Equipa Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa
CFCUL
Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Por um Novo Contrato Social
(Estado da Arte do Projecto C&SC)
Lisboa, 28 de Maio de 2008
Equipa Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa
(CFCUL)
Nota Prévia
Esta publicação informal emerge do registo documental do Argumentário do
Projecto Cidadania & Sociedade do Conhecimento em processo de inserção na
página que a ele se reporta no site institucional do CFCUL.
Abrange dois livros de autorias distintas.
O primeiro Livro, assinado por Maria Alfreda Cruz, Coordenadora do Projecto,
é constituído pelo conjunto de comunicações constitutivas da ontologia do tema
que a autora tem vindo a configurar e a discutir desde 2002 nos agoras
interessados pelas dimensões do Conhecimento implicadas na relação deste
com a Cidadania, sendo esta entendida simultaneamente como direito
individual e como bem público assente na relação autosustentável com a
Coesão e com o Capital Social. A tese, os princípios e os conceitos mobilizados
no Projecto apontam para que a sustentabilidade de uma tal relação passa por
praxis assumidas quer no âmbito das comunidades territoriais de proximidade
quer nas emergentes da sua desterritorialização por via da net. Daí que a
abertura de um site em território de incubação de uma experiência piloto deste
projecto se constitua em regime de observatório web de contornos laboratoriais,
susceptível de produzir resultados a ponderar e a avaliar nos registos de
conhecimento explícito e tácito, assumidos pelas comunidades envolvidas,
entre as quais a de origem do Projecto
O segundo Livro, assinado por Maria Tereza Ventura, Doutoranda em
Didáctica e Organização das Instituições Educativas é constituído pelos
documentos fundadores de um Programa de Mediação destinado a tornar
experimentalmente inclusiva uma Cidadania Activa que se configure como
direito tendencialmente universal e por isso se proponha pugnar pela equação
de praxis e de metodologias que em registo blending o permitam e o incentivem
em registo de longlife training facultado pelo sistema público de governação do
país, com mediação autárquica.
A articulação entre os desideratos de ambos no Livros, no território web passa
pelo Portal em fase de Protótipo cuja estrutura e manual de acesso às páginas
em que a metodologia se suporta conduz ao conjunto das Adendas comuns a
ambos os no âmbito da presente versão e-book.
Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Por um Novo Contrato Social
Índice
Nota Prévia
Livro I - Do Princípio da realidade ao princípio da Possibilidade
por Maria Alfreda Cruz
Parte I – Etapas de construção do Argumentário do Tema
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas com os mesmos títulos aos Congressos do
Centro Latino-americano para o Desenvolvimento sobre a Reforma do Estado e da
Administração Pública entre 2002 e 20007 (reunidos sucessivamente em Lisboa/2002,
Madrid/2004, Santiago do Chile/2005, Guatemala/2006 e São Domingos/2007 )
Capítulo I – O Direito à Cidadania na Sociedade do Conhecimento
Capítulo II – A Cidadania na Estratégia de Desenvolvimento do Capital Social
Capítulo III - Perfil da Política Pública de promoção da Cidadania Activa e
Inclusiva
Capítulo IV – Vectores de Operacionalização da Cidadania Activa e Inclusiva
Capítulo V – Uma Cidadania de Perfil Social
Parte II - Ângulos de apresentação do Tema a discussão académica
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas - ao Congresso Internacional da
Cibersociedade (promovido pelo Observatório da Cibersociedade - com decurso online de
Novembro a Dezembro de 2006, Barcelona, Espanha) e ao Colóquio Vivre na Europa- Filosofia,
Ciência e Política Hoje, Lisboa, IFP 29 31. 10.07, promovido pelo Centro de Filosofia das
Ciências da Universidade de Lisboa com a Embaixada de França, Lisboa, Portugal)
Capítulo I – Capital Social e Cidadania na Sociedade do Conhecimento
Capítulo II – Por um Novo Contrato Social: Uma perspectiva de inclusão social
para as comunidades
Livro II – Do Reconhecimento ao Conhecimento. O caminho: aprender
sempre
Por Maria Tereza Ventura
Capítulo I - Sistemas de informação e estratégias organizacionais: o impacte das
redes (extraído de Sistemas de Informação Organizacionais, Edições Sílabo, Lisboa,
2005).
Capítulo II Investigação-Acção em Formação Contínua. Formação de
Mediadores de Trabalho Colaborativo (extraído de Formação de Mediadores de
Trabalho Colaborativo – uma proposta para reconversão de Secretária(o)s -Edições da
Universidade Moderna, 2007.
Capítulo III -Formação de Mediadores de Trabalho Colaborativo na Sociedade
do Conhecimento – Constituição da Equipa Local do Projecto C&SC, CFCUL,
2008
Livro III - Abstracts, Anexos e Adendas aos Livros I e II
Por Maria Alfreda Cruz e Maria Tereza Ventura
Abstract 1 – Towards the Social Contract underlying the Knowledge Society
Abstract 2 – Towards an Approach of the Concepts
Abstract 3 – Colaborative training. Mediator Skills for Knowledge Society
Anexos – Feedback Básico Emergente dos Documentos do Portefólio de base da
Parceria do CFCUL com a Câmara Municipal de Montijo
Anexo 1 - O cenário RECCRIA_PROMOVE _RESISTE (GUIÃO)
Anexo 2 - Framework da Política Pública de Articulação da Cidadania à
Sociedade do Conhecimento
Anexo 3 - Referenciais do Portal de Cidadania Social
Anexo 4 - Modelo de Interacção de valências dum sítio de cidadania
Anexo 5 - As políticas públicas e sociais na articulação dos tipos de capitais
investidos no Desenvolvimento Integral.
Anexo 6 – Manual das páginas de abertura do Observatório do Cidadão
Anexo 7 - Projecto de Constituição de uma Bolsa Autárquica de Recursos de
Mediação
Adendas – Dimensões avaliativas
A - CLAD
B - Observatório da Cibersociedade
Equipa Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa
(CFCUL)
Cidadania & Sociedade do Conhecimento
Por um Novo Contrato Social
( Estado da Arte do Projecto C&SC)
Livro I
Do Princípio da realidade ao princípio da Possibilidade
Maria Alfreda Cruz
Lisboa, 28 de Maio de 2008
Índice
Nota Prévia
Livro I - Do Princípio da realidade ao princípio da Possibilidade
por Maria Alfreda Cruz
Parte I – Etapas de construção do Argumentário do Tema
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas com os mesmos títulos aos Congressos do
Centro Latino-americano para o Desenvolvimento sobre a Reforma do Estado e da
Administração Pública entre 2002 e 20007 (reunidos sucessivamente em Lisboa/2002,
Madrid/2004, Santiago do Chile/2005, Guatemala/2006 e São Domingos/2007 )
Capítulo I – O Direito à Cidadania na Sociedade do Conhecimento
Capítulo II – A Cidadania na Estratégia de Desenvolvimento do Capital Social
Capítulo III - Perfil da Política Pública de promoção da Cidadania Activa e
Inclusiva
Capítulo IV – Vectores de Operacionalização da Cidadania Activa e Inclusiva
Capítulo V – Uma Cidadania de Perfil Social
Parte II - Ângulos de apresentação do Tema a discussão académica
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas - ao Congresso Internacional da
Cibersociedade (promovido pelo Observatório da Cibersociedade - com decurso online de
Novembro a Dezembro de 2006, Barcelona, Espanha) e ao Colóquio Vivre na Europa- Filosofia,
Ciência e Política Hoje, Lisboa, IFP 29 31. 10.07, promovido pelo Centro de Filosofia das Ciências
da Universidade de Lisboa com a Embaixada de França, Lisboa, Portugal)
Capítulo I – Capital Social e Cidadania na Sociedade do Conhecimento
Capítulo II – Por um Novo Contrato Social: Uma perspectiva de inclusão social
para as comunidades
Síntese Biográfica da autora
Parte I – Etapas de construção do Argumentário do Tema
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas com os mesmos títulos aos Congressos do
Centro Latino-americano para o Desenvolvimento sobre a Reforma do Estado e da
Administração Pública entre 2002 e 20007 (reunidos sucessivamente em Lisboa/2002,
Madrid/2004, Santiago do Chile/2005, Guatemala/2006 e São Domingos/2007 )
O direito à cidadania na sociedade do
conhecimento
Maria Alfreda Cruz
VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
O direito à cidadania na sociedade do conhecimento
Maria Alfreda Cruz
INA - INSTITUTO NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO
2002
I - A cidadania enquanto direito social
Ao contrário do que parece ser o entendimento dos políticos com responsabilidade no exercício do
poder, a cidadania não é um modo espontâneo de ser e de estar em sociedade. Exige condições para ser
conscientizada, assumida e exercida, na teia dos laços que prendem um ser humano a cada um dos
outros e a todos em conjunto.
O conceito remete originariamente para os direitos e deveres de convivência na cidade e estendeu-se
paulatinamente da urbe para a sociedade, em geral. Mas não basta viver na cidade / na sociedade, para
se ser cidadão. É preciso que, numa e noutra, se integre, não podendo por isso ser exterior aos
protocolos formais e informais dessa convivência.
Estar integrado não significa estar conforme com todos. Significa poder estar ou não conforme com
regras que eles estruturam, assumi-las ou resistir-lhes, entendê-las, problematizá-las, discuti-las.
Significa por isso saber e poder optar. Significa participar e decidir – em conformidade ou não.
Significa ter subido a “escada” de construção do cidadão(1), na relação interactiva com aqueles com
quem vive em comunidades de pertença ou de opção.
Convivência e integração são assim os conceitos fundadores do de cidadania. O problema nunca é
simples, mas torna-se tanto mais complicado quanto mais diversificados forem os contextos da
socialização e mais fluidos forem os valores que subjazem aos protocolos que norteiam as dimensões
“civismo” e “exigência”. Os valores nunca foram absolutos: são apenas verdades teleológicas,
pertinentes portanto com o projecto referenciador das práticas individuais e sociais que constróem a
sociedade e as comunidades que a compõem. Quem fala de práticas, fala de quotidianos vividos no
espaço habitado, tanto mais estruturador quanto mais estruturado for na sedimentação dos seus registos
e na legibilidade dos seus sinais. No espaço habitado, as cidades constituem memórias legíveis: a
história pode ler-se nos monumentos das paisagens urbanas e nas estruturas territoriais que registam as
suas influências . Mas quem diz história, diz poder/poderes: o político, o económico, o jurisdicional, o
da comunicação, o da informação, susceptíveis de – conflituando ou não – imporem/implementarem/
gerirem/ concretizarem/ plasmarem os seus projectos nos territórios habitados / fruídos ou sofridos em
função deles. O balanço será “lido” consoante os níveis e estilos de vida em presença, mas, em
qualquer caso, as comunidades habitacionais dependem sempre da orgânica das infra-estruturas e
equipamentos que impõem o jogo da habitabilidade e da mobilidade do território, sedimentado ao
longo da história da sua organização
Acresce que a identificação deste com as comunidades deixa de ser linear quando o ambiente social se
desterritorializa no palco da globalização que todos hoje habitamos – uns como protagonistas, outros
como figurantes, outros ainda como peças de montagem de cena ou como subprodutos desta. A
civilização ainda se poderá definir como “conjunto de valores e técnicas de relação com a natureza e de
organização do espaço”, mas é na lógica de funcionamento da rede de cidades propulsoras do poder
económico e financeiro que domina o mundo, que deve buscar-se o sentido dos quotidianos vividos
pela nova estrutura de classes que o habita, não importa onde.
A metapólis será então essa rede de metrópoles que, à escala planetária, estrutura, como projecto da
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
pós-modernidade, a ubiquidade de uma informação capaz de unificar uma perspectiva global de
sociedade fundada nos valores consentidos pela lógica dessa perspectiva. Isso remete para o próprio
questionamento do modo de ser da Sociedade do Conhecimento que habitamos, onde emergem novas
injustiças fundadas na apropriação diferencial deste mesmo Conhecimento, pela estrutura social forjada
pelas ancestrais relações de trabalho e dominação e onde a subversão dos valores que fundaram um
outro modo de ser se justapõe à mutação das regras de jogo do funcionamento económico de hoje.
Partilha- se um quotidiano, onde as indústrias de lazer e a estimulação do consumo substituem a lógica
de produção esforçada e o comedimento em face do outro, o que justifica que os sete pecados capitais
de Dante se volvam hoje em acicates de adesão às novas regras com que o mercado impõe o desejo,
como função da liberdade. A preguiça, a avareza, a inveja, a gula, a luxúria, o orgulho e a ira faziam
mais sentido como estigmas das velhas economias que evoluíram da Idade Média às várias formas do
capitalismo, do que no pós-industrialismo:
- onde o consumo do lúdico é a oferta crucial da actividade das principais cidades entre as 0 as 6 horas
dos dias de trabalho ...
- onde a competitividade entre as empresas e os actores sociais estimula a ambição autista da
acumulação de proventos e lucros ...
- onde a inveja se transmudou em emulação, como regra de jogo do escalonamento social...
-- onde o orgulho é a sua decorrência e o fundamento dos poderes autocráticos, qualquer que seja a
escala do seu exercício...
- onde a gula é a mola das principais indústrias de consumo corrente e da organização de muitas das
empresas monopolistas de hoje...
- onde a promoção da luxúria fundamenta alguns dos mais rentáveis investimentos na exploração
antropológica da natureza humana ...
- onde, finalmente, a ira substitui as práticas de interacção construtivas que fundam os laços da
sociabilidade e o sentido de missão das expedições guerreiras que moldaram a geopolítica de outróra.
Logo:
I - Se a cidadania for o processo de equacionar e praticar a interacção entre direitos e deveres que
prendem os indivíduos aos seus grupos de pertença e de escolha, nos contextos vivenciais da
comunidade e da sociedade em que se movem...
-...e se são os valores que estruturam os protocolos dos direitos e deveres de tais convivências...
ƒ ...faz ainda sentido falar da consistência de valores na teia de registos, de mensagens
e de sinais contraditórios da nossa contemporaneidade? – é a questão.
ƒ E, se não fizer, de que se fala quando se fala de cidadania?
II - Se assumirmos como validado que, na criação de laços de socialização, será sempre possível
encontrar um punhado de referências pertinentes com o objectivo de um ser humano se incluir em
comunidades de pertença ou de escolha – e essa é a resposta provisória à questão:
... será possível assumir, nesse quadro, um protocolo que abstraia da teia de
dependências que ligam a comunidade à sociedade e à globalidade mundializada?
ƒ E se não for, haverá cidadania sem capacidade de problematizar essa mesma
globalidade, seja ou não para lhe encontrar rumos ou alternativas?
III - Se assumirmos que só há cidadania desde que essa capacidade se verifique,
( subscrevendo quatro hipóteses, a saber:
ƒ 1 – que a consciência de direitos e deveres comporta a identificação de soluções
múltiplas sobre as quais haverá que tomar posição em função dos valores e
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
ƒ
ƒ
ƒ
interesses subscritos;
2 – que a capacidade de avaliar e decidir sobre alternativas de escolha varia com o
capital cultural de que cada um dispõe e que esse capital depende da posição de
cada um na estrutura social que o integra;
3 – que a referida capacidade exige conhecimento activo e criativo com implicação
do próprio projecto de ser cidadão;
4 – que é possível desenvolver esse conhecimento em qualquer etapa da vida)
-... será possível:
a) ignorar o determinismo de classes que estrutura a diversificação de possibilidades e
de interesses?
b) esperar que a cidadania se generalize como possibilidade, sem que seja dotada de
recursos indispensáveis a habilitar os indivíduos menos preparados a assumirem o
seu papel de cidadãos?
ƒ
E se não for, que recursos serão estratégicos para fomentar e generalizar quer as
competências estruturantes de uma tal habilitação, quer a consciência da vantagem
social de as adquirir?
De facto, sendo as supracitadas hipóteses emergentes, convém identificar se a prática social tem ido ou
não no sentido de as validar. Essa prática - desenvolvida num quadro conflitual de valores, em
situações que vão da anomia à pertença a grupos e comunidades das mais variadas configurações e
códigos comportamentais – tem vindo a configurar uma tal validação, em termos de demarcação da
fronteira entre as pessoas que se encontram fora ou dentro do quadro de habilitação que potencie tais
capacidades. Independentemente das abordagens das causas, nas situações concretas em que os
observadores avaliam as tensões desencadeadas nos seus quotidianos ou na globalidade que os “media”
lhes apresentam, percebe-se que, ser ou não excluído dessa habilitação, é um factor relevante de
precariedade e de pauperização para quem as sofre e um factor de tensão e insegurança para todos.
Acresce que, na teoria dos direitos humanos que se têm vindo a desenvolver e a sedimentar em
gerações e tipos de exigências dos indivíduos perante a sociedade e as estruturas do seu governo e da
sua governação, o direito à cidadania coloca problemas novos e abrangentes de todos os outros.
Aqui chegados, convém salientar que não estou a pôr o problema a partir do campo das teorias de
Administração Pública. Estou antes a falar do direito de toda a gente a essa habilitação, num paradigma
que seja o da cidadania activa e inclusiva, apta para capacitar os sujeitos a ajuizarem das situações em
que se encontram e a partilharem as decisões com impacto nas suas vidas. Em tempo de globalização
incontornável, é difícil perceber se alguma coisa fica fora do círculo que as demarca.
Sujeito quer dizer indivíduo capaz de gerar e de gerir o seu próprio projecto de vida. A grande questão
de uma socialização que o reconheça é saber facultar-lhe competências que balizem a diferença entre
um projecto de vida e os interesses rotineiros da comodidade, e saber incentivá-lo a inserir nesse
projecto a aquisição de conteúdos de conhecimento operacionais e universalizantes, que possam
mostrar-lhe como abordar a vida.
Isto quer dizer que encarar o indivíduo ou o colectivo como sujeito, significa reconhecer-lhe o direito
de aprender a apropriar-se do sentido das evidências e das não-evidências – ou seja a trabalhar o
semântico, na perspectiva de aprender a interpretar o que vê em referência à pauta de registos que o
habilite a tornar-se parceiro dos que a utilizam.
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
É aqui que começamos a falar de prevalência da aprendizagem em qualquer processo formativo,
formal ou informal, dirigido ou não a finalidades específicas. Nesta perspectiva, a capacidade de
iniciativa na identificação dos temas e problemas a configurar em sede de conhecimento objectivo
cabe, na triangulação interactiva, ao pólo destinatário do processo.
Do projecto de um sujeito, pode fazer parte a intenção de se qualificar como cidadão. De facto, ser
cidadão não é apenas uma questão de acesso à prática da cidadania – é também uma questão de desejo.
O exercício da cidadania, além de ter de ser possível a todos, é também passível de ser entendido como
um direito. Um direito de qualificação individual para participar na esfera social e política – um direito
social que joga contra a alienação individual e, na medida em que o individual interfira na polis, é um
direito que joga contra a alienação política, no sentido mais nobre do termo.
II - Uma política pública para a Cidadania
Numa modernidade avançada, a cidadania alarga o espectro das palavras-chave “direitos/deveres” no
contexto territorializado, gerido por um Governo que os reconhece e estabelece (acepção tradicional de
cidadania) para englobar as palavras-chave de “responsabilidade” e “participação nos poderes”,
exercidos em diversos contextos de governação ( cidadania emergente). Neste crescendo, também a
escala da “exigência dos direitos” se alarga das formas locais e estatais de “convivências” reportadas
aos territórios que os sujeitos habitam, para a fluidez das formas globais e virtuais que lhes sejam
transversais. A participação cidadã, chave da nova postura de políticas públicas que subscrevam a
aliança dos poderes instituidos com o poder emergente e informal da cidadania, assume-se perante eles,
enquanto sujeito activo de decisão.
Assim:
I - Partindo do entendimento de que a responsabilidade é a capacidade de assumir direitos versus
deveres no contexto das situações vividas em concreto, uma cultura de responsabilidade
compartilhada é interdependente da criação de condições gerais para a fruição do bem-estar em que
os direitos se relevam e operacionalizam;
II - isolando a responsabilidade como cerne de uma cultura, sociologicamente definida como o
sentido dado às práticas sociais que relacionam entre si os sujeitos, e partindo da definição de sujeito
enquanto entidade portadora de consciência reflexiva;
assumimos que este detenha a capacidade de gerar e de gerir, na tensão dos direitos e deveres,
expectativas de vida que satisfaçam simultaneamente ao próprio e a essa relação;
Qualquer que seja o grau de complexidade e de abertura dos laços que inter-relacionam os sujeitos, a
responsabilidade exprime-se sempre na dimensão singular, que individualiza a relação de cada sujeito
consigo mesmo, e na dimensão relacional, em que se interage com os outros e com a universalidade
que ele conheça e em que se projecte, quer no espaço, quer no tempo.
As políticas públicas permitem problematizar a inter-relação das responsabilidades dos indivíduos e do
Estado. A leitura que fazemos de um tal desafio baseia-se na equação de um modelo (Anexo I), que
permita estabelecer as consonâncias pertinentes com as hipóteses antes enunciadas. Identificando os
referentes da responsabilidade dos indivíduos e do Estado, enquanto sujeitos ou actores sociais, a
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
esquematização do seu inter-relacionamento permite-nos pôr em confronto as categorias de análise dos
valores e atitudes que exprimem os princípios dos primeiros e os comportamentos expressos pelas
políticas públicas, a que o segundo pode recorrer para lhes fazer face.
A homotetia identificada no esquema (Anexo I), permite a leitura de que ao Estado incumbe garantir o
conjunto de procedimentos de justiça e de cuidado que todos possam reconhecer como mobilizadores
de comportamentos compatíveis com uma vida de relação positiva e com a decorrente autoestima.
Estas são condições indispensáveis ao civismo e à cidadania, conceito este abrangente daquele, ainda
que, como orientação de conduta, releve os valores concientizados sobre as regras subscritas na
convivialidade.
Permita–se-nos ainda a leitura de que só um Estado que assuma a Sociedade como alter-ego ( “O
Estado somos todos nós”...) pode estabelecer um contrato social, fundado em valores
constitucionalmente explicitados e vinculativos do exercício da justiça e dos cuidados facilitadores das
práticas sociais que se situem em registos de civismo e de cidadania. A ser assim, as leis e os
normativos de relação com os indivíduos terão de ter expressão efectiva em políticas públicas que
enquadrem a vida de relação com os outros e com os espaços reais ou virtuais em que esta se projecta.
São elas, as políticas públicas, que constituem o denominador comum das várias acepções atribuídas à
noção de serviço público, na medida em que - qualquer que seja o perfil a que este corresponda, de
acordo com a opção macropolítica que o oriente - lhes compete sempre a elas a função de formular os
objectivos da produção e fruição dos bens públicos. Do mesmo modo, é também a elas que compete
garantir – no enquadramento de um projecto coerente com os valores constitucionalmente assumidos
com/pela sociedade – a operacionalização dos compromissos e o acesso dos destinatários aos
resultados contratualizados na fase de decisão promotora do processo.
III - Um Observatório para o Cidadão
Assumida a cidadania como direito social e geral, exercitável na complexa teia das registos
culturais da nossa contemporaneidade, em registo de liberdade responsável que evite a desregulação
das causas pelos interesses, torna-se indispensável uma política pública que assegure o seu acesso a
todos, no enquadramento legal que motive e esclareça as regras de jogo desse direito. Exercida no
campo da vida quotidiana, a cidadania activa centra-se na relação com as políticas de educação e de
comunicação versus as de modernização e desenvolvimento, em tensão dialéctica com as de
resolução das desigualdades sociais e de oportunidades. Nessa teia mobiliza competências sociais e
culturais em quadro polarizado, por um lado, pelas políticas e experiências que emanam das
metodologias de formação difundidas pelo Estado e, por outro, pelos movimentos sociais que as
assumem ou rejeitam. Na Sociedade do Conhecimento de hoje, a cultura científica e tecnológica
omnipresente, deve então ser encarada como problema e recurso. “Tem hoje a ver” - lê-se no site da
Cultura Científica e Sociedade do Conhecimento(3) – “ com praticamente todos os domínios da vida
social ...porque os processos de incorporação intensificada de tecnologias de base científica na
produção económica, nos modos de vida e nos sistemas de regulação institucional têm vindo a
acentuar-lhes a relevância social. Basta mencionar domínios como os do desenvolvimento
económico e da competitividade internacional, da educação e da formação, das qualificações e da
empregabilidade, do ambiente e da qualidade da vida, da mediatização da sociedade e da
reconfiguração dos estilos de vida, das dinâmicas culturais e dos movimentos sociais, da
participação democrática e do exercício da cidadania”…
Sendo a cidadania reconhecida neste âmbito, pela própria comunidade científica, como lida o Estado
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
português com tal responsabilidade, em face designadamente das obrigações criadas também neste
domínio pelos seus parceiros comunitários? Encarando a escola como a instituição promotora da
problematização de cidadania. Que essa problematização se adeque à escola, não se duvida. Que ela
seja eficaz nesse domínio, sim – desde já, porque o seu objecto é limitado no quadro extensivo e
abrangente da vida social. Mesmo admitindo que algo se corrija, na reprodução das desigualdades
sociais, com as pedagogias emergentes da escola moderna, educar para a cidadania não abarca a
mole imensa de excluídos do seu exercício, que são precisamente aqueles que a abandona(ra)m ao
longo do frustrante percurso que nela empreenderam.
A escola que constitua pedra basilar de uma política cultural credível - precisamente aquela que
situa do lado da procura social a exigência de qualidade da produção cultural - faz parte mas não
esgota o universo do campo educativo, já que o desenvolvimento de capacidades e de competências
individuais e grupais passa também pelo exemplo e pelos métodos de instituições e organizações de
outro tipo que - constituídas em torno de problemáticas mobilizadoras e experienciáveis -,
assumem, em geral, práticas educativas informais. As associações estão neste caso, com as suas
práticas de animação e um empenhamento que implica os indivíduos como sujeitos, em dinâmicas
sociais concretas. Mas contra a situação em que se encontram os indivíduos privados dos mais
elementares níveis de qualidade de vida e de direitos, simples recursos braçais e descartáveis de
uma economia de rosto desumano, urge ir mais longe.
De facto de entre os poderes do cidadão, em situação e registo de cidadania activa, integra-se os de:
- fruir e produzir informação, percorrendo o campo da percepção e consciência do que subjaz às
políticas públicas e ao diagnóstico das situações abordadas;
- estabelecer alianças em partenariados eficazes, visando intervenções conjuntas e em simbiose,
nas matérias de qualidade de vida, protecção de direitos e produção de conhecimento;
- exigir a consistência das instituições com as missões que lhes são atrbuídas, no contexto de
uma cultura de responsabilidade vinculativa de todos os participantes em presença.
A política pública de criação de redes sociais, desde que implique respeito pela iniciativa da
sociedade civil na equação de projectos de intervenção, mobilizadores da cidadania activa, deve ser
assumida, nessa perspectiva, como abertura a possibilidades de livre iniciativa aos parceiros que a
pretendam pôr de pé. Ao cidadão que nelas se implique deve assegurar-se meios não só de se
envolver nas suas práticas, mas também de as avaliar e ponderar, com recurso a formação
disponível e adequada para esse efeito. Um sítio deve por isso fundar-se nessa perspectiva e
polarizar a sua actividade em torno da captação, análise e produção de informação que sirva não só
ao diagnóstico, mas à equação de projectos e propostas de futuro, com o âmbito e o alcance a que o
colectivo - em formação contínua, por adesão perfilhada - conseguir chegar.
Para que possa optar por alternativas em confronto, os cidadãos precisam de se empenhar
afectivamente em projecto de ser e de estar em comunidade aprendente, de se envolver
cognitivamente no seu desenvolvimento, de aprender a observar e a interpretar a verdade e as suas
prospectivas. Cada sítio corresponde assim à montagem e gestão de um observatório, dirigido pelos
cidadãos para cada um deles em concreto e para o colectivo da comunidade: um observatório para
o cidadão.
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
Documento Libre
IV – A rede de sítios de cidadania
Não se faça a leitura do exposto, que se pretende fazer de cada cidadão um cientista – a comunidade
científica não precisa de se preocupar com tal arrojo... Todavia, o pensamento da modernidade
avançada /pós-modernidade, adquiriu já o consenso de que os conhecimentos em registo científico e
em registo de senso comum interagem por intermédio de uma dimensão cultural comum que
“sensocomuniza” os primeiros e os devolve às práticas científicas, já reciclados pelas práticas
sociais vulgares, para que o seu desenvolvimento se promova e adeque à procura e exigências
societais.
A Sociedade do Conhecimento, nos termos massivos em que implica os recursos das novas
tecnologias na comunicação interactiva em tempo real, potencia condições para o consumo e a
produção de informação nos mais diversos domínios a que teoricamente todos podem ter acesso,
mas só alguns o conseguem, porque os meios cognitivos e instrumentais só são acessíveis a uma
minoria. Por isso, a exclusão social comporta hoje a valência da info-exclusão em termos que
reforçam as condições de sempre. E, no entanto, esta é pelo menos teoricamente, a dimensão em que
se pode intervir mais generalizadamente e sobretudo com mais impactos expectáveis em todas as
outras. De facto, a comunicação interactiva a distância que passa pela consola do computador e pela
destreza de manuseamento, interpretação e reconstrução da informação de que ele é mediador, é um
dado adquirido da penetração da sociedade pelas novas tecnologias. A sua importância em todos os
ambientes de socialização com impacto nas orgânicas societais, é absolutamente incontornável. O
que aqui se discute é o modelo da sua utilização, fruição e consumo, o modo de os restringir a uma
minoria, encaminhada para lhe poder aceder e a forma de tornar a educação e a formação, enquanto
vectores de socialização dirigida, o instrumento de uma tal política.
A opção pela inclusão dos excluídos na problemática da cidade e da cidadania deve, pelo contrário,
nortear a formulação de políticas com carácter de urgência, neste como noutros domínios. Dispor de
sítios adequados à reunião, produção e utilização de informação objectiva e utilizável na formação
de opinião e de intervenção na gestão pública do quotidiano, é indispensável à reconstituição de uma
democracia que não se inscreva na tentação totalizante da globalização economicista vigente. O
conceito de sítio remete para o de rede, sistema e pólo, tem como paradigma a flexibilidade de
organização do mundo contemporâneo e como referencial o site da Internet. No tocante à cidadania,
foi apropriado pela Comunidade Europeia, em política diferenciadamente posta em prática,
consoante o perfil e características de envolvimento de cada país na cultura de participação no
poder. A experiência portuguesa (4), ainda em fase de avaliação, elegeu como “sítio” a rede de
projectos disseminados nas diversas escolas da área da Grande Lisboa que aderiram ao repto. Aquilo
que aqui se defende não o contradita, mas aponta para outra vertente: a da formação em cidadania,
com o perfil de formação em exercício, aberta a todos e como política de recusa de exclusões.
Instrumento de acesso ao conhecimento e ao processo de formação de opinião e de habilitação à
decisão informada, o sítio de cidadania poderá ser pólo:
- de resistência à desterritorialização, enquanto modo de descaracterização de identidades
fundadas nas práticas sociais do habitat ;
- de conscientização glocal dos problemas;
- de produção de conhecimento problematizador das situações observadas /experienciadas nos
quadros de referência de pesquisa/acção.
