O Brasil”, p. 215, 1938. José da Silva Lisboa – Anais do Senado do Império, sessão de 28.9.1830. Idem, “Roteiro Brasílico”, 1822, p. 5. 102 época na qual a Inglaterra, de velhas tradições liberais, segundo suas próprias informações 17, castigava com desterro para a Nova Holanda os que fossem julgados culpados de abusos de imprensa, e em país onde este meio de comunicação do pensamento constituía uma novidade e que, até hoje, discute a matéria. Isto revela quão sábias eram as palavras de Cairu, ao dizer que “pela discrepância de opiniões que têm aparecido no Senado, cada vez mais ajuízo ser racionável a tese do celebrado Conselheiro Prussiano Quintus, na sua obra sobre a Liberdade de Imprensa, que “achar o exato expediente de reprimir os seus abusos, sem prejudicar o direito do homem em comunicar seus pensamentos é problema insolúvel. Por isso a prática do Governo Inglês parece-me consentânea à mais boa razão, por deixar à religião e consciência do jurado o decidir quando haja ou não criminalidade nos impressos”18. José da Silva Lisboa encontrou-se diante de uma daquelas evidências que o faziam aceitar ou repelir idéias e acreditamos que nenhum liberal, mesmo dos nossos dias, deixaria de subscrever a proposição de Cairu, segundo a qual, “tem-se dito que a liberdade de imprensa é como a lança de Aquiles, a que os antigos atribuíam a virtude de curar as feridas que fazia. O mal dos folhetos incendiários ou licenciosos quase sempre se aniquila por outros escritos que os refutam, de sorte que no fim do ano o balanço de contas, o saldo é mais em benefício do que em malefício do Estado” 19 . Portanto, embora idoso, não era um decrépito, pois tornou-se permeável às novas idéias, nem tão absolutista, que não deixasse de proclamar, quase às vésperas de morrer: – “A Árvore da Liberdade assemelha-se à Árvore do Bem e do Mal que existiu no Paraíso Terrestre. A melhor instituição humana é suscetível de abusos. Os mais liberais do Universo conhecem que a Liberdade tem causado grandes males, mas que o seu destino é de bens imensos”20. 17. 18. 19. 20. Idem, Idem, Idem, Idem, “Anais do Senado do Império”, sessão de 8.5.1829. idem, sessão de 9.5.1829. idem, idem. idem, sessão de 9.8.1833. 103 III A volta de D. João VI Depois dos sucessos de 26 de fevereiro ficou assentada a partida para Portugal de D. João VI, conforme foi anunciado ao povo pelo decreto de 7 de março de 1821, data em que foram convocadas eleições para escolha dos futuros representantes do Brasil nas Cortes de Portugal. A deliberação régia veio contrapor-se aos anseios de muitos brasileiros, entre os quais o próprio José da Silva Lisboa, partidário da permanência do Rei no Brasil, nova sede da monarquia, para onde os deputados portugueses deveriam vir, querendo. Os moradores do Rio de Janeiro logo opuseram embargos àquela decisão, procurando destruir as alegações lusitanas contidas no manifesto de 15 de dezembro de 1820, inclusive mostrando que “sendo uma das queixas dos portugueses da Europa no seu manifesto o abrirem-se os portos do Brasil aos estrangeiros... parece que queriam que os portugueses do Brasil andassem nus até que eles pudessem para aqui mandar o que lhes sobrasse, não se lembrando que os seus maiores pecuniários tais como Quintela, Bandeira, Branchamp, e outros, depois da saída dos franceses, em lugar de prestarem os seus cabedais para encorajarem e reedificarem as fábricas demolidas, entraram a comprar propriedades de casas, quintas etc.”21. As instâncias de seus súditos não conseguiram, porém, impedir a viagem do Rei, e assim no término do mês seguinte rumou D. João para Lisboa, ficando sua partida tragicamente marcada pelos acontecimentos da Praça do Comércio, local onde se reuniram os eleitores paroquiais, sufragados na forma estatuída pelo decreto de 7 de março: os cidadãos elegiam os compromissários, estes escolhiam os eleitores das paróquias, que, por sua vez, indicavam os das comarcas que, finalmente, apresentavam os nomes dos Deputados às Cortes Portuguesas. 21. A. J. Melo Moraes, op. cit., pp. 42/43. 104 A inexperiência constitucional do Brasil, e o exíguo lapso decorrido entre o decreto e a realização das eleições, 7 de março a 8 de abril, provocaram o desinteresse do povo, pelo que, afiança-nos Melo de Moraes, as eleições “foram feitas nesta corte com a maior indiferença da parte da população brasileira, e que nelas só tomaram parte ativa meia dúzia de brasileiros que depois se distinguiram pelas suas turbulências”22. Apurados os votos, verificou-se ter sido eleito 12o compromissário da freguesia de S. José do Rio, o novo desembargador dos agravos da Casa da Suplicação, José da Silva Lisboa, cargo para o qual havia sido nomeado no dia 4 de abril. Pouco depois, o Ouvidor Joaquim José de Queiroz convocou a Junta Eleitoral para no dia 21 de abril, às 16 horas, escolher os eleitores das comarcas, de vez que já se tinham realizado as eleições paroquiais. Ingenuamente foi estipulado na convocação que “toda a pessoa que quiser assistir pode ali concorrer nos dias e horas indicados, esperando-se de todos que observem o silêncio e o respeito devidos a um ato de tanta seriedade, e importância nacional; e quando tenham a fazer algumas reflexões as reduzam a escrito e mas presentem para eu como presidente as propor à junta”23 . Não era possível, diante do estranho convite à intervenção da assistência, esperar que a mesma se mantivesse dentro da disciplina requerida pelo presidente, principalmente se levarmos em consideração o ambiente carregado dos dias que transcorriam. De fato, o povo comparecendo em massa, e tendo como principais líderes o padre Macamboa e Luís Duprat, passou a influir diretamente nos trabalhos eleitorais e mediante coação aos componentes da Junta Eleitoral, desviaram-na dos objetivos para os quais havia sido convocada, transformando-a em verdadeira assembléia revolucionária, tal a natureza das proposições aprovadas pelos eleitores reunidos: a aprovação da Constituição da Espanha, até que 22. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 256. 23. Biancardi, Theodoro José – “Reflexões sobre alguns sucessos do Brasil”, 1821, p. 38. 105 chegasse a que estava sendo feita em Lisboa; a proibição da saída de D. João VI, mediante ordem expedida às fortalezas da barra e a substituição do ministério por outro indicado pela tumultuosa reunião. Surpreendido pelo inesperado dos acontecimentos, D. João acedeu às pretensões revolucionárias, jurando respeitar a Constituição espanhola. Horas depois, porém, a assembléia foi dissolvida a ferro e fogo, resultando mortes em número que jamais ficou conhecido. Anulado no dia seguinte o decreto de aprovação da Constituição de Espanha, foi instaurado inquérito do qual resultou a condenação de Luís Duprat, Nogueira Soares, Pereira Ramos e Macamboa, figuras salientes na sedição. Muito interessante torna-se a leitura dos depoimentos prestados pelos componentes da Junta Eleitoral, que são unânimes em afirmar a ilegalidade dos atos praticados, aos quais deram conformidade premidos pelas ameaças populares. Assim, José da Silva Lisboa 24 declarou que apuzera sua assinatura na aprovação da mencionada constituição “debaixo de terror e manifesta força pública por ele reconhecida e pelos mais assinantes que o precederam porque a ninguém se deixou falar nem protestar”. Quanto à nomeação de um novo ministério, Cairu não só disse que a lista dos membros deste governo por ele depositada na urna era “mera cópia que pediu a um Eleitor próximo que a tinha na mesa do Presidente, e ignorando ele testemunha quais eram essas pessoas”, como também reafirmou que procedera desta forma “a fim só de evadir-se à declarada força pública e ao iminente perigo de vida”. Logo depois, “receando maior insulto, sendo impossibilitado de sair pela porta por onde entrara visto o cerco impenetrável da multidão procurou e obteve com dificuldade o sair pela porta do mar e se retirou para sua casa” – debaixo do impropério da populaça, não deixou de assinalar outro eleitor, João Bandeira de Gouvêa 25 . A validade destes depoimentos foi posta em dúvida pelo es24. Biblioteca Nacional, op. cit., p. 290. 