Enquanto infraestrutura social da polis, o sítio de cidadania – fisicamente sediado e equipado com
recurso ao envolvimento autárquico, seja como promotor ou aderente da iniciativa mobilizadora - pode
7
VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
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implicar-se na territorialização das políticas públicas, incluindo as de planeamento e de gestão
orçamental dos planos anuais que interfiram com o quotidiano, da polis aos “polis”, do centro urbano
ao subúrbio, do condomínio ao “bairro”. Enquanto recurso político, será ele o elo do bairro à metapolis,
se se dotar de recursos estratégicos para o efeito, recriando continuamente a cidadania activa,
promovendo projectos mobilizadores de vida, apoiados na actividade educativa, resistindo aos ditames
de uma globalização predatória do trabalho e da cultura que nele se enraíza. E isto pode ser uma
proposta fracturante da evolução na continuidade conflitual dos nossos dias.
Equacionemos então uma política de interacção consistente entre serviços de apoio público à
procura e à oferta de cidadania activa. Isso implica:
1. Do lado da procura :
-
Defender a urgência da decisão parlamentar de criar o Observatório da Cidadania, como
recurso político de promoção da cidadania activa e inclusiva na sociedade portuguesa.
-
Estimular a implementação voluntária de sítios locais de habilitação para a cidadania,
articuláveis em redes interactivas, nas dimensões: de inclusão activa, apoio à estruturação de
projectos de vida e de habilitação para a empregabilidade. Configuremo-las semanticamente
como:
- RECCRIA - rede de criação de inclusão activa
( enquanto processo de resistência à exclusão social nos vários domínios da sua incidência )
-
PROMOVE – rede de projectos mobilizadores de vida, apoiados na actividade educativa
( enquanto processo de desenvolvimento contínuo de capacidades e de competências)
- RESISTE – rede de acesso ao sistema de trabalho/emprego.
( enquanto processo mobilizador de actividades laborais, certificáveis pelo sistema público de
formação de adultos )
2. Do lado da oferta:
- Produção de emprego, fundada na gestão das oportunidades emergentes dos dispositivos legais
e políticos existentes e exigíveis no quadro de funcionamento do serviço público :
- ao nível das funções e competências do Estado Central, responsabilizado pela AR;
- ao nível das redes sociais potenciadas pelas comunidades junto das Autarquias locais
e dos serviços desconcentrados do Estado.
- Implementação do Observatório da Cidadania, enquanto sistema integrador das redes de sítios
em funcionamento, e aberto à utilização ponderada da informação pelos cidadãos, no
desenvolvimento dos seus próprios projectos.
O Mod(el)o de interacção oferta/procura sublinha:
-
investimento do Aparelho de Estado em recursos humanos, técnicos e tecnológicos, adequados
ao provimento das redes de sítios de cidadania;
receptividade aos movimentos sociais na perspectiva de uma democracia accionada pelos vários
pólos de formação da decisão;
fomento da educação como estratégia de vida, na qual a escola formal seja assumida como caso
8
VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
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-
particular do acesso aos modos de aquisição de conhecimento, tendencialmente distribuído pelo
conjunto de práticas de socialização educacional, assumidas no contexto cultural de hoje;
apelo às Autarquias locais na receptividade aos movimentos sociais e à implementação de redes
sociais de suporte à integração do serviço público indispensável ao provimento generalizado da
cidadania.
É este o modelo que propomos, para que a cidadania deixe de ser um privilégio, num processo de
globalização produtor de uma info-exclusão capaz de acelerar as restantes dimensões de segregação
social. E para que a democracia poliárquica – enquanto forma de poder distribuído pelas comunidades
que o reivindiquem – obste à tentação totalizante de uma Sociedade do Conhecimento que se autorepresenta e reproduz “ como gigantesca prova de natação, destinada a afogar a maior parte, para
depois premiar os vencedores”(5).
V-Um serviço público para a cidadania
“Excluido.com” – dizia NEGROPONTE num seminário da Universidade do Minho, em 2000, sobre o
investimento das NTIC no ensino, é o novo endereço da precarização social, se muita coisa não mudar
no modo de ser da escola e de todas as estruturas de formação de recursos humanos. De facto, o que
está em causa hoje é exigir que o Estado assuma contra essa perspectiva uma política pública do
conhecimento e, nesse âmbito, a escola seja apenas um caso, ainda que o mais emblemático, da sua
operacionalização educacional. Outras instâncias urgem, neste mesmo registo de implementação de
uma cidadania activa, em articulação a todos os outros sítios de sociabilidade e de formação adequada
ao autocontrole dos saberes e ao desempenho de funções que redensifiquem o mundo do trabalho. Os
modos de assumir tais desafios terão de ser diversificados, mas o enquadramento estratégico das
parcerias possíveis compete ao Estado que se queira de direito. Porque se trata de reconhecer direitos,
compete-lhe promover os serviços que assegurem o seu exercício, mesmo que o mercado lhes não
reconheça interesse, e situar nesse âmbito a escola de massas, diferenciada de modo a que as
aprendizagens sejam significativas para todos, quaisquer que sejam as diferenças que à partida, os
alunos manifestem.
Assumo assim a praticabilidade de uma utopia reivindicativa dos meios para se rejeitar uma política
fraccionista, que será sempre a que, permitindo que se mantenha a fronteira entre os que sabem/podem
e os que não sabem nem podem exercer os seus direitos de cidadania, sustente as novas dimensões de
desperdício de recursos humanos que passam pela info-exclusão e pela mutação de paradigmas
associados à Socidade do Conhecimento. De facto, enquanto se fala de competitividade e de
produtividade à maneira neotaylorista do século passado, emerge perante os nossos olhos um novo
modelo cultural de raiz tecnológica que comporta :
- nova percepção da relação entre espaço e tempo que exige a reconceptualização de tais conceitos;
- novas linguagens inerentes às novas teconologias e à sua implicação nos media, nomeadamente
através do exercício de leitura das novas simbologias, patenteadas por eles;
-aprofundamento da relacionalidade da razão com a emoção, implicada na criatividade e na
inovação;
-consciência, ainda que difusa, de que novos modos de inteligibilidade decorrerão da primazia
crescente do “virtual” sobre o “real”.
Atendendo a tais desafios, é essencial assumir os pressupostos da inclusão social que relancem a
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política de inovação, com apelo a pedagogias de projecto e as práticas pedagógicas centradas na
articulação de registos de conhecimento e de linguagens dos actores sociais. Em todos os locais de
habilitação para a cidadania, haverá que recorrer a uma animação cultural ponderada e integrada nos
protocolos da investigação-acção. Na escola ou fora dela, em todos os sítios onde tenha sentido centrar
a educação formal e informal na dinâmica da polis, transformando em educadoras as cidades digitais e
em sítio de cidadania alargada as lojas e guichets de alguns cidadãos, poderá a partir daqui evitar-se a
fractura cognitiva entre quadros e trabalhadores descartáveis. Sem o que o e-government com que os
Governos procuram pôr a Administração Pública em linha, poupando “trabalho vivo”, servirá apenas à
sua relação directa com a os perfis de cidadão que ela própria reconhece na consola dos computadores
pessoais ou institucionais.
Só no âmbito de uma política pública que responsabilize o Estado perante a sociedade pela
substituição de uma tal estratégia, será possível accionar todos os sítios de cidadania que a Sociedade
de Informação hoje permite, de modo a transformá-la nessa Sociedade de Conhecimento que se supõe
habilitável aos desafios da cidadania activa, construtora da polis. Isso implica muito investimento na
formação de quadros, meio aliás de defrontar a recessividade do emprego qualificado, como o docente,
que, de outro modo, está no terreno para durar. Mas é fundamental consciencializarmo-nos, com J.
PEDRO DA PONTE (1998, p.281) de que “ a realidade tem mostrado que o voluntarismo e as propostas
ingénuas estão muito longe de chegar para conduzir aos resultados desejados. Por isso, também na
formação é preciso um suporte de conhecimento gerado pela investigação”. A função desta numa
política pública de conhecimento é aliás transversal a todos os domínios com que ela se articule, em
registo de investigação-acção.
Em síntese, apelando às múltiplas dimensões das ciências sociais e de investigação científica aplicadas
à análise decisional, o modelo que defendemos permite, a partir duma formulação semântica objectiva,
identificar a tipologia dos recursos que mobilizará a articulação da rede de sítios de cidadania aos
restantes vectores da defesa dos cidadãos, bem como as categorias de impactos e os pressupostos gerais
da política pública que o deverá fundar (Anexo II). A sua representação ideográfica permite visualizar a
interactividade das suas dimensões essenciais (Anexo III). Mas para que as redes não sejam simples
“arquitecturas de fuga” às responsabilidades sociais, individuais e estatais, é fundamental que a
cidadania activa se funde nos protocolos que alargam a semântica da cidadania clássica - fundada na
tensão entre direitos e deveres -, à da cidadania emergente - fundada na tensão entre o exercício dos
poderes e a ética da responsabilidade. E uma tal complexidade é matéria que implica a responsabilidade
do Estado e um serviço que realize a política pública do conhecimento para todos, matriz da inclusão
dos nossos dias. Para que todos possam assumir os seus direitos de cidadania activa, desde que,
conhecendo o que está em causa, o desejem e para isso se mobilizem.
Referências do texto
(1) cf. ROGER HART, in Actas do Congresso de Educação Ambiental e Contemporaneidade, U.M./IIE (2000)
(2) cf. M.Alfreda CRUZ (2001), in http://www.iie.min-edu.pt/rec/dudh/encontro/index.htm
(3) cf. Apresentação do site CCSC em http://ccsc.iscte.pt
(4) cf. Relatório Final do Grupo Português de Acompanhamento do Projecto ” Educação para a Cidadania Democrática,
Lisboa, GAERI, 2001
(5) cf. CALVET DE MAGALHÃES ( dos jornais /1972)
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VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8 - 11 de Oct. 2002
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A cidadania na estratégia de desenvolvimento do
capital social
Maria Alfreda Cruz Viana
Instituto Nacional de Administração
Departamento de Investigação e Desenvolvimento
Programa Sabáticas 2001-2004
IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública, Madrid, España, 2 -5 Nov. 2004
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Documento Libre
A cidadania na estratégia de desenvolvimento do capital social
Maria Alfreda Cruz Viana
Instituto Nacional de Administração
Departamento de Investigação e Desenvolvimento
Programa Sabáticas 2001-2004
O tema, a questão e o contexto
“ In the knowledge lies the power”
FEIGENBAUM (1980)
O presente estudo sequencia-se àquele que, em 2002, a autora apresentou como comunicação ao VII Congresso
do CLAD – Centro Latino e Americano para o Desenvolvimento – realizado em Lisboa de 8 a 11 de Outubro
desse ano e intitulado O Direito à Cidadania na Sociedade do Conhecimento. De facto, enquanto história e
projecto de uma utopia útil, nos termos em que este conceito é validado na epistemologia das ciências sociais, o
direito à cidadania numa Sociedade do Conhecimento assume como necessidade a estratégia do
desenvolvimento do capital social, enquanto componente dum desenvolvimento sustentável, tese que a autora
tem vindo a subscrever na rota do seu desenvolvimento curricular no campo temático em questão, conforme se
infere das referências bibliográficas que lhe concernem. Que um serviço público assuma a necessidade de se
distribuir em redes virtuais com suporte em pivôs territorializados é o vector comum ao presente estudo e ao
assinado em 2002. Que esse serviço possa emergir no contexto de uma governação da modernidade avançada,
susceptível de colocar o país na agenda da paz social e na rota da estratégia de Lisboa, é o desafio a que o
processo de implementação deste projecto se poderia propor, desde que estruturalmente suportado por um
sistema de formação ao longo da vida dos quadros de investigação e de mediadores de animação sociocultural
que em níveis diferenciados se habilitassem, em sedes próprias, para a promoção das funções adequadas ao
funcionamento da rede de cidadania que aqui se preconiza.
I
Educar e formar: uma política pública de I&D para a reorganização do capital social
A formação de quadros em sede de inovação - No contexto descrito, o que está em causa é defender
que o Estado assuma a política pública do conhecimento e, nessa perspectiva, a própria instituição
escolar deve ser considerada apenas como um caso, ainda que o mais emblemático, da
operacionalização educativa do conhecimento. Outras instâncias urgem, neste mesmo registo de
aprendizagem responsável em clima de cidadania activa, o que comporta a articulação a todos os
outros modos de produção formativa, desde os sítios de sociabilidade produtora de capital social aos
de formação clássica, adequando as práticas ao autocontrole dos saberes e ao desempenho de funções
que densifiquem o mundo do trabalho. A adução de uma tal perspectiva aos modos de formação
clássica, poderá ter pertinência acrescida sobretudo se potenciar relações produtivas com o modo
laboral - que faculta a habilitação em exercício, em contexto de trabalho formatado - e com o modo
social, de que decorre a habilitação pelo exercício de actividades informais certificáveis. Nesta trilogia
de sustentação do modelo de sítio de cidadania social que defendemos1, as formas de assumir os
desafios terão pois de ser diversificados, mas o enquadramento estratégico das coexistências possíveis e
das parcerias que as possibilitem compete ao Estado que se queira de direito. Porque se trata de
apetrechar o Poder para reconhecer direitos, compete à sociedade esperar que ele promova os serviços
que assegurem os bens públicos, mesmo que o mercado lhes não reconheça interesse, e nisso se inclui
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Maria Alfreda Cruz, “O Direito à Cidadania na Sociedade do Conhecimento”, comunicação INA ao VIII Congresso
CLAD, Lisboa, 2002.
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a moderna escola de massas, diferenciada de modo a que as aprendizagens sejam significativas para
todos, quaisquer que sejam as diferenças que à partida, os alunos manifestem.
Investir este conceito de escola moderna em todos os locais em que se formalizem aprendizagens
creditadas e certificáveis é a mola real da institucionalização do conceito de educação ao longo da vida,
formando paralelamente os destinatários enquanto sujeitos activos da própria aprendizagem e
capacitando-os desse modo para o desenvolvimento da própria personalidade, em contexto de
interactividade com os saberes e com aqueles com quem os partilha2. E é no âmbito de uma tal política
e de um tal entendimento que a escola formal pode ter um papel potenciador de uma nova ordem
cognoscente, susceptível de contribuir nos seus próprios termos para organizar a Sociedade do
Conhecimento, enquanto sociedade de aprendizagem activa do saber saber, fazer, estar e ser, em todos
os territórios vivenciais da contemporaneidade. A escola é porém apenas um caso e só nessa
perspectiva poderá ser um paradigma na transmissão, interpretação e transformação de saberes. Mas é
pelo conjunto das redes de produção de aprendizagens, formais ou não, que passa a construção
integrada dos vários registos do saber, incluindo o da cidadania, como processo de equação de direitos
versus deveres de cada um, na interactividade e transacção com os outros, de modo a não os utilizar
como recurso inerte ou escape de frustrações e desnortes. A cada um caberá fazer as suas escolhas,
boas ou más, para o consenso cultural da maioria, mas sem ser condicionado a faze-las pelos ditames
de uma orgânica que só sobrevive desde que possa encaminhar os seres humanos para destinos que a
ela servem mas que eles nem reiteram nem escolhem por iniciativa própria.
Nesta perspectiva, faz sentido, na escola formal ou fora dela, centrar a educação na dinâmica da polis,
transformando em educadoras as cidades digitais e em sítios de cidadania alargada, as lojas e guichets
do segmento de cidadãos que a governação encara como clientes dos seus serviços. Assumir os
pressupostos da inclusão escolar que relancem a política de inovação, com apelo a pedagogias de
projecto fundadas em práticas centradas na articulação de registos de conhecimento e das linguagens de
expressão dos actores sociais, implica o recurso a uma animação cultural integrada nos protocolos e
procedimentos da investigação-acção. A nossa tese é a de que nesses procedimentos é possível
ancorar-se uma cultura de responsabilidade inter-activa que potencie a extensificação da cidadania e
alicerce o desenvolvimento do capital social.
O conceito de cidadania cognitiva3 – A dupla perspectiva de que o conhecimento deve ser entendido
não apenas como recurso para o progresso cognitivo dos que o adquirem, mas também como bagagem
da capacitação para a cidadania, subjaz ao posicionamento da UNESCO (1997), segundo o qual a
educação deve servir a sociedade no sentido moral, crítico e cognitivo. A complexidade decorrente da
transversalidade necessária à abrangência dos temas e das suas implicações na relação com a
sociedade, implica a interdisciplinaridade que se consubstancia no movimento de integração dos
aspectos disciplinares susceptíveis de se inter-relacionarem para esse fim, mas sem que um tal
movimento seja alternativo ao aprofundamento das investigações, pedagogias e didácticas especificas
aos conteúdos científicos em presença, dado que estes cumprem os compromissos inerentes à sua
própria evolução.
2
Maria Alfreda Cruz, “ O mercado interno europeu do conhecimento e a perspectiva da cidadania activa e inclusiva”,
Galileu. Revista de Economia e Direito cit. Esta postura articula-se à de Bento de Jesus Caraça, paladino de um modelo de
estimulação de procura do conhecimento com contornos específicos ao país que éramos e à situação da problemática do
trabalho na sua época, mas já Fialho de Almeida na aurora da República defendia a necessidade de mudar a sociedade com
recurso ao modelo das Universidades populares ( Explore-se também o pensamento de Ortega e Gasset sobre matéria afim).
3
J. ALBERTO CORREIA, “ Formação e Mundo do Trabalho. Novos Papeis dos Formadores”, Conferência do Ciclo
Educar e Formar. Mutações e Convergências dum Campo Profissional, Fac. de Psicologia e Ciências da Educação/UL e
Instituto de Emprego e Formação Profissional, Lisboa, FPCE., 18.03.04.
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A passagem do sujeito ao cidadão implica a assunção de valores susceptíveis de guiarem o percurso das
opções que se colocam nos procedimentos cognitivos e atitudinais. No plano cognitivo, esse percurso
assume explicitamente a subjectividade como condição da perceptividade humana, configurando a
objectividade do exercício racional como conquista de postura e de método, no quadro de
compromissos e adquiridos da prática cognoscente vs.científica, em desenvolvimento contínuo. No
plano atitudinal, o indivíduo assume a consciência de si, mas na relação com os outros e com a
globalidade, na matriz do sentido que confere conteúdo cultural às práticas sociais ao longo da vida
toda, na escola e fora dela, quer a aprendizagem se lhe antecipe ou prolongue, quer a secunde ou lhe
sirva de alternativa.
Reconhecer as potencialidades da cidadania activa para a defesa de um desenvolvimento integral – ou
seja, aquele que não possa abstrair da dimensão individual na dinâmica desenvolvimentista, em que o
sujeito inter-age com os outros e com a totalidade integradora -, não justifica o individualismo,
enquanto ideologia: antes se inscreve na utopia útil dos direitos humanos, em perspectiva que venha a
justificar que eles passem menos pelo assistencialismo alheio do que pela capacidade de autonomia e
de reivindicação inalienável, fundada na “observação” objectiva e reflexiva dos acontecimentos. Que o
sujeito individual possa reconhecer-se nos colectivos em que inter-age é o que subjaz aos conceitos de
cidadania social ou comunitária, fundada em laços que densifiquem a participação individual, e de
democracia poliárquica (DAHL, 2000), distribuída por territórios concretos, onde as comunidades
possam regressar ao terreno, ainda que providas de plataformas virtuais que, em concreto, se liguem ao
mundo que todos habitam, vencendo as distâncias no espaço e no tempo. Mas, dado que o talvegue de
intersepção de tais vertentes se chama cognição, o conceito de cidadania cognitiva, emergente na
epistemologia do olhar e da escuta de que fala Guy BERGER é um conceito estruturante do novo
modo de entender a formação profissional, desde o contexto académico ao informal.
Aprender em contexto de cidadania activa significa pois dotar a sua prática do recurso às
disponibilidades que a Sociedade do Conhecimento faculta, desde que os recursos sejam requalificados
na base de metodologias adequadas à especificidade dos grupos diferenciados de utentes que,
utilizando-as, se exercitem como cidadãos. É um processo de novo perfil na formação e na
aprendizagem ao longo da vida, processo complementar dos instituídas pelos regimes formais. Isso
requer que se invista na panóplia de práticas da investigação-acção e numa sistemática de suporte que
seja pública para se distribuir por todos. Requer ainda que ela seja aberta a parcerias diversificadas com
as entidades que promovam articulação aos sectores do associativismo e da economia social e que
possam constituir saídas aos entraves que a globalização vigente coloca ao processo de garantir a todos
o acesso ao bem-estar e à participação na vida pública, dispondo-se do conhecimento que permita
assumir relações interactivas, norteadas por tais objectivos. Um tal conhecimento requer condições
para que se aceda a fontes de informação estratégica, cujos desideratos exigem suporte de um serviço
adaptado a este fim, com base em funções associadas à emergência da Sociedade do Conhecimento.
Trata-se assim de acolher e incentivar com responsabilidade pública uma nova dimensão da cidadania a
aduzir à da inclusividade : a dimensão cognitiva. Esta perspectiva pode ser, em si mesma, a
oportunidade para garantir trabalho a profissionais habilitados pelo
sistema educativo, cultural e social, os quais alimentam, cada vez com mais frequência, as estatísticas
do desemprego e a economia psíquica do stress urbano.
II
A pedagogia de projecto e a investigação-acção, na formação do capital social
Porquê a pedagogia de projecto? – Porque um projecto é sempre uma actuação de carácter
pragmático, quiçá temporário, orientado pela prossecução de objectivos concretos e destinados a
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induzir actividades coesas e coerentes, em postura de reflexividade propícia à dinâmica auto-regulada
dos procedimentos. A pedagogia que neles se suporta recorre à motivação personalizada dos
destinatários e à criação de laços de sociabilidade que, pela via da cooperação e da partilha, criam o
contexto necessário à referida dinâmica. De facto, um projecto de aprendizagem só tem sentido em
contexto específico. A capacitação cognitiva só se transforma em conhecimento no ambiente sistémico
dos laços que prendem um ser humano a todos aqueles que constituem o seu grupo de pertença ou de
escolha, porque esse é o terreno próprio à produção do sentido a dar a quaisquer práticas, incluindo as
da aprendizagem. Por isso a necessidade de aprender que essa necessidade implica, suscita a
solidariedade tácita ou expressa entre os aprendentes que partilham, no projecto comum, o projecto
próprio do conhecimento que pretendam adquirir para a compreensão dos problemas que o desafiam,
como possam ser os que se colocam no quotidiano de cada um, no contexto social, local e temporal em
que se desenrola a sua história de vida. Qualquer caso pode ser entendido deste modo e, qualquer que
seja, implica a habilitação de quadros que actuem como mediadores de aprendizagens múltiplas, dada a
complexidade dos correspondentes objectos de análise e de problematização. Professores, monitores ou
orientadores terão pois de assumir esta postura e de se habilitarem para este desafio, subscrevendo
também eles as directrizes da pedagogia de projecto que àquela subjaz, praticando-a com recurso a
estratégias e métodos que propiciem a capacidade de equacionar e resolver problemas, nisso incluindo
o próprio problema de reconversão das aprendizagens formais próprias e alheias nas que decorram do
desafio de as pôr em questão. A estratégia de investigação-acção pode ser a porta de entrada no
caminho do envolvimento dos saberes adquiridos na produção autosustentada de saberes adequados
para equacionar e quiçá satisfazer as novas necessidades.
E porquê a investigação-acção? Porque esta perspectiva de abordagem e enquadramento dos
problemas levantados com o propósito de serem objectivamente analisados, tem dado provas de
adequação a problemáticas complexas, como são as sociais e psicológicas cada vez mais desreguladas
na vivência actual, bem como todas aquelas que as contextualizam. O próprio conceito remete para um
procedimento colectivo, cujas regras de actuação e impactos recaem na interacção dos actores sociais
que conjuntamente o desenvolvem, subscrevendo os pressupostos da formação de matriz educacional
de MORIN, antes equacionada. Enquanto praxeologia, comporta objectivos de produção de
conhecimento, de inovação, de formação de competências e um faseamento que passa prioritariamente
pela implicação dos actores externos
às situações experienciadas ( investigadores, quadros e
formadores) no estudo in situ das mesmas e nas relações estáveis e duráveis com os restantes actores do
processo, incluindo os destinatários directos das soluções equacionadas. É privilegiada a implicação no
âmbito da análise compreensiva que comporta o processo argumentativo de suporte à configuração dos
problemas. Para isso, é indispensável trabalhar-se com as representações sociais em jogo, investindo
no seu questionamento, simulação e ponderação e identificando esquemas de monitorização e de
avaliação sistemáticas, reguladores dos espécimes metodológicos seguidos e dos correspondentes
ajustamentos, sempre em sede de plausibilidade e de compatibilidade com os parâmetros da I&D.
A geometria dos métodos subscritos, caso a caso, pela investigação-acção é tão variável quanto a
variabilidade das situações configuradas a partir do(s) problema(s) posto(s) em equação, desde a mais
simples à mais complexa das problemáticas. Em estudo de caso apresentado ao Seminário O Fundo
Social Europeu e a estratégia Europeia para o Emprego – Contributos para a Coesão Económica e
Social, ALBINO LOPES4 descreveu a aprendizagem de actividades elementares de hotelaria como
campo de experienciação desse domínio de métodos, equacionados enquanto modos de conferir
habilitação em práticas laborais, atitudinais e convivenciais que implicam decisões autonómicas e
4
In Workshop Temático “ Educação, Formação e Aprendizagem ao Longo da Vida”, Estoril, Instituto de Gestão do Fundo
Social Europeu e União Europeia/ Fundo Social Europeu, 13-14.11.03.
4
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responsáveis. Por outro lado, qualquer processologia complexa de planeamento do desenvolvimento
sustentável e do ordenamento integrado dos correspondentes recursos, designadamente em âmbito
territorial, poderá situar-se no outro extremo do leque de possibilidades estratégicas da investigaçãoacção. Em qualquer dos casos, esta não se limita porém à análise diagnóstica. A prospectiva é um dos
seus traços essenciais, o que significa uma postura de pró-actividade que comporta a preparação dos
actores sociais para desenvolverem comportamentos consistentes na relação com os poderes.
Investigação
y
Mudança
Investigadores
+ Formadores
z
Conhecimento
x
Actores
Sociais e Políticos
Acção
Fig1 - Os eixos da problemática da investigação-acção, segundo Isabel Lopes da Silva(1993), p.75,ajustado por CRUZ( 2003 c),sendo:
x– eixo epistemológico
y - eixo metodológico
z- eixo político
Dos vários mod(el)os de processamento da investigação-acção, o da resolução de problemas imediatos
é o que faz mais sentido em questões de natureza social. Todavia, cada vez menos elas podem
dissociar-se das que se colocam a outras escalas, o que significa o seu cruzamento com as agendas dos
outros mod(el)os: ou sejam, o de inter-acção social, como abrangência determinante da equação das
problemáticas, e o de práticas prevalentemente fundadas na investigação teórica. Está neste caso, a
investigação educacional, como contexto da formação de quadros para intervirem em lógicas de
inovação que tenham por objecto a intervenção em situações emergentes.
Do sujeito individual ao epistémico, a emergência do empowerment – A pedagogia de projecto e a
investigação–acção potenciam a inovação, enquanto prática de pesquisa e de assimilação do que, sendo
emergente num contexto, neste inova posturas e saberes susceptíveis de acrescentarem ou substituirem
acervos e qualidades aos conhecimentos pré-adquiridos. Ambas as estratégias remetem para o conjunto
de princípios da pedagogia e da pesquisa da ciência dita de projecto, que reconstroi os princípios do
método cartesiano, subordinando-os à primazia da finalidade do sujeito sobre o pressuposto da
imanência do objecto que aquele apreende, o que implica que questione a objectividade, enquanto
qualidade própria do objecto de estudo, e a recuse como um dado transcendente à inter-acção
sujeito/objecto, em que delibera envolver-se. Conhecer um objecto implica assim saber e poder
questioná-lo em referência a uma agenda de enquadramento que comporta teorias apropriadas e
pragmáticas de orientação de pesquisa, mas comporta também que o sujeito se auto-questione
sistematicamente em relação ao conhecimento que detém e ao modo como ele se desenvolve no próprio
processo de pesquisa. Nesse sentido, todo o processo de investigação é simultaneamente de acção, mas
a investigação-acção com o propósito de sondar caminhos de inovação que desemboquem na equação
de situações alternativas à situação inicial e na preparação para agir no quadro de processos de
5
IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Madrid, España, 2 -5 Nov. 2004
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mudança chama também a terreno propósitos de intervenção nos factos, de acordo com valores
subscritos em sede de opções conscientizadas, estruturando as ocorrências correspondentes ao ser e ao
dever vir a ser, centradas em factos e em valores, que implicam respectivamente uma postura
descritiva em termos de objectivação factual, tendencialmente científica, e uma postura prescritiva em
termos de subjectivação interpretativa, tendencialmente valorativa. A relação entre subjectivação e
objectivação, recorrente da relação sujeito/objecto, decorre assim da ruptura epistemológica com que a
comunidade científica contemporânea assumiu, enquanto geral, o sistema aberto, dinâmico e
autoregulado na sua abertura ao contexto, sendo o sujeito e as suas opções o contexto capaz de fornecer
ao sistema de factos, a energia neguentrópica que o pode fazer evoluir tanto quanto possível na
direcção das opções e das metas perfilhadas, no quadro da finalidade da pesquisa. A recusa do
determinismo cartesiano parte destes princípios que assumem a objectividade cartesiana como o caso
em que o contexto dos factos, constituído pelo sujeito e pelas suas opções, corresponde a um conjunto
vazio – por responsabilidade do próprio sujeito, naturalmente, pois é a ele que caberia tê-lo
sistemogrado...O sistema de factos observados não é, neste caso, mais do que um sistema fechado, caso
limite do sistema geral.
A validade de qualquer perspectiva de intervenção planeada numa situação futura ancora-se em tais
pressupostos, qualquer que seja a sua modalidade e os seus actores. A eficácia da acção dependerá da
pertinência do sistema de métodos e de recursos mobilizados em face da finalidade e da agenda
perfilhadas pelos seus actores. Estes serão ou sujeitos de pleno direito ou simples recursos, ditos
humanos, quando actuam guiados por deliberação alheia. Epistémico, será portanto o sujeito que
concebe, assume e gera um projecto de conhecimento, qualquer que sejam as dimensões e alcances
temporais identificados na relação com o objecto. Pode a intenção do sujeito ser a de o gerir no futuro,
mantendo ou inflectindo tendências de acordo com a manipulação do sistema de informação que
exprime o dos factos. Actuando no espaço projectivo e em direcção ao prospectivo, terá, por inerência
do princípio da interconstituição sujeito/objecto, de recorrer a princípios de consciencialização dos
valores em jogo, para ponderar os vectores de manipulação em registo ético, ou seja, o registo de
superação dos interesses áuticos e egocêntricos que possam desprezar os imanentes ao próprio objecto.
A entidade que pode superintender no jogo, pela via da validação dos processos e dos resultados, será
sempre a comunidade de pertença dos actores, actuando no comprimento de onda da cidadania
cognitiva – e a comunidade científica constituirá sempre o feedback de todas as outras que actuam em
sede de produção e difusão do conhecimento.
É nesse sentido que se diz que o conhecimento envolvido na produção e gestão de um projecto, seja no
plano da definição dos princípios científicos, seja nos da sua aplicação à I&D, em geral, e às suas
estratégias e metodologias como as da investigação-acção, em particular, terá de reintroduzir a ética de
feição aristotélica no plano dos pressupostos da acção, seja ao nível conceptual ou ao pragmático.
Trata-se pois de assumir operativamente a postura ética e deontológica como condição necessária,
ainda que não suficiente, de auto-regulação da objectividade, a qual emerge, na interconstituição
sujeito/objecto, do incontornável respeito pela imanência deste5.
III
Um modelo para a dinamização do capital social com recurso à cidadania social ( cognitiva,
activa e inclusiva )
Os vectores inter-activos do desenvolvimento da democracia poliárquica – Assumindo como
Governação o desempenho de funções de controle que, sendo imprescindíveis em qualquer escala de
5
Maria Alfreda Cruz, “ A Teoria Genética do Objecto”, Documentos para o ensino da Cadeira de Métodos e Técnicas de
Investigação Sociológica I UAL 1996 –1998 (inédito)
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vida em sociedade, não exigem contudo estruturas formais inerentes ao funcionamento do Governo
clássico, porque tais funções incluem, na gestão da res pública, mecanismos informais exteriores, é
indispensável que ela - governação - opere ancorada em relação coerente com as instituições exteriores
à sua área de dependência institucional. Uma tal coerência exprime-se em “regimes definidos como
conjuntos implícitos ou explícitos de princípios, normas, regras e procedimentos de decisão, para os
quais convergem as expectativas dos actores sociais” ( PUREZA, 2002).
“Âncoras” são, nesse âmbito, entidades intermediárias entre o Estado e a sociedade civil, as quais
desempenham um papel de co-gestão em determinadas dimensões da governação – estão neste caso, as
associações, sejam expressamente políticas( partidos) ou de outra natureza, como ONG’s, fundações
ou agências, que, em todo o caso, assumem consociações verticais ou horizontais entre si e/ou com o
Estado, no quadro de protocolos explicitáveis e configuráveis em termos de princípios, normas, regras
e procedimentos de decisão. O relacionamento destes dois vectores é fulcral na articulação dos tipos de
capitais investidos no Desenvolvimento Integral (fig.2).
É na tensão entre as políticas públicas e sociais que a emergência e a gestão dos capitais se processa.
Enquanto modos de enquadramento das praxis, através de princípios, normas, regras e procedimentos
codificados em termos formais ou informais, consoante se deduzem ou não de dispositivos
vinculativos, apresentam padrões de dedutibilidade lógica, com força de lei e de normativos
disciplinadores, no caso das políticas públicas, ou de natureza indutiva, a partir de experienciação
testada, no caso das políticas sociais.
O capital desenvolvimentista é antes de tudo o capital social e humano. Sem que ambos atinjam um
nível adequado ao alcance dos direitos humanos e sociais, a própria economia definha e desregula-se.
Nesta tríade se suportam os fundamentos de uma política social do conhecimento emergente de uma
cidadania cognitiva, activa e inclusiva , cujos vectores podem ser reconhecidos no seguinte sumário:
FUNDAMENTOS DE UMA POLÍTICA SOCIAL
1.Transformar as relações do Estado com a sociedade apostando simultaneamente na:
- Universalidade de direitos
- Promoção da qualidade de vida
- Construção da cidadania
como critérios de suporte de um novo paradigma de exercício do poder, potenciando novos actores sociais que adquiram
protagonismo em face das questões fulcrais:
dos factores de iniquidade
das necessidades sociais
através do exercício da democracia participativa, organizada em redes sociais
2. As redes sociais enquanto tecidos de participação cidadã e comunitária de iniciativa independente do Estado condiciona-o
exactamente por isso a assumir a perspectiva trans-sectorial e transdisciplinar das problemáticas postas no terreno pelos actores
sociais.
3. Uma política para todos é a que emerge desta inter-acção das comunidades com o Estado, corresponsabilizando-o na garantia dos
direitos sociais contrariando activamente a exclusão do direito à cidade, à polis e ao conhecimento.
4. A mudança de paradigma - O impacto social das possibilidades desta nova política requer o fortalecimento da capacidade de
resposta permanente e da habilitação dos canais institucionais para a necessidade de combater as causas estruturais da exclusão.... o
que significa que as estruturas de poder terão de conectar-se numa horizontalidade concertada, apoiada em estratégias
institucionais dinâmicas que ponham de lado a transmissão hierárquica das decisões unilaterais, por serem comprovadamente
desajustadas da transversalidade das problemáticas complexas.
Esta mudança de paradigma não é fácil. Pressupõe novos cenários com múltiplos desafios. Por exemplo:
Como incorporar as estruturas existentes na prática da mudança de paradigma ?
Que implicações têm os estudos de caso na adopção de estratégias conseguidas?
Como pode a génese desta nova política dissociar-se duma Constituição que expresse com rigor os direitos universais de
todos os seres humanos e de todos os povos do planeta, onde quer que a mobilidade planetária os colocar ?
5. As Agendas Permeáveis à intervenção social A relação construtiva “ Estado-Sociedade é decisiva para a adequada identificação
de prioridades e confluência de esforços que se expressem na construção da agenda social dos países e nas agendas locais,
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vinculando os seus signatários aos compromissos assumidos nesses desideratos.
6. Os Vectores da mudança - O desenho de espaços de reflexão em torno de ideias, propostas, projectos e cenários que confluam
na criação de um mapeamento sistémico das novas estratégias de política social, terão de ser assentes:
na reequação do papel do Estado, vocacionando-o e agilizando-o estruturalmente para a equação e resolução de
problemas múltiplos e complexos;
na habilitação geral das populações para o empowerment, pela via do acesso à produção e distribuição de conhecimento,
em circunstâncias reais e virtuais* que contrariem activamente a infoexclusão;
na formação de capital humano habilitado aos novos desafios emergentes;
na distribuição integrada de recursos de apoio à consolidação e emergência das redes sociais devidamente habilitadas,
designadamente em formadores e mediadores, para se pronunciarem sobre as dinâmicas glocais que se lhes deparem;
no investimento do capital social emergente das redes sociais nas parcerias de desenvolvimento implicando-as nos
projectos de incidência correspondente às suas escalas de actuação.
Na habilitação do poder político para lhes dar resposta no quadro da interactividade produtora do desenvolvimento
sustentável
Fonte: Centro de Investigación y Documentación Escuela de Gerencia Social, Caracas – www.gerenciasocial,org.ve
Um programa desta amplitude pressupõe que o próprio Estado se assuma, ele próprio, como sujeito de
cidadania, agindo na interacção com as redes sociais em contexto de responsabilidades partilhadas e
assumidas com clareza perante toda uma sociedade.
Observatórios para o empowerment- É desse pressuposto que partimos para a identificação de um
instituto de governação adequado à poliarquia da cidadania cognitiva. Sendo a sociedade provida de
recursos que potenciem a capacidade de manuseamento, apropriação e desenvolvimento da informação
e da comunicação, que hoje constituem o ambiente de qualquer quotidiano, a capacidade de
objectivação constitui o cerne da consistência de um conhecimento que tenha por norte a intenção de
inovar situações. O empowerment passa por aqui e será tanto mais consistente quanto mais habilitado o
actor social se encontrar para desempenhar o seu papel enquanto cidadão. De facto – e a figura 1
sugere-o com clareza -, os actores sociais dinamizam-se na relação com os formadores e investigadores
que desenvolvem as práticas que lhes são próprias nos quadros de referência da produção, apropriação
e difusão de um conhecimento aberto à mudança, subscrevendo em conjunto, na especificidade de
cada grupo e com recurso aos saberes com que partem e que desenvolvem no processo, as finalidades
gerais de pesquisa efectuada no campo empírico social, com relevo para a observação participante. In
situ, haverá pois que :
-
descrever/analisar/comparar os problemas e problemáticas em questão;
compreender e explicar os aspectos relevantes, identificando as invariantes, constantes e
tendências;
estabelecer relações consistentes das situações em presença com as práticas que se delibere
reportar-lhes, com recurso à validação e à plausibilidade das opções que sejam assumidas
nesse contexto;
finalizar, ou seja, dar um sentido à perspectiva de inovação, concebendo a situação desejável
e pilotando o caminho equacionado para a atingir;
suportar todos os procedimentos em bases consistentes de informação assumidas como
componentes privilegiadas da observação, argumentação e fundamentação das práticas;
estruturar tais componentes em termos sistémicos, enquanto observatório dos fundamentos e
itinerários das práticas e procedimentos de pesquisa6.
O recurso a métodos de objectivação e aos argumentários da subjectivação constitui o cerne dos
observatórios, assim entendidos. Constroem-se pondo em interacção iterativa os saberes detidos e
6
Maria Alfreda Cruz, A Estratégia Metodológica da Investigação-Acção. Documentos para o ensino da Cadeira de
Métodos e Técnicas de Investigação Sociológica II UAL 1996 –1998 (inédito).
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desenvolvidos nos quadrantes de Investigação / Conhecimento e de Acção / Mudança, através das
metodologias reunidas para o efeito e em registo de animação cultural susceptível de animar a
autonomia dos aprendentes, pela via da estimulação da sua consciência reflexiva. É isso difícil?
Depende do nível de base da procura e da oferta dos serviços educacionais e formativos de que se
dispuser. Mas é sempre possível desde que estes últimos se habilitem a dispor de qualidade suficiente
para o efeito. Tal como a cultura artística e musical se pode expandir sem que os seus cultores tenham
necessariamente de ser produtores dos respectivos campos, também a cultura científica, tecnológica e
humanista não tem de ser propriedade exclusiva de cientistas, tecnólogos ou intelectuais, porque a
gente comum pode sempre fruir os seus estímulos e usufruir os seus resultados, desde que estes tenham
impacto na solução dos problemas com que a sociedade se defronta. Habilitá-la para que lhe seja
possível prescrever o bem comum (PETRELLA,2003) é o desafio que, cada vez mais, se lhe coloca
perante o caos globalizado com que se defronta sistematicamente quer no quotidiano vivido, quer no
apreendido nas janelas do mundo, abertas de par em par pela comunicação. Ao actor social, compete
problematizar as situações, uma vez compreendidas, e tomar partido sobre as opções de evolução
possível. Tomar partido significa escolher. Significa poder fazê-lo, por se ter apetrechado para isso e
ter deliberado assumi-lo. Significa ser cidadão.
O papel das redes de conhecimento, de entre-ajuda e de sociabilidade passa por garanti-lo, pugnando
contra as principais disfunções geradoras de frustração, violência e crime, pela via indestrutível de um
conhecimento assumido em clima de responsabilidade cívica. Tudo isso em todos os sítios em que
cidadania se aprenda e pratique, desde a escola à cidade, em redes abertas à interactividade presencial e
virtual, captando os apoios e recursos necessários para o efeito, e erigindo estes em novas
oportunidades de criação de infraestruturas que reconfigurem o território habitado e incentivem a
produção da riqueza cultural, humana e económica. Estes os termos susceptíveis de levantarem do chão
das estatísticas da Europa, um país que tarda em retomar o lugar que direito lhe caiba, no concerto da
“pátria” dos direitos humanos que é a civilização a que pertence.
Principais disfunções geradoras de frustração
Desemprego e dificuldades de acesso legalizado a condições de vida
adequadas
Incremento de oportunidades marginais e decréscimo de laços sociais
Precarização, pauperização e exclusão social
Ambiente físico degradado ou desmotivante
Habitações desadequadas
Problemas familiares
Perda de identidade, de referências e de coesão social
Impactos da informação dos media.
Fonte: Jean MANS, Manual on local Authorities and Urban Crime
Prevention, CPL(8)2 - 8ª Sessão, Strasbourg, 29-31 mai 2002
Um Serviço Público no equilíbrio de Poder(es) - A expressão denota a ideia de serviço ao público e
nesta perspectiva implica o(s) poder(es) enquanto servidores de todos aqueles perante os quais os
assumem. A hierarquia dos poderes na contemporaneidade subordina frequentemente o político (quer
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se trate do poder central ou do local) aos restantes poderes – ou sejam: o económico, o financeiro, o
jurisdicional, o da comunicação – poderes que vão superintendendo ou instrumentalizando os de feição
política, onde quer que cheguem os braços tentaculares do sistema de regulação dominante da
globalização de hoje. Por isso cada vez mais todos esses poderes reclamam a sua legitimidade na
prestação de serviço público às comunidades a que se dirigem, valorizando os correspondentes
interesses nos sectores em que actuam.
Todavia e em tese é ao poder político que cabe formular aquilo que o distingue dos restantes, neste
domínio. São as políticas públicas que especificam os serviços e a sua instituição compete a essa
forma de poder. Numa sociedade democrática, as políticas públicas, qualquer que seja a estratégia de
que o(s) poder(es) se sirva(m) no modo de concretização dos mais variados serviços prestados aos
cidadãos ou por eles reclamados, implicam, por um lado, a sociedade civil nas esferas de actividade
que as subscrevam e, por outro, os cidadãos a que explicitamente se destinam, quer na vertente dos
outputs dos processos publicamente desencadeados para as levar por diante, quer na vertente de
prossecução do próprio processo.
Visando destacar a cidadania enquanto dimensão essencial duma governação que se queira participada,
de modo a consolidar a consistência do poder político no quadro dos poderes que gerem o mundo e as
sociedades que o habitam, Giovanni Moro (2000) propôs-se definir o lado da governação dos cidadãos,
ao considerar o tema da maior importância para o campo de pesquisa que incide nas políticas públicas,
ainda que estranhamente – constata - seja subestimado por académicos, políticos e fazedores da
opinião pública. Sem postergar as questões gerais ligadas à governação, designadamente sob o ponto de
vista teórico e metodológico, defendeu que o papel das iniciativas dos cidadãos nessa governação
implica que ela problematize uma nova cidadania - a cidadania activa -, capaz de assumir as suas
próprias responsabilidades no relacionamento com a governação, mas exigindo-lhe, em contrapartida, a
capacidade de assumir as suas perante as potencialidades desse mesmo relacionamento. A perspectiva
fulcral é a do alargamento sistemático da qualidade de vida e do bem comum, expressão que aqui
utilizamos no sentido atribuído por PETRELLA(2003) a uma sociedade decente, ou seja, aquela em
que os seus membros se defendem entre si.
Enquanto espaço aberto a questionamento, ponderação e escolha, a produção de uma política pública
será então o domínio de uma inter-acção no âmbito de exercício democrático do poder, em que, do
nosso ponto vista, se consubstanciam as funções de participação decisional e de peritagem ,
moblizando respectivamente :
-
o cidadão – desde que ele reivindique participar na definição, implementação e condições de
enfoque da referida política, em ordem a adequá-la aos seus interesses e valores no
quotidiano a que o serviço se destina;
o perito – chamado a investir o seu saber específico na trajectória do poder de definição,
implementação e uso de uma política pública;
o formador e o investigador – que, a montante, articulam os saberes fundamentais aos
assimiláveis e aos aplicáveis e, a jusante, ponderam os resultados e inserem-nos na base do
conhecimento produzido e reintegrável noutras aplicações.
Esta distinção não impede que a peritagem se sintonize com o exercício da cidadania e não cerceia ao
perito a dimensão de cidadão, desde que a assuma. A discussão e o questionamento da política pública
no decurso do processo da sua produção não lhe estão vedados, mas a peritagem não é em si mesma
uma função da cidadania. Esta compete aos indivíduos e às suas comunidades e grupos de pertença ou
de opção, enquanto sujeitos portadores de projecto de vida e de sociedade, próprios e independentes da
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configuração que deles façam os poderes e os respectivos projectos. A cidadania é por isso a função de
resistência à violência simbólica de que se reveste qualquer poder, seja qual for o grau em que se
exprime, sendo que este grau depende do tipo de poder perfilhado. A característica de “serviço
público” aberto à participação, questionamento e ponderação independente dos cidadãos, contrapõe-se
à da “dominação”( implícita ao exercício da violência simbólica), inscrevendo-se antes num modo de
exercício democrático do poder.
Assim entendida, a habilitação para o exercício da cidadania constitui a pedra de toque da
reconstituição do capital social, hoje em dia dessorado pelo esgarçar de laços sociais e de valores, no
contexto universalizante de uma política de exclusão instaurada pela ordem económico-financeira
global. O Grupo de Lisboa, sob presidência de PETRELLA, comissário europeu responsável pela tese
dos Limites à Competitividade , defendeu, em 1995, um sistema de governação cooperativa orientado
por um Contrato Social compósito nas dimensões de terra, haveres, cultura e democracia. Baseia-se
este numa engenharia política da solidariedade que possa vir a ser assumida no decurso dos próximos
20 anos, em substitutição da do reordenamento que decorreu da Conferência de Bretton Woods (1944)
e resultou na criação do FMI e do BM, num contexto de pressupostos que os Relatórios do
Desenvolvimento Humano viriam a configurar com improcedência crescente para o critério de bem
comum, desde que o processo de globalização em curso pôs em causa o Estado de Welfare. Em
contrapartida, a nova engenharia social implica que as infraestruturas que enquadram o conhecimento
se habilitem para a formação em exercício de todos os que pretendam resolver a multiplicidade de
aspectos que constituem o ambiente sistémico dos problemas trazidos à plataforma de
intercomunicabilidade que se lhes faculta. E esse é, quanto a nós, o desafio de edificação de uma
Sociedade do Conhecimento. Por um lado, porque o exercício livre de funções do interesse geral por
cidadãos, como indivíduos e como organizações, no quadro do princípio da subsidiariedade, é uma
forma de reorientar a governabilidade para o interesse público. Por outro lado, porque só privilegiando
as pessoas e as suas iniciativas, como condição de garantia da coesão social, o conhecimento pode ser
um direito de todos, além de energia, output e outcome dos processos produtores de informação e de
comunicação, os quais constituem as dimensões nucleares da nova era da organização do trabalho e do
quotidiano que desafia o mercado interno europeu.
O vector da economia social na emergência das parcerias – Para que o cidadão se habilite a produzir
“o discurso pragmático do consenso possível” (J. HABERMAS (1989), na relação interactiva com o discurso
formal dos especialistas, é fundamental facultar a todos, como horizonte, uma plausível capacidade de
participação na “res publica” e uma perspectiva de inclusão social para os que dela careçam, cujo eixo
seja o emprego do tempo em trabalho útil para si próprio e para a comunidade que integrar. As
estatísticas nacionais e internacionais confirmam, como “quadratura de círculo”, a dificuldade em dar o
mesmo peso ao mercado e à sociedade na concretização da política europeia. Com oscilações que
traduzem as diversas leituras que os países têm feito, conforme os regimes políticos, da explícita
intenção de salvaguardar direitos dos trabalhadores à estabilidade do emprego, a verdade é que esta não
resiste à nova ordem económica de uma globalização ameaçadora para o próprio modelo europeu. Por
outro lado, a permeabilidade do mercado de emprego aos ingressos de novos trabalhadores, verifica-se
quase sempre em condições que não erradicam as tendências de exploração dos recursos humanos mais
precarizados pela pobreza e pelas várias iliteracias que se cruzam nos nossos dias. A esperança numa
saída para estes impasses passa pela aposta numa economia social que, ainda que imatura, se possa
constituir em processo de reorganização de um capital humano de perfil adaptado aos desafios da
inclusão, implicando nesta dinâmica a área marginal às estruturas vinculativas do contrato social que,
na ordem económica dominante, regulamentam a dicotomia entre o capital o trabalho. Comportando as
variadas formas de cooperativas, mutualidades, associações, fundações, organizações de solidariedade
diversas, as entidades da economia social assumem-se como produtoras de valor acrescentado de perfil
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social, na base da contratualização de projectos partilhados entre utilizadores, promotores e mediadores
de agências, que, emergindo da periferia do sistema económico, interferem nos domínios financeiro (
da banca aos seguros e fundos de pensões), da previdência, da assistência social e da saúde, bem como
nos sectores do consumo e do comércio, da habitação social e da cooperação produtiva e distributiva. E
assim como a economia do conhecimento, na sua interoperacionalidade virtual, se alimenta de um
subsistema da sociedade que designa por Sociedade da Informação/ da Comunicação/ Cognitiva /
Digital, reproduzindo velhas e novas exclusões sociais, a economia social, na sua disseminação
territorial, pode articular-se produtivamente ao subsistema de sociedade que for capaz de gerar formas
de inclusão, a partir de uma rede de aprendizagens mobilizadoras dos recursos dessa mesma Sociedade
da Informação/ da Comunicação/ Cognitiva/ Digital. Tal articulação pode funcionar em benefício de
outro subsistema que, complementando ou desafiando o primeiro, erija com ele a Sociedade do
Conhecimento, nos termos que permitam que ambos suportem técnicas inovadoras de inclusão social.
Uma glocalização de sinal produtivo não pode deixar de passar por aqui.
Dos interesse mobilizados ao sistema de resposta institucional - Numa cultura de responsabilidade
mútua, quer o Estado quer os cidadãos terão interesses convergentes que passam pela criação de
oportunidades de trabalho e de mais valias da participação destes na gestão do quotidiano e das
políticas públicas e sociais – do conhecimento, do ambiente, do território, da cidade, da polis, enfim de
todas as que comportam capacidade de obviarem às frustrações identificadas no manual supracitado
das autoridades locais apresentado que, em 2002, apresentaram e debateram em Estrasburgo a
prevenção do crime urbano. Como noutro lugar defendemos,7 enquanto os habitantes de um território
se mantiverem excluídos da possibilidade de configurarem opinião objectiva sobre problemas
complexos com que se deparam nesses domínios, não lhes é possível implicarem-se na vivência da
cidadania e é isso que perdura no âmago da frustração pessoal e societal de que se alimenta a violência
quotidiana. Uma política pública para estimular uma cidadania activa e inclusiva será pois fundamental
para apoio de todas as que visem uma coexistência pacífica nas cidades cosmopolitas. É no seu
contexto que pode reforçar-se a consciência reflexiva e crítica dos seus habitantes, no quadro de
alianças que impliquem as autoridades locais a defender o quotidiano urbano da dominação dos
interesses especulativos que jogam contra o ambiente e o desenvolvimento da polis. Colocar a cidade e
os seus bairros no coração duma política de coesão social pode passar pelas mais diferentes acções de
participação das comunidades abrangidas, nomeadamente no que respeita á identificação e seriação de
prioridades de intervenção nesses domínios. Por isso, a criação de novos interesses simbólicos, que
atravessem culturas emergentes e novos públicos em registos de interculturalidade distensora do clima
social, terá de passar pela emergência de novos institutos de consolidação da segurança económica e
social dos cidadãos, como sejam o alargamento do campo de intervenção do mutualismo e dos seus
operadores mais creditados para experienciação do bem comum, tais como o microcrédito, o banco do
tempo e a advocacia solidária, enquanto esquemas de supletividade das dinâmicas sindical e de apoio
social, com atenção especial aos casos não abrangidos pelas práticas institucionais correntes.
Experiências destas já existem no terreno. O que aqui se propõe é a sua sedimentação em sede de
política pública e, nessa perspectiva, o suporte físico para esta cidadania activa e solidária terá
necessáriamente de interligar-se, na sua distribuição territorial, à iniciativa
Internet que, em Portugal, estando ainda em expansão, já atinge a centena de concelhos. Como noutro
lugar dissemos8, a rede de acolhimento dos interessados nos propósitos divulgados deverá garantir
7
Maria Alfreda Cruz (VIANA), « Pour Une Politique Fondatrice de la Citoyenneté, Note au sujet du Thème La Charte
Urbaine Européenne en tant que facteur de stabilité », Rapport d’intervention dans la Conference Internationale sur La
Charte Urbaine Européenne, Congres des Pouvoirs Locaux et Regionaux de l’Europe, Sofia, 16-17.05.2002 .
8
Helena Rato e M. Alfreda Cruz,“ Estratégias de desenvolvimento do Capital Social”. Módulo de Abertura do Curso INA
aos Gestores dos Serviços Sociais da CML, Algés, 19.04.03.
12
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acessibilidade à procura social a que se destina e ser provida de recursos metodologicamente orientados
para aprendizagens inclusivas, configuradas a partir das problemáticas suscitadas pelos próprios
destinatários e com reflexo em programas instrumentais que vinculam o país à dimensão europeia,
como o Programa Operacional da Sociedade de Informação (POSI). Mas o carácter de subsidiariedade
das políticas europeias, em relação aos estados-membros, exige destes a iniciativa de conceber
metodologias e processos próprios que se adaptem às situações vigentes, contextualizando-as nas
dimensões científicas adequadas. No caso vertente, a articulação ao Espaço Europeu de Inovação e de
Investigação, no contexto do 6º Programa (2003-2006), pode gerar sinergias compatíveis com esta sua
7ª prioridade, assumindo, como objectivo de pesquisa e de política pública, a reversão da dinâmica da
exclusão social na da inclusão social, em contexto de cidadania. Chame-se a cada um dos seus nós sítio
de cidadania, onde se concretize a procura social desta - enquanto bem público - e de acesso ao
empowerment - enquanto direito de todos a participarem na preparação, configuração e controle das
decisões que lhes respeitam. Na capacidade da sua concretização, está o mod(el)o de distribuição
territorial tão alargada quanto a sociedade o desejar, nisso envolvendo a capacidade das autarquias
locais para aderirem ao desafio de uma política pública que as convide a facilitar o acesso físico dos
cidadãos aos locais de convívio com a net e às práticas de fomento da participação fundada no
conhecimento e fundamentação das causas mobilizadoras .
Estabelecida a rede de oferta, na base da malha autárquica, uma cidadania activa que recorra ao
provimento de recursos de formação comportamental e cognitiva ao longo da vida e na sua relação
explícita com o quotidiano apela à capacidade de auto-organização dos cidadãos numa multiplicidade
de formas de mobilização de recursos e de exercício de poderes orientados para a prossecução de bens
públicos inerentes à estabilidade social e a revitalização do sistema político. Ao Estado compete, no
quadro de parcerias que promover em ambiente dinâmico e aberto, conceber, dinamizar, estimular e
implementar o quadro de formação estruturado e capaz de apetrechar os sítios de cidadania, da
mediação e da animação cultural integradora das dimensões de vida educacional, habilitação para o
exercício da decisão e para a articulação do trabalho à empregabilidade. Tratando-se de áreas de knowhow cuja emergência apela à formação de formadores ao mais elevado nível epistemológico e
metodológico, pressupõe-se o investimento do ensino superior e equiparável nas pósgraduações
adequadas à reciclagem de habilitações genéricas as quais tendem aliás para a perda do mercado
formal, no quadro das ciências sociais e das profissões implicadas nos sistemas de educação e de outros
serviços no domínio social. A inovação implicada pela criatividade da economia do terceiro sector
constitui, a par de lastro para o desenvolvimento da Sociedade do Conhecimento, uma saída para a
readaptação do mercado do trabalho terciário e quaternário aos novos e movediços desafios societais e
da sua rede de distribuição do capital social. O aprofundamento epistémico e metodológico que uma tal
estratégia implica, suscita a intersepção de saberes diferenciados quer nos de registo científico, quer na
diversidade de know-how do senso comum.
Tome-se como caso de estudo de uma tal intersepção, guiada pela interactividade das práticas
profissionais e sociais com as das comunidades científicas que se lhes adequem, a construção da rede
de formações pós-graduadas que em 2003/2004 envolveu cerca de 120 técnicos no aprofundamento
teórico-epistemológico das suas próprias práticas, questionando-as e ajustando-as em 4 Universidades
- no Algarve, em Coimbra (Fac. de Economia) e em Lisboa ( ISCTE e UAL). Estas constituem o
primeiro grupo de instituições académicas que aderiram à proposta do Gabinete de Gestão do
Programa português inerente à Iniciativa Comunitária EQUAL (PIC_ EQUAL). Ainda que emergente,
em processo de avaliação, ponderação e integração em política de maistreaming pertinente com a
13
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Iniciativa Comunitária9 –, a rede assenta nos princípios – chave desta e na constelação de áreas de
intervenção incidentes na promoção da cidadania activa e das várias dimensões de igualdade de
oportunidades. E isso apela ao enquadramento, em sede de mediação e de animação cultural, das
práticas sociais da participação e do empowerment, enquanto condição de construção de uma
qualidade de vida de sinal positivo.
IV
A relação da prospectiva com as experiências em presença
Do caso à rede: a sistematização de problematizações casuísticas – Como transferir as experiências
diversas e plurais em política pública integrada é o desafio de qualquer mainstreaming emergente das
suas finalidades integradoras. Tornar inclusiva a cidadania activa é uma das finalidades da do bem
comum – logo: geral. Tornar inclusiva a cidadania activa significa pois estendê-la aos excluídos, com
recurso às disponibilidades que a Sociedade do Conhecimento faculta, desde que requalificando
recursos na base de metodologias adequadas à especificidade dos utentes que, utilizando-as, se
exercitem como cidadãos. É um processo de novo perfil na formação e na aprendizagem ao longo da
vida, processo complementar dos instituídos pelos regimes formais. Isso requer que se invista na
panóplia de práticas da investigação-acção e numa sistemática de suporte que seja pública para se
distribuir por todos. Requer ainda que ela seja aberta a parcerias diversificadas com as entidades que
justifiquem a articulação aos sectores do associativismo e da economia social e que possam constituir
saídas aos entraves que a globalização vigente coloca ao processo de garantir a todos o acesso ao bemestar e à participação na vida pública. A um observador atento não restarão dúvidas de que se trata
tanto dum direito social como de um bem público. Citando as sociólogas Anália Torres, Luísa Lima e
Rosa Novo10, o jornal Público difundiu, pela pena da jornalista Andereia Sanchez11,que “os
portugueses estão descontentes com tudo o que tem a ver com política interna: estado da economia,
forma como o Governo está a actuar, funcionamento da democracia, estado da educação e dos serviços
de saúde”, situando-se entre os que demonstram menor confiança nas instituições. A transversalidade
da problemática apontada justifica a pertinência de uma política pública como a que aqui se defende,
desenvolvendo-a em casos dotados de monitorização susceptível de lançar as bases de uma
sistematização coerente dos vectores de uma mudança centrada num modo de produção do
conhecimento que interesse a todas as camadas da população e por isso se diferencie e articule na
correspondente inter-acção, em registo de cidadania activa, inclusiva e social.