25. Idem, idem, p. 319. 106 pectador anônimo que em maio daquele ano escreveu que “alguns eleitores, tendo depois a fraqueza de se quererem justificar dos atos a que procederam, desculpam-se com estes clamores de homens do povo, mas porventura estes homens obscuros e inermes, ainda que tivessem a voz de Stentor e a eloqüência ciceroniana poderiam obrigar 160 eleitores a faltarem ao seu dever, se eles próprios não pensassem que obravam com legalidade?”26 . Opinião infundada de algum partidário das medidas tomadas pela Junta Eleitoral, acreditamos, pois não é crível tivesse Cairu, jurista de longo tirocínio, desembargador de reconhecidos méritos, político intransigente na defesa dos princípios esposados por Burke, procurado igualar-se aos agitadores que sempre profligou, afastando-se, de moto próprio, dos propósitos da reunião. Embora rejeitando os resultados da trágica assembléia e os métodos empregados pelos agitadores, Cairu não compactuou com a atitude dos que transformaram a Praça do Comércio no “Açougue dos Braganças”, denominação dada pelo público ao local da reunião e onde, hoje em dia, funciona a Casa França-Brasil. “Exercício Militar em dia da Ressurreição! – increparia Cairu. – O fato por si só fala. O Ressentimento Público foi o mais doloroso. Basta dizer, que nunca mais Negociante algum, Nacional ou Estrangeiro, entrou na Praça do Comércio, que pouco antes havia sido aberta com grande pompa, e honrada com a Presença de El-Rei e da Real Família... Não se tendo procedido a legal ato de achada das armas na Praça, nem a Conselho de Guerra contra os que fizeram a matança sem ordem, mal determinando-se devassa da Justiça, que não teve resultado, o mistério da iniqüidade ficará sempre incógnito, verificando-se o que diz o Pai da História Portuguesa – assim acontece em casos de ignomínia do Governo, onde tudo fica entre Reis e Ministros”27. No dia 26 de abril de 1821, retomava a Lisboa o “Ínclito Argo26. Memória sobre os acontecimentos dos dias 21 e 22 de abril de 1821 na Praça do Comércio do Rio de Janeiro – Rev. I.H.G.B. – Tomo XXVII, 1864, p. 278. 27. José da Silva Lisboa – “História dos Principais etc.”, parte X, p. 63. 107 nauta”, que há treze anos passados chegara ao Brasil. Em seu lugar deixou o “Príncipe Imortal, Mártir da Honra Brasileira”, que passou a receber a veneração de José da Silva Lisboa. IV O “Fico” Cairu, embora contrário à partida do Rei, conformou-se com os fatos consumados, na esperança de que seria ao menos respeitada a liberdade econômica que lhe custara tantos estudos e tantos aborrecimentos. Nesta vã ilusão, procurou promover a união entre os portugueses da América e da Europa, através de uma série de escritos, entre os quais o “Conciliador do Reino Unido”, que lhe deu a glória de ter sido, conforme nos assegura Hélio Viana, o primeiro jornalista brasileiro que dirigiu um periódico no Brasil28. Além deste jornal, José da Silva Lisboa, logo nó início de 1821, vendo “iminente a Tormenta Revolucionária” diligenciou “prevenir a desordem popular” 29 publicando um opúsculo em que compendiou preceitos do grande Vieira, fazendo ver, em conclusão, que “tinha assaz, e de sobra apresentado várias amostras do espírito de Vieira, para conciliar a benevolência dos compatriotas d’aquém e d’além mar, amantes do Reino Unido e da Legítima Dinastia da Augusta Casa de Bragança” 30. Cairu continuaria desejando a união estabelecida por D. João VI se aos poucos não percebesse a formação nas Cortes de Portugal da inqualificável Cabala Anti-Brasílica, símbolo dos desejos de recolonização e perante estes propósitos, só lhe restou legar ao passado a primitiva confiança nas intenções lusitanas e tomar posição inquebrantável junto ao Brasil e ao seu príncipe regente. “Cordialmente anelei a União do Brasil com Portugal, e, quanto em mim esteve, fiz esfor28. Hélio Viana – “Contribuição à História da Imprensa Brasileira”, 1945, p. 367. 29. José da Silva Lisboa – “História dos Principais etc.”, p. 173. 30. Idem, “Espírito de Vieira”, 1821, p. XLVI. 108 ços literários para os trazer à concórdia – escreveu Cairu quinze dias antes da Independência –, mas ora vejo que em vão trabalhei: todas as ilusões estão dissipadas e quase as esperanças de reconciliação desvanecidas...”31. E quando no ano seguinte defendia os direitos do Brasil à independência, humildemente confessava, referindo-se ao Manifesto das Cortes ao Brasil: – “Eu também (tão simples fui) não pude suspeitar que desígnios insidiosos se ocultavam em tal Ato... Agora só me resta reconhecer e retratar o meu erro sobre o juízo da época e dos homens”32. O desfecho da crise de confiança nos deputados de Lisboa ocorreu com a chegada em fins do ano de 1821 do decreto ordenando a partida de D. Pedro para a Europa, a fim de viajar incógnito. Nos acontecimentos que sobrevieram a esta notícia, não vemos Cairu procurando persuadir pessoalmente o príncipe regente para proclamar a independência política do Brasil, como outrora capacitara outro príncipe regente para decretar a independência econômica de sua Pátria. Desta feita preferiu manter-se nas trincheiras da imprensa e o “Despertador Brasiliense” e a “Reclamação do Brasil” foram os meios de que se utilizou para arrebatar a opinião pública em favor da permanência do jovem príncipe, o que representava, pelo caráter de insubordinação, a virtual separação política do Brasil. O primeiro, panfleto cuja autoria foi definitivamente atribuída a José da Silva Lisboa por Rodolfo Garcia e Hélio Viana33, segundo A. J. Melo Morais, “produziu o efeito que desejava, animou a todos e decidiu a oposição à saída do Senhor D. Pedro e o apresto para a magnânima empresa da independência do Brasil”34. Não menor influência desempenhou no desenrolar dos eventos o periódico “Reclamação do Brasil”, cujo primeiro número veio à luz no dia 9 de janeiro. Nesta ocasião, Cairu, revelou que não era apenas um homem de gabinete. De acordo com a narrativa de Vale Cabral, no 31. Idem, “Roteiro Brasílico”, 1822, p. 3/4. 32. Idem, “Causa do Brasil no juízo dos governos e estadistas da Europa, 1822/3, p. 7. 33. Hélio Viana, op. cit., p. 406. 34. Idem, idem, p. 407. 109 auge do entusiasmo “das janelas de sua casa distribuía ele ao povo exemplares de sua “Reclamação do Brasil” 35. A repercussão deste escrito foi tão acentuada que uma vez “atendido pelo príncipe D. Pedro o pedido do povo, tendo os componentes da Câmara Municipal voltado a seu paço, subiu a um monte de pedras existente perto do consistório da Igreja do Rosário, à rua da Vala (hoje Uruguaiana) o jovem Inocêncio da Rocha Maciel, filho do líder político e maçônico José Joaquim da Rocha, e em voz alta leu à multidão entusiasmada o conteúdo do referido exemplar”36. A partir desta data, o precipitar dos acontecimentos não mais permitiu a Cair u afastar-se de seus periódicos e folhetos, mantendo-o em constantes polêmicas, muitas delas repletas de pesadas ofensas pessoais. Vemos então Cipriano Barata de Almeida alegando que conhecia “um Visconde que até a idade de 22 anos andou com casaca de cotovelos rotos, botões caídos e chapéu casquete”37; José Bonifácio de Andrada e Silva apelidando-o de “Sílvio – o corcunda, fração de gente, charlatão idoso”38. Evaristo da Veiga alcunhando-o de “poço de literatura”39; o autor anônimo de “O Burro Magro”, chamando-o de “chafariz das ciências”40, vemos enfim, seus adversários procurando ultrajá-lo de todas as formas possíveis, como se pobreza, cultura e doença fossem desdouros, velhice e verdade, deméritos41. Aliás, de um dos seus adversários, o Pe. Diogo Antônio Feijó, disse José da Silva Lisboa que “recorreu a injúrias em lugar de razões, pela manha dos presumidos, que só tem facilidade de falar, mas impotência de examinar, e até atacando a pessoa, e não o discurso”42. 35. A. Vale Cabral – “Vida e Escritos de José da Silva Lisboa” – Rev. Brasileira, 1881, Tomos 9/10. 36. Hélio Viana, op. cit., p. 381. 37. Idem, idem, p. 442/3. 38. Idem, idem, p. 402. 