A análise, diagnóstico e monitorização de uma tal mudança deve ser, caso a caso, provida da edificação
de bases de dados e de conhecimento cuja função primordial seja a de constituírem o observatório dos
cidadãos “residentes” – ou sejam, os que procurem, adiram e desenvolvam o projecto do sítio de
cidadania. Ou seja, cada sítio de cidadania suportará as suas práticas no método de produção de um
observatório do sítio. Por outro lado, a relação do quotidiano com o aparelho de produção e a da
vivência dos direitos que a todos assistem com as leis reguladoras dos correspondentes deveres,
implicam, por outro lado, que o modo de produção da cidadania activa e inclusiva, tão extensiva quanto
a prática social o ratificar, comporte, além da experienciação e difusão de tais práticas, a
9
A Iniciativa Equal é sucessora para o período de 2003-2006 dos Programas Comunitários antecedentes, sucessivamente
designados por Iniciativa Emprego e ADAPT. Os cursos 2003-2004, integrados no PIC e na consigna comum de Formação
Pós- Graduada Gerir Projectos em Parceria, correspondem à primeira parceria assente, com essa perspectiva, no protocolo
estabelecido entre as referidas Universidades e o referido Gabinete. A experiência formalmente avaliada na presença de
responsável EQUAL da Comunidade em 28 de Junho 2004, constitui ponto de partida para um protocolo que visa
aprofundá-la e transferi-la para o horizonte do sistema, como forma de a inserir sustentavelmente na política comunitária
do sector.
10
Comunicação "Atitudes e valores dos europeus - a perspectiva do género" apresentada em debate académico público, no
primeiro caso, e da análise dos resultados do European Social Survey nos seguintes.
11
ANDREIA SANCHES, Bem-estar em Portugal é menor do que noutros países, Jornal Público, 19 de Maio de 2004.
14
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institucionalização de um observatório unificador que integradamente centralize os outputs da
produção dos observatórios locais e funcione como base do conhecimento resultante em modo de
comunicação interactiva com todos eles. Um tal sistema, por imperativo da pesquisa, terá de observar a
mais rigorosa das independências dos processos decorridos no terreno, sempre atenta às posturas de
planeamento e intervenção contínua, a quaisquer das escalas em que as mesmas se justifiquem.
Defender a localização de um tal observatório integrado dos outputs dos observatórios locais, em sede
institucional gerida por instâncias técnico-científicas no Parlamento, cumpre tais requisitos e assenta no
pressuposto de que todas as componentes políticas do país com representação parlamentar, lhe têm
acesso e direito a opinião própria, sem que nenhuma disponha de ensejo de controle preferencial sobre
o processo emancipatório da cidadania activa. A gestão estratégica da inovação possível passará por aí,
criando, como campo de impactos comuns, o do ambiente integrador da qualidade de vida e da
conscientização individual no sentido da fruição comum do que não tendo preço, é detentor de uma
dignidade societal. Eleja-se para a observação ponderável da mudança poliárquica – distribuída
portanto pela rede dos sítios de cidadania - um território político neutral integrador das experiências, o
qual – garantindo acesso a todas as forças políticas do espectro formal da democracia representativa –
seja da responsabilidade de gestão directa do Parlamento, onde as questões legais, gerais e ideológicas
se debatem, confrontam e interagem, produzindo o ambiente sistémico de governação do país e das
políticas públicas que a esta incumbe assegurar.
Um método para a mudança - Desenvolver métodos para que as pessoas possam dar voz às suas
aspirações e para que os investigadores e formadores dêem sentido científico à postura de observação
participante/participada é a questão que se coloca à interacção dos transmissores e produtores de
conhecimento científico e do do senso comum, seja qual for o sítio dessa inter -acção. O envolvimento
dos interessados na solução dos problemas configurados pelos investigadores conduz a um efeito
multiplicador insuspeitado em qualquer investigação académica. Terá riscos, mas calculá-los e
controlá-los é um problema de método e de observância da deontologia profissional que preside à sua
formulação e praticabilidade no quadro dos pressupostos da formação e da educação da modernidade
avançada que recorre à epistemologia emergente da nossa contemporaneidade. Nesta perspectiva, a
estratégia metodológica da investigação-acção estrutura os métodos de produção de significados
referenciadores de aprendizagens, qualquer que seja o estádio de conhecimento de que se parta, desde
que em interactividade explícita com os actores sociais implicados no apoio ao seu desenvolvimento
autonómico. Da complexidade da processologia que tal estratégia implica, faz parte a equação de um
percurso prospectivo, entrecruzado com as dimensões de conscientização, análise estratégica,
desenvolvimento e observação reflexiva da acção perfilhada12.
A mudança prospectivada nestes termos é então antes de mais um imenso desafio. Nem a sociedade,
neste tempo de desnorte em que se vive, nem os professores, a braços com a emergência de um novo
paradigma deontológico e com a incerteza de um futuro em que poderão continuar a ser alvos
preferenciais do desemprego qualificado, se mostram suficientemente motivados para a construir de
moto próprio. O caminho passará por se adoptar, em todos os âmbitos das práticas sociais, uma
dinâmica de acção e retroacção que, problematizando as situações vividas, apele à combinatória do
conhecimento objectivo dos problemas com a imaginação social para a equação das respectivas
soluções, gerando e gerindo nessa articulação redes de intersubjectividade esclarecida que impliquem
os sujeitos em movimentos sociais subscritores do futuro. Não é nada fácil e será frequentemente
ineficaz, se o objectivo for o de priorizar a criação de recursos humanos, indispensáveis à simples
reprodução do sistema. Mas, se em vez de se apostar no capital humano se apostar no desenvolvimento
humano, se em vez de recursos subordinados ao economicismo se apostar em gente implicada nas
12
Maria Alfreda Cruz, “ Animar a Autonomia: Um Método contra a Exclusão”, Anais de Sociologia II, Lisboa, UAL 2003.
15
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várias dimensões do desenvolvimento, a partir do seu próprio desenvolvimento autonómico, então
nenhuma ineficiência de processo pode ser confundida com ineficácia. Porque eficaz será o processo de
libertação pessoal e social em cujo “ponto de fuga” possa estar a recusa da pauperização e da violência
que geram as assimetrias de poder e de acesso aos múltiplos recursos de que a sociedade global é
detentora, para ainda afinal os distribuir generosamente por um terço dos habitantes da terra...
Um método para a mudança é portanto aquele que promove uma acção competente no contexto de
inovação. Uma acção que conte com os actores em contexto para uma intervenção em sede de
consciência cognitiva/atitudinal no plano da cidadania, terá de recusar qualquer exclusão a esse
universo que não resulte da exclusiva responsabilidade de uma automarginalização consciente. O
docente/formador/animador implicado no processo de investigação-acção, terá de observar, a montante,
todos os compromissos que garantam, através de uma acção competente, que o processo disponibiliza
igualdade de oportunidades de capacitação e escolha a todos os implicados. Para isso deverá o
formador colocar a formação que faculta aos aprendentes no centro das histórias de vida e de percurso
destes13, reequacionando aquelas na perspectiva destes enquanto sujeitos históricos14 do seu próprio
futuro. Uma acção competente que vise a produção de conhecimento nestes termos resultará, então, de
centrar o processo cognitivo dos sujeitos na conjugação do conhecimento factual e da análise
interpretativa correspondente em correspondência com a identificação de acções passíveis de serem
implementadas, visando a mudança e comportando os correspondentes critérios de escolha.
Este bloco de intenções deve desenvolver-se entre dois pólos:
-
o pólo dos interesses conflituantes, embebidos nas condições ambientais e nas de uma
ordem económico-social que se questione em termos de “quem”, “porquê”, “onde” e
“como” agem, interferem e transacionam entre si as representações sociais em presença ;
-
o pólo da imaginação social resultante, por um lado, dos seus contornos intuitivos e, por
outro, dos valores individuais/sociais assumidos pelos sujeitos implicados .
Inovar na sua decorrência de um tal binómio exige que as competências promovidas possam frutificar.
E aí entram os recursos políticos e instrumentais, de suporte aos recursos humanos. Todas as
possibilidades então se abrem: desde a convergência de finalidades à oposição tácita, ideológica ou
subreptícia. Novas frentes de articulação ou de conflito se abrem, mas agora no terreno das práticas
mais claramente políticas, com reflexos institucionais potenciadores ou bloqueadores da mudança,
consoante as missões que as instituições subscrevem e os projectos que sintonizem, mobilizem ou
suportem. Em face disso, a cidadania será tanto mais operativa na exigência de uma resposta
consistente aos problemas que se lhe deparam quanto mais conhecedora for de todos os vectores que os
explicam. Sendo interdependente de valores que se pautam por critérios de justiça e dignidade, o seu
impacto no desenvolvimento, enquanto mudança ou enquanto processo de libertação de entraves,
depende muito da “massa crítica” envolvida nos processos que subscreve.
Um contexto visível para a problemática dos valores na teoria e na prática educacional da
cidadania- Introduzir a problemática dos valores na teoria e na prática educacional, em geral, e na da
habilitação para a cidadania, em particular, coloca duas opções quer à comunidade, quer à sociedade,
13
“ A formação no centro das narrativas de vida: contributo para uma teoria da formação na perspectiva do sujeito
aprendente” é o ponto de partida para a tese de Marie –Christine Josso ( 2002) que identifica o registo activo das histórias
de vida enquanto metodologia de investigação – formação. Da pertença do método ao campo da sociologia da cultura, já
Idalina Conde der a testemunho problematizador em Falar da Vida, Problemas e Práticas, 1992.
14
Conceito fundador da teoria do accionalismo de Touraine (1992).
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quer à opinião pública: ou se seleccionam como vectoriais os valores que orientam a filosofia assumida
pelo(s) poder(es) em presença, o que enforma uma atitude seguidista, de reprodução do sistema, ou,
pelo contrário, se assumem os que se lhes furtem ou contraponham, numa atitude de resistência ou de
alternatividade que passe quer pela rejeição da filosofia de partida, quer pela intuição da pertinência de
valores inovadores. Os impactos de cada uma de tais atitudes na cultura de um grupo ou de uma
instituição, serão opostos e/ou variáveis , bem como o grau de liberdade dos sujeitos na escolha dos
critérios de equação e de validação da mudança, assim como o alcance do valor desta. Os críticos da
atitude seguidista reprovam a esta atitude a sujeição do cognoscente ao conhecido, da criatividade à
rotina, do indivíduo ao sistema, bem como a heteronomia que limita a passagem do indivíduo à
condição de sujeito, portador de projecto próprio ou apropriado, em consciência e partilha de decisão e
gestão. Por seu turno, os críticos da atitude de resistência, criticam a esta a feição de “caixa de
pandora” de difícil governabilidade, bem como a autonomia potencialmente desregredora do stato quo
estabelecido e a insegurança na previsão e trilho dos rumos que conduzem ao futuro.
Na perspectiva de um percurso de transição da atitude seguidista para a da resistência, situa-se a
emergência de representações sociais e de práticas epistemológicas e sociais valorizadoras da
problemática da mudança, qualquer que seja a esfera em que tais atitudes, representações e práticas se
cruzem, convivam ou conflituem . A escola – sítio tradicional de ensino de cidadania - é uma apenas de
entre essas esferas. E mesmo que da convergência ou conflito resulte uma opção consistente, nenhuma
estratégia escolar de mudança superou eficazmente a rejeição e mesmo a indiferença que a sociedade
abrangente assumiu perante ela. Inversamente, as práticas sociais divorciadas das escolares, demitemse de nelas induzirem impactos e delas receberem estímulos potenciadores não só do seu desempenho,
mas também da problematização do sentido que lhe cabe no período histórico correspondente. Persistir
nesse divórcio é persistir em alimentar a disjunção dos saberes e conhecimentos gerados nas várias
esferas de socialização em presença, com o decorrente cortejo de disfunções e desconfianças
empobrecedoras da atribuição de sentido às práticas emergentes.
A educação ambiental como dimensão transversal do currículo de formação para a cidadania
cognitiva - A educação ambiental, enquanto disciplina de formação para a cidadania é fulcral na
mudança de atitude que se impõe para que a articulação escola/comunidade – quer académica, quer
territorial - seja então mais do que um campo de experiências frustrantes para os esforços investidos
por quantos nelas se empenham. E neste pressuposto pode e deve ser replicada e desenvolvida em
todos os sítios onde seja possível praticá-la, a partir da equação dos problemas concretos, como suporte
da identificação criteriosa das respostas alternativas possíveis e sempre aberta aos valores implícitos à
problematização dos direitos de 4ª geração, de que participam o direito à qualidade de vida que
inelutavelmente remete para o ambiente em que esta decorre . De facto, como dimensão transversal do
currículo de formação para a cidadania cognitiva, a educação ambiental pode constituir o ambiente da
relação entre a produção casuística e as políticas social e pública susceptíveis de a integrarem no
desenvolvimento sustentável, desafio vital para a sobrevivência do país, enquanto sujeito do seu
próprio destino. Área temática de encontro de ciências sociais, naturais e tecnológicas, a EA tem tido
na escola o principal suporte de consciencialização contemporânea, mas os seus desafios na produção
da cidadania não se restringem à escola. Aberto ao ambiente, enquanto universo de observação, de
experienciação e de acção (E.A. sobre, no e para o ambiente), um sítio de cidadania deve ser ele
próprio, onde quer que funcione, um ambiente de vida, em observação que recorra ao fomento de
aprendizagens activas. Essa possibilidade resulta de estarmos em fase de mudança de paradigma
quanto às responsabilidades da Educação: já não se trata só de fornecer aos destinatários bagagem
cognitiva, mas sim também oportunidades de crescimento que os tornem suceptíveis de a desenvolver
enquanto cidadãos.
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A relação do conhecimento com a acção, mediatizada pelos aprendentes, enquanto actores sociais
prioritariamente vocacionados para a assumir no âmbito da relação com os seus grupos de pertença e de
eleição, deve partir do entendimento de que todos são cidadãos em autoconstrução e não simples
recursos de intervenção decidida sem o seu envolvimento na decisão.
A passagem do sujeito ao cidadão implica por isso a assunção de valores susceptíveis de guiarem o
percurso das opções que se colocam nos procedimentos cognitivos e atitudinais. No plano cognitivo,
esse percurso assume explicitamente a subjectividade como condição da perceptividade humana,
configurando a objectividade do exercício racional como conquista de postura e de método, a
solucionar no quadro de compromissos e adquiridos da prática cognoscente vs.científica, em
desenvolvimento contínuo. No plano atitudinal, o indivíduo assume a consciência de si, na relação com
os outros e com a globalidade, na matriz do sentido que confere conteúdo cultural (e portanto
cognitivo) às práticas sociais. A problematização e valorização do ambiente emerge dessa matriz, no
quadro e tipo das relações contextualizadoras dos laços que integram o indivíduo nos seus grupos de
pertença ou eleição.
A educação ambiental não pode ainda assim privilegiar-se em relação à de uma educação para o
desenvolvimento que se queira integrado em todas as suas dimensões, a partir da dimensão pessoal. A
questão ambiental é parte da do desenvolvimento sustentado/sustentável, e a sua problematização interrelaciona-se, nesse âmbito, com a da qualidade de vida para todos, o que só é possível se a
sustentabilidade implicar critérios de justiça e atitudes comportamentais subordinadores das
capacidades e competências para uma acção liberta e libertadora, porque a liberdade faz parte da
panóplia dos direitos humanos, em que se inscreve o direito ao ambiente e às paisagens naturais ou
construidas, ao desenvolvimento e ao conhecimento, à polis e, finalmente –mas não por fim -, ao
exercício da cidadania que condiciona os restantes.
Estes pressupostos inserem pois a E.A.no conjunto disciplinar de educação para a cidadania,
entendendo-se o conceito como processo de equação dos direitos e deveres dos seres humanos, nos
contextos significantes do ambiente da própria vida, sendo estes sedimentados pelos vários processos
de atribuição de sentido às práticas sociais que decorrem das várias esferas de socialização em
presença, sejam elas uni, multi ou pluriculturais. Assim sendo, a educação ambiental é uma “disciplina”
política por excelência, porque problematiza o porquê das coisas, a partir da observação directa do
quotidiano. O currículo que a suporte tem que integrar portanto as dimensões de justiça social e de
análise social, na relação com as problemáticas da pobreza e exclusão social no acesso aos mais
variados recursos. O questionamento do modo de participação na análise deve ser o núcleo duro da
reorganização dos conteúdos, em ordem ao aprofundamento da consciência crítica dos sujeitos,
enquanto actores sociais emergentes no campo de uma possível intervenção. Viver a vida em registo
educacional, passará necessariamente por este vector de formação contínua da cidadania activa.
Da ética e da estética ambiental - Onde quer que se exerça, a Educação Ambiental integra-se
portanto numa epistemetodologia que assume a integração dos valores nos processamentos cognitivos
indispensáveis ao conhecimento dos objectos e situações com que se defronta o sujeito provido do
propósito de os (re)conhecer com o rigor de uma objectividade que nem por isso deixa de ser científica.
Apela a um raciocínio moral na perspectiva dos direitos que assistem aos sujeitos para se integrarem no
conjunto de relações que os prendem aos outros, nas várias dimensões de vivenciar o ambiente. Nesta
perspectiva, em que o direito ao ambiente – físico, social, cultural, civilizacional e construído -, passa
pela relação com os outros, a educação ambiental é sobretudo uma questão contextualizada na dos
Direitos Humanos, Sociais e Culturais. Neste sentido, a moral é uma relação entre humanos que, no
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caso, implica uma ética complexa, capaz de articular o interesse pela sobrevivência da espécie, com o
cuidado pela qualidade ambiental e pela harmonia da justa medida da relação com os outros e com a
globalidade ambiental do planeta. A justificação actual da avocação da moral aos domínios das ciências
sociais é pois menos antropocêntrica e biocêntrica do que esteve no cerne da perspectiva iluminista,
que privilegiou a componente biológica da afiliação do homem na relação com a natureza. Mas mesmo
na perspectiva mais geral dos nossos dias, a compreensão do ambiente remete para as várias dimensões
do conceito de harmonia, que comporta uma tipologia compósita e complexa de atitudes do cidadão em
face de si próprio ( implicando uma ética de sentido sensorial e experiencial), em face dos outros (ética
de tipo relacional) e em face da própria globalidade, inclusa na ambiental ( ética de responsabilidade e
de cuidado físico). Todas estas dimensões da ética se exprimem numa estética de composição que apela
ao equilíbrio e à justa medida. É portanto uma questão de civilização, sem deixar por isso de ser
também hoje e cada vez mais - à medida que os riscos crescem exponencialmente com o
desenvolvimento demográfico, o crescendo da pauperização dos povos e da precariedade da terra,
enquanto recurso da Humanidade - uma singela questão de sobrevivência...
Em síntese: Para operacionalizar a educação ambiental, qualquer que seja o meio em que se exerça, é
fundamental:
1. investigar o que se observa, partindo da relação crítica que o sujeito estabelece, individual
ou colectivamente (grupo), com o contexto que enquadra as vivências de que participa;
2. ser - se motivado para a compreensão crítica e para a capacidade de intervir no sentido de
poder gerar impactos na emergência de situações futuras, assumíveis como metas possíveis;
3. desenvolver potencialidades / competências para intervir de acordo com as capacidades
despoletadas no processo de aprendizagem assistida pelo processo de investigação-acção de
que se participa, em inter-acção com os outros e com o decurso da intervenção;
4. exigir respostas à altura do esforço investido na habilitação da cidadania cognitiva- .
A finalidade do envolvimento do sujeito no processo é a de prosseguir os objectivos de mudança,
perfilhados em sintonia com o seu próprio projecto de vida. A educação deve assim cumprir, na
perspectiva de uma tal aliança, o objectivo de animar o desenvolvimento das pessoas e das
comunidades, para lhes permitir que sejam livres, solidárias e felizes. Um projecto educativo que se
paute pelo faseamento I-V-A-M (investigação – visualização - acção - mudança)15, tendo o ambiente
como conteúdo substantivo, está tanto mais nesse caminho quanto mais habilitados e sintonizados com
tais objectivos estiverem os formadores que mediatizem, como parceiros dos formandos, o modo de os
tornar investigadores e cidadãos. Mas este é por natureza um percurso biunívoco, na medida em que
possa espoletar processos que recorram a protocolos de sustentação de políticas específicas. Está no
caso a dos solos urbanos, política pública ainda imatura na relação com o direito administrativo, mas
indispensável ao enquadramento de projectos de ordenamento territorial acordados no âmbito da
negociação de propostas que possam ser apresentadas aos poderes públicos por observatórios de
cidadania. Identificado o solo urbano como vectorial num país em que os processos de desorganização
territorial passam por um conglomerado de factores, cujo enfrentamento exige determinação política e
habilitação técnica, propostas deste tipo podem comportar a necessidade de se proporcionar aos
agentes relacionados com a gestão do solo formações específicas ao nível de peritagens técnicas
orientadas para a acção e centradas na reflexão, diagnóstico e identificação dos instrumentos
necessários ao conjunto de políticas orientadoras de uma acção transformadora da gestão dos processos
dos solos urbanos, assim se permitindo que o ordenamento territorial devolva ao ambiente os seus
créditos na fundamentação da qualidade de vida.
15
PATRÍCIA JOYCE, Congresso de Educação Ambiental. Braga, U: M:-IIE., Outubro de 2000.
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A gestão estratégica da inovação possível- Com fundamento em todo o argumentário implícito ao
presente estudo e às referências que expressamente o contextualizam, desde as da autora à dos
especialistas das várias matérias também avocadas, o ensaio de um sítio de cidadania recorre a um
duplo protótipo que nos propomos enunciar na vertente WEB e na da sua experienciação em sítio(s) de
cidadania territorializado(s). Preve-se que o sítio Web seja concebido como sistema de portais que
abrem a uma explicitação do projecto vocacionada para os seus públicos-alvo, a saber os cidadãos, em
geral, aqueles que careçam de habilitação específica para exercerem os desafios do empowerment e
finalmente os que acedam aos propósitos e desafios de habilitação apropriada à oferta pública dessa
mesma habilitação. Da relação do sítio web assim entendido com os portais dos mesmos universos
temáticos – da governação à cidadania e ao sistema de conhecimento, inovação e ciência – emergirão
linhas de força da auto-regulação do sistema de informação constitutivo do observatório de que é
provido cada sítio de cidadania. A estruturação do portal emerge do cruzamento das dimensões
contextuais de KNOWSHARE, LEGISLAÇÃO, LINKS e FAQ16, bem como as dimensões vectoriais do
modelo de funcionamento da rede de cidadania polárquica, com a sua especificação em três níveis - o
nível de sítio local, o nível do observatório de cada um dos sítios e o nível do observatório de
cidadania que integra num outcome único os outputs de toda a rede.
O desenvolvimento do portal deverá comportar cinco páginas: a página de átrio ou mapa do sítio web ,
a da política pública da cidadania activa e inclusiva, a da sítio local do cidadão na rede de cidadania, a
do observatório local do cidadão e a do observatório integrado da cidadania, cada uma delas provida de
texto introdutório e de percursos de acesso e de exploração de conteúdos nas variáveis seguidamente
listadas.
0. Home
Mapa do sítio WEB
1.1.Princípios Básicos
1.2. Grupos-alvo
1.3. Parcerias
1.4. Actores Sociais
1.5. Políticas Públicas
1.6. Enquadramento legal
O sítio e a rede de cidadania
2.0. Knowshare
2.0.1. Teses
2.0.2. Glossário
2.0.3. Modelo
2.1..Acolhimento
2.1.1 Os objectivos do sítio (cf. power point)
2.1.2. Os objectivos de quem aceda à rede
2.1.3.O Projecto de inter-acção
2.2.Locais de implantação geográfica
2.2.1.Os sítios à escala do país
2.2.2.O sítio no território do concelho
2.3.Equipa do sítio
2.3.1. de enquadramento do observatório
2.3.2. de investigadores
2.3.3. de formadores
2.4. Actividades
2.4.1. Core: Funções de suporte
2.4.2. Modo de inter-acção funcional
16
- As perguntas mais frequentemente colocadas sobre o projecto (FAQ,no léxico anglosaxónico) devem ser identificadas
em processo de interacção da equipa de promoção do projecto com o(s) protótipo(s) territorializados.
20
IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Madrid, España, 2 -5 Nov. 2004
Documento Libre
3.
2.5. Projecto específico de funcionamento do sítio
2.5.0. Especificação das dimensões funcionais
2.5.1. Especificação e recursos envolvidos
2.5.2. Acções de formação presencial
2.5.3. Portfólios metodológicos
2.6. Laboratório de ambientes virtuais de aprendizagem
2.6.1. Especificação e recursos envolvidos
2.6.2. Acções de formação
2.6.3. Portfólios metodológicos
O observatório local do cidadão
3.0. Localização no sítio
3.1. Glossário
3.1.0. Links recomendados
3.1.1. Palavras-chave
3.2. Assuntos em foco
3.2.0. Links recomendados
3.2.1. Outcome
3.2.2. Opiniões recolhidas
3.3. Assuntos em carteira
3.3.0. Links recomendados
3.3.1. Opiniões recolhidas
3.3.2. Bloco de Notas
3.4. Trabalhos em curso
3.4.0. Assunto específico
3.4.1. Bloco de Notas
3.4.2. Metodologia
3.4.3.Plano de desenvolvimento
3.4.4.Relatórios-progresso
3.4.5. Links recomendados
3.5. Assuntos Resolvidos
3.5.0. Assunto específico
3.5.1. Bloco de Notas
3.5.2. Output
3.5.3. Relatório – Síntese
3.5.4. Discussão
3.5.5. Links recomendados
3.6. Assuntos Transitados
3.6.0. Assunto específico
3.6.1. Projecto de encaminhamento
3.6.2. Processo de acompanhamento
3.6.3. Links recomendados
3.7. Bases de Dados
3.7.1. Estatísticas
3.7.2. Geográficas
3.7.3. Outras
3.7.3. Links recomendados
3.8. Bases de conhecimento
3.8.0. Bloco de Notas
3.8.1. Assuntos específicos
3.8.2. Estudos de caso
3.8.3.Sistemas de opinião
3.8.4.Sistema de objectivação
3.8.5. Links recomendados
3.9 3.9 Eventos
3.9.1.Perfil
3.9.1.1.Encontros
3.9.1. 2.Outros
3.9.2.Resultados
21
IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Madrid, España, 2 -5 Nov. 2004
Documento Libre
3.9.2.1.Encontros
3.9.2. 2.Outros
3. 10. Outputs locais
3.10.1.Comunicados
3.10.2. Outros
3. 11.Produção
3.11.1.Publicações
3.11.2. Decisões
3.11.3. Links recomendados
4. Observatório da Cidadania
4.0. Localização no sítio
4.1. Glossário
4.1.0. Links recomendados
4.1.1. Palavras-chave
4.2. O sistema de observatórios locais do cidadão
4.2.1.O processo input/output/outcome
4.2.2. O processo benchmarking
4.3. Produção
4.3.1.Assuntos em foco
4.2.0. Links recomendados
4.2.1. Outcome
4.2.2. Opiniões recolhidas
4.3.2 Assuntos em carteira
4.3.0. Links recomendados
4.3.1. Opiniões recolhidas
4.3.2. Bloco de Notas
4.3.3. Assuntos transitados
A gestão estratégica da inovação possível em cada um dos sítios dependerá do grau de acerto das várias
valências implicadas na praxis que vier a ser assumida na interacção dos agentes locais nela implicados
e na dinâmica de outputs locais e outcomes integrados nas políticas sociais e publicas incentivadoras de
uma cidadania para todos na Sociedade emergente do Conhecimento.
Bibliografia
A presente bibiografia aduz os seguintes espécimes à da Comunicação da autora ao VII Congresso CLAD (
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IX Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Madrid, España, 2 -5 Nov.
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23
Perfil da política pública de promoção da
cidadania activa e inclusiva
Maria Alfreda Cruz Viana
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
Perfil da política pública de promoção da cidadania activa e inclusiva
Maria Alfreda Cruz Viana
Portugal, 2005
A cidadania no questionamento da complexidade - Tomando por pontos de partida os pressupostos
dos painéis do presente Congresso que se propõem problematizar:
a)os âmbitos das estratégias pertinentes à luta contra a pobreza, a partir das dinâmicas de
pauperização e da precarização que lhe abre caminho accionando os mecanismos de exclusão e de
vulnerabilização, vigentes nas sociedades duais 1 ,
b)o modo como os processos de descentralização do poder político-administrativo afectam o
território e o grau da autonomia com que as suas peças intervêm nas políticas públicas 2 ,
c) o desafio de encontrar em cada particularidade glocal o elo entre a investigação e a prática da
gestão pública que permita coordenar com sentido estratégico um desenvolvimento sustentável 3 ,
para o qual os meios operacionais da sociedade do Conhecimento, ainda que por si só não bastem,
constituem poderosas alavancas. 4
o presente documento articula-se sequencialmente àqueles que em 2002 e em 2004 a autora
apresentou aos VII e IX Congressos do CLAD, respectivamente intitulados o Direito à Cidadania na
Sociedade do Conhecimento e A Cidadania na Estratégia de Desenvolvimento do Capital Social. No
seu desenvolvimento, o presente argumentário faz apelo a documentação emergente da participação
ulterior em eventos confluentes no tema, com destaque para o próprio Congresso antecedente do
CLAD, em que Edgar Morin apresentou a perspectiva epistemológica que aqui se subscreve.
Assim, o presente documento desenvolve os princípios da concretização de uma política pública,
sustentada pelos conceitos de direito universal, civilização e desenvolvimento sustentável como sendo
os nucleares dos argumentos a favor da defesa do interesse do Estado na promoção da cidadania social,
enquanto modo activo e inclusivo:
1 - de se assumir ele próprio como Estado-cidadão e portanto portador de projecto promotor de uma
política fundacional da cidadania, entendida como direito universal à plena participação na polis e
como garantia de coesão social fundada em critérios educacionais e civilizacionais que
operacionalizem a governação democrática na pós-modernidade;
2 - de tornar exequível o desenvolvimento sustentável, enquanto processologia integral e integrada,
com recurso ao long life training do pensamento complexo e, por isso, habilitado para problematizar
a sociedade de risco e para aprender a optar entre alternativas múltiplas que se coloquem nas
vivências concretas e nos decursos temporais expectáveis;
3- de operacionalizar nesse âmbito a democracia electrónica no universo dos objectivos imanentes
ao funcionamento dos sítios que integrem a rede de promoção e dinamização da cidadania social,
1
Area: Estrategias para la lucha contra la pobreza. Coordinador: Fabián Repetto
Area: El fortalecimiento de la capacidad de gestión de los gobiernos subnacionales. Coordinador:Darío Restrepo
3
Area: El fortalecimiento de la cooperación y la coordinación gubernamentales. Coordinador: Leonardo Garnier
4
Area: El desarrollo del gobierno electrónico. Coordinadora: María Alejandra Sepúlveda
2
1
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
que modelizamos e funcionalizamos em termos que identificam tanto as valências centrais da
habilitação para a cidadania e para a empregabilidade como a complexidade das dimensões de
afectação das políticas públicas e sociais à sustentabilidade dos vários capitais indispensáveis ao
desenvolvimento de todas elas ( cf. Anexo 0).
A questão da Democracia Electrónica - O desenvolvimento da Internet enquanto chave da
organização das sociedades da modernidade avançada, tem ocorrido em função de perspectivas,
características e possibilidades que demonstram como os vectores de apropriação social e política da
informação propiciada pelas redes virtuais têm tendência a democratizar o questionamento e intervenção
nos poderes decisionais, mas exactamente na medida do grau de conscientização dos destinatários destes
mesmos poderes.
Em quadro sistematisado em Anexo ( Anexo III), aponta-se, com a entrada no século XXI, a emergência
de uma cidadania social fundada na viragem das práticas da participação. Mas para que as suas
virtualidades tenham impacto significativo é preciso que o universo dos usuários se extensifique o que,
em nosso entender, será possível com o investimento político e social nas diferenciadas vertentes que
aliem a prática da democracia electrónica à do funcionamento em rede de uma democracia poliárquica
que traga para o terreno social das práticas da cidadania o território preciso em que elas se desenvolvem
e reflectem.
Um desenvolvimento de cariz civilizacional - Cruzando o exposto com os pressupostos dos painéis do
presente Congresso, encaremos então os desafios da governabilidade, ponderando a problematização das
práticas de gestão pública com que Edgar Morin encerrou o IX Congresso CLAD. Ao salientar que a
mundividência actual exige a reforma de pensamento necessária para lidar com a complexidade, o
epistemólogo 5 questionou os princípios de descentralização, anarquia e especialização de competências
implicados em formas de burocratização constituídas de modo a conduzirem à desresponsabilização dos
subordinados e à corrupção que progride em contexto de deterioração do valor da solidariedade. A
alternativa passa por encarar uma reforma do Estado baseada numa desburocratização capaz de
combinar especialização, competências e responsabilidades interactivas, mas sem que possa dispensarse um “núcleo duro” sistémico, que seja assumido como centro de dinamização comum das referidas
funções. De facto, o processo burocrático desbloqueia-se não quando não quando esse núcleo duro se
esvai, mas antes quando ele próprio reconhece a possibilidade de iniciativa e de autonomia a uma área
periférica ao centro decisional. É pois o cruzamento da hierarquia com a poliarquia que permite
implementar um modo de organização interactiva vivificada por espaços de iniciativa e de
corresponsabilização. As competências especializadas deixam de ser autónomas, na medida em que as
policompetências as cruzem e articulem. Visões epistemológicas intrínsecas aos vários modos de
produção do saber podem então interagir produtivamente e as sociedadades podem inserir-se neste
modo de ser, gerando organizações aprendentes que se adequem ao processamento do pensamento
complexo. A inovação e a criação em qualquer domínio são qualidades emergentes deste contexto.
A racionalidade deste modo de ser corresponde à atitude que favorece os intercâmbios de informação e a
comunicação interactiva. Pelo contrário, a racionalidade que favorece a compartimentação das
especialidades produz a hierarquização que, no plano organizativo, conduz à centralização. O
taylorismo é o seu paradigma e demonstra como uma tal racionalidade conduz à perversão mecanicista
dos estilos de vida. A reforma da Administração é interdependente da da Sociedade e põe problemas
5
Na Conferência conclusiva do IX Congresso Internacional do CLAD sobre a Reforma do Estado e da Administração
Pública, em 5 de Novembro de 2004, o autor que actualmente preside à Associação para o Pensamento Complexo (Paris)
remeteu o aprofundamento epistemológico da questão para a sua obra “O Método”, em particular o vol. I “ A Vida da Vida”
e para o vol. II, “ O Conhecimento do Conhecimento”.
2
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
muito complexos, porque a mudança de paradigma societal dos nossos dias exige que ela se fundamente
na reforma dos referenciais da ética, dos modos de vida e da educação. A reforma do Estado necessita
dos agentes da sociedade que aceitem implicar-se nela e que sejam simultaneamente conhecedores
desses referenciais e conscientes de que todo o conhecimento deve habilitar-se a processar redundâncias,
embora deva recusar a cultura de desperdício cognoscente, implícito a qualquer modo de
epistemicídio, como é frequente praticar-se em dinâmicas autoritárias de aculturação ou de convivências
dos saberes eruditos com os do senso comum..
Dito isto, haverá no entanto que assumir que a democracia não basta para a produção e o
desenvolvimento do conhecimento e das suas implicações nos modos de resolução dos antagonismos
que surgem necessariamente nos sistemas abertos, onde porém melhor se exprime a pluralidade dos
direitos e deveres, bem como das formas de investigação, comunicação e de informação que constituem
os pilares nucleares da Sociedade do Conhecimento. A regulação institucional neste contexto pode
exigir procedimentos novos em relação aos vigentes noutros contextos. Desde logo porque o
conhecimento não se circunscreve apenas às componentes da investigação académica e dos saberes dos
peritos: também os saberes compósitos do senso comum são indispensáveis ao sistema que processa as
conexões possíveis e pertinentes para os desempenhos societais a que Administração se dirige. O
autismo dos peritos pode porém desmuniciar a capacidade de pensar dos cidadãos. A democracia
cognitiva necessita portanto de boas instituições democráticas, mas com vitalidade capaz de favorecer a
relação dos cidadãos com a res publica. Sem que isso aconteça, continuaremos a assistir à deterioração
das vivências democráticas, implicando a deterioração do civismo e a iniquidade que convive com a
insuficiência de procedimentos transparentes, porque assim o exige a situação fundada em caos de
competências e de responsabilidades. A integração destas em sistema unificador é o modo de contrariar
tal situação, sendo a recursividade um critério a ter em conta por um sistema de administração que
maximize o interesse dos destinatários e o da própria sociedade.
Assumir a consciência de que a reforma da vida é a base da reforma da civilização e esta a da reforma
do Estado, é utilizar a chave de que o impulso de todas deriva da primeira. Mas reformar a vida é
reformar o modo de a conceber, de a pensar e é assumir a própria necessidade de questionar os
processos mentais que subjazem às várias concepções daexistência e do quotidiano. Central neste
procedimento recursivo Vida/Sociedade/Estado é então o conhecimento e a educação que o infraestrutura para que ele possa assegurar a reforma das mentes que garanta a maximização dos direitos à
autonomia, à liberdade e à interrogação...
A questão educacional – A identificação da educação como questão vectorial da apropriação do
conhecimento não pode porém continuar a ser remetida para a especificidade da educação formal, de
paradigma escolar, porque isso significa que se está a remeter para horizonte futuro a expectativa dos
seus impactos na sociedade, abstraindo de dois aspectos nucleares: o de que as comunidades escolares
funcionam em sistema fechado à administração do contexto e o de que o direito aos benefícios da
educação não podem continuar a restringir-se a quem não passa ou passou pela escola o tempo
suficiente para dispor das ferramentas essenciais da literacia. A situação portuguesa é amplamente
significativa do facto. Como noutro lugar dissemos 6 , apesar da aposta universal na educação para todos
ter acompanhado difusão da escola pública que o Estado promove entre nós desde o início do 3º quartel
do século XX, nem por isso se deixou de continuar a viver numa sociedade com duas velocidades de
desenvolvimento quanto a oportunidades e acesso aos saberes e aos poderes, o que demonstra à
saciedade que o sucesso escolar não é por regra independente da estrutura social. O mistério do
6
“ Tornar possível o sucesso escolar”, Comunicação da autora ao Congresso da Sociedade Portuguesa de Ciências da
Educação, abril de 2005.
3
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
insucesso escolar pode pois ser desvendado recorrendo à problematização do modo como, na tragédia
do Titanic, as desigualdades sociais se reproduziram em face do desafio colocado pelo acesso aos meios
de salvamento. Então, o que está aqui em jogo é o sistema autoregulado de que a escola faz parte. Logo,
quaisquer que sejam os perfis dos sistemas educativos que os países perfilhem, a auto-regulação do
macro-sistema abrangente dos sistemas institucionais que, na educação, o reproduzem chega por si só
para desvirtuar as soluções especificamente equacionadas como respostas plausíveis ao insucesso
escolar.
Este é o desafio com que nos encontramos confrontados. A chave de uma resposta ao nível das
comunidades educacionais, quaisquer que sejam, tem necessariamente de passar por perfilhar-se e
praticar-se uma pedagogia diferenciada que recuse tratar por igual as diferenças duais, já que este é o
modo insofismável de as perpetuar. Mas passa igualmente por inscrever as práticas educativas numa
política de cidade e de polis que se não conforme com uma simples abertura da escola ao contexto em
que se inscreve, porque o estímulo à participação cidadã das famílias e das suas comunidades territoriais
só obtem resposta de quem sabe como fazê-lo e esse universo continua a ser restrito. Os riscos que este
modelo comporta põe em causa a consolidação dos laços de coesão permitem a sobrevivência dos
princípios e valores que constituem o património ético das comunidades. Estamos na hora de
configurarmos outro modelo, em que a participação em contexto de cidadania extensiva parta da própria
polis para as comunidades educativas. E isso passa formalizar uma alternativa á lógica da organização
formatadora da hierarquização excludente e autista que destrói a coesão do tecido social de que as
organizações emergem. Incluindo a escolar, naturalmente.
A “linha de fuga” da inclusão social - Não se pode pois actuar sem repensar a crise da modernidade
contemporânea. Muitas buscas de saída para a crise correspondem à equação de soluções para o
desenvolvimento. Mas este conceito, mesmo na acepção de sustentado é um conceito ambíguo, porque a
sua carga conotativa pode trair o objectivo final que é o do próprio desenvolvimento do ser humano. É
certo que a potenciação do conceito de pessoa humana, remete para a cultura ocidental que o concebeu e
também é certo que outras culturas podem denegri-lo em função do vício do etnocentrismo da cultura
ocidental. Mas por outro lado, quando o próprio conceito de desenvolvimento sustentável assume a
dimensão da qualidade de vida, é preciso sublinhar que a vida é, entre outras coisas básicas e
inalienáveis, o direito à autonomia, à liberdade e à interrogação. Se o desenvolvimento subscrever o
individualismo que trai a solidariedade e desprezar a capacidade do ser humano para reconhecer o que
subjaz ao que é visível, muito conhecimento é desperdiçado e muitos direitos subestimados.
A noção de desenvolvimento carece pois de ponderação, de calibração. Não queremos um
desenvolvimento anómico em contraponto com a ética e com o poder de regeneração que toda a
sociedade comporta. Então há um outro conceito que é preciso trazer à tona e reabilitar: o conceito de
civilização para que qualquer reforma se efectue no contexto dos referenciais: ética, responsabilidade,
solidariedade. Pronunciando-se neste sentido e citando Holderlïn, Morin rematou a intervenção no IX
Congresso afirmando que “onde cresce o perigo, cresce também a salvação” - assim se opte por ela.
Transitando então do desafio da governabilidade do sistema de administração pública em geral e em
particular o da educação para o das estratégias da luta contra a pobreza, a precarização e os direitos de
vivenciar o território da polis no contexto da globalização de hoje, depara-se-nos a questão da
participação dos seus usuários. Perfilho a tese de que a participação das pessoas no exercício das
escolhas é a questão-chave de qualquer política pública verdadeiramente aberta, como aquela que Edgar
Morin defende. A operacionalização desta tese passa pelos seguintes princípios:
1 - A participação reporta-se à questão da cidadania, entendida como interacção direitos/deveres no
universo dos direitos humanos, sociais, culturais, económicos, com proeminência dos direitos.
4
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
2 - Para encarar o envolvimento das autoridades locais nesta matéria, no contexto da Sociedade do
Conhecimento que emerge da aceleração dos saberes por efeito das novas tecnologias que se lhes
reportam, e tendo em conta a apropriação diferencial das mesmas pelas várias classes e segmentos
sociais em presença, será necessário configurar uma política pública no quadro dos princípios de uma
Carta de Direitos Urbanos 7 , capaz de articular aos poderes públicos, os cidadãos e os peritos adequados
`a prossecução dos objectivos de referência das políticas inclusivas.
3 - A realização destas políticas deverá apoiar-se em novos lugares de difusão de informação e da
habilitação das pessoas para poderem escolher uma “linha de fuga” entre a multidão de soluções
possíveis em referência aos problemas analisados. A actividade desses novos locais reporta-se às
práticas de funcionamento de comunidades de aprendizagem absolutamente voluntária, em ligação às
ONG e com sustentação pública no que concerne a sinergias de investimentos para a apropriação e
tratamento de informação, designadamente no plano dos recursos tecnológicos, pedagógicos, de
investigação-acção e de animação cultural desenvolvidos no contexto da vivência quotidiana.
5- Estes lugares de aprendizagem informal e para-formal, implicada na promoção da cidadania activa e
integrativa, poderão comportar diversas configurações físicas, de acordo com a organização territorial da
cidade, desde que em articulação às instituições do sistema educativo e de emprego abertas à inovação e
ao apoio à criatividade.
6- Neste contexto será possível:
a)
abrir novas perspectivas às pessoas mais carenciadas no que se refere ao controle da sua
habilitação para intervirem com conhecimento de causa no seu quadro de vida, incluindo nisso o
desenvolvimento pessoal e o modo de encarar a empregabilidade fungível do nosso tempo;
b)
assegurar uma dimensão de mercado social de emprego às classes profissionais fustigadas
pelo declínio demográfico da escolarização e da formação tradicional de adultos, encaminhando o
investimento dos seus saberes para uma política pública implicada na prevenção da violência e
convocando também para isso pesquisas transversais particularmente incidentes nas matérias das
várias ciências humanas, sociais e políticas que se lhes referem;
c)
opor a estratégia da violência, enquanto prática de dominação e de imposição argumentativa
à da interacção social encarada pelo ângulo da negociação e da convivialidade interpessoal;
d)
captar as iniciativas cidadãs no que respeita à identificação de prioridades de resolução dos
problemas complexos, tendo em conta lógicas solidárias e participativas.
e)
assumir que respeitar a individualidade dos seres humanos é um dever distinto do incentivo
ao individualismo, pelo que é fundamental modernizar os processos de controle das sinergias naturais
que respeitem as individualidades, mas em contexto de responsabilização interactiva.
A política pública para estimular uma cidadania activa e inclusiva com estes contornos será, pois, do
nosso ponto de vista, fundamental para apoiar todas as outras políticas inclusivas conduzidas no sentido
duma coexistência pacífica na cidade. No seu contexto, será possível apostar na regeneração do civismo,
condição sine qua non da maturidade democrática e reforçar-se a consciência reflexiva e crítica das
pessoas, sem deixar de se levar em linha de conta os constrangimentos fora de controle à escala local,
por serem desencadeados por fenómenos de organização global de exploração de recursos e de seres
humanos, em proveitos de empreendedores que dispõem para isso de vantagens permitidas pelo modo
de dominação da globalização vigente. Entretanto as autoridades locais podem assumir o desafio da
inter-cooperação, fazendo o que estiver ao seu alcance não somente para melhorar o quadro de vida dos
7
Council of Europe, Congress of Local and Regional Authorities of Europe, http://www.coe.fr/cplre/
5
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
cidadãos mas também para alargar a todos a oportunidade de encararem as suas circunstâncias,
estabelecendo um novo quadro de alianças para defender a cidade da dominação dos grandes interesses
financeiros e especulativos.
Colocar o quarteirão no âmago de uma política de coesão social pode passar pelas mais diversas acções
de participação. Em todo o caso, grande parte da população não tem possibilidades de configurar uma
opinião positiva sobre os assuntos que apresentem maior complexidade, nomeadamente no que respeita
à identificação de prioridades a considerar no orçamento das autarquias e portanto também por aí passa
a incapacidade de tomar em mãos o seu próprio destino. E nisso reside o cerne da frustração pessoal e
mesmo da violência quotidiana. E a fragilização da sustentabilidade.
A perspectiva da sustentabilidade – Segundo Pierre Gourou, autor do conceito que norteou a escola
portuguesa de geografia até aos nossos dias, “ a civilização corresponde ao conjunto de técnicas de
domínio da natureza e de organização do espaço”. A perspectiva epistemológica da modernidade
avançada autoriza ao ajustamento do conceito no sentido de que a civilização seja encarada enquanto
sistema de técnicas de relação dos seres humanos entre si e com a natureza, incluindo a organização dos
múltiplos espaços dessa relação desde o da convivência interpessoal ao da projecção desta no território.
A cidade constitui o leit motiv da organização deste e o locus privilegiado da convivialidade capaz de
atingir a discussão das problemáticas que trancendam a simples sobrevivência. Passar tais princípios à
prática passa por banalizar a consciência de que a cidade, sendo a expressão duma relação social
integrada, deve corresponder no seu desenho e no seu funcionamento à vitalidade dinâmica desta
interacção e que qualquer intervenção no território deverá ser promovida de acordo com o corpo do
direito instituído, apostando evitar a colisão de interesses em presença, através do recurso a negociação
das partes que os exprimam, mas usando a lei e a legalidade para os desempates indispensáveis. Para
isso, a negociação deverá atravessar todo o processo de um planeamento mediador da investigação e da
acção não apenas algumas das suas fases, cumprindo-lhe chamar à discussão de tudo o que for estando
em jogo quer os actores sociais que do lado da procura, quer os agentes que do lado da oferta
subscrevam as regras da participação assumida. Isso significa que o processo decisional em modo de
participação consciente terá de cruzar todo o faseamento do chamado processo de planeamento,
programação e execução controlada, desde a equação das problemáticas envolvidas à opção pela
alternativa que lhes d(ar)á resposta.
Essa é a pedra de toque de um planeamento mediador que se pretenda actuante e não apenas prospectivo
As suas opções terão de ser integradas e faseadas no tempo, mas isso não chega. Um processo deste
tipo terá ser contínuo e flexível para que possa sempre comportar, em sede de avaliação/ajustamento, a
introdução de inovações que o decurso temporal possa justificar, sejam elas de natureza técnica, sejam
de natureza processual. Todavia, este carácter de flexibilidade liberto da cega rigidez de uma
planificação burocrática, deverá blindar-se contra oportunismos e irresponsabilidades injustificáveis à
luz dos postulados éticos inerentes aos “cadernos de encargos” do processo participativo A mediação de
conflitos na busca activa de soluções alternativas às previstas quando estas se justificarem por razões
emergentes, designadamente em sede de risco ou de inovação, deverá pois passar a ser função central do
processo de planeamento assente na observância responsável dos princípios da incerteza, do respeito
pela natureza e pelos parceiros envolvidos. Com o perfil de I&D, compete à mediação habilitar-se em
permanência para esse efeito para que possa responder por tais princípios, em relação simultânea com as
instâncias que enquadrem funções implicadas nas problemáticas postas em questão, mas também com
os comuns destinatários a quem terá de fornecer-se os instrumentos de objectivação de tudo o que for
estando em causa, para que as suas livres opções possam ser assumidas com perfeito conhecimento de
causa.
6
X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
Dos princípios às práticas, coloca-se então imperativamente a questão do método de objectivação dos
problemas. A objectividade decorre do rigor com que a metodologia de observação e de interpretação
dos problemas for assumida. Ora a identificação dos problemas conduz-nos a ultrapassar os limites
administrativos do(s) território(s) em que cada comunidade se projecta, o que remete para a necessidade
de se identificar formas de os ultrapassar de acordo com a espacialização das soluções e isso implica
conceber e institucionalizar modos de intervenção aplicáveis ao desenho espacial que se ajustar ao
desafio de solucionar os ditos problemas.
Trata-se pois subscrever o compromisso de não iludirmos a complexidade e por isso não nos podemos
cingir nem aos limites administrativos como fronteiras de concepção e de intervenção no espaço, nem à
grelha temporal dos processos eleitorais como sendo desiderato suficiente para que a gestão do território
assuma este como património daqueles que o fruem e o habitam. Este é o primeiro desafio que se nos
coloca. E só faz sentido assumir tal compromisso se o processo de planeamento contínuo comportar a
produção de planos territorializados da inter-relação das soluções encontradas para os sistemas
complexos de problemas que se colocam à vida quotidiana em meio urbano, perspectivando a
colmatação de carências numa sucessão de horizontes temporais cujas saídas se consubstanciem
sucessivamente num Plano de Muito Longo Prazo (PMLP) 8 e em todos aqueles em que ele se for
desdobrando na escala temporal e pormenorizando na escala espacial, tendo permanentemente em conta
a interdisciplinaridade de registos de análise prospectiva, a conscientização dos usuários e a
responsabilização dos eleitos perante os cadernos de encargos que transitem de um a outro mandato
popular.
Uma situação planeada nestes termos solidários da Agenda XXI corresponde a uma dimensão integrada
de políticas públicas com compromissos de longo prazo e executáveis em modo eficaz de coordenação
interinstitucional do poder político projectada nas redes horizontais da governação em linha e nos
vectores verticais da articulação e delimitação de competências entre os níveis de administração central
e autárquica. Este princípio só faz sentido se o segundo desafio for assumido e o segundo desafio é o da
ratificação das propostas pela dinâmica da participação. Isso exige uma dimensão participativa que
inclua a capacidade de transcrever a leitura técnica e científica dos fenómenos para a da subjectividade
racional do senso comum. A mediação deverá estender-se pois à mobilização e gestão de parcerias
mobilizadoras da participação pela via do associativismo ou outras que, de modo espontâneo ou
sustentado, habilitem os interessados na res publica a ultrapassarem neste mesmo âmbito a simples
condição de eleitores. Só deste modo é que a sustentabilidade das propostas de intervenção no território
fará sentido, ao ratificar-se a sustentabilidade de políticas públicas responsáveis pela perspectivação
congruente do desenvolvimento nas várias etapas que o integrarem. Estas deverão subscrever para isso
os necessários critérios de rigor na identificação cruzada das exigências dos destinatários e dos recursos
disponíveis, incluindo a previsão prudente dos custos orçamentados. Tudo isto passa porém por nunca
iludir 3 imperativos:
O primeiro é a necessidade de maximizar o objectivo do equilíbrio social e de atender à
satisfação das populações;
O segundo é a capacidade de centrar a intervenção no território na política de mobilidade
capaz de reduzir as deslocações quotidianas, optando por meios de transporte que possam ser
adoptados como factor de qualidade de vida e do ambiente e incentivando políticas que
privilegiem recursos renováveis, assumidos no âmbito de políticas ambientais de perfil ecossocial;
O terceiro é a competência para conectar a estas outras intervenções que incidam num
ordenamento territorial às várias escalas de fruição do espaço, desde o da cidade ao(s) da(s) sua(s)
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Os Desafio da Sustentabilidade segundo M.Costa Lobo ( Ciclo de Conferências INA, 2005)
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X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
Documento Libre
área(s) de influência directa (e regional).
Neste âmbito é possível conceber e ratificar variações a prazo na velocidade do progresso previsto. A
combinatória dos períodos de expansão com os de recessão pode traduzir-se numa função sinusoidal
normal que é a que, no domínio de observação cósmica, exprime a cintilação das estrelas. Para que tal
combinatória faça sentido, é exigível que a nomalização da curva de progresso tenha um perfil
ascendente e que este possa ser passo a passo avalizado e eventualmente renegociado com os
destinatários, o que implica facultar-lhes habilitação para a percepção do desenvolvimento de tudo o que
possa estar em jogo. Essa habilitação corresponde ao terceiro desafio que em si mesmo implica uma
política pública emergente de apoio à transparência de todas as outras.
O PROJINA ( Projecto de Investigação na acção) propõe-se constituir-se como um caso-escola num
domínio de sustentabilidade fundada nos pressupostos antecedentes. As suas balizas emergem da
estratégia de concepção que o vincula ao universo do mod(el)o por que nos vimos batendo ao longo das
sucessivas Comunicações apresentadas ao CLAD.:
1 – A estratégia de concepção visa assegurar a emergência de uma cultura de cidadania extensiva,
activa e inclusiva:
1.1.criando políticas públicas destinadas a apoiar o desenvolvimento de uma cidadania com
incidência em todas as etapas da vida e que conduza os indivíduos a saberem optar entre as
alternativas que se lhes vão colocando no quotidiano;
1.2. fundando um serviço público distribuído em rede que garanta os recursos adequados para
banalizar:
- o controle das agendas que decidem dos destinos colectivos
- os modos de acesso a fontes fundamentadoras das alternativas de decisão em presença
- a compreensão dos assuntos que se lhes reportam;
2. Os desafios que esta estratégia enfrenta passam por integrar nesse âmbito os objectivos dos
destinatários que o perfilhem, atendendo :
- aos perfis dos segmentos sociais em presença
- às vertentes do respectivo posicionamento nas vertentes da oferta e da procura do serviço de
promoção da cidadania social.
3. Nessa perspectiva, o PROJINA pretende culminar na criação dum protótipo de sítio, que se constitua
como “laboratório” de investigação-acção, enquanto
estratégia de articulação dos eixos
epistemológico, político e metodológico do projecto, em qualquer situação que venha a ser
especificada:
3.1. reestruturando para esse efeito, como núcleo duro da gestão dinâmica desses recursos, os
efectivos da Administração Pública habilitados e habilitáveis no quadro dos pressupostos da
Sociedade do Conhecimento;
3.2. mobilizando estratégias de formação adequadas ao provimento da arquitectura de
informação e de comunicação implícita à observação controlada dos processos implementados
nos sítios de cidadania que vierem a ser territorializados.
4.O ponto ómega de uma tal estratégia consiste no desenvolvimento autónomo de um observatório do
cidadão em cada um dos sítios em que as referidas práticas se desenvolvam, cabendo a sua gestão ao
colectivo dos cidadãos e à mediação e animação dos recursos humanos investidos na criação e
enquadramento da base de dados.
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X Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. 2005
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5. O estudo de um protótipo concretizará assim a aproximação entre as problemáticas do território e da
administração, na lógica do serviço público, o que implica a necessidade de criar ferramentas
apropriadas aos objectivos de:
5.1.- facultar os circuitos de comunicação e de informação implícitos à observação controlada das
situações, práticas e processos sobre os quais recaiam os interesses manifestados;
5.2.- habilitar os indivíduos para a livre participação na decisão, em sede de exercício do
conhecimento objectivo;
5.3.- evitar a segregação social, através do investimento nas dimensões do desenvolvimento
integrado capazes de desafiarem a intervenção das comunidades, na discussão objectiva das
alternativas em presença e no controle da agenda política que se reporta aos compromissos assumidos
6. A construção das referidas ferramentas recorrerá à operacionalização de partenariados eficazes que
trabalhem em rede para a consecução dos objectivos enunciados(3) e da finalidade visada (1), fazendo
corresponder :
6.1. – ao primeiro (3.1.), observatórios que recorram a uma arquitectura de sistemas de informação
e de comunicação adequados à estratégia metodológica da investigação-acção, definida em (2);
6.2 – ao segundo (3.2.), processos de animação cultural que partam das redes de intersubjectividade
em presença, para o desenvolvimento dos conhecimentos implicados na problematização das
situações e na equação das necessidades e soluções indispensáveis ao nível de qualidade de vida a
que se aspira;
6.3. – ao terceiro (3.3), investimento do referido processo na autoconstrução da cidadania
implicada na progressiva transformação do indivíduo, centrado nos seus interesses específicos, em
cidadão, centrado nos da comunidade de cuja construção participa; estará neste caso, entre outros, o
objectivo de opor a democracia à violência, quer na dimensão poliárquica, quer na de política interna
ao país.
7. Assumida deste modo como comunidade aprendente dos mecanismos de uma democracia lúdica,
exercida como meio de acesso aos recursos da Sociedade do Conhecimento, a prática comunitária visará
objectivos de curto, médio e longo prazo, dependendo estes últimos da interação com o contexto político
em que a referida Sociedade se produz e desenvolve.
7.1. Daí ser fundamental criar um Observatório da Cidadania, resultante da articulação dos
observatórios do cidadão, integrantes dos sítios que decidam aderir à rede. A localização daquele
deverá por isso, eleger um território político neutral, que - garantindo o acesso a todas as forças
políticas do espectro formal da democracia representativa – seja da responsabilidade directa do
Parlamento, onde as questões gerais e ideológicas se debatem, confrontam e interagem, produzindo o
ambiente sistémico da governação do país.
7.2. Esta poderá ser uma das vertentes que venha a propor-se a um Plano Internacional dos
Direitos Humanos de 4ª geração, capaz de conectar, em termos práticos, a dimensão dos direitos
civis e políticos à dos direitos económicos, sociais e culturais, inerentes a pactos internacionais
defendidos pelas Nações Unidas que – apelando à iniciativa e criatividade dos Estados, para a
equação de cenários não formais de promoção dos Direitos Humanos e de uma Cultura da Paz –
conte com a disponibilidade do Alto Comissariado para os DH para a globalização de medidas
significativas nesse domínio.
Balizas de sustentabilidade do PROJINA - Neste âmbito, salienta-se :
-
O Projecto de Formação PROJINA
-
O Projecto de Portal PROJINA
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Documento Libre
-
A Estratégia de difusão e de implicação da democracia poliárquica na política pública
PROJINA
O Projecto de Formação PROJINA ( Projecto de Investigação na Acção) estrutura-se numa dimensão
transversal a todos os destinatários da formação, quaisquer que sejam os níveis em que se situam na
estratificação dos papeis que lhes cabem no desempenho integrado da política pública de promoção da
cidadania social e em 3 dimensões horizontais específicas aos referidos níveis. A dimensão transversal
comporta:
- a fundamentação teórica do Projecto relativo à referida política, proporcionada em download das
teses do Projecto Sabático e pelo powerpoint de síntese;
- e o roteiro de operacionalização através do Portal ( Anexo III) que especifica o trajecto da
edificação da política pública propiciado aos usuários da net, em geral, e, em particular, a todo o
universo da formação, desde os quadros aos formandos finais.
As dimensões horizontais de Investigação e Desenvolvimento Experimental (I&DE) especifica à
referida política, deverão ser constituídas de modo que encaramos através das seguintes propostas:
uma Proposta de Seminário de sensibilização à temática da I&DE (SIDE), tendo como eixos
metodológicos a análise sistémica pertinente ao enquadramento da complexidade e as praxis de elearning pertinente ao desenvolvimento da formação de quadros que extraiam por essa via, a capacidade
de inserir a distância na análise de proximidade dos fenómenos;
uma Proposta de Curso de I&DE (CIDE), tendo como eixos metodológicos a teoria e as praxis
da equação dos sistemas abertos, da análise de impactes e da estratégia metodológica da investigação–
acção, dimensões pertinentes à configuração de redes e de problemáticas integradas e à equação de
soluções alternativas;
uma Proposta de Operacionalização local de Praxis (OPINA) decorrentes de práticas de
investigação na acção articuladas aos referidos eixos metodológicos.
O seminário SIDE( Anexo I) destina-se a decisores e a peritos de gestão da política pública, o curso
CIDE a formação de formadores locais e o Projecto de operacionalização das praxis de investigação na
acção (OPINA) a estes, enquanto formadores, por seu turno, dos destinatários finais da política que são
os formandos ao longo da vida em todas as dimensões do quotidiano e em registo de cidadania.