39. Otávio Tarquínio de Souza – “Evaristo da Veiga”, 1939, p. 226. 40. Hélio Viana, op. cit., p. 261. 41. Idem, idem, p. 415. 42. José da Silva Lisboa – “Defesa contra o ataque do Pe. Feijó ao Velho Canonista”, 1828, p. 2. 110 A separação do Brasil de Portugal, encontrou-o publicando o “Roteiro Brasílico”, coletânea de idéias políticas de conhecidos escritores, inclusive do seu mestre Burke, de quem, fazendo seus, apresentou pensamentos sobre o problema das reformas das instituições, que nos ajudam compreender sua posição cautelosa face às pretendidas modificações políticas: “Raiva e frenesi podem derribar em uma hora mais do que prudência, deliberação e perícia podem edificar em cem anos. Em geral é uma verdade que os habituados a não verem senão faltas dos outros, são incapazes da obra de reforma; pois que os seus espíritos não estão bastantemente supridos com padrões do bom e belo, e só se deleitam na contemplação da malícia e por isso odeiam os homens. – Reformar não é inovar linha por linha. Os Revolucionários Franceses queixaramse de tudo, e nada reformam : quiseram mudar tudo e as tristes conseqüências de suas fantasias estão ante nós e sobre nós”43. Com estas idéias, Cairu, consagrou-se à tarefa de estruturar o novo regime político do Brasil, base de futuras reformas que a experiência dos tempos porventura demonstrasse imprescindíveis. Então, o reconhecimento da independência pelas nações estrangeiras; o combate às revoluções locais, que punham em perigo a integridade do território nacional; a sustentação dos princípios monárquicos encarnados na pessoa de D. Pedro; a elaboração de uma constituição que mais se aproximasse da realidade social, foram os objetivos imediatos em prol dos quais Cairu reuniu à sua infatigável atividade jornalística, a eloqüência e erudição demonstrada nas tribunas da Assembléia Constituinte, em 1823, e do Senado do Império, de 1826 até sua morte. V Em defesa da Independência De todos os opúsculos de autoria de José da Silva Lisboa e dedicados à defesa da independência brasileira avulta, sobretudo, 43. Idem, “Roteiro Brasílico”, pp. 21/23. 111 a “Causa do Brasil no Juízo dos Governos e Estadistas da Europa”, não só por se tratar do primeiro periódico com esta finalidade, como também porque nele vemos patenteada de forma inconfundível o conflito econômico que motivou o processo da nossa independência. Em suas violentas censuras à Cabala Antibrasílica, reflete-se o ardor com que se empenhou no patrocínio da causa da liberdade política do Brasil e a revolta que lhe provocou a morte de seu irmão Daniel da Silva Lisboa, inerme capelão do Convento de N. S. da Conceição da Lapa, assassinado a coices de espingarda no assalto das tropas do General Madeira àquele estabelecimento religioso; por isso exclamava: – “o coração me salta e rebenta no peito, e não posso a sangue frio escrever com serenidade neste assunto” 44. Girando todos os argumentos expostos neste periódico em torno da liberdade econômica, Cairu com ela acenava às potências estrangeiras e aos habitantes do Brasil, mostrando-lhes o profundo interesse em conservá-la e neste sentido lançava apelos à honra da Dinastia dos Braganças, da Inglaterra, da Europa, do Brasil, do Rio de Janeiro e da América. Dizia Cairu em resumo, que os benefícios advindos ao país pelo sistema liberal, implantado por um Bragança, precisavam ser preservados contra as maquinações das Cortes Portuguesas: “é portanto da Honra Bragantina, que tão magníficas Obras Régias sejam sustentadas pelo Senhor Príncipe Real”. Por outro lado, tendo D. João viajado para o Brasil sob proteção da Inglaterra e ajustado com a velha aliada tratados comerciais que permitiram a criação de importantes interesses ingleses no Brasil, “o Governo Britânico considera a Honra da Nação empenhada em que a Augusta Casa de Bragança aumente em força e esplendor no Brasil” para que o Império do Equador não volvesse a ser “simples Feitoria Comercial, estreita Ilha de Sota-Vento ou agreste Sesmaria dos Trópicos”. A legislação liberal, não sendo exclusiva dos ingleses, induziu que indivíduos de outras nacionalidades também se estabelecessem no Brasil; portanto, “é da Hon44. Idem, “Causa do Brasil”, parte IV, p. 20. 112 ra Européia, que as Potências ora cooperem, em amigável acordo, a bem da Causa do Brasil, para a manutenção da posse em que se acham os respectivos súditos de gozarem do Indulto da Coroa Fidelíssima, e a fim de que não fiquem submetidos ao Jugo do Sistema Colonial”. Mas, e neste ponto Cairu fala ao coração dos Brasileiros, desde que as Cortes de Lisboa “tentam firmar no Brasil o Sistema de Morte, que fez odioso na Sociedade o Nome Português, aniquilou o seu Império da Índia, exterminou da China e Japão o Culto Católico, e reduziu os seus Portos da Ásia, ainda na Capital da outrora Goa Torreada a pestíferos cemitérios; é força que a Honra Brasileira clame por Auxílio aos Céus e à Terra e defenda a Causa da Justiça Própria e da Civilização do Mundo no Tribunal da Sociedade...”. Dos habitantes do Rio de Janeiro, que desde a chegada de D. João vinham gozando das vantagens que a instalação da corte lhes proporcionou, Cairu procurava ferir o amor próprio, mostrando-lhes que embora “a Honra Brasileira imperiosamente dite, desde o Amazonas até o Prata, o sustentar da independência do Brasil, proclamada pelo seu Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo, parece com especialidade interessar esta Empresa Política à Honra Fluminense; por ter sido a imediatamente atacada pelos ditadores de Portugal, com insultos intoleráveis e destinados a deprimir a Dignidade da Capital do Império do Equador, e onde se achavam os mais importantes Estabelecimentos da Nova Corte, que viu surgir como Aurora, a Roma Americana”. Finalmente, acentuemos com destaque, que José da Silva Lisboa depois de se referir ao reconhecimento pelo governo de Buenos Aires assinala que o “Império do Brasil pode contar com este Amigo nas fronteiras do Sul”, da mesma forma que os “Estados Unidos ao Norte da América devem ser outro especial Amigo deste Novo Império”. Proclama então o autor da “Causa do Brasil”, que a “Honra Americana se tem mostrado acrisolada no Teatro da Civilização, tendo-se mostrado à Humanidade ser a Magna virum Mater, e, por assim dizer, a Matriarca da Independência do Mundo. O seu prolífico exemplo tem ocasionado a Nova Constelação de Gover113 nos Constitucionais desde o Golfo do México à Terra do Fogo: e é fácil ver que a Liga Transatlântica muito excederá em força e esplendor a Anfictiônica e Hanseática, que aterrou em antigos tempos o Barbarismo Asiático e Europeu”45. A consciência da solidariedade continental, que o fazia preconizar uma cooperação amistosa entre todas as nações da América para a conservação da independência contra possíveis ataques europeus, coloca Cairu sob o aspecto menos conhecido de um dos precursores do pan-americanismo, antecipando-se à formulação da doutrina de Monroe, e mostrando-nos a fonte inesgotável de estudos que ainda representam suas esquecidas obras. Além destes apelos, Cairu no mesmo periódico examina outras questões relativas à separação do Brasil de Portugal, destacando-se as objeções levantadas por Mr. Balbi contra a excelência do Brasil e do Rio de Janeiro, em particular, para sede da monarquia portuguesa, inclusive sob a alegação de que “o Brasil teria sempre uma população relativa muito inferior em número e em qualidade à de Portugal”46. Repelindo o argumento e face às ameaças de invasão do Brasil, Cairu, confiante nos sentimentos patrióticos dos habitantes do novo Império, não temia dizer que “se somos muitos ou poucos, os nossos inimigos o dirão, quando assaltarem as nossas praias e se internarem nas matarias”47, prenúncio do desafio que mais tarde formulou em plena Assembléia Constituinte: – “Venha todo o Portugal: basta o nosso pau-ferro para desancar e desqueixar os invasores”48. Publicando a “Causa do Brasil” e o “Império do Equador”, José da Silva Lisboa penetrou no ano de 1823, ano de rumorosos acontecimentos, destacando-se a instalação e posterior dissolução da Assembléia Constituinte, a cuja convocação se opusera, procurando mostrar a inconveniência da assembléia enquanto as Províncias do Pará e Maranhão não aderissem à causa pátria. 