A estratégia de operacionalização local de Praxis (OPINA) suportar-se-á na difusão de KIT de suporte à
implicação da democracia poliárquica na política pública PROJINA. Com os objectivos explícitos de
integrar na perspectiva de clarificação para os formadores as teses, o glossário, o modelo e os
dispositivos que integram o projecto e presidem ao funcionamento de cada sítio, explicita-se
simultaneamente os objectivos expectáveis de quem aceda à rede e o projecto de inter-acção que se lhes
deve propor em registo de comunidade aprendente, quaisquer que sejam os sítios e escalas em que o
serviço público se encontre assumido. Aos destinatários começa por se facultar a identificação da equipa
do sítio que os acolhe, distinguindo os seus papeis na relação com as principais funções e actividades
que inter-agem na produção e desenvolvimento do projecto. Disso decorrerá a sua integração no portal.
Funcionando cada sítio como laboratório de cidadania nas dimensões presencial e virtual, os produtos
suportam-se em dimensões e recursos que a todos responsabilizam perante a comunidade de
destinatários, às escalas locais e àquelas com que elas inter-agem. Núcleo duro do sítio, o observatório
local do cidadão terá de prover-se de um sistema de informação baseado na teoria do sistema geral, em
termos que garantam práticas de recolha, circulação e produção de conhecimento e de informação que,
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em recursividade e abertura ao universo dos restantes sítios, cumpram as finalidades que presidem ao
modelo e ao modo de um funcionamento contratualizado pela equipa de formadores e de mediadores
com a comunidade aprendente a quem a equipa terá de facultar os procedimentos e processos que a
comunidade exige e proporciona.
Para isso haverá que garantir a interacção do universo dos sítios com os da correspondente
contextualização e destino, com relevo para o sítio da cidadania activa, cujo observatório integrador dos
inputs dos observatórios locais, uma vez situado em terreno neutro e de produção do mainstream da
governabilidade do país, como compete à Assembleia da República, deverá configurar-se em sintonia
com o perfil destes. A identificação do sistema dos observatórios e os processos adequados de
input/output/input analisadores das propostas dos observatórios locais e/ou produtores de análises
decisionais que se lhes reportem passarão naturalmente pela instância de ponderação técnica
vocacionada para assessorar os grupos parlamentares a tomarem posição fundada sobre as questões que
em seu critério, se lhes levantem.
A gestão estratégica da inovação possível em cada um dos sítios dependerá pois do grau de acerto das
várias valências implicadas na praxis que vier a ser assumida nos processos de interacção dos agentes
locais explicitamente envolvidos, tendo por horizonte a dinâmica de outputs locais e dos outcomes
integrados nas políticas sociais e publicas orientadas para e pelo incentivo de uma cidadania para todos
na Sociedade emergente do Conhecimento. Mas esta emergência decorrerá do acerto com que a arena
política as valorizar, desde o assento parlamentar aos gabinetes dos executivos de uma governação
capaz de responder a um duplo desafio: o da articulação com o universo da sociedade civil, na
perspectiva activa e inclusiva a que este projecto se propõe, e o da praticabilidade do pensamento
complexo a que a Europa se procura habilitar com condição sine qua non de um desenvolvimento
sustentável, em sede do mainstream civilizacional, reabilitador dos valores do bem comum.
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Vectores de operacionalização da cidadania
activa e inclusiva
Maria Alfreda Cruz Viana
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
Documento Libre
Vectores de operacionalização da cidadania activa e inclusiva
Maria Alfreda Cruz Viana
Portugal, 2006
I O ESTADO CIDADÃO
“Se a questão é não apenas "gerenciar" - fazer com que as coisas funcionem da
melhor maneira - mas mudar, transformar e produzir igualdade de forma ampliada e
sustentável, então é no conjunto da experiência sociocultural, determinada em termos
históricos concretos e em termos de história universal, que os olhares devem se
concentrar. Os povos podem "tudo", desde que saibam traduzir em seus próprios
termos os dados e as possibilidades da época - NOGUEIRA, Marco Aurélio, “Um
Estado para a sociedade civil: temas éticos e políticos da gestão democrática” - São
Paulo : Cortez Editora, 2004. - Ubicación Física: (01017) - CLAD L-20309.00
A Sociedade do Conhecimento em questão na estratégia referenciadora de Lisboa - No
pressuposto de que a Sociedade do Conhecimento possa ser contexto de problematização das
circunstâncias em que decorre a vida de todos os cidadãos, bem como uma linha de fuga à pobreza e à
exclusão social nas várias dimensões em que ela societáriamente se estrutura, a matriz de inspiração de
um Projecto no âmbito da relação do Estado com o universo da Cidadania passa pela equação do
Estado como entidade promotora de condições adequadas ao exercício desta, sendo esse exercício
entendido como direito social e como bem público. Um tal propósito fora já identificado pela
governação que apresentou a Estratégia de Lisboa 1 à ponderação da Europa e que, em simultâneo,
expressou o mote de Estado Cidadão num desdobrável de suporte ao propósito governamental de criar
o Instituto de Reforma do Estado, no âmbito do Ministério que, com designação abrangente, integrava
então o organograma do Governo. A mudança de Executivo em 2002 não assumiu a mesma estrutura
governamental nem nenhum dos seus desideratos na matéria, mas fora no referido contexto que o
Programa Sabáticas do Instituto Nacional de Administração garantira entretanto acolhimento a este
Projecto de I&D 2 que, acompanhando o acervo de pistas decorrentes da produção universal relativa ao
tema, desde logo visou o longo prazo como horizonte de ponderação das hipóteses de produção e
promoção de uma política pública para a cidadania extensiva, activa e inclusiva.
Em finais de 2005, já na vigência de novo Executivo, o Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu 3
1
Uma política europeia do conhecimento - cujos grandes momentos de definição foram as cimeiras de Luxemburgo(1997),
Lisboa (2000), Nice (2001) e Barcelona (2002) – encontrou na Cimeira de Lisboa a aposta numa estratégia e num método
.que lhe conferiu notoriedade, apesar do impasse que se mantém, devido ao desinteresse dos seus potenciais
impulsionadores, aos níveis da UE e dos estados membros. ANN METTLER BIO, Directora Executiva do Lisbon Council,
di-lo claramente à imprensa diária portuguesa que a entrevistou no dia do relançamento do “espírito de Lisboa” (sic) pelos
chefes de Estado e do Governo da UE em Março de 2006 (cf. DN, 22.03.06).
2
Este enunciado sucinto suporta-se num conjunto de teses que temos vindo a desenvolver em regime sabático no quadro
de um projecto de I&D no INA dando disso conta em eventos problematizadores do relacionamento entre o Poder Político
e a Cidadania, como por exemplo a Conferência Internacional sobre a Carta Urbana Europeia promovida pelo Congresso
Permanente dos Poderes Locais e Regionais da Europa em Sofia e em Maio de 2002, e os Congressos do Centro LatinoAmericano para o Desenvolvimento nas edições de 2002, 2004 e 2005, estando as edições disponíveis em rede no site
www.clad.org.ve/docume.html.
3
O presente capítulo segue de perto as linhas de força das Jornadas Portas Abertas promovidas pelo referido Instituto em 19
de Dezembro de 2005. A identificação do acervo de base pode ser encontrada no site http://www.novasoportunidades.pt e
no CD-Rom documental de apoio à referida Jornada.
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
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retomou, como referências das prioridades de afectação de recursos para as questões que venham a ser
equacionadas no âmbito da regulamentação do novo enquadramento 2007-2013 - definido entretanto
como Quadro de Referência Estrutural - os desafios inerentes à Estratégia de Lisboa, âmbito em que se
salienta o carácter central da formação e da requalificação de recursos humanos para a resolução dos
problemas estruturais da sociedade portuguesa, designadamente em matéria de produtividade e de
competitividade. É manifesto que essa centralidade deriva da verificação de que Portugal não fora,
entretanto, capaz de afectar mais de 24% dos recursos financeiros que poderia ter afectado pela via da
comparticipação plena nas regras do funcionamento da EU. Começa pois a generalizar-se a convicção
de que a inoperacionalidade que, a todos os níveis, Portugal tem demonstrado na utilização dos
instrumentos de política comunitária de que tem disposto desde a adesão à UE, resulta de não ter
conseguido empenhar-se em contrariar o lastro da iliteracia proveniente da tardia generalização da
escolaridade, o que, resultando já por si num défice de capital humano, veio a ser claramente
incrementado pelas inconsistências da utilização do FSE, desde que, há já 20 anos, esta janela de
oportunidades se abriu para a qualificação dos portugueses. Reconhece-se que, no dealbar do século e
em plena vigência do III QCA, se procurou, com a criação da ANEFA 4 , redireccionar essa política
para aproximar o investimento centrado na reversão do desempenho da formação profissional para a
qualificação dos portugueses, do investimento feito no âmbito do ensino formal, o que antes nunca se
verificara, dado que sempre se perspectivou que o grosso da qualificação dos portugueses teria
obrigatoriamente de passar pela escola. A teoria “implícita” a esta postura - a do incremento
gradualista da qualificação de recursos humanos pela via privilegiada da inclusão, no mercado de
emprego, dos sucessivos coortes provindos do sistema escolar – resultou numa espécie de laissez
faire/laissez passer da produção escolar que gerou a inevitabilidade de impasse na qualificação da
massa laboral portuguesa. E isso por um sistema de razões. Desde logo, porque se foi sempre
remetendo para a geração seguinte de recursos humanos as expectativas positivas com que urgia
contar a curto prazo... e depois porque se abstraiu displicentemente da verificação factual do baixo
nível dos resultados alcançados ao longo de três décadas de massificação da escolaridade, conduzindo a
que, nem mesmo a curto prazo, os referidos coortes apresentem, em geral, um diferencial significativo
de qualidade em relação ao capital humano do mundo laboral a que acedem. Em todo o caso, ainda em
2005 se registou que 2/3 da população activa saída do sistema educativo formal ficasse aquém do 9 º ou
do 12º anos, representando respectiva e aproximadamente 50% e 15% do universo laboral de destino.
O impacto na elevação dos níveis de literacia pela via de um tal modelo tem sido pois diminuto e nem
doutro modo poderia ser, dado o peso específico do atraso com que entre nós se promoveu a
universalização da escolaridade mínima de 9 anos, olhada aliás com relativa indiferença por largos
sectores da população que desde logo resistiram a entendê-la como ferramenta de vida ( CRUZ,1978) .
É este “universo” de razões que explica o facto de a Estratégia de Lisboa não ter ainda ser
percepcionada pela sociedade portuguesa nas suas potencialidades de galvanização para que o país
ultrapasse os handicaps que tem vindo a acumular nos segmentos do trabalho e do empreendedorismo.
Para contrariar esta impreparação do capital humano para os desafios do desenvolvimento
socioeconómico, os decisores decidiram retomar a referida estratégia, tomando como referências das
prioridades de afectação de recursos as actuais regras de jogo da UE, pelo que os eixos da
aplicabilidade do FSE nos próximos 7 anos se referem a dois grandes pilares vectoriais – o Plano
Nacional de Acção e Crescimento ((PNACE) e o Plano de Emprego (PNE), tendo ambos como
referencial comum o Plano Tecnológico – combinados, através do Programa Novas Oportunidades,
com políticas específicas de incremento de competências do capital humano. A esse enlace confere-se
4
Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos, instituída em 2001 e operacionalizada no lastro de fundamentos
genéricos da Declaração de Jomtien, com base na metodologia de promoção de e certificação do conhecimento tácito
adquirido no âmbito exercício profissional .
2
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uma tripla orientação:
- qualificação de jovens - revalorizando a vertente do ensino técnico-profissional e a dupla
certificação que permita ao país sair do impasse constituído pelo desperdício de recursos
humanos capazes de responderem positivamente a formas de valorização de saberes alternativos
aos formais;
- formação e qualificação de activos adultos, retomando e explorando, no mesmo sentido, o acervo
da experiência da ANEFA e combinando as apostas de formação contínua com as de formação de
base dos trabalhadores no activo;
- qualificação e incentivo à formação e à densificação do tecido empresarial, habilitando-o para a
interacção em rede das dinâmicas de formação contínua destinadas tanto ao mundo do trabalho
laboral como ao organizativo, em termos compagináveis com a formação ao longo da vida de
todos, quadros e decisores incluídos.
A nova política de regulamentação governamental da Estratégia de Lisboa tem pois como horizonte
emblemático a perspectiva em que a UE a assumiu enquanto ideia-chave e tem como condicionantes
desta quer o entendimento emergente das actuais regras de jogo definidas pela Comissão Europeia para
obviar à descoordenação das tentativas de implementação por parte dos vários Estados, quer os
impactos da política governamental portuguesa dos anos 2002-2004 que a não terá levado em suficiente
conta na sua própria agenda.
Assim sendo, a implementação da fase actual da Estratégia de Lisboa suporta-se num Plano Nacional
de Acção para o Crescimento e o Emprego que assume, como conceito-chave, o da economia do
conhecimento. Constatando que esta fase se sucede à de uma oportunidade que se perdeu em resultado
de inadequados cenários macro-económicos, o actual Plano retoma objectivos potencialmente
sustentáveis, centrando a interacção das dinâmicas que eles visam na valorização do conhecimento e da
inovação, como sendo vitais para uma economia com futuro.
Mas a criação de mais e melhores empregos num contexto de competitividade definida à escala
universal com cerne na Europa, terá necessariamente de assumir como factores dessa mesma
competitividade não só a produtividade dos vários factores da produção de bens e de serviços, mas
também a qualidade e a inovação que estes denotem, pelo que é indispensável incentivar o
desenvolvimento das competências e das capacidades de implicação e de criatividade por parte dos
produtores e gestores dos mecanismos da microeconomia. Daí que o crescimento e o emprego
impliquem, além das grandes finalidades em plano macro, uma estratégia de diferenciação
autosustentada da rede territorializada das ocorrências microeconómicas, postura que exige a própria
qualificação dos territórios em que a referida rede se suporta, condição que se reflecte, ainda que de
modo indirecto, na qualificação dos seus habitante ou usuários, qualquer que seja a função ou papel que
desempenham na mobilização do tecido económico.
Assumindo-se que qualquer programa microeconómico não implica apenas a responsabilidade do
sector público, mas também a dos agentes privados que nele procurem encontrar parcerias ou qualquer
outro modo de interacção adequada à satisfação dos seus interesses e da sua consciência social, a
questão da responsabilidade dos actores é central na identificação de estratégias e na produção de
3
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
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resultados equilibrados que validem a teoria da equidade de NASH 5 , reconhecida através do prémio
Nobel atribuído ao autor em 1994 pela demonstração, avocada ao quadro da teoria dos jogos, da
indispensável compatibilização, na esfera da microeconomia, do interesse individual com o do próprio
grupo.
Um “modo de estar” por construir - Esta possibilidade passa porém pela consciencialização da
opinião pública em torno do desiderato da responsabilidade dos actores políticos e sociais no que se
reporte ao investimento em capital humano e à alocação de recursos financeiros a actividades de
enquadramento da formação avançada deste, em interdependência com as dinâmicas de docência do
ensino superior e da investigação, decisivamente orientadas para o desenvolvimento cognitivo e para a
inovação. Todavia, se em determinadas instâncias profissionais é previsível a adesão a tais desideratos,
em contexto de garantia de direitos e de responsabilidades individuais e tendo por horizonte a resposta
aos desafios da globalização, já no tecido esgarçado da coesão social a adesão exige a densificação das
redes de capital social capazes de mobilizarem o investimento individual na dinâmica de aprendizagem
ao longo da vida, nisso se envolvendo a necessária elevação da autoestima e da motivação responsável.
Mas aqui chegados, o problema que se nos coloca é o seguinte: de que forma se prevêm estruturas e
dinâmicas de intermediação para o efeito?
A conexão de todo este acervo de políticas ao das que visem a correcção das desigualdades de acesso à
panóplia de oportunidades que vão sendo desenvolvidas pela marcha do progresso tecnológico,
rentabilizando e explorando o percurso das várias experiências positivas que têm marcado terreno nas
dinâmicas públicas, societárias e comunitárias, poderá ser potenciada no sentido de dar resposta às
expectativas europeias de definição e aplicação eficaz da dinâmicas de inclusão social, se se definir este
campo de actividades como componente do próprio mercado de trabalho e de empregabilidade,
referenciado pelo sistema de princípios implícito ao modelo social europeu e à estratégia de Lisboa.
Mas, uma vez mais, de que forma se pode prever estruturas e dinâmicas de intermediação para o
efeito?
Divulgadas as políticas públicas inerentes à comparticipação do Estado na implementação do PNACE e
à sistematização das 125 medidas que o integram no quadro de 7 áreas da organização geral do Estado 6
- sendo 11 as medidas na área do Crescimento Económico e da Sustentabilidade das Contas públicas;
17 na da Governação e da Administração Pública;15 na área da Competitividade; 21 na área da
Investigação e do Desenvolvimento; 17 na área da Gestão Territorial e da Sustentabilidade Ambiental;
14 na área da Eficiência dos Mercados; e 30 na área da Qualificação, Emprego e Coesão Social – a sua
articulação ao Plano Nacional de Emprego (PNE) 7 reforça a estratégia de Lisboa, situando o apelo à
aposta dos cidadãos na componente social da globalização, uma vez que esta - constituindo o ambiente
comum das políticas que venham a ser implementadas – está em relação paramétrica com todas elas.
As prioridades do PNE partem entretanto do reconhecimento prévio de três grandes condicionantes: A
primeira é que o desemprego é uma variável estrutural que se traduz na tendência pesada da longa
duração. A segunda é que o investimento na educação demora entre 50 a 75 anos a dar frutos, segundo
estudo imputado a Roberto Carneiro que estudou os mais diversos casos, incluindo o dos EUA, para
concluir que este país partiu duma base de iliteracia muito significativa no pós-guerra para a
confortável situação que hoje se encontra, designadamente no campo da produção e circulação de
conhecimento académico de alto nível e de investigação de ponta nos domínios mais diversos. A
5
John Nash, professor da Universidade de Princeton recebeu o referido prémio conjuntamente com R. Selten e J. Harsanyi,
mas deve-se-lhe ter defendido a referida tese, em 1949, entretanto ratificada no quadro da matemática pura.
6
Cf. nota 3
7
Idem
4
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terceira é que um crescimento sustentado implica a indispensabilidade de uma estratégia global de
longo prazo, capaz de gerar o sistema abrangente das políticas sectoriais programadas e implementadas
a curto prazo - sendo que, em tal perspectiva, é fundamental entrelaçar os objectivos e as medidas
sectoriais com as transversais e identificar nesse contexto a seriação das prioridades.
De acordo com a perspectiva do PNE, com que claramente nos identificamos, os objectivos
transversais os mais relevantes situam-se:
- na indispensabilidade de promover uma abordagem do trabalho baseada no ciclo de vida dos
indivíduos
- na garantia de igualdade de oportunidades de acesso e fruição do direito ao trabalho e de
implementação das condições dessa garantia em termos de oferta inclusiva;
- no investimento no capital humano capaz de promover o crescimento sustentado, tendo por
horizontes:
- o pleno emprego
- a melhoria da qualidade e da produtividade do trabalho
- o reforço da coesão social e territorial.
Para a combinação destes efeitos é indispensável a implementação de centros de recursos de
conhecimento, cuja distribuição seja pertinente com os objectivos enunciados. O eixo do PNE que se
lhe refere desenvolve o enlace destes com o PRODEP com enfoque no Pós-conhecimento. Todavia, a
necessidade de equacionar e detalhar medidas aos níveis micro e macro comporta ainda zonas de
sombra. Da Administração Pública, espera-se ainda que a prevista reforma do sector atente a esta
problemática, designadamente no que ela se prende com a aplicação da vertente do FSE no quadro da
componente social da globalização. É neste quadro que a opção do PNACE e do PNE pela política de
inclusão social se densifica. A sua urgência em termos de macropolítica decorre da relação directa que
existe entre esta dimensão da realidade quotidiana e o crescendo de pobreza persistente, o que coloca
Portugal numa posição incómoda perante si próprio e os seus parceiros, dado que o diferencial entre os
que mais rendimentos auferem e os que menos auferem ( d >7) é comparativamente significativo de
uma sociedade tendencialmente mais injusta do que a grande maioria das restantes. A ponderação da
Iniciativa Comunitária EQUAL 8 cuja extinção decorre no quadro do QCA cessante que lhe delimitou
por inerência, o horizonte de vida, pode ainda assim avocar a esta problemática um conjunto
significativo de sinais a ter em conta, desde já porque a Comissão responsabiliza os Estados membros
pela sequenciação dos seus princípios na vigência do novo Quadro 9 – e, de resto, pela necessidade de
equacionar o modo como a experiência desenvolvida antes poderá reverter para a situação presente.
Sendo assim, a pergunta de partida pode formular-se do seguinte modo: como poderão os actores
sociais actuantes no terreno próprio da EQUAL – ou seja o do desenvolvimento da coesão social – lidar
com a multiplicidade de programas e de medidas do PNACE e do PNE?
As hipóteses de resposta assumidas na relação com a experiência EQUAL são basicamente as
seguintes:
- necessidade de tomar em atenção a coerência e a convergência das diferentes políticas e das suas
medidas por parte dos actores sociais que detêm responsabilidades no processo emergente de gestação
e de gestão do seu projecto de empowerment;
- carácter nuclear da coesão social em todo o processo de desenvolvimento pessoal, comunitário ou
8
9
Cf. nota 3
identificado na nova nomenclatura como Quadro de Referência Estratégica
5
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outro, constatando-se que nenhum deles decorre automaticamente do crescimento económico que, por
hipótese não confirmada, poderia antecedê-lo.
A experiência da EQUAL no sentido de conduzir os actores sociais a incorporar os princípios da
Iniciativa em processo teórico-prático que aliou a aprendizagem académica à acção no terreno, resultou
da própria avaliação feita em sede da UE quanto aos impactos dos modelos de formação e de educação
na habilitação para o desempenho na vida laboral e social. Donde:
- a necessidade de identificar práticas e políticas de formação incidentes na empregabilidade e no
desempenho social, em contracorrente do desperdício escolar e das formas de formação desadequadas
aos perfis dos destinatários;
- a indispensabilidade de acautelar as questões de segmentação e de exclusão do mercado laboral e das
vivências sociais;
- a indispensabilidade de passar da retórica à prática através da criação de condições de experienciação
que permitam ultrapassar as desadequações vigentes nas problemáticas em que o quotidiano das
populações se expressam.
- A sustentabilidade das soluções a formular e a concretizar passa pela capacidade de:
- garantir uma relação consistente com os destinatários postos em rede na procura das referidas
soluções;
- formar públicos geradores de massa crítica adequada à receptividade das acções desencadeadas,
o que passa pelo reconhecimento do seu valor e qualidade, bem como da justiça dos critérios
implícitos às políticas postas em questão (por exemplo as de igualdade);
- aceder à intercooperação transnacional como modo de gizar a interacção de processos e práticas
e de incentivar a adopção ou a irradiação de novas soluções;
- demonstrar na prática e pela prática que a inovação é primacialmente social, porque resulta
muito mais do trabalho em parceria do que de esforços anómicos e que, por isso, exige o
alargamento dos circuitos de responsabilidade e empowerment, condições necessárias à
produção de mudanças.
Mas aqui chegados, o problema que se nos coloca é de novo o seguinte: de que forma se prevêm
estruturas e dinâmicas de intermediação para o efeito?
Desta constelação de interrogações emerge uma certeza relevante: ainda que o PNE tenha vida própria
por ter substância nos próprios Tratados, não dependendo pois do horizonte temporal da vigência da
Estratégia de Lisboa que culminará em 2010, pelo menos 60% dos fundos FSE inerentes ao quadro de
referência 207-2013 reportam-se à referida estratégia. E esta reajusta-se hoje na primazia dada ao
emprego que, se atender a directrizes com impacto na inclusão social, emergirá da implementação de
Planos diferenciados, desde o PNE aos Planos Nacionais da Igualdade e da Inovação. É neste contexto
que se inicia um novo ciclo de produção de documentos com acolhimento ou incidência no Plano
Tecnológico e na Inciativa das Novas Oportunidades 10 .
A resposta do empresariado a tais estímulos continua porém a revelar-se problemática. A imprensa
diária e a da especialidade dá disso sinais concludentes. Tomando como pedra de toque da inovação, a
10
Convida-se uma vez mais ao convívio com o site http://www.novasoportunidades.pt ou com o CD-Rom documental de
apoio à presente Jornada.
6
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relação entre o tecido empresarial e as universidades, os resultados de uma recente investigação 11 na
área apontam para que apenas 1% de empresas vê interesse nos centros de investigação como
potenciais parceiros nesse domínio. O diagnóstico vai no sentido de identificar que paradigma da
inovação não é assumido como vital, a não ser em casos perfeitamente excepcionais e circunscritos a
determinados aspectos que geralmente não valorizam o respectivo contributo para o valor acrescentado
da respectiva produção. O nível dos conhecimentos detidos pelas universidades enquanto expoentes de
conhecimento científico raramente é valorizado ou sequer questionado no sentido disso vir a acontecer,
seja através delas, seja através da promoção de centros de conhecimento emergentes de outra qualquer
estratégia, o que demonstra a ausência de uma massa crítica suficientemente consolidada para se poder
contar com ela no sentido de que os desideratos em que o FSE aposta possam vir a contar com uma
iniciativa relevante do tecido empresarial. Entendemos por isso que a operacionalização de tais
orientações aponta para a inter-complementaridade da referida lógica da economia do Conhecimento
com a lógica de produção de uma Sociedade do Conhecimento, entretanto subestimada na
reformulação vigente da Estratégia de Lisboa.
Perfil dum conhecimento societário - Aqui chegados, coloca-se-nos a própria questão da natureza do
conhecimento capaz de sustentar tal desafio. Na versão corrente, dá-se ênfase à utilização e gestão do
conhecimento explícito e à apropriação deste pelo circuito informativo, onde ele possa ser
genericamente identificado e explorado, ainda que com incrementos secundários que recaem no
referido circuito, com as mais valias que o desenvolvimento cognitivo produz. Com fundamento
cartesiano, o conhecimento explícito depende então da majoração da dinâmica informativa sobre a do
investimento no risco da inovação, a qual, por seu turno, depende igualmente da lógica da investigação
que se apoia na socialização e no reconhecimento do conhecimento emergente, dito tácito.
A inovação corresponde ao desafio de recriar as situações em função das ideias com que se pretende
encontrar um novo perfil ou estado do objecto de cuja análise se parte e em cuja dinâmica se procura
intervir. Nesta acepção, contrapõe-se ao conceito de conhecimento explícito, mais ou menos estático (
knowledge), o de conhecimento tácito e dinâmico, centrado no fluxo da sua própria produção
(knowing). Mas a reversão do conhecimento tácito em conhecimento explícito, através da criação e
difusão dum conceito de referência duma ideia, dum princípio, dum produto ou de um serviço, é o
fecho de abóbada do processo construcionista ao qual se conecta o da inclusão do referido objecto
emergente no elenco e no processo difusor da informação que o inclui explicitamente no património
validado pela comunidade cognoscente. Logo, à tendência central de produção e circulação do
conhecimento, é fundamental aduzir outra cuja ênfase seja posta na cognição emergente de um
construcionismo apoiado na partilha social do conhecimento tácito e que alie a criatividade abdutiva
aos mecanismos clássicos do raciocínio.
É neste quadro que situamos as perplexidades com que temos vindo a pontuar a análise das intenções
expressas na supracitada lógica da economia do conhecimento, dado que ela remete para a tradução das
perspectivas enunciadas às escalas da macro e da mesopolítica pública na micro-escala da sua
concretização extensiva. Assim sendo, o que está em causa é apostar na pressão das comunidades que
habitam o território em que a economia se concretiza. Para que à lógica da sociedade de classes não se
suceda a das multidões portadoras do desespero e da inquietação que as tornam incapazes de gerar e de
gerir projectos de vida a prazo, é preciso defender a sociedade (BOUTANG, 2005, pp. 91-97) e para
isso são precisas redes de sítios em que se tenha acesso a aprendizagens dialécticas, capazes de
11
Estudo da Faculdade de Economia do Porto fundamentado num Inquérito a 1538 empresas distribuídas por todo o país,
das mais diversas dimensões e a generalidade dos ramos de actividade – com questionários distribuídos entre 2001 e 2003 e
recolhidos no termo de 2005... – mereceu divulgação avant la lettre na imprensa diária (DN 23.03.06), pela pena de Elsa
Costa e Silva, citando Aurora TEIXEIRA e Joana COSTA, autoras do estudo em processo de publicação.
7
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
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conferirem sentido prático à motivação com que as pessoas comuns se envolvem na produção do seu
próprio conhecimento relativo às questões que verdadeiramente lhes interessam, incluindo a da própria
habilitação para a empregabilidade e para o reconhecimento a que todo o ser humano se propõe. Dessa
prática decorrem tanto a sustentabilidade da própria existência das comunidades e dos seus membros
pela via da sua implicação na res publica que lhes assegure trabalho ao longo de toda a vida, como a
qualidade e a certificação do conhecimento que reforcem o processo corrente da sua angariação e da
plenitude da sua integração no modo de ser cidadão. Só desta forma teremos a garantia de que as
referidas redes não terão o perfil daquelas a que se refere MIKE DAVIS ( 2005, , pp.104-130),
reportando-as como “redes de micro-exploração ubíquas e corruptas, em que até mesmo os pobres
exploram os mais pobres” na luta primária pela sobrevivência.
Para que a ética de libertação funcione, as comunidades terão pois de valer-se de condições de
exercício da cidadania avocadas pelo próprio Estado, enquanto coordenador da distribuição de meios
de acesso e de questionamento da informação, difundindo-os em rede pelo povoamento, de modo a que
se permita ao cidadão comum problematizar o ambiente e o ordenamento territorial, enquanto factores
de equilíbrio civilizacional e de desenvolvimento integral.
De facto, a abordagem e mobilização da complexidade com que se depara a lógica de investigação que
preside à produção de conhecimento, sintoniza-se cada vez mais com “lógicas de valores múltiplos
incorporando operacionalmente a incerteza”, dado que uma função de variáveis múltiplas permite
inevitavelmente múltiplas soluções. O experimentalismo intensivo propiciado pela rapidez do
desenvolvimento tecnológico opera diferenciadamente, em registo de Knowledge, domínios tão
variados como os dos conteúdos disciplinares clássicos bem como, na esfera da produção científica de
ponta, “a genética, a biologia molecular, a física sub-atómica, a astrofísica”, as nanotecnologias, mas
chamando cada vez mais a epistemologia, “as ciências do comportamento”, “as matemáticas e as
próprias artes” ao território conceptualizador da complexidade e da criação de hipóteses de resposta,
quer aos questionamentos que surgem em tais domínios quer aqueles que emergem das interfaces de
uns com os outros. É porém em registo de Knowing que se aprofundam cada vez mais as interfaces de
todos eles com as áreas de crescente atenção e procura social por parte das opiniões públicas
culturalmente amadurecidas, e por isso permeáveis aos sinais portadores de sentido evolutivo.
Não menos diversificados, sejam ou não tão relevantes do ponto de vista da cultura científica, são os
domínios implicados na vivência do quotidiano, questão central da racionalidade com que o
conhecimento se defronta nos registos interactuantes da ciência e do senso comum e cujo desafio
essencial continua a ser o da busca de metodologias que possam motivar e apoiar o trabalho em rede
de equipas disciplinares e interdisciplinares, necessariamente implicadas na convergência de saberes e
na inteligibilidade de questionamentos complexos que sirvam a vida social e humana - todos eles
susceptíveis de mobilizarem pensadores, investigadores e cientistas, mas também artistas e
profissionais dos mais variados sectores. Excepção feita à fatia de voluntariado que em tal experiência
recaia por decisão própria, este é um campo de empregabilidade que implica reorientação de percursos
laborais, reconstrução de perfis profissionais e agilização, em exercício aberto, de dinâmicas incluídas
nas perspectivas matriciais de longlife learning e de formação autosustentada, desafio com que a
sociedade se encontra confrontada, através da indispensável política de reinvestimento em recursos
humanos qualificados, precisamente nos sectores que deles careçam.
Defendemos ser neste cenário que o funcionamento de uma economia equânime possa vir a sustentar o
modelo social europeu, devidamente clarificado na trama dos seus outros pressupostos. A qualidade do
link entre economia e sociedade depende do modo como a urdidura desta for capaz de gerar e de
investir na produção e distribuição de bens e serviços, o capital social que resulte das redes de Know
8
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
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how indispensáveis à Sociedade do Conhecimento, preocupação expressa no próprio PNE que aqui se
releva. Uma das fileiras a explorar será cada vez mais a habilitação pós-graduada para a produção do
bem comum - consigna que recobre a diversidade de matérias implicadas na emergência de causas
comuns da vida em sociedade. A apresentação geral da Universidade do Bem Comum enquanto
projecto educativo emergente da reflexão produzida em torno da problemática da Agenda de Lisboa
por um grupo independente de docentes e de peritos com apoio dum comité internacional para o
Contrato Mundial sobre a Água, corresponde a um novo modelo de universidade que “tem como
objectivo epistemológico valorizar o bem comum para se poder viver em conjunto no mundo global”
12
.
A emergência de planos de estudos pós graduados apoiados em programas de investigação conectados
aos vectores de enquadramento da Fundação da Ciência e Tecnologia parecer-nos-ia fundamental para
garantir receptividade a modularização de um projecto semelhante identificado a partir do
desenvolvimento de projectos emergentes da comunidade académica. As possibilidades de enlace
poderia implicar que, na missão desta entidade 13 , fossem integrados critérios susceptíveis de
ponderação do mérito de projectos transdisciplinares de interesse público extensivo, e para isso
ponderando medidas destinadas ao reconhecimento da vertente da I&D susceptível de acolher, na
carteira de incentivos institucionais, perfis de investigação que assumam o risco da iniciativas no
domínio das políticas sociais e públicas incidentes na formação de capital social. Nessa perspectiva, o
apoio a programas e projectos de I&D orientados, no quadro da Sociedade do Conhecimento, para as
sinergias de registos dos vários saberes que na sua síntese confluem, poderia parametrizar quadros
teóricos e metodológicos inovadores não apenas destinados à importação, produção e integração de
processos e de produtos do conhecimento explícito de génese científica, mas também à própria
gestação e gestão de conhecimento tácito, pela via da reconstrução do conhecimento científico em
registo de senso comum, condição indispensável ao investimento do primeiro no capital social e na
cidadania extensiva, activa e inclusiva, capaz de o sustentar.
No horizonte de um tal cenário, estaria a perspectiva de que qualquer que seja o seu ponto de partida
todo o ser humano pode ir além dele próprio pelo poder das sinapses emergentes das conexões
dendríticas do tecido cerebral e da economia dos procedimentos mentais inerentes ao fomento das
estratégias de pensamento lateral 14 . Lato senso, o processo de complexificação é susceptível de
propiciar a criatividade pela sistemática contínua e recursiva da observação e interpretação dos
problemas versus ponderação e encontro de soluções, potenciando circuitos de pensamento reflexivo
que permitem a passagem da consciência local à abrangente, numa dinâmica que a generalizar-se
comporta repercussões favoráveis à emergência de uma Sociedade do Conhecimento, mais apta a lidar
com o risco e com a responsabilidade social do que a vigente. Razão bastante para nisso se investir,
potenciando a abertura das várias Ciências implicadas num projecto comum ao registo que
epistemológicamente estabeleça as conexões pertinentes com programas de investigação pós graduada
que frontalmente subscrevam o carácter distintivo da Sociedade do Conhecimento em relação à da
Informação e da Comunicação.
12
JOÃO CARAÇA, Le Monde Diplomatique (4.04.06), com remissão ao site www.contrattoaqua.it Em Portugal e
tomando como critério-chave a resposta institucional ao apelo do Projecto EQUAL a formação pós~graduada de
funcionários implicados no terreno do trabalho social , a UAL, o ISCTE, a Faculdade de Economia de Coimbra e a do
Algarve, podem, entre outros, ser identificados como exemplos premonitórios deste perfil.
13
A missão da FCT(http://www.fct.mces.pt) concretiza-se principalmente através da concessão de financiamentos na
sequência de avaliação de mérito de propostas de instituições, equipas de investigação e indivíduos, apresentadas em
concursos públicos, e também através de acordos de cooperação e outras formas de apoio em parceria com universidades e
outras instituições públicas e privadas.
14
De ANTÓNIO DAMÁSIO a CASTRO CALDAS, a importante comparticipação portuguesa na produção científica da
viragem do século vai no sentido da I&D neste domínio se apresentar com contornos ainda imprevisíveis.
9
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Assumir este registo da Sociedade do Conhecimento na carteira dos Programas Operacionais
comparticipados pelos Fundos da UE e do MCTES, implicaria propiciar, sem prejuízo da consolidação
de conteúdos e competências específicas, a conexão destas e destes em função de projectos de
conhecimento factual, tendo por horizonte o “arquipélago dos saberes” 15 que chama os registos
científicos ao convívio aberto e interactuante com todos os outros. Mas o caso é que a própria
Sociedade do Conhecimento, enquanto Projecto de Sociedade, implica que a sua prossecução passe, na
vertente essencial do longlife learning, pela necessidade de priorizar a dimensão Grundtvig não só na
lógica da formação de quadros mas também como horizonte de enlace global das restantes
componentes do Programa Sócrates da U.E., já que o capital social visado neste contexto societal é
transversal à organização duma oferta educacional integrada a que se tenha o direito de acesso ao longo
de todo o percurso da vida.
Este “modo de ser” terá necessáriamente impactos na dimensão do bem comum e constituirá lastro
essencial ao cumprimento de um dos desígnios da estratégia de Lisboa, ao tomar a organização do
território como nuclear para os fundamentos da sua prossecução. Estes passam designadamente pela
microeconomia e pelas vertentes de preservação e reabilitação dos seus recursos ambientais e
patrimoniais, apelando a uma reformulação do papel dos poderes locais no desempenho específico que
assumir no âmbito das funções do Estado. Cabe-lhe precisamente a reconstrução do tecido esgarçado
da coesão social, através das dinâmicas participativas da democracia poliárquica . Mas só um Estado
verdadeiramente cidadão será capaz de estruturar esse capital social em todos os estratos que compõem
hoje a sociedade de risco em que vivemos, a partir da declinação de um projecto de cidadania que a
todos eles, diferenciada e operacionalmente, se destine.
II - ENTIDADES INCUBADORAS DE CIDADANIA SOCIAL
“A Ciência tem que ser considerada quer enquanto produção de teorias, quer de
linguagens e de sociedades, ou seja, deve ser entendida como um dispositivo
cognitivo, retórico e comunitário (...).É claro que é preciso mais ciência e melhor
ciência. Mas é igualmente claro que este objectivo só pode ser atingido no âmbito
de um aprofundamento do arquipélago dos saberes, das suas linguagens e
comunidades, bem como do quadro que lhe está subjacente. É que a compreensão
dos fenómenos naturais e sociais ( e de nós próprios) é, em última análise a
condição da nossa segurança e identidade; sobre ela repousa a nossa garantia de
liberdade” -JOÃO CARAÇA, “A Ciência no Topo da Pirâmide?” (1994).
Enfrentar o desafio da complexidade - O sítio de cidadania, tal como o equacionamos, responde na
dinamização das suas funções aos princípios de integração das vertentes RECCRIA-PROMOVERESISTE que reclamam equipas de formação diferenciadas e habilitadas a investir no tratamento da
complexidade, em registo de empowerment extensivo a toda a comunidade aprendente. O processo
deverá recorrer às componentes de pós-gradução do universo do ensino superior que pratique como
externalidade o bem comum. Campo aberto à qualificação em exercício de trabalhadores científicos das
mais variadas proveniências, é nesse âmbito de Knowing que se mobilizarão as adesões dos cidadãos à
lógica do empowerment, garantindo-se-lhes orientação aos questionamentos que a materializem no
15
JOÃO CARAÇA e MANUEL MARIA CARRILHO, “O Imaterial e o Arquipélago dos Saberes”, Colóquio Ciências nº12
(1992), pp.83-92 – assunto divulgado em registo de Opinião em artigo publicado no Jornal O Público de 3.03.93 na secção
Ciências com o título” A Ciência no topo da pirâmide?”.
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plano da vivência quotidiana e no dos projectos de vida que nela recaiam. O domínio de qualificação
dos quadros será assim o da complexidade, registo da cientificidade da modernidade avançada que os
mais variados autores problematizam como sendo o mais adequado à Sociedade do Conhecimento, que
é simultaneamente a do risco e da incerteza. O sítio de cidadania estará em situação de mobilizar a
reunião e a construção de saberes, recorrendo à perspectiva modular da sua organização. Logo, a
emergência de equipas interdisciplinares de investigação que tomem por objecto a própria
complexidade da formação ao longo da vida situa-se no cerne do questionamento da formação em
exercício do próprio formador dos usuários do sítio, na interacção com a destes.
Desse questionamento 16 - que assume a necessidade de ponderarmos as metalinguagens enquanto
maneira de se “escolher a nossa combinação do universal e do particular enquanto objectos, objectivos
e linguagens” 17 - resulta serem três os eixos que permitem controlar tal complexidade, em registo de
Knowing: o da formação em si, o da investigação e o do desenvolvimento humano.
No eixo da formação, relevam-se:
- a perspectiva da formação ao longo da vida, enquanto processo permanente, integrado e aberto que,
não sendo linear, cruza níveis individuais e sociais de uma aprendizagem estruturada pela gestão do
próprio projecto de vida do sujeito, qualquer que seja o papel que ele assume no “ teatro” da
formação;
- os processos conjuntos de auto e de heteroformação em exercício nas suas interacções quer com os
contextos em que decorrem, quer com a interactividade da formação/readaptação de formadores
relativamente à dos destinatários da actividade com que asseguram o enquadramento facultado;
- o desenvolvimento de dispositivos formais e informais de formação tendencialmente associados aos
referidos contextos de acção e às actividades implicadas nas aprendizagens dos formandos;
- a processologia da autoformação interdependente das aprendizagens dos formandos, entendidos
também como sujeitos autónomos, no contexto da sua participação na equipa e entendendo-se esta
enquanto comunidade de pertença que emerge:
o da ponderação conjunta dos valores de cidadania e de democraticidade
o das práticas de pesquisa e de reflexividade associadas aos processos informais da aquisição e
da mobilização dos saberes postos em comum;
o da competência para se conectar os conhecimentos de que os formandos vão sendo
detentores aos que eles próprios constróem nos campos das práticas, designadamente as
emergentes do próprio quotidiano vivido;
o do processo decisional inerente à escolha de lideranças que facilitem a circulação da
informação na comunidade aprendente e a sua difusão no ambiente que a contextualiza.
No eixo da investigação relevam-se:
- assumir-se a validade da ciência do particular, valorizando as teorias do sistema geral e da
complexidade em ruptura com o clássico paradigma cartesiano, o que implica:
o a compreensão do objecto 18 de análise compreensiva que todo o caso é, referenciando-o na
sua totalidade e singularidade, através da esquematização das dimensões nucleares da sua
descrição dinâmica, funcional e estrutural;
o a recurso ao processo dialógico inerente ao cotejo das diferentes linguagens, metodologias,
16
ANA PAULA CAETANO, pp.15/16, in Formação e Desenvolvimento Humano: Inteligibilidade das suas relações
complexas
17
RICHARD LEE e alia (1996), Open the Social Sciences, Lisboa, FCG, ed. Europa-América, p.87.
18
Cf. Teoria do Sistema Geral de LE MOIGNE
11
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o
o
fontes e etapas diferenciadamente percorridas pelos sujeitos no âmbito da
multireferencialidade das abordagens;
a construção de percursos integrados de pesquisas que objectivem a conscientização
multidimensional;
a gestão reflexiva das tensões entre investigação e formação, bem como entre as vertentes
quantitativa e qualitativa das metodologias perfilhadas e finalmente entre as dimensões
analíticas e holísticas da compreensão dos objectos e objectivos de pesquisa;
- construir e validar, em todo este contexto, metodologias dinâmicas 19 consistentes com os percursos
heurísticos dos sujeitos, a partir da combinatória da formação ao longo da vida de cada um deles com
a aprendizagem do grupo em exercício, disciplinada pela pauta referencial da formação-acção, em
registo de investigação assumida.
No eixo do desenvolvimento humano relevam-se :
- a gestão flexível e complexa das tensões “indivíduo-colectivo, autonomia-cooperação, estruturaçãoflexibilidade, desafio-resposta”, conhecimento explícito – conhecimento tácito 20 , bem como a
promoção de atitudes de valorização simultânea das lógicas de investigação e da acção convergentes
na estratégia metodológica nuclear que é precisamente a da investigação-acção;
- a dialógica crescente das vertentes e dimensões do conhecimento:
o vertente tácita, abstracta e analógica vs. vertente da conscientização conceptualizada,
contextualizada e holística da complexidade
o dimensões relacionais, intuitivas, emocionais e metacognitivas do conhecimento implicadas
quer na progressão deste, quer nas do pensamento e da acção comunicacional de que ele
participa;
- a avaliação de impactes das referidas vertentes e dimensões nos contextos alargados das comunidades
de pertença e na relação biunívoca destas com as instituições que naqueles se contêm;
- a ponderação da pluralidade de caminhos de desenvolvimento individual implicado quer na
consciência de si e do(s) outro(s), quer na interconexão desta mesma consciência com a construção de
sentidos com que cada um define as finalidades que presidem ao seu próprio projecto de vida, bem
como a importância relativa dos valores agregativos e dos valores partilhados face aos interesses
individuais e do grupo.
Esta pauta referencial da formação na componente Knowing não se contrapõe à da observância dos
registos de conhecimento explicito na componente Knowledge, à medida que eles sejam avocados às
matérias e às predisposições cognitivas dos destinatários. O desafio da complexidade não pode iludir o
da exigência de rigor na transmissão da informação e do thesaurus de conhecimento disponível, sob
pena de se minimizar o impacto da habilitação dos destinatários para os fins integrados a que o projecto
se destina, qualquer que seja o universo territorializado em que a emergência dos sítios de cidadania
seja possível. Em cada um deles, o recurso a estudos de boas práticas parte da hipótese de que a
observação destas possa constituir ponto de partida para o debate e para a escolha de instrumentos
pertinentes à autoregulação das mesmas e à progressiva consolidação das unidades do sistema.
19
Exemplos de referência preferencial: estudos de casos, estudos comparativos, leituras interpretativas e indutivas da
complexidade, análises de impactos reais e virtuais das resoluções de problemas
20
Cf. Tendências Teóricas in 3º capítulo – MARIA JOSÉ GONÇALVES, A criação e gestão do conhecimento. Contributo
para a formação contínua universitária, pp.75-82
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Naturalmente que, embora a finalidade do sistema integrador de todas as entidades em presença seja
abrangente, nem por isso as estratégias de cada uma delas devem deixar de ser explicitamente
equacionadas de acordo com os seus perfis identitários e com as finalidades que especificamente se
lhes referem. Por isso, a conexão da estratégia particular de cada entidade promotora de cidadania ao
desafio de se vir a tornar progressivamente actuante nos desideratos da incubação de uma prática
extensiva, implica que essa entidade subscreva dois critérios referenciais: o do público-alvo para
o qual ela se dirige prioritariamente e o de contextualização das praxis que se lhe reportem naquelas
que sejam conectáveis aos públicos complementares ou a públicos-alvos de outras entidades, em
esforço sustentável de alargamento de horizontes que conduza à percepção do corpo de dinâmicas em
presença.
Passar deste princípio virtual à corporização prática da coesão social que se pretende alcançar, passa
pelo desenvolvimento de redes fundadoras ou reanimadoras do capital capaz de garantir a urdidura do
tecido social de um território, dito por isso capital social por, em si mesmo, constituir a condição sine
qua non da referida coesão. Recobrindo e (re)animando o capital humano inerente ao funcionamento
económico capilarizado no puzzle territorial em que a sociedade se organiza, o capital social será
factor de desenvolvimento integrado na exacta medida em que, aliando a acção ao conhecimento, for
capaz de conscientizar as perspectivas e os compromissos que o referido desenvolvimento pode por
em jogo, desde logo operacionalizando-o através de praxis sociais e políticas que nele incluam o
desenvolvimento da organização dos múltiplos espaços da relação implicados na multiplicidade de
problemas com que actualmente o sistema–mundo se defronta, com especial relevo, por um lado, para
a fome e para as várias formas de humilhação que resultam dos vários graus de violência que opõem
dominantes a dominados nas várias arenas em que o poder se exerce, e, por outro, para a poluição e o
desperdício de recursos e seus impactos na saúde e na própria desintegração ambiental. A questão que
se coloca é pois como viabilizar a participação das comunidades cidadãs na complexidade de uma
Sociedade do Conhecimento cujas bases se encontram largamente amputadas pela espessa iliteracia
que grassa na generalidade da população portuguesa.
A dimensão pedagógica – Posta assim a questão, a dimensão pedagógica central do sítio do cidadania
social é a da desalienação dos sujeitos, através da alfabetização 21 presencial, susceptível de induzir o
autoinvestimento destes no desenvolvimento das suas próprias virtualidades. O sítio corresponderá
assim ao lugar onde se organiza a reflexão sobre os condicionamentos sociais, económicos e políticos
do sujeito que se assuma como interveniente nos mesmos, em sede de produção de conhecimento das
respectivas causas. A pedagogia que se lhe adequa consiste em vocacioná-lo para facultar aos
destinatários os instrumentos de “leitura” dos seus contextos próximos ou longínquos, nisso se
inscrevendo a multidimensionalidade do espaço de relações de que ele participa enquanto indivíduo –
desde a relação com o grupo à do ambiente, passando pelas que emergem das esferas de produção, de
circulação e de comunicação que condicionam o acesso e fruição dos bens públicos a que se possa
aspirar.
Ao assumir esta perspectiva como ponto de partida da situação de aprendizagem proporcionada pelo
sítio, tendo por norte a linha de integração geral da sua organização num horizonte de cidadania
cognoscente -e com isso priorizando a linha da fuga à exclusão social dos sujeitos que a sofrem-, o
modo de produção do conhecimento in situ pode designar-se de pedagogia da desopressão. Esta
21
Conceito-chave da epistemologia de PAULO FREIRE cuja axiomática fundamenta o referencial da Pedagogia do
Oprimido, tese fundadora da investigação freiriana, a cujas linhas de força se acede em www.paulofreire.org.
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expressão remete explicitamente para o domínio actual da investigação freiriana 22 que toma, como
categorias básicas de análise, as de oprimido, expectativa e autonomia, comuns às mais diferentes
situações e cadeias de interacção subordinante/subordinado .
Toda a investigação que actualmente prossegue a axiomática fundadora:
- investe na necessidade de situar o oprimido em contexto, enquanto actor bivalente que age e pensa
simultaneamente como oprimido e como opressor, quando recorre ao olhar do opressor para assumir
actos de fatalismo ou de violência, através dos quais procura fazer-se respeitar na topologia das
relações sociais com as quais convive e o manietam como cidadão;
- constata que é só quando o oprimido se situa no “olho do furacão” que se lhe torna mais provável
participar na transformação das relações de opressão que pedagogicamente se lhe proponha;
- reinventa, nesse âmbito, as categorias analíticas de Paulo Freire, identificando como domínios de
investigação formativa, a educação / pedagogia do oprimido, a civilização do oprimido, a estética do
oprimido, o património do oprimido, a saúde do oprimido, a arte do oprimido;
- questiona-se sobre o modo de lidar com a diversidade dos registos de opressão, investindo na
transversalidade do diálogo e na perspectiva universal da educação pela arte, ao entendê-la como modo
de produção expedita da consciencialização capaz de avocar ao pensamento reflexivo a predisposição
para a subordinação das atitudes e da estética dos comportamentos à ética da libertação do sujeito.
Torna-se assim superlativo que a prática metodológica da investigação-acção priorize o estudo dos
saberes do aprendente, avocando à análise das situações vigentes e aos cenários prospectivos de
mudança, os pilares de emancipação e de autonomia inerentes à pedagogia da praxis de empowerment,
cuja matriz releve a interactividade reflexiva centrada nas vivências expressas, e a expectativa de
mudança que possa decorrer do investimento de saberes eficazmente acrescidos. Ao contrário da
pedagogia da acumulação amorfa de conhecimentos, pedagogia dita “ bancária” na expressividade
freiriana, a nova pedagogia defende ser antes preferível desaprender o que interfere negativamente na
produção de pensamento próprio, por ser por este que passa o processo de desalienação. Nesta
perspectiva, o professor/formador é simultaneamente um mediador e um investigador, cuja prática
coexiste com as do animador e do organizador das actividades, papeis que, em conjunto, conferem
consistência às actividades e à externalidade destas.
Um círculo de cultura - Situado o sítio nas pautas de pressupostos anteriores e identificados os
registos problematizadores dos quotidianos, serão sistematizados os conteúdos a objectivar no processo
de produção do conhecimento que se lhes reportam e organizados os espaços da sua elaboração, com
recurso a toda a panóplia que se lhes adeque, desde os formais aos informais. O sítio de cidadania
corresponde assim ao conceito de círculo de cultura 23 , uma vez que na acepção sociológica do termo, a
cultura é o sentido e a expressividade que se confere às práticas sociais e à sua problematização.
De facto, a centralidade do conceito de aprendizagem está para a do círculo de cultura, na plasticidade
que a expressão comporta, como a centralidade do conceito de ensino está para o da sala de aula, na
rigidez que a esta se lhe outorga. Os “teatros” da acção interaccionista podem ser pois de vária ordem,
desde que observem os pressupostos da desopressão cognoscente e coloquem cada sujeito na situação
simultânea de actor e de analisador do conjunto das interacções produzidas. Esse é o contexto da
despistagem das problemáticas que deverão ser seleccionadas e perspectivadas no sentido da
22
Conforme JOSÉ EUSTÁQUIO ROMÃO, presidente do Instituto Paulo Freire – centro de estudos brasileiro da rede
freiriana, presente, a convite da Universidade Lusófona em Lisboa, em acções de Seminários de pós-graduação promovidas
em 2004 e em 2006.
23
Na interacção e reciprocidade inerente ao círculo de cultura o conceito de dodiscência substitui a clássica dicotomia
conceptual docência / discência
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contratualização dos programas de aprendizagem, desde a fase de alfabetização a partir da equação dos
conhecimentos tácitos às da produção de conhecimento dos mais diversos conteúdos disciplinares e
interdisciplinares, com recurso à metodologia da pesquisa de conteúdos expressos e do apuramento de
pontos de vista situados em registo de reflexividade.
A ênfase nos conteúdos destinados a situar a produção cognitiva no âmbito da expressividade do
sentido a dar às práticas vivenciais dos seres humanos, na relação de uns com os outros e com as
várias dimensões do ambiente que as rodeia, tem por norte a tese de que uma educação cidadã passa
prioritariamente pela arte ANTÓNIO DAMÁSIO, António (2006) já que é ela que lida com as
emoções e estas “funcionam como classificadores de acções e de ideias”, sendo por isso capazes de
cumprirem a função que articula a razão à emoção. Se uma tal articulação é imprescindível para se
atingir o estádio de consciencialização moral, então a educação da sensibilidade é, segundo reitera o
referido autor, condição necessária para a formação de cidadãos.
De facto, como já noutro lugar defendemos ”(CRUZ; M.A e OLIVEIRA, M.E., 2001) 24 , “são
consistentes as pesquisas que, apontando a interactividade razão/emoção, enquadram o entendimento
de que a educação/formação –atenta ao sentido do quotidiano e à semiótica da produção cultural e
artística– é fundadora de uma curiosidade intelectual que abre caminho a aprendizagens motivadas,
activas e produtivas (...) É nesse sentido que pode assumir-se a educação/formação pela arte como
dimensão cultural de uma educação cidadã –ou seja uma educação em cidadania e para o exercício da
cidadania-, atenta aos valores da alteridade, no campo da fruição da vida e da edificação da sua
qualidade.
Será então na interligação destas vertentes que cabe estruturar-se cada dimensão curricular num
programa de formação diversificada que conduza os aprendentes a aceder às bases conceptuais e às
metodologias de abordagem das situações observadas, bem como ao tratamento das descobertas
emergentes das pesquisas levadas a cabo na sua descrição cognitiva e nos vários registos da sua
representação, incluindo os da expressividade escrita, oral e comportamental, inerentes à relação com o
universo sensorial. Educar para a criatividade, com propostas de actividade abertas, passa por estes
trâmites. A auto-regulação do estímulo passa pelos incentivos que cabe ao formador enunciar e aos
quais o aprendente corresponderá de acordo com o nível de experiência de que for detentor, quer a de
origem educacional (curricular e extra-curricular) quer aquela que obtém na “escola paralela” que a sua
própria vida constitui. Retomando a axiomática da investigação freiriana, diríamos que “ninguém
ensina nada a ninguém”, mas também que “ninguém aprende sozinho”. A estratégia que se adequa ao
universo de aprendizagem do sítio será então a que se contraponha á da reprodução de ensinamentos,
entendida na acepção teorizada por BOURDIEU (1990), o que privilegia a interactividade propiciadora
da transferência de conteúdos expressos, em sede de problematização equacionada pelo próprio
destinatário . E neste pressuposto, o desafio que se coloca ao formador é o de saber induzir o processo
de pensar e o gosto por o praticar.
O Plano de formação em metodologia de projecto – Apoiando a integração de profissionais
vocacionados para a sua própria reconversão profissional na lógica do enquadramento da qualificação
proporcionada pelo sítio aos seus destinatários finais, deverá este proporcionar também aos primeiros,
enquanto destinatários intermédios, uma oportunidade de autoformação em exercício, vinculada aos
princípios da cidadania social, nas dimensões cognitiva e extensiva, e conectada por isso aos projectos
de desenvolvimento pessoal dos destinatários.
24
in “ As Artes numa Educação Cidadã”, APEM: Educação Musical. '01-4º Trimestre & '02-1º Trimestre, conteúdo a que
por opção editorial se encontra em Jornal de Letras (2001), sob o outro título assinado pelas autoras.
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A mobilização da reflexão crítica destes sobre as circunstâncias do quotidiano vivido constituirá o
ponto de partida comum a todos; e a integração dos registos discursivos numa matriz de conteúdos
sujeita a discussão e a ponderação de alternativas de abordagens possíveis, permitirá que se defina uma
estrutura modular de organização dos referidos conteúdos, identificando as praxis de cada um dos
módulos a partir dos pressupostos metodológicos fundadores de cada um deles e da respectiva
operacionalização didáctica.
O plano de formação terá também de integrar a diversidade identitária dos destinatários finais através
das trajectórias traçadas na estrutura modular, que melhor se adequem aos casos em presença. Essa
diversidade porém não obsta a que, enquanto subscritores de um programa comum de empowerment, os
destinatários possam abdicar da aquisição de competências relativas à objectivação das suas próprias
subjectividades. Mas será o fomento de atitudes de corresponsabilização pelas causas de intervenção
comuns que corresponderão à aquisição de competências indispensáveis à objectivação das
características do ambiente físico, social e cultural em que individualmente se inscrevem.
A conexão entre os módulos de formação visará permiti-lo, através de um trabalho de estruturação
curricular que pondere devidamente as relações de implicação coerente e pertinente entre os seus
conteúdos-chave, relevando os que forem tributários de conteúdos transversais e dando-se a estes uma
posição central na organização curricular, por eles serem objecto do desenvolvimento de aprendizagens
comuns a todos os módulos. Estão neste caso as linguagens, quer do domínio linguístico, quer do da
instrumentação lógica e matemática que, em conjunto, permitam desenvolver discursos e apoiar o
pensamento dedutivo, indutivo e abdutivo – princípio fulcral de uma lógica de descoberta (ECO,1978,
pp.174-175) e por isso apropriado à exploração da reversibilidade dos registos do conhecimento
envolvidos na interpretação dos factos e nas pesquisas subsequentes. O desenvolvimento de
competências de observação, notação, registo e descrição suporta e suporta-se na produção e gestão de
um sistema integrado de informação, de comunicação e de conhecimento em que os saberes do sítio se
irão integrando à medida que emergem, se depuram, validam e utilizam, na relação com os vários
contextos em que intervenham – comunidade de pertença, redes de sítios territorializados e contextos
públicos, desde os locais aos de governação.
A identificação da matriz comum dos destinatários finais de um sítio com o ambiente em que este se
situa permite aliás que, no processo de formação em que eles se envolvem, se espoletem e aprofundem
competências de empregabilidade, no âmbito das soluções que sejam identificadas no sentido de se dar
respostas aos problemas, pela via das praxis perfilhadas.
Estrutura modular de um projecto de referência - No modelo integrado do sítio de cidadania
social, a conexão de vectores RECCRIA- PROMOVE-RESISTE não deverá perder de vista a
identificação de referenciais de empregabilidade e dos perfis profissionais compatíveis com as
expectativas da vida activa, sempre que estas forem nucleares na adesão ao sítio. Mas em todos os
casos, o apetrechamento das comunidades locais para participarem na qualificação do ambiente pode
inspirar-se na experiência INDE 25 , assente numa estratégia de superação dos entraves que resultem
das indiferenças institucionais, partindo para isso de:
- identificação de parceiros possíveis no âmbito referencial da política pública visada pelo sistema de
objectivos perfilhados pelo sítio 26 ;
25
Identificada e enquadrada por Maria Helena Cavaco (2000) no quadro da concepção e montagem em terreno do Projecto
assumido pela INDE.
26
No caso, o eixo YOUTHSTART da UE e os normativos imperativos a jusante do Despacho 123/97.
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- estruturação das parcerias e do núcleo duro dos recursos implicados na operacionalização das ditas;
- identificação do plano de formação dos profissionais de enquadramento 27 na modalidade de
projecto, sendo este publicamente assumido em termos de logotipo identificador o projecto – no
caso, o PROJECTO VIAGEM -, programas de desenvolvimento curricular, avaliação de resultados
finais e sua certificação, bem como a previsão de estudo de impactos a jusante da cadeia de
produção do sítio;
- difusão activa junto das entidades com perfil clientelar – escolas formais, Univas , ensino recorrente,
associações através da divulgação da estratégia de certificação a promover 28 no âmbito do sítio;
- organização dos espaços de formação da oferta contratualizada com os destinatários finais das
actividades do sítio e da avaliação do montante das expectativas activas que revertem para o sistema
de metas a considerar no detalhe programático do plano das referidas actividades.