45. 46. 47. 48. Idem, Idem, Idem, Idem, 114 idem, pp. 16, 18, 24, 29, (parte IV), 26 e 36. idem, p. 53. idem, p. 75. “Anais da Assembléia Constituinte”, sessão de 30.8.1823. VI Na Assembléia Constituinte Para a nossa primeira Constituinte, convocada em 3 de junho de 1822, Cairu integrou a representação de seu torrão natal, como 4o suplente. Não tendo o deputado efetivo Cipriano Barata de Almeida assumido o mandato, em 5 de agosto de 1823 ingressou na carreira legislativa para uma curta experiência de cerca de três meses 49. Na tribuna parlamentar, pedra de toque onde melhor se prova o caráter dos homens públicos; cadinho da nacionalidade, onde se fundem no mesmo anseio do bem comum, o idealismo que empolga a juventude e a prudência que a idade traz, Cairu soube, no dizer do Marquês de Abrantes, “aliar o saber de Cícero à constância de Sócrates, e o talento de Sêneca à virtude de Catão”50. Por isso, foi no recesso das Câmaras que os historiadores ao traçarem seu retrato moral, encontraram a coragem que o fazia dizer: “A fortaleza deve ser uma das virtudes cardiais dos representantes do povo. Quem não tem coragem para arrostar a face dos ministros, não se assente na assembléia dos legisladores”51; notaram a firmeza em sustentar suas opiniões, colocando mesmo o bem da pátria acima dos prazeres da amizade: – “Sr. Presidente, a matéria é tão grave que declaro nesta assembléia estar resolvido a inimizar-se com os melhores amigos, que se obstinarem na dita tese, e congraçar-me com os meus maiores inimigos (que só terei gratuitos) se me ajudarem a combater tal opinião, que entendo causaria se fosse adotada com generalidade a ruína do Império do Brasil”52. Esta constância que o impeliu repetidas vezes de votar contra a assembléia inteira, não representava, contudo, uma atitude rebelde ao exame da evolução dos problemas: – “Quanto à argüi49. Passou a deputado efetivo em 8.10.1823. 50. Marquês de Abrantes – Discurso na Soc. Agricultura, Comércio e Indústria da Bahia em 31.1.1838. 51. José da Silva Lisboa – “Anais da Assembléia Constituinte”, sessão de 6.8.1823. 52. Idem, idem, sessão de 18.9.1823. 115 ção que um dos Srs. Deputados me fez de ser inconseqüente nos meus escritos... aqui só direi: não pode qualquer emendar o passado erro com o seu posterior acerto?’’53. No ardor dos debates, os biógrafos apontaram um caráter pugnaz, ora exclamando resoluto, quase com setenta anos: “Tenho peito triplicado para resistir à rapaziada”54; ora dizendo o que desejava para muitas vezes ouvir acres respostas, que não era de seu hábito deixar sem adequada contestação. Certa vez, chamando Costa Barros de carbonário, este replicou-lhe: “Se bem que à maneira de Sparta estejamos dispostos a respeitar as suas cãs pela suposição de que elas trazem consigo a idéia de maior saber e de ajustada experiência; contudo conhecemos também que este direito dos velhos cessa todas as vezes que êles não conservam o respeito devido aos outros homens e então a mocidade deixa de lhe prestar aquela veneração devida”55 . Infelizmente, seguiu-se tal tumulto que o taquígrafo não conseguiu registrar a resposta de Cairu: foi pena, pois dada a natureza do reproche, qual não teria sido a contestação de um orador que fazia até Mont’Alverne calar? Em todos os assuntos debatidos, Cairu oferecia uma ponderação serena, um parecer fundamentado, um esclarecimento sábio, frutos de vastíssima cultura, nascida do estudo ininterrupto e do convívio com os grandes vultos das artes e ciências, nos quais sempre buscava reforço para suas idéias: Bacon, Smith, Vattel, Camões, Lucrécio, Lavater, Tácito, Jarrold, B. Constant, Plínio, Montesquieu, Burke, J. P. Odar, Aristóteles, Zeuxis, Apeles, Blackston, Virgílio, Gibbon, St. Hilaire, João de Barros, autores clássicos e contemporâneos, sagrados e profanos, épicos da língua, portuguesa, antigos e venerandos mestres de Coimbra, corifeus das ciências políticas e econômicas, escritores que se perderam através do progresso da cultura, autores que a evolução dos tempos redobrou a fama, artistas, historiadores, naturalistas, filóso53. Idem, idem, sessão de 29.8.1823. 54. Idem, idem, sessão de 29.8.1823. 55. Costa Barros, idem, sessão de 15.9.1823. 116 fos, poetas e políticos, todos perpassavam através de seus eloqüentes discursos, numa erudição que no dizer de Araújo Lima, esmagava seus adversários. Assim foi a figura moral e intelectual de Cairu, assim foi José da Silva Lisboa no recinto da Constituinte, discutindo não só os projetos de lei nela apresentados, como também os 24 artigos da Constituição que a Assembléia conseguiu examinar antes de ser dissolvida por D. Pedro I. Daqueles projetos, poucos proporcionaram melhor oportunidade para Silva Lisboa demonstrar seu acendrado amor ao estudo do que o da criação de uma Universidade no Brasil cuja sede devia ser, em sua opinião, no Rio de Janeiro. Por mais de uma vez, Cairu teve ensejo de expender considerações que ainda hoje podemos admirar pelo descortino dos problemas brasileiros e perfeita compreensão do verdadeiro sentido da formação universitária. “É experimentado, que os que não fizeram estudos regulares nas Universidades, ainda que sejam muito estudiosos e provectos em qualquer ramo literário, sempre em toda vida sentem um vazio, que nada supre; salvas as honoríficas e raras exceções de pessoas de extraordinário talento, que são como estrelas de primeira grandeza”56. Cairu não desejava uma Universidade repleta de estudos inúteis, antes preferia o estudo das artes que ajudam o desenvolvimento das indústrias; dos direitos mercantil, marítimo, internacional, contra o exagero do ensino do direito romano. Se desta discussão não resultou verdadeiramente a Universidade, pelo menos dela nasceram os cursos jurídicos instalados em São Paulo e Olinda. Além do saber enciclopédico, na ocasião em que foram examinados os artigos constitucionais que estabeleciam os lineamentos da formação territorial do Brasil e fixavam os direitos dos cidadãos, Cairu exibiu em toda plenitude a orientação política que lhe era peculiar. De início, ao discutir a introdução à Constituição, Silva Lisboa 56. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 27.8.1823. 117 ajoelhou-se em pleno recinto da Assembléia, mostrando que não desejava que a invocação à Santíssima Trindade incluída no intróito da malograda Carta Magna, ficasse restrita a simples palavras, não acompanhadas de “atos de adoração em culto externo”57. E a disputa acesa que se estabeleceu em torno do preâmbulo, foi o antelóquio das infindáveis discussões que, embora demonstrando por sua elevação e sapiência o nível intelectual dos homens da Constituinte, exigiriam, se considerarmos o mesmo andamento, mais de 600 dias para a aprovação de todo o projeto constitucional. Nestes debates Cairu fulmina o estabelecimento do federalismo no Brasil, procurando provar que a “palavra federal inserta na Constituição teria pior efeito que uma bala pestífera do Levante para dissolução do Império”58; defende com intransigência os escravos e seus descendentes, pedindo aos seus colegas: “Deixemos de olhar para a África com maus olhos. Lembremo-nos que Moisés foi africano, criado como se diz no Ato dos Apóstolos na Sabedoria do Egito e foi casado com mulher Etíope. A Igreja Africana foi famosa nos primeiros séculos do cristianismo: ela produziu os Ciprianos e Agostinhos. Todas as nações que ora são mais civilizadas, foram antigamente bárbaras”59; procura restringir, sem êxito, pois votou sozinho, a competência do júri somente às causas cíveis, sob a alegação de que o povo em sua generalidade ainda não possuía suficiente instrução para se constituir em corpo de jurados destinado a apreciar também as causas criminais onde estava em jogo até a vida dos cidadãos. Silva Lisboa impugna ainda a liberdade religiosa, contra diversos sacerdotes, membros da Constituinte, dizendo que esta liberdade “considerando as circunstâncias atuais do Brasil eqüivalia à liberdade de perjúrio e liberdade de apostasia, pois havendo todos os cidadãos brasileiros jurado guardar a religião católica, o declarar-se em Constituição que era seu direito individual ter liberdade religiosa, era o mesmo que declarar-se que podia perjurar, e prescindir do seu juramento, sen57. Idem, idem, sessão de 15.9.1823. 58. Idem, idem, sessão de 17.9.1823. 59. Idem, idem, sessão de 30.9.1823. 118 do apóstata da religião”60; e, surpreendentemente, defende as corporações de ofício, ele que tão liberal era em matéria de economia, argumentando que sendo elas em pequeno número, restrita influência teriam na vida econômica do País, além de propiciar o aprimoramento das artes. Quando a Assembléia atingia o artigo 24 da Constituição, as divergências entre os partidários dos Andradas e D. Pedro I tinham chegado ao auge, prenunciando os sombrios acontecimentos que de fato ocorreram. A agressão sofrida por David Pamplona Corte Real e praticada por oficiais portugueses, inflamou os espíritos e provocou vivos ataques ao Imperador, entrando a Assembléia no dia 11, às 10 horas, em sessão permanente que se prolongou até o dia 12 às 13 horas. Cairu, se bem que idoso, manteve-se nesta sessão até os últimos minutos, apenas com ligeira interrupção por sentir-se doente, na defesa de D. Pedro I. Já no dia anterior, Andrada Machado permitira a entrada do povo no recinto, sob protesto de Cairu, porque certamente vieram-lhe à mente tristes recordações do trágico desfecho da reunião da Praça do Comércio. Neste ambiente conturbado, com as tropas em movimento, a Constituinte cerceada em sua liberdade nada mais poderia fazer: rodeada de soldados, recebeu com indiferença, no dia 12, o decreto imperial que a dissolvia. Estava cumprida a experiência parlamentar de José da Silva Lisboa. Menos de três anos depois, novamente o encontraremos impávido na tribuna do Senado do Império, onde se reuniu a muitos de seus antigos colegas da Assembléia Constituinte. VII Cairu, Senador do Império A época em que se deu a interrupção das atividades parlamentares de José da Silva Lisboa, nomeado, em 20 de outubro de 1823, 60. Idem, idem, sessão de 8.10.1823. 119 Desembargador Graduado do Paço e Chanceler da Relação da Bahia, ficou assinalada nos fastos pátrios, em 1824, pela Confederação do Equador e, em 1825, pela beligerância no sul do país, da qual resultou mais tarde a independência da Província Cisplatina. Estes acontecimentos proporcionaram ao futuro senador motivos para aumentar sua imensa bagagem literária, com novos periódicos e panfletos destinados à defesa de seus pontos de vista políticos. Contra Manuel de Carvalho e, demais revolucionários de Pernambuco, utilizando-se dos condenáveis processos de seus adversários, Cairu publicou uma série de opúsculos aos quais imprimiu invulgar e por todos os motivos lamentável virulência, para a qual somente podemos encontrar explicação no seu ódio acérrimo ao federalismo. A “História Curiosa do mau fim de Carvalho & Cia. à bordoada de pau brasil”, por exemplo, em que os adeptos da revolução de 1824 são chamados de “tolos, castas ruins, quadrúpedes marcados, asneirões da República do Crato”, foi taxada por Hélio Viana de “abjeto folheto indigno de ter saído da pena do Visconde de Cairu”61. Além deste e dos outros habitualmente citados (Rebate Brasileiro contra o Typhis Pernambucano, Apelo à Honra Brasileira contra a facção federalista de Pernambuco, e Pesca de Tubarões do Recife em três revoluções dos anarquistas de Pernambuco), Basílio de Magalhães admite ser de autoria de José da Silva Lisboa, a, “Análise do manifesto publicado no Diário de 30 de julho”62. Se o federalismo era combatido sob o temor de uma possível desagregação do imenso território nacional, não menor atenção recebeu de Cairu as atividades do General Artigas, no Rio da Prata. Por isso, com o objetivo de reprovar as ações do libertador do Uruguai, vieram à luz o “Triunfo da Legitimidade, contra a facção dos Anarquistas”, a “Desafronta do Brasil contra Buenos Aires Desmascarado” e “Recordações dos Direitos do Brasil à Província Cisplatina”. Sublinhando sua personalidade multiforme, nos anos em que 61. Hélio Viana, op. cit., p. 423. 62. Basilio de Magalhães – in Rev. do Inst. H. G. do Brasil – Tomo 83, 1918, p. 406. 120 escreveu estas diatribes, Cairu iniciou a publicação do modelo de serenidade e meditação que é a “Constituição Moral e Deveres dos Cidadãos” obra de fôlego em três volumes, destinada a elucidar o verdadeiro espírito de certas normas constitucionais, mediante a exposição dos princípios da Moral Pública. Ainda em 1825, anunciou a futura edição da “História dos Principais Sucessos Políticos do Império do Brasil”, escrita atendendo ao convite que lhe fora formulado pelo Marquês de Valença, confirmado pelo Imperador, segundo Aviso de 12 de janeiro e Portaria de 1o de fevereiro de 1825. Para desincumbir-se desta tarefa, Cairu, foi licenciado de suas atividades no Tribunal e recebeu dois auxiliares de reconhecidos méritos, o Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio e o Brigadeiro Domingos Alves Branco Moniz Barreto, que, por diferentes motivos, não chegaram a oferecer-lhe efetiva colaboração. Não obstante as providências do governo, a obra não chegou a ser concluída, muito contribuindo para isto a demora de sua impressão na Tipografia Nacional, onde permaneceu sem andamento por mais de seis meses, e o corte dos Rs. 365$000, atribuídos pelo orçamento ao autor para pagamento dos serviços prestados pelo escrevente Estanislau de Souza Caldas, auxiliar de inestimável valia, porque, segundo o próprio Cairu, suas obras lhe davam bastante trabalho pelo hábito de repetidas correções. Foi depois da publicação deste livro, adianta-nos José Honório Rodrigues, “que se passou a considerar o dia 7 de setembro de 1822 como a primeira máxima época dos Anais do Brasil”63. Em 22 de janeiro de 1826, José da Silva Lisboa, já agraciado em 12 de outubro do ano anterior com o título de Barão de Cairu, foi escolhido por D. Pedro I, Senador pela Bahia. No desempenho de seu mandato, jamais desmereceu o conceito que o tornara um dos maiores nomes da Assembléia Constituinte. Não abandonou a coragem em sustentar suas opiniões, fazendo ver que “as câmaras são escolas de fortaleza e magnanimidade, não entre nelas quem não tem força de espírito para desprezar injúrias que lhe fizerem 63. José Honório Rodrigues – “Teoria da História do Brasil”, 1949, p. 160. 121 por causa de suas opiniões neste recinto”64. Continuou demonstrando a firmeza que o tornou imune aos conluios contrários aos interesses de sua Pátria: – “Não pertenço a partido algum, sou puramente do partido dos brasileiros genuínos”65. Manteve o amor à discussão, travando acirrados debates com seus pares, dos quais recebeu censuras injustificáveis, semelhantes àquela que Barbacena lhe dirigiu: – “Homem velho, doente e recolhido em sua casa, poucas vezes conhece a opinião pública, mas sim aquela do pequeno círculo em que vive”66. Dias depois Cairu respondeu-lhe que “triunfara com barata vitória” e que por isso prescindia “de personalidade que não me acobertou uma amizade de 35 anos”67. Acendrado sentimento de honra, demonstrou também na ocasião em que a Câmara dos Deputados procurou reformar a Constituição sem a participação do Senado. Desejando alguns de seus colegas uma intervenção imediata do Senado, contestou-lhes: – “Quando, pois, senhores, vierem as reformas, nós nos ocuparemos delas, mas não vindo para o Senado tomar nelas a parte que deve, então nós deliberaremos a tal respeito, embora o Senado sucumba, como se diz, mas sucumbirá com honra”68. E são outrossim seus autores favoritos, Smith, Rocha Pita, Montesquieu, Solon, Catão, Pitt, Burke, Fox, Canning, Roscoe a lhe fazerem companhia nos momentos críticos dos debates, a lhe fornecerem os alicerces das opiniões contrárias às de seus opositores que se mantinham, do mesmo modo que na Assembléia Constituinte, admirados de sua vasta cultura, como, aliás, nos deixou consignado o Senador Borges ao afirmar que o Visconde de Cairu, jamais se levantava “sem que no desenvolvimento de sua vasta erudição deixe de revolver os Anais da Rússia, da Grécia, da China etc., e ainda agora mesmo acabou de citar-nos 64. 65. 66. 67. 68. José da Silva Lisboa – “Anais do Senado do Império”, sessão de 15.5.1829. Idem, idem, sessão de 7.6.1832. Marquês de Barbacena – idem, sessão de 30.5.1832. José da Silva Lisboa – idem, sessão de 5.7.1832. Idem, idem, sessão de 6.8.1834. 122 Inglaterra, França, Estados Unidos da América, Cidades Hanseáticas e até Bonaparte”69. Nove anos de atividades na mais alta Câmara Legislativa do Império, permitiram-lhe a discussão de dezenas de, projetos, entre os quais o da criação de um Banco de Circulação e Depósitos, em defesa do qual procurou mostrar no desenvolvimento da argumentação que nenhum bom patriota devia se opor a que se substitua “no giro mercantil e comércio o papel de crédito ao sempre raro e dispendioso meio circulante de moeda metálica”, tanto mais que seus admirados ingleses “honram-se de (como dizem) comerem e viverem do papel de crédito, especialmente das notas de Banco”70. Também por isto, já tivemos, oportunidade de mencionar, votou contra a liberdade de mineração dos metais preciosos, pois preferindo a circulação de notas de Banco, era até motivo de glória que o Brasil, em lugar da moeda metálica introduzisse “um melhoramento comercial a que a Inglaterra chegou depois de mais de século”71. Ao tratar da extinção das Mesas de Inspeção, as saudades de seus velhos tempos da Bahia deram-lhe forças para defender sua antiga repartição naquilo em que estimava útil. Dizia então a seus pares: “Não sou propenso à abolição de instituições, ainda que defeituosas, que se podem reformar para o bem comum. “Destruir não custa nada, edificar é mais difícil e nisto é que se vê o juízo do legislador”72. Outros projetos de lei, de caráter eminentemente político, muitos deles derivados dos sucessos que determinaram e seguiram a abdicação de D. Pedro I em 7 de abril de 1831, ofereceram-lhe ensejo para discutir a liberdade de imprensa, com idéias já expostas em capítulo anterior, e lançar-se a uma ferrenha defesa da Constituição promulgada pelo seu soberano em 1824, afirmando com a 69. 70. 71. 72. Borges, idem, sessão de 30.5.1832. José da Silva Lisboa, idem, sessão de 16.6.1827. Idem, idem, sessão de 12.5.1827. Idem, idem, sessão de 2. a. 1827. 123 convicção que lhe era muito própria: “Qualquer que seja a sorte que nos espera, eu sempre direi: quero antes errar com Catão, pugnando pela Constituição da Pátria, do que acertar com amantes de novidades perigosas e que menosprezam a estabilidade de uma lei Fundamental”73... “Nós devemos andar e não ser fixos e retrógrados; para isso é necessário que se não esteja a fazer e desfazer todos os dias”74. A substituição do tutor do futuro D. Pedro II foi combatida com a mesma tenacidade e aquele que lhe chamara charlatão idoso foi apresentado no Senado como “insigne homem de Estado”. Vale Cabral, nos adianta que nessa época as relações outrora tensas entre os dois Patriarcas da Independência75 tornaram-se mais cordiais, pela concórdia de ideais que esta defesa pressupõe. Uma das críticas geralmente feitas pelos adversários de Visconde de Cairu prendia-se a sua pretensa adesão ao partido que desejava a restauração de D. Pedro I. Contra esta invectiva, dizia o senador baiano que não podia conceber estivesse “a espécie humana tão depravada” que pudesse acreditar fosse o primeiro Imperador “capaz da baixeza de arrancar a coroa da cabeça de seu filho”76. A defesa intransigente dos princípios que lhe eram caros, cada vez mais o impopularizava, e não obstante as ameaças da multidão, alquebrado pela moléstia, jamais deixou de comparecer às sessões do Senado, até mesmo naqueles agitados dias em que, opondo-se a todo o cenáculo, votava sozinho. Quando faltou à contenda parlamentar, foi para que “na fria lousa” que cobria a sua campa, a juventude encontrasse “representadas, como em límpido espelho, as imagens do saber, da lealdade e da honra”77. 73. Idem, idem, sessão de 18.6.1832. 74. Idem, idem, sessão de 12.7.1833. 75. “É portanto Silva Lisboa o verdadeiro Patriarca de nossa independência” – Cândido Mendes de Almeida – “Ao Leitor” – in “Princípios de Direito Mercantil”, VI, ed. 1874. Por isso, seu lema seria sempre.: “Constituição e D. Pedro II”. 76. José da Silva Lisboa, op. cit., sessão de 26.6.1833. 77. Marquês de Abrantes, op. cit. – apud José Soares Dutra, “Cairu”. 124 VIII O fim da jornada A doença que afligiu os últimos anos de sua vida, por fim quebrantou-lhe a resistência. Cairu não veria o amanhecer de 20 de agosto de 1835. Em sua casa, à rua da Ajuda, cerca de 5 horas da manhã, repousava de setenta e nove anos de vida intensa. Visões de uma existência fecunda atravessavam-lhe a mente em tropel: a despedida de seus humildes pais, no velho cais de Salvador; as acolhedoras salas de aula de Coimbra; os numes ilustres de seus antigos mestres; as contendas de Ilhéus; o cobre de Cachoeira; o velho Smith que lhe fizera abandonar as idéias dos “miseráveis economistas de França”; a figura hesitante de D. João VI; o estrépito da populaça vaiando aquele que só queria o bem público... Sentia a íntima satisfação de ter sido o único brasileiro que participara de todos os atos da independência da Pátria, desde 28 de janeiro de 1808 até 7 de setembro de 1822... Em seus ouvidos ressoava ainda a voz do Marquês de Paranaguá, recitando a Ode que lhe dedicara e que de estrofe em estrofe esmaecia... ............................................................... Desta forma caminhas Denodado Cairu, ao Templo Augusto Com ânimo tranqüilo, A planta firme, os olhos sempre fitos No facho luminoso Da portentosa Torre, que entre nuvens Esconde a excelsa grimpa E descobre os sem-fins da Eternidade.78 As últimas palavras confundiram-se com o maior silêncio que existe. 78. Marquês de Paranaguá – “Ode” – Rev. do Inst. H. G. do Brasil, Tomo I, 1839. 125 IX Bibliografia de José da Silva Lisboa Bastante razão tinha Antônio de Morais Silva ao garantir a Cairu que “as obras, que o prelo perpetua e o tempo não gasta... asseguram-lhe uma duração de glória e até de reconhecimento dos ânimos bem formados”79. De fato, o acervo literário do Visconde de Cairu é imenso, em quantidade e valor, e vem repetidas vezes sofrendo alterações a partir da primeira lista de suas obras apresentadas pelo 2o Barão de Cairu, em 1839, até às preciosas retificações que às bibliografias mais completas de Inocêncio, Vale Cabral e Blake, impôs o prof. Hélio Viana, depois de pacientes pesquisas em nossas Bibliotecas. Temos a convicção que outras obras ainda virão juntar-se à seguinte lista, por nós copilada: AGRADECIMENTO do povo ao Salvador da Pátria, o Sr. Príncipe Regente do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822. ÁGUA vai – Calmante às “Malaguetas” no 3 e 4. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824. APELO à honra brasileira contra a facção federalista de Pernambuco. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824. APÊNDICE à Memória da vida de Lord Wellington. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1815. ARTIGOS no Diário do Rio, sob o pseudônimo de “Jurista”. ATALAIA. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1823. CARTILHA da escola brasileira para instrução elementar da religião do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1831. ____. 2.ed. Pará: Justino Henriques da Silva, 1840. 79. F. A. Pereira da Costa – “Apontamentos Bibliográficos do Dr. Antônio de Morais e Silva”, 1910, pp. 111/115. 126 CATECISMO da Doutrina Cristã. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1832. ____. 2.ed. Pará: Justino Henriques da Silva, 1840. CAUSA da religião e disciplina eclesiástica do Celibato Clerical. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1828. CAUSA do Brasil no juízo dos governos e estadistas da Europa. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822. CAUTELA Patriótica. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1828. CONCILIADOR do Reino Unido. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. CONSIDERAÇÕES sobre a doutrina econômica de J. B. Say. Minerva Brasiliense, Rio de Janeiro, 1844. T. II. ____. Minerva Brasiliense, Rio de Janeiro, 1845. T. III. CONTESTAÇÃO à história e censura de Mr. de Pradt sobre os sucessos do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1825. CONTRADITA a Mr. Chapuis. Rio de Janeiro: [Tip. Plancher Seignot], 1826. CONSTITUIÇÃO moral e deveres dos cidadãos. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824. CRÔNICA autêntica da Regência do Brasil do Príncipe Real o Sr. D. Pedro de Alcântara. Rio de Janeiro: [s.n.], 1829. DA LIBERDADE de trabalho. Guanabara, Rio de Janeiro, 1851. T. I. DEFESA contra o ataque, do Pe. Feijó ao Velho Canonista. Rio de Janeiro: Tip. Plancher- Seignot, 1828. DEFESA da “Reclamação do Brasil”. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822. 127 DESAFRONTA do Brasil a Buenos Aires desmascarado. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1825. DESFORÇO patriótico contra o libelo do português anônimo de Londres, inimigo da independência do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1825. DESPERTADOR brasiliense. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. DIÁLOGO entre filósofo e pastor. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. DISCURSO pronunciado na sessão de 18 de junho. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1832. EDITAL de José da Silva Lisboa, Diretor de Estudos. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. EDITAL dos mestres e professores de aulas públicas. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. ELOGIO do Conde de Linhares. In: Investigador Português. Londres: [s.n.], 1812. ENSAIO econômico sobre o influxo da inteligência humana na riqueza e prosperidade das nações. Guanabara, Rio de Janeiro, 1851. T. I. ENSAIO sobre o estabelecimento de bancos. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1812. ESCOLA brasileira ou instrução útil a todas as classes. Rio de Janeiro: Tip. Plancher-Seignot, 1827. ESPÍRITO da Proclamação do Sr. D. Pedro à nação portuguesa. Rio de Janeiro: Tip. de P.Plancher-Seignot, 1828. ESPÍRITO de Vieira. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1821. ESTUDOS do Bem Comum e Economia Política. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1819. 128 ____. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1820. ____. 2.ed. Rio de Janeiro: IPEA, 1976. EXORTAÇÃO aos baianos sobre as conseqüências do hórrido atentado da sedição militar cometido na Bahia em 25 de outubro de 1824. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824. EXTRATOS das obras políticas e econômicas de Edmundo Burke. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1812. ____. 2.ed. Lisboa: Viúva Neves & Filho, 1822. FALSIDADE do correio e reverbero contra o escritor das Reclamações do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822. GLOSA à Ordem do Dia e manifesto de 14 de janeiro de 1822 do ex-General das Armas Jorge de Avilez. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1822. GUERRA de pena contra os demagogos de Portugal e do Brasil. Rio de Janeiro: Tip. Nacional, 1824. HEROICIDADE brasileira. 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VIGIA da Gávea. Rio de Janeiro: [Tip. Nacional], 1823. 133 CRONOLOGIA 16-07-1756 Nascimento em Salvador. 1772 Viagem de estudos para Portugal. 10-10-1774 Ingresso no Curso de Direito da Universidade de Coimbra. 23-11-1778 Obtenção por provas da Carta Régia de Substituto Ordinário de Grego e Hebraico da Universidade de Coimbra. 08-06-1779 Conclusão do curso na Universidade. 10-06-1779 Outorga da Carta de Formatura. 01-10-1779 Carta de D. Martinho de Mello e Castro apresentando José da Silva Lisboa ao Marquês de Valença, Governador do Brasil. Início de 1780 Nomeação para o cargo de Ouvidor de Ilhéus. 02-02-1780 Ordem para abertura de inquérito sobre escândalos ocorridos no foro de Ilhéus em administrações anteriores. 24-02-1780 Edital exigindo o pagamento de fintas e obrigando o plantio de mandioca. 03-03-1780 Providências sobre a crise de farinha e expulsão de malfeitores. 14-03-1780 Representação contra o cadete Antônio Rodrigues de Figueiredo. 28-04-1780 Comunicação do naufrágio do capitão Mor. 25-08-1780 Nova representação contra o cadete Antônio R. de Figueiredo e contra o Capitão-Mor. 18-10-1781 Importante carta dirigida ao Dr. Vandelli, de Lisboa. 134 29-11-1782 Provimento na cátedra de Filosofia, de Salvador. 04-06-1783 Idem, idem, de língua grega na mesma cidade. junho 1783 Exploração da Serra de Cachoeira para descoberta de mina de cobre. 11-01-1784 Novas explorações na mesma serra. 19-01-1784 Carta a Martinho de Melo e Castro considerando duvidosa a existência da mina de cobre em Cachoeira. 11-02-1784 Carta a D. Martinho de Melo e Castro sobre a cultura de tabaco e fundação de uma sociedade para desenvolvimento da agricultura. 19-04-1784 Casamento com D. Ana Francisca Benedita de Figueiredo. 1787 Substituição na cadeira de grego por Luiz dos Santos Vilhena. 14-08-1787 Carta de D. Rodrigo José Menezes comunicando, ao Ministro da Marinha e Ultramar a concessão de licença para que José da Silva Lisboa fosse ao Reino.Viagem a Portugal. Conhecimento das teorias de Adam Smith por intermédio de Antônio de Moraes Silva. 1796 início de 1797 Viagem a Portugal. 20-02-1797 Jubilação no cargo de prof. de Filosofia. 04-09-1797 Nomeação para o cargo de Deputado e Secretário da Mesa de Inspeção da Bahia. Posse neste cargo. Ofício propondo um prêmio para Joaquim Sequeira Bulcão. 27-07-1798 28-03-1799 29-03-1799 Proposta para compra dos trapiches em que se encontrava a Mesa de Inspeção da Bahia. 135 1802 Viagem a Lisboa. 28-01-1808 Abertura dos portos do Brasil às nações amigas. 23-02-1808 Nomeação para prof. de Economia Política, no Rio de Janeiro. 26-02-1808 Viagem para o Rio de Janeiro. 07-03-1808 Chegada ao Rio de Janeiro. 22-04-1808 Nomeação para o cargo de Desembargador da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens. 13-05-1808 Nomeação para membro da Junta Diretora da Imprensa Régia. 23-07-1808 Nomeação para Deputado à Junta do Comércio e Agricultura, Fábricas e Navegação do Estado do Brasil. 16-11-1808 Nomeação para Desembargador da Relação da Bahia, com exercício e Deputado da Real Junta de Comércio. 31-08-1811 Morte da esposa. 14-10-1814 Nomeação para o cargo de Censor Régio. 06-08-1818 Nomeação para Desembargador da Casa de Suplicação. 03-05-1819 Obtenção do título do Conselho de S. M. Fidelíssima. 23-02-1821 Nomeação para membro da Comissão preparatória da reunião dos procuradores das cidades e vilas do Brasil e ilhas do Atlântico. 26-02-1821 Nomeação para o cargo de Inspetor dos Estabelecimentos Literários ou Diretor dos Estudos e Museus. 136 04-04-1821 Nomeação para Desembargador dos Agravos da Casa de Suplicação. 08-04-1821 Eleito 12o compromissário da freguesia de São José do Rio. 21-04-1821 Reunião dos eleitores paroquiais na Praça do Comércio. 08-10-1823 Ingresso na Assembléia Constituinte para a qual fora eleito suplente de deputado. 20-10-1823 Deputado efetivo pela Bahia. 20-10-1823 Nomeado Desembargador Graduado do Paço. 12-10-1825 Nomeação para Chanceler da Relação da Bahia. 22-01-1826 Agraciado com o título de Barão de Cairu. 12-10-1826 Escolhido Senador do Império pela Província da Bahia. 19-10-1828 Agraciado com o título de Visconde de Cairu. 05-08-1823 Aposentadoria no cargo de Desembargador do Paço. 20-08-1835 Morte no Rio de Janeiro. 137 BIBLIOGRAFIA ABRANTES, Marquês de. 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Oficial do Estado, 1921. 147 ÍNDICE ONOMÁSTICO Abrantes, Marquês de 115, 124 Abreu, João Capistrano de 12, 53, 54 Aftalion, Albert 72 Agostinho, Santo 118 Aguiar, Marquês de – vide Portugal, Fernando José de Aguiar e Souza, Antônio 26 Alegrete, Marquês de 100 Almeida, Cândido Mendes de 25, 69, 70, 124 Almeida, Cipriano Barata de 36, 37, 110, 115 Alorna, Marquês de 48 Amorim e Castro, Antônio 28 Amzalak, Moses Bensabat 58 Anadia, Visconde de – vide Sá, João Rodrigues de Andrada Machado e Silva, Antônio Carlos Ribeiro de 119 Andrada e Silva, José Bonifácio de 16,110 Andrade, Mário de 8 Angeja, Marquês de – vide Noronha, José Apeles 116 Araújo, Antônio de 49, 52, 53 Aristóteles 116 Arkwright, Richard 11 Artigas, José 120 Auchincloss, Louis 9 Avilez, Jorge 129 Bacon, Francis 116 Balbi, Adriano 114 148 Bandeira, (Jacinto Fernandes da Costa?) 104 Barbacena, Marquês de 122 Barbacena, Visconde de 31 Barreto, Domingos Alves Moniz 121 Barros, Pedro José da Costa 116 Barros, Francisco Borges de 22, 23, 36, 38 Barros, João de 116 Beauchamp, Alphons de 130 Bellas, Marquês de – vide Vasconcelos e Souza, José de Benevides, Inácio Antônio da Fonseca 57, 58 Bentham, Jeremy 43 Beviláqua, Clóvis 43, 44 Biancardi, Theodoro José 105 Bissell, Richard 9 Blackston, William 116 Blake, Augusto V. A. Sacramento 126 Bomfim, Manuel 102 Borges, Senador 122 Botado, Dr. 65 Branchamp 104 Brito, João Rodrigues de 34, 50, 56, 57 Bulcão, Joaquim Inácio da Siqueira 33, 56, 135 Burke, Edmund 13, 14, 15, 16, 37, 43, 50, 60, 68, 86, 107, 111, 116, 122, 129 Cabral, Alfredo Vale 109, 110, 124, 126 Cadaval, Duque de 53 Cairu, Barão de – vide Lisboa, Bento da Silva Caldas, Estanislau de Souza 121 149 Calmon, F. M. de Góes 50, 51 Calmon, Pedro 18, 26, 32, 37, Câmara, Manoel Ferreira 24, 56, 67 Camões, Luís de 116 Campos, João Silva 24 Canard, Nicolau 40,46 Canning, George 122, 133 Carvalho, Manuel de 16, 120 Carvalho, Sebastião José de 20, 34, 41, 93 Casas, Bispo Bartolomeo de las 66 Castelo Branco, José Diogo Ferraz 56 Castro e Almeida, Eduardo 21, 23, 25, 27, 28, 30, 31, 32, 33 Catão 115, 122, 124 Chapuis, Pierre 127 Cícero 115 Cipriano – vide Cipriano Barata de Almeida Colbert, Jean Baptiste 41 Constant, Benjamin 116 Corte Real, David Pamplona 119 Cossa, Luigi 70 Costa, Cláudio Manoel da 13 Costa, F. A. Pereira da 40, 58, 86, 126 Costa, Francisco Nunes da 23 Coutinho, José Joaquim da Cunha de Azeredo 43 Coutinho, José Lino 45 Coutinho, Rodrigo de Souza 12, 15, 33, 48, 52, 53, 57, 59, 128 Crossmann, R. H. S 15 Cunha e Menezes, Francisco da 32 150 Cunha e Menezes, Manuel da Dannemann, Robert N. Dantas, Francisco Clementino San Tiago Deiró, Eunápio Dobb, Maurice Duprat, Luís Dutra, José Soares Engels, Friedrich Falcão, Manoel Lopes Feijó, Diogo Antônio Ferreira, João Ferreira, Silvestre Pinheiro Figueiredo, Ana Francisca Benedita de Figueiredo, Antônio Alvares de Figueiredo, Antônio Rodrigues de Figueiredo, Izabel Antônia de Fonseca, Pedro José Forjaz, Djalma Fourgeaud, A. F. Fox, Charles James Franklin, Benjamin Furtado, Celso Galvão, Dr. Garcia, Rodolfo Gibbon, Edmond Gide, Charles Gomes, Agostinho Gonçalves, Pe. João 20, 23 7 88 69 72 105, 106 19, 80, 124 80, 84 26 110, 127 53 48, 100, 101 57, 135 57 22, 23, 134 57 18 44 76 122 63 77, 91 28 20, 109 116 84 36 26 151 Gonnard, Renê 79 Gouvêa, João Bandeira 106 Hamilton, Alexander 91, 92, 93, 94 Hawley, Cameron 9 Hayek, Friedrich A. von 72 Hicks, John R. 72 Holanda, Sérgio Buarque de 73, 74, 76 Homero 19 Hoppe, Fritz 94 James, Émile 78 Jarrold, Thomas 116 Jesus, Helena Nunes de 19 Jevons, William Stanley 46 João III (D.) 48 João IV (D.) 48, 69 João VI (D.) 13, 34, 37, 44, 48, 50, 51, 52, 54, 58, 59, 67, 69, 71, 84, 85, 86, 88, 95, 97, 98, 100, 101, 104, 106, 108, 112, 113, 125, 133 José I (D.) 35, 48 Keynes, John Maynard 72, 84 Kindersley, Mrs. Nathaniel 18 Kirkland, Edward C. 92, 94 Klein, Lawrence 46 Koopmans, Tjelling 46 Lauderdale, James Maitland 62 Lavater, John Gaspar 116 Leão XIII, Papa 80 Levene, Rícardo 16, 70 152 Lewis, Sinclair 8 Lima, Pedro de Araújo 117 Lima, Alceu Amoroso 25, 34, 73, 80 Lineo (Line), Carl von 31 Linhares, Conde de – vide Coutinho, Rodrigo de Souza Lisboa, Antônio da Silva 36, 53 Lisboa, Bento da Silva 14, 46, 51, 57, 58, 126 Lisboa, Daniel da Silva 112 Lisboa, Domingos da Silva 37 Lisboa, Henrique da Silva 19 Lisboa, Míguel Maria 133 List, Frederico 77, 78, 79, 84 Lucrécio 116 Luiz XVI 11 Lumiar, Conde de – vide Cunha Menezes, Manuel da Macamboa, Pe. Marcelino José Alves 104, 106 Macedo, Joaquim Manuel de 13 Macgrave, Jorge 31 Machado Neto, Brasílio 9 Maciel, Inocêncio da Rocha 110 Madeira, General Joaquim Pinto 112 Magalhães, Basílio de 120 Maria 1, (Da.) 23, 25, 32, 48, 91 Mariana d’Austria(Da.) 130 Marrocos, Luiz Joaquim dos Santos 85 Martius, Carl Friedrich Phillip 29 Marx, Karl 80, 84 Mauá, Visconde de 8 153 Mawe, John 28, 29 Melo e Castro, Martinho de 20, 21, 25, 27, 28, 31, 134, 135 Menezes, Djacir 72 Menezes, Rodrigo José de 31, 135 Meyer, Augusto 7 Meyer, J. P . 15 Miranda, José Antônio 98 Moisés 118 Moniz, Heitor 50 Monroe, James 114 Mont’Alverne, Frei Francisco de 116 Monteiro, Tobias 54, 85 Montesquieu, Charles Secondant, Barão de 116, 122 Moraes, Alexandre José Mello 40, 50, 51, 53, 57, 59, 99, 104, 105, 109 Morais, Eugenio Vilhena de 44, 69 Morais, Francisco 18 Napoleão Bonaparte 48, 65, 123 Nascimento, João de Deus 36, 38 Nassau, Maurício de 31 Nogueira, Antônio Barros da Silva 27 Noronha, José 53 Norris, Frank 8 Norton, Luiz 48 Odar, João Paulo 19, 116 Oliveira Lima, Manuel 49, 99 Palmela, Conde de 100 Paranaguá, Marquês de 125 154 Pareto,Vilfredo 45, 46, 72, 84 Passos, John Dos 8 Paula, Luiz Nogueira de 71,72, 73 Payne, Thomas 15 Pedro I (D.) 49, 97, 100, 101, 109, 110, 111, 117, 119, 121, 123, 124, 127, 128, 133 Pedro II (D.) 124 Penalva, Marquês de 101 Pereira, Marcelino da Silva 26 Pimentel, Inácio 36 Pinho, Wanderley 95, 96 Pitt, William 49, 122 Plínio 116 Pombal, Marquês de – vide Carvalho, Sebastião José de Pombal (2o Marquês de) 53 Ponte, Conde da 50 Portugal, Fernando José de 12, 35, 51, 53, 54 Portugal, Tomaz Pompeu Vilanova 53, 54, 100 Portugal e Castro, Afonso Miguel 20, 21, 27, 134 Pradt, Dominique Dufour du 127 Prosser, W. H 9 Queirós, José Joaquim de 105 Quesnay, François 11, 13, 89, 90 Quintela, Joaquim Pedro 104 Quintela, Inácio Costa 101 Quintus 103 Ramos, João Pereira 106 Raynal, Guillaume Thomas François 14 155 Ricardo, Davíd 70, 72 Rist, Charles 84 Rocha, José Joaquim 110 Rocha Pitta, Sebastião da 122 Rodrigues, José Honório 7, 121 Roebuck, John 11 Romero, Silvio 24 Roosevelt, Franklin Delano 80, 81, 84 Roscoe, William 122 Rousseau, Jean Jacques 14 Ruy, Afonso 12, 36, 38 Sá, João Rodrigues de 53 Saint Hilaire, Auguste de 116 Sampaio, Frei Francisco de Santa Teresa Jesus 121 Santos, Antonio Oliveira 6 Santos, Manoel Faustino dos 36 São Francisco, Barão de – vide Bulcão, Joaquim Inácio de Siqueira Say, Jean Baptiste 40, 65, 127 Schoonover, Lawrence 9 Schumpeter, Joseph Alois 60, 92 Sêneca 115 Silva, Antonio de Moraes 13, 40, 58, 75, 85, 86, 126, 135 Silva, Inocêncio F. da 126 Silva, João Manuel Pereira da 50 Silveira, Francisco Ferreira Paes da 31 Silveira, Zenith Mendes da 77, 79 Smith, Adam 13, 14, 15, 16, 40, 41, 45, 46, 47, 50, 54, 65, 69, 70, 73, 77, 78, 79, 81, 82, 83, 84, 88, 89, 90, 114, 122, 125, 135 156 Soares, José Nogueira. 106 Sócrates 115 Solon 122 Souza, Martim Afonso de 48 Souza, Otávio Tarquinio de 12, 37, 110 Spix, Johann Baptiste von 29 Sraffa, Peter 72 Stappelton, Auguste Granville 133 Stewart, Douglas 65 Strangford, Lord – vide Sydney, Percy Clinton. Sydney, Percy Clinton 15, 49, 53, 59 Tácito 116 Tinbergen, Jan 46 Tiradentes 52 Torres, Lucas Dantas de Amorim 36 Torres, Joaquim José Monteiro 101 Turgot, Anne Robert Jacques 65 Ulisses 19 Valença, Marquês de – vide Portugal e Castro, Afonso Miguel Vandellí, Domingos 20, 21, 24, 27, 31, 89, 134 Varnhagen, Francisco Adolfo 20, 101 Vasconcelos, Bernardo 102 Vasconcelos e Souza, José 51, 53, 54 Vattel, Emmerich 116 Veiga, Evaristo da 110 Viana, Hélio 16, 37, 108, 109, 110, 120, 126 Viana, Manoel Álvaro Souza Sá 69 Vieira, Antônio 19, 108, 128 157 Vilhena, Luiz dos Santos Villey, Daníel Viner, Jacob Virgens, Luiz Gonzaga das Virgílio Volney, Constantin François Chasseboeuf Voltaire, François Marie Arouet de Walras, Léon Watt, James Wellington, Lord Zeuxis 158 26, 32, 135 84 63 36 116 14 83 46, 72 11 86, 126, 130 116