É central neste modo de produção de conhecimento, o espoletar de capacidades para que em todos os
papeis e em quaisquer registos identitários, sejam desejadas e assumidas competências nos âmbitos de
saber ser cidadão (dimensão RECCRIA - no léxico do modelo de partida), saber fazer no âmbito das
competências proporcionadas e adquiridas (dimensão PROMOVE) e saber estar ao longo e nos vários
âmbitos da vida (dimensão RESISTE). No caso em referência, o modelo recorrente deste exprimiu-se
antes em termos de meridianos de inserção social, formação escolar e formação profissional e o
acolhimento dos destinatários integrou uma equipa constituída por:
- um profissional de psicologia responsável pela registo sociográfico dos candidatos à formação, com
vista à identificação negociada do percurso de formação;
- um profissional responsável pela mediação no acesso dos formandos às fontes de informação,
conhecimento e de comunicação, implicando funções de animação pedagógica e de tutoria;
- animador sociocultural de actividades in situ e em contexto, nas esferas da relação com os outros e
com o ambiente;
- gestor do projecto de formação, responsável pela negociação do desenho curricular tipo, da sua
adequação às condições concretas do formando e sua inserção nos círculos de cultura adequados à
expansão da sua personalidade;
- um gestor do contrato de formação, tendo como primeiro outorgante o gestor do projecto da referida
formação, 29 e como segundo outorgante o formando, enquanto sujeito implicado na explicitação e
contextualização do seu próprio projecto.
Do estudo de caso às virtualidades modeladas
MERIDIANOS
DO
PROJECTO VIAGEM
Inserção Social
Formação Escolar
Formação Profissional
VALÊNCIAS
DO
SÍTIO PROJINA*
RECCRIA
PROMOVE
RESISTE
* Projecto de Investigação na Acção
27
Assim aqui referidos, lato senso, sem prejuízo da identificação precisa das funções e dos papeis inerentes à sua
diversificação profissional.
28
No caso, uma dupla certificação de competências através de duas alternativas: a profissional, através da habilitação de
técnico de ambiente ( de nível II) com 3 fileiras – floresta, solo e águas ; e a formal em caso de conclusão do 9ºano, através
de ensino recorrente.
29
No caso do Projecto Viagem, a própria associação promotora (INDE – Intercooperação e Desenvolvimento).
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A estratégia de articulação das dimensões de um sítio PROJINA (CRUZ_VIANA,2002;2004;2005),
identificado à semelhança da experiência montada pelo Projecto Viagem, terá por base:
- um núcleo de objectivos explícitos que atribua prioridade à integração dos destinatários em grupos
corresponsáveis por actividades comuns e à habilitação dos mesmos para a empregabilidade, tendo
como horizonte a relação das aprendizagens com as expectativas de angariação de trabalho com os
direitos necessários à dignificação que ele propicie;
- o contrato de formação assumido como contrato de trabalho clarificador dos direitos, deveres e áreas
de corresponsabilização de formandos e formadores, deduzidos ambos dos objectivos explícitos e da
sua gestão/avaliação sistemática;
- práticas de aprendizagem em sala, com privilégio de:
o
o
o
o
o
apresentação e discussão de problemas;
organização e prática de acesso às fontes de informação e de conhecimento, na relação com
a gestão da árvore dos conteúdos disciplinares implicados;
produção de discurso expositivo, argumentativo e sintético;
elaboração de dossiers de organização dos materiais inerentes aos procedimentos de
argumentação, recolha de informação e produção de conhecimento ;
canalização de resultados para:
ƒ “diários de bordo” e “relatórios progresso”
ƒ bases de dados, com identificação de variáveis significativas e potencialmente
certificáveis;
- práticas de terreno com registo sistemático de experienciação e de apports aos dossiers e às bases
de dados;
- práticas de disseminação de resultados no âmbito da sociedade civil com:
o recurso privilegiado aos diários de bordo, cuja elaboração por formandos e formadores,
preveja a interlocução com quaisquer interessados, assumindo a produção como
prioritariamente aberta às parcerias formalizadas no âmbito do Projecto;
o apuramento sinóptico dos relatórios de estágio, dos processos e perfis de valorização
conseguidos em quaisquer dos meridianos do Projecto e das disponibilidades do sítio de
incubação do mesmo.
Centrada na actividade de projecto, as componentes de formação visadas pelo sítio serão pois, à
semelhança do caso em que se inspira, das esferas :
- da formação comportamental que acompanhará toda a relação do formando com o sítio desde a fase
de preparação das restantes ao termo da relação com este;
- das actividades curriculares, privilegiando actividades desenvolvidas em registo de praxis, desde a
fase preparatória à terminal;
- das actividades desenvolvidas em estágio ou vocacionadas para desempenhos similares;
- das actividades lúdicas e culturais, em paralelo com as de formação comportamental e assumidas
como fulcrais na integração das restantes;
- das actividades transversais aos vários âmbitos de formação.
No conjunto, a INDE equacionou 1136 horas de carga anual para o conjunto total das actividades,
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incluindo a estrutura curricular de uma formação formalmente vocacionada para a empregabilidade
no contexto territorial da experiência. O desenho desta vertente (que no caso consumiria 17,44% da
carga horária referente à totalidade das actividades programadas) tomou por referenciais da procura
entretanto identificada como expectável, a habilitação para profissões susceptíveis de serem
assumidas nas vertentes do ambiente, por um lado, e, por outro, na de prestação de cuidados à
comunidade, na relação com o sistema de saúde e as práticas de apoio domiciliário a idosos e a outros
segmentos carenciados do referido apoio.
Desenho de estrutura de formação implícita às
Actividades Curriculares
ÂMBITO
DISCIPLINAS
CARGA ANUAL
GERAL
PORTUGUÊS
INGLÊS
MATEMÁTICA
SOCIOCULTURAL
FORMAÇÃO DO
CIDADÃO
TÉCNICO
ÂMBITO
AMBIENTAL
Fonte: Projecto Viagem, ob.cit. pp.30-33
33
33
33
33
CARGA
HORÁRIA
SEMANAL
1
1
1
1
66
2
A pluralidade do sistema comunitário – Ao tomarmos o estudo deste caso como referencial
metafórico do universo de comunidades passíveis de subscreverem programas similares, assumimos
que a experiência formulada é passível de funcionar nas dimensões contextuais e intertextuais do
referido universo, na condição de haver vontade política para o efeito, quer no âmbito local, quer no
enquadramento das políticas públicas que lhe confiram sustentabilidade, tomando como esteio a da
I&D operacionalizável nessa perspectiva.
Configurando o conjunto de comunidades como sistema, diremos que, na totalidade deste, há
claramente lugar à identificação de vários subsistemas, sendo três deles nucleares para a
extensividade do direito à cidadania e da sua configuração como bem público: o subsistema escolar, o
associativo e o autárquico. Dado que o desafio de os tornar progressivamente e convergentemente
actuantes nos desideratos da incubação de uma cidadania extensiva implica a capacidade de todos eles
contextualizarem as suas práticas nas praxis decorrentes dos referidos desideratos, a análise de casos
conduz-nos a procurar, nestes subsistemas e nesta perspectiva comum, aqueles que denotem
características funcionais que permitam esperar, da implicação prioritária dos que forem relevantes,
efeitos multiplicadores no clima de receptividade que se pretende generalizar.
Estarão entre esses casos a excelência autonómica da Escola da Ponte, no caso do subsistema escolar
ou a emergência da Escola de Cidadania de Montijo, que polariza em instalação autónoma, uma
formação em cidadania facultada, com apoio autárquico, a alunos da rede de secundárias da Cidade; as
praxis de base da Iniciativa Equal desenvolvida no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio, no
caso do associativismo; e, no caso autárquico, as práticas dos municípios que indiciem vocação para
conectarem as vertentes socioterritoriais das suas políticas públicas à dinamização destas no sentido da
cidadania extensiva vs. reforço da coesão social vs reordenamento integrado do território, em resultante
que tenha por norte o desenvolvimento integral. Em todos os casos, qualquer intervenção implica
incentivar a vertente participativa da democracia, quer através do fomento da aprendizagem de linhas
19
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
Documento Libre
de fuga à exclusão social quer através de práticas de ponderação objectiva das alternativas que, em sede
de opção, se coloquem nas vertentes da qualidade de vida individual e colectiva, desde que tenham
expressão na polis e nos territórios em que as arenas decisionais se inscrevem.
Pela multiplicidade de públicos-alvo e pela transversalidade das políticas públicas de proximidade, os
municípios constituem sítios privilegiados de auto e hetero observação das práticas e dinâmicas que
neles confluem e interagem. Bastar-nos-á uma tríade de municípios que aceitem demonstrá-lo e
demonstrar-nos a pertinência da hipótese que, em simultâneo, se pretende testar, a qual passa pelo
princípio de que as dinâmicas participativas se superlativizam neste quadro em relação às
representativas e que estas não pretenderão impedi-las, dado que os seus créditos só se jogarão a
jusante, em território decisional adequado, que constituirá o “nível de base” a que afluem as propostas
emergentes dos sítios. Seleccionando o número mínimo de autarquias com gestão política diferenciada
na região metropolitana de Lisboa, para que faça sentido contar com uma rede identitáriamente
diferenciada, em articulação com a Agenda da Estratégia de Lisboa e na vigência do actual quadro de
referência estratégica 2007-2013, a decisão que perfilho, enquanto sistema de representação
sistemográfica do Projecto de I&D que aqui se defende, iria no sentido de seleccionar autarquias de
escala adequada a uma experienciação portadora de variáveis diferenciadas e suficientemente
contrastadas em matéria de representatividade do sistema político-partidário do país para, em conjunto,
recobrirem a variedade de segmentos sociais que decidam implicar-se na vertente participativa da
democracia.
Em todo o caso, nenhuma escolha é excludente de outras possibilidades alternativas, muito menos
constituem óbices a dinâmicas movimentistas que configurem iniciativas de adesão voluntária aos
princípios difundidos pelo Projecto e aos impactos que venham a ser comparáveis aos dos casos
seleccionados como exemplares. Ainda assim, a responsabilidade demonstrativa destes é tão grande
que só em práticas muito sedimentadas, esta se pode escorar em termos de poderem servir de referência
fidedigna à de outros. Defendemos pois que tais condições se implementem à medida de provimento de
know-how, contratualizado por reivindicação das autarquias que se mostrem capazes de substituírem a
lógica de investimento no “hardware” das infraestruras habitacionais pela de “software” implicado na
produção de um empowerment susceptível de avocar, ao sistema de formação ao longo da vida, o
próprio sentido actual do conceito de paiedeia, o qual, no universo da cidadania activa, subjaz a um
processo educativo extensivo ao percurso da vida, mas em dinâmica capaz de o centrar na capacidade
de atribuir sentido às práticas sociais 30 e de situar a produção e a circulação do conhecimento no
arquipélago dos saberes validado pela comunidade científica.
A função de um protótipo - Entretanto, a escolha criteriosa de um protótipo de funcionamento de uma
entidade incubadora de cidadania no âmbito poliárquico, onde se concentrem meios que permitam
explorar as virtualidades do Projecto para os fins gerais que ele se propõe atingir, não será de somenos
importância. Essa concentração, sujeita ao processo de auto-observação e de hetero-avaliação do sítio
por instâncias independentes, pode constituir a base da estimativa dos recursos que vierem a ser
exigíveis pela generalização da rede e pode ser o caminho para identificar as necessidades de emprego
que directa e indirectamente decorram da própria política pública de promoção da cidadania social. À
partida, o provimento de recursos comporta:
uma organização integrada por uma bolsa de recursos humanos, tecnológicos e financeiros
indispensáveis à montagem e à operacionalização integrada das vertentes do sítio, em conexão com os
30
Acepção sociológica do conceito de cultura em relação ao qual outros relevam antes o desabrochar das virtualidades do
homem tornado verdadeiramente homem" (Marrou, 1966: 158, citado in http://cfcul.fc.ul.pt).
20
XI Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Ciudad de Guatemala, 7 - 10 Nov. 2006
Documento Libre
referenciais de enquadramento estratégico assumido ou expectável no âmbito das políticas públicas e
sociais do sector;
- um funcionamento orientado por estrutura de enquadramento composta pelos núcleos de formação de
formadores em exercício, de coordenação de conteúdos disciplinares e de formação e tutoria dos
destinatários finais;
- uma prática que garanta a interacção das referidas estruturas ao longo de todo o processo dual de
formação, com suporte na planificação, programação e readaptação contínua das actividades
projectadas;
- uma estrutura de externalização da actividade do sítio nas várias dimensões para as quais se encontra
vocacionado.
Convém assim escolher a sua localização no universo das entidades que deliberem aderir
voluntariamente ao conceito de entidade incubadora de cidadania, o que se reporta a quantas
enquadrem as suas políticas de incentivo e de apoio ao livre desenvolvimento da prática cidadã, à
perspectiva de esta se poder generalizar à vivência quotidiana de todos, sem distinção de género,
idade, classe, credo ou habilitação de base. Cumpre pois divulgar-se-lhes exaustivamente os
pressupostos, argumentos e expectativas, através de website apropriado a esse efeito e avaliar as
credenciais apresentadas em sintonia com o Projecto de implicação da cidadania social no
desenvolvimento integral.
Questão civilizacional permeável à promoção da justiça, a cidadania é, nestes termos, encarada pela
própria semiótica da Europa social como polegar da mão em cuja palma a justiça possa repousar e em
que os restantes dedos configurem a solidariedade, a igualdade, a liberdade e a dignidade referenciais de que a prática do associativismo de todos os quadrantes e recortes se tem geralmente
feito eco, ainda que por investimento de geometria variável que urge agora inserir numa urdidura
integrada, para que tais consignas se inscrevam na consciência colectiva de uma sociedade capaz de
se posicionar perante os riscos, com plena consciência de lhes poder fazer face.
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Uma cidadania de perfil social
Maria Alfreda Cruz Viana
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la
Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
Documento Libre
Uma cidadania de perfil social
Maria Alfreda Cruz Viana
Portugal, 2007
CONTEXTO REFERENCIADOR
Se intenta un nuevo flujo de ideas para despertar los administradores a nuevos temas y estimularles su espíritu
de iniciativa, animándolos a enfrentar nuevas aventuras. En este contexto parece importante el avanzar en
propuestas para: redistribuir recursos del poder decisorio y facilitar la emergencia de nuevos actores; crear
nuevos espacios y accesos a bienes públicos y privados; e instituir nuevas interacciones sociales que ayuden a
repensar las actuales prácticas burocráticas. Además de los temas clásicos de la formulación y análisis, se
espera la generación de nuevas ideas sobre gobernanza, referencias valorativas, institucionalismo, decisiones
y elecciones públicas y sobre experiencias administrativas. Por lo tanto, se invita a los estudiosos y
profesionales en este campo a dar a conocer las transformaciones y conquistas que están ocurriendo, como
también a pensar y diseñar
Apelo ao XII Congresso CLAD, Coordenação do Painel Inovação e Gestão de Políticas Públicas
Esta comunicação sucede-se às apresentadas pela autora aos VII, IX, X e XI Congressos 1 e visa a
conexão com as temáticas dos painéis do presente Congresso, com enfoque nas perspectivas que situam
as Políticas Públicas em face da problemática da exclusão social, partindo do princípio que esta se
reproduz nas dinâmicas de precarização que abrem caminho à pobreza, bem como ao desvirtuamento
da estratégia de prossecução da Sociedade do Conhecimento.
Esta foi aliás a dupla perspectiva em que temos vindo a abordar a situação portuguesa e as
virtualidades do país, enquanto subscritor de uma Sociedade do Conhecimento perfilhada pela teoria e
pela prática da União Europeia(U.E); equacionando a escala local como âmbito de experienciação das
políticas glocais que a governação multinível for capaz de promover e de municiar, visando a
observância dos pressupostos do modelo social que lhe subjaz . Esta complexidade implica a
necessidade de configurar, passo a passo, a elaboração de uma política transversal aos vários aspectos
parcelares que exigem especificidades próprias na abordagem das problemáticas em questão, a
qualquer dos níveis em que estas se coloquem e que os Painéis referenciadores 2 da presente
Comunicação equacionam do modo permissor da sua organização em referencial integrado a que nos
propomos corresponder nos capítulos I e II.
I
DO DISCURSO À ACÇÃO
O Estado da Arte - Enquanto âmbito de desenvolvimento societal , a estratégia implícita a um cenário
integrador das valências temáticas em questão remete para referências epistemológicas e jurídicas de
suporte à governabilidade contemporânea e especifica-se na casuística das situações concretas. Cabe à
perspectiva portuguesa, situar-se no sistema de relações que a tornam simultaneamente parte do Espaço
Europa e do Espaço Latino-Americano, comportando em agenda os seus projectos de inovação na
matéria. Aquele pelo qual nos responsabilizamos tem como matriz central de investigação o
questionamento das práticas de I&D de suporte à constituição dum Capital Social próprio de uma
Sociedade do Conhecimento que seja capaz de assumir, em contexto de reflexão cognoscente, os
objectivos universalmente ratificados para garantia do Desenvolvimento Sustentável, bem como para a
1
2
CRUZ VIANA (2002) (2004) (2005) (2006)
Sociedade de Informação e Governo Electrónico, Inovação e Gestão de Políticas Públicas e Desenvolvimento Local
1
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
Documento Libre
do Contrato Social que lhe for inerente.
Enquanto projecto plurimensional de I&D, designamo-lo por Projecto de Promoção do Capital Social
da Sociedade do Conhecimento (PCSSC), sucedendo-se, em sede institucional refexiva, 3 a um outro
projecto de política pública desenvolvido durante um triénio sabático a partir de 2002 no Instituto
Nacional de Administração. Suportados numa framework 4 da política pública que a ambos subjaz,
ambos se centram na dimensão nuclear da Cidadania, assumindo a formulação da estratégia de Lisboa
como norte do processo de transição e de identificação das mudanças inerentes à mutação da Sociedade
de Informação para a do Conhecimento . De facto, o novo perfil a que a Sociedade do Conhecimento se
propõe desde 2000 emerge da problematização de matérias convergentes na identificação do perfil e do
papel da cidadania na própria reconstrução do papel e do perfil do Estado. Ao formular tal desafio, o
Estado Português, assumia então o desiderato de se definir ele próprio como “estado cidadão”,
identificando nesse âmbito uma figura institucional capaz de configurar os contornos da revolução
institucional a empreender na matéria. “A Face Oculta da Governança” foi por isso a consigna com que
o INA chamou a Congresso Internacional, em fins de 2001, a discussão dos três meridianos centrais
para a equação da mudança anunciada – Cidadania, Administração Pública e Sociedade, a qual já então
se configurava nos discursos públicos menos como Sociedade da Informação do que como Sociedade
do Conhecimento.
Tendo presente as circunstâncias das sociedades actuais de perfil periférico, começamos por, na
promoção do Projecto INA, aduzir ao conceito de cidadania qualificada de activa e teorizada como
instrumento de desburocratização dos mecanismos tradicionais da Administração Pública, a
qualificação de inclusiva, ponderando, na perspectiva da I&D, os pressupostos e vectores de referência
do Seminário Internacional que, em Portugal, abordara a Educação para os Direitos Humanos, no
âmbito da celebração dos 50 anos das Nações Unidas. Nesta perspectiva, a questão da cidadania e o
perfil que a qualifica questionam simultaneamente o Estado e a Sociedade, no modo como ambos se
estruturam e funcionam e na relação em que interagem.
Contextualizamos o caminho feito desde então no vasto referencial das ciências sociais que se vêm
desenvolvendo em Portugal desde meados dos anos 70, com relevo para as escolas de pensamento
constituídas nas academias de Lisboa e Coimbra, particularmente insistentes na situação problemática
do país. Paradigmática, enquanto acervo monumental, é “A Sociedade Portuguesa perante os Desafios
da Globalização”(1999-2005), obra dirigida por Boaventura Sousa Santos, onde se analisa e
problematiza, em espécimes bibliográficos tematicamente diferenciados, como abordar os desafios da
inovação inerentes à transformação da economia e das várias problemáticas societais, repentinamente
envolvidas em dinâmicas de internacionalização que transcenderam as suas capacidades tendenciais de
adaptação. Daí ”o agravamento do risco social associado ao aumento da pobreza e das
desigualdades”(SANTOS, B.S.,1999), ainda que compagináveis com a equação de respostas plausíveis
em domínios particulares incidentes em várias escalas da sua territorialização, mas sempre diluídas na
teia global da net e dos locci que lhe são próprios.
A questão da net transfigurou, de facto, a partir dos meados dos anos 90, a atitude do Estado e dos
actores sociais perante os riscos imputados às dinâmicas globalizadoras. Na “condição semiperférica
que Portugal ocupa no sistema mundial(...) a combinação entre destruição/reconfiguração institucional
e a emergência de novas figuras regulatórias”(PUREZA, JM e FERREIRA, AC, 2002) enquanto
condição de inserção nesse mesmo sistema, encontraram no espaço virtual que a net constitui um apelo
3
4
Centro de Filosofia da Ciência da Universidade de Lisboa
Cf. Capítulo II
2
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
Documento Libre
de múltiplos matizes. Nesse contexto, os sujeitos dotados de protagonismo social que baste para
lidarem eficientemente com as múltiplas networks que organizam o território web, encontraram neste
uma poderosa linha de fuga à exclusão do mainstream das ideias em que a relativa marginalização do
país até então os colocava. “Impulsos transformadores e estímulos ao espaço da cidadania”( idem) têmse vindo a aprofundar em sectores socioculturais, como a Sociedade Portuguesa de Filosofia e a
Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações que, em 1989, promoveram em
conjunto um Simpósio Internacional sobre as “Tecnologias da Informação & Sociedade”(ALVES, JL,
2002). Dos Usos da Teoria à Teoria dos Usos a variedade de temas veio a confluir na identificação de
três áreas de impacto fundamentais: “O papel da comunicação nas dinâmicas de mudança cultural”, “A
Sociedade Computorizada: vida nova ou destruição?” e a “Filosofia Artificial e o declínio da
Tecnologia”, entendida esta como “força de melhoria de vida”, que se alimenta da ciência em que se
origina e da apropriação societal que confere sentido às suas aplicações. Mas o que, desde então,
persiste em faltar é um modo de investir tais recursos e potencialidades na recuperação do atraso
português, exactamente onde ele se enraíza: na persistente iliteracia das camadas sociais que não
tiveram margem de manobra própria para aderiram ao apelo das políticas educacionais que o Estado
Democrático lhes destina na vertente da generalização do acesso aos equipamentos escolares. Esta tese
sublinha que a incapacidade de se conferir novos sentidos às práticas, indicia uma anomia social que
resulta da incapacidade societal para lidar com os desafios colocados por uma vigorosa dinâmica de
mudanças, pelo que a insuficiência do grau de competência das comunidades mais afastadas da
literacia para vencer o gap em relação às restantes, está na origem dos indicadores do desperdício
escolar traduzido nas taxas de retenção e de abandono que insistem em penalizar todas as reformas
educativas que se sucedem desde 1974, independentemente do grau de acerto que apresentem em
relação aos objectivos que assumem.
As praxis académicas e educacionais partiram, pelo contrário, do princípio de que a universalidade da
educação para todos era uma questão de garantia de acessibilidade, entretanto generalizada a uma
procura social garantida pela coesão do tecido social de que emergissem os sucessivos cohortes
acolhidos pelo sistema escolar. A prática demonstrou não ser bem assim, mas a crença de que a
eficiência do ensino é função da capacidade formatadora da escola justificou que durante décadas se
esperasse que esta cumprisse só por si o papel de colmatar o atraso expresso em iliteracias que outros
países foram ultrapassando pelo menos ao longo do mesmo período. O paradigma interpretativo da
escola moderna coloca entretanto no terreno a questão da escola paralela, função assumida pelas
práticas e perspectivas das comunidades de pertença original dos alunos, chamando as ciências sociais
e políticas à `intervenção nas abordagens multidisciplinares das situações em presença e da prospectiva
de decisões de mudança. E estas passam pela interconectividade da rede de articulação de saberes em
que uma situação se inscreva. Partir do contexto da escola para a transformação da sua capacidade de
resposta aos desafios que aos alunos se colocam é a hipótese que perfilhamos, embora as políticas
públicas de perfil prospectivo, continuem a situar se, entre nós, na “infância da arte”.
Contextualizamos finalmente a nossa postura naquela que, a outra escala e dimensão, trouxe a Portugal,
em Fevereiro de 2003, um Meeting Internacional no âmbito do VI Programa do III Quadro
Comunitário de Apoio que viria a terminar em 2006 e cuja organização procurou aqui concertar com os
Estados Membros da U.E. uma política integrada para alicerce de uma Sociedade baseada no
Conhecimento. Tal política, enraizada na Estratégia de Lisboa com foco no Espaço Europeu de
Investigação, perspectivava-se constituir-se como o principal instrumento de base de uma dimensão
estratégica de longo prazo construída pela União Europeia e pelos seus Estado membros através da
comparabilidade e da multidisciplinaridade duma abordagem integrativa das diversas situações em
presença. Um tal programa. sustentável pela aliança entre Ciência e Políticas Públicas, com foco em
prioridades temáticas, deu relevo a uma destas que designou precisamente por “Cidadãos e
Governança na Sociedade baseada no Conhecimento” e atribuiu a responsabilidade da sua
3
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
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fundamentação às Ciências Sociais e às Humanidades. As principais “Opções & Escolhas” centradas
nesta componente programática relevaram a importância de perfis de desempenho científico de alta
qualidade em áreas de políticas públicas estruturantes do referido campo científico, sendo este um dos
caminhos de plena exploração das potencialidades do Espaço ERA. Foi com este perfil que se
configurou a Sociedade baseada no Conhecimento, no âmbito do Meeting, enquanto campo de
geração, distribuição e uso de um Conhecimento compaginável com os vectores da Qualidade de vida,
Coesão Social e Estratégias Políticas implicadas no funcionamento do Mercado de Trabalho e das
esferas da Educação ao Longo da vida e do Desenvolvimento Sustentável.
A valorização das ciências sociais e das humanidades na produção da Sociedade do Conhecimento
cruza-se com dois domínios de interpretação até certo ponto alternativos: aquele que encara a
pluralidade do território das ciências como central no funcionamento da globalização, expressando-se
na diversidade hierarquizada dos modo de fazer ciência e excelência, conforme a posição que os países
ocupam no sistema mundial de produção e circulação das actividades e dos saberes científicos, com
indiferença aos restantes, e por outro lado, aquele que aposta na prevalência da imbricação das praxis
de I&D no funcionamento societal e esses são precisamente os das Ciências Sociais e das
Humanidades. Antes do Meeting Europeu de 2003 afirmar em terreno académico de Lisboa a sua
profissão de fé no apelo que uma Sociedade baseada no Conhecimento comporta para a relevância da
referida área científica, já a Fundação Gulbenkian promovera um livro branco sobre a matéria da
responsabilidade societal das Ciências Sociais, cuja abertura preconizou. Mas o mais importante neste
domínio é a emergência da tese que deu corpo à ideia do Arquipélago do Conhecimento (CARAÇA,
J.,1994): a da tranversalidade dos saberes, desde a filosofia, as expressões e o direito, às ciências
“duras” e às “ciências da interpretação e do mistério”, em todo o caso abertas a registos de saberes
diversos do da ciência, mas nem por isso impossível de convergir com o dela na emergência duma
sociedade em que o conhecimento se torne um bem de consumo geral - e esse será o conhecimento
problematizado quotidianamente a partir da observação de tudo o que interessa à vida e à civilização,
incluindo a ciência, qualquer que seja o quadrante epistémico em que esta se situe e aplique. E só assim
o acesso social ao sistema educativo poderá justificar que a educação possa ser encarada como
ferramenta de vida útil para quem lhe entrega os filhos e que a escola deixe de ser mal amada por estes
- e estes são tantos quantos alimentam as estatísticas do abandono e do insucesso escolar em todos os
azimutes do país. O país deve a si próprio os estudos de follow up capazes de ajudarem a identificar o
estado em que a coesão social se encontra e o que no seu tecido falta cerzir para que o capital social
seja um dos capitais do desenvolvimento sustentável e um terreno de eleição da problematização do
quotidiano e do auto –conhecimento dos cidadãos.
Estruturar o conhecimento pela via da integração das capacidades de pesquisa que relevem dos
programas e actividades conectadas à observação do quotidiano, implica uma forte
multidisciplinaridade inerente à abordagem deste e não abstrai da uma perspectiva de longo prazo das
suas coordenadas: Conhecimento emergente e integração das Ciências Sociais e das Humanidades na
Europa e no Mundo, mudanças educacionais vocacionadas para a Sociedade do Conhecimento,
sistemas de links entre Educação e Ciência, políticas de prevenção de riscos, modelos de
desenvolvimento socioeconómico, atitudes de cidadania e de interiorização de valores cívicos,
sustentabilidade recorrente de iniciativas em sede de produção de conhecimento objectivo, assumindo
este como bem público valorizador do humanismo e aberto a dinâmicas de empreeendedorismo
interventivo na produção do bem comum. Mas tudo isto implicando um núcleo duro de transformações
culturais visando a valorização da responsabilidade, nos planos estatal, corporativo e social, a garantia
consistente dos direitos humanos, a activa participação cívica na res publica e o funcionamento de
redes de excelência desde as esferas públicas às comunitárias.
Este cenário, recorrente daquele que o Meeting de 2003 enunciou, continua na ordem do dia da
4
XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
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Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável 2005-2014, como
perpassa por todo o território Web, onde o apelo se universaliza. Na esfera do Estado, porém, a
depressão portuguesa que a obra supracitada ( Santos, BB e alia) de algum modo faria prever,
sobrevive desde 2002, ano em que a Administração Pública optou por identificar prioridades que se
sobrelevaram as que, tendo-se imposto na época em que Estratégia de Lisboa marcou a passagem de
Portugal pela instância regulatória da União Europeia, ainda aqui se repercutia em eventos como o
referido. Imperativos de contenção de despesas orçamentais recentraram então o Estado nos vectores
tradicionais da gestão, mas privilegiando as opções pelo reforço da qualificação dos seus próprios
quadros em matérias correlativas de aperfeiçoamento metodológico de práticas de organização e de
replicação normativa .
Todavia, ainda que remetido nesse âmbito para o perfil de utopia útil, dado à estampa através da linha
geral do argumentário que temos vindo a defender é fundamental não abdicar da perspectiva de
ponderarmos a política pública formalmente enunciada em registo de I&D, avançando para
experiências-piloto de estruturação da Sociedade do Conhecimento, pela via da promoção do Capital
Social, projecto esse que mantemos em agenda .
A equação dum percurso – “Passo a passo” é o modo como explicitaremos a framework de como agir
em consonância com os desafios que sublinhámos nos painéis do Congresso, responde ao
questionamento do painel Sociedade de Informação e Governo Electrónico, concretizando, na relação
como os restantes, o argumentário subjacente ao cenário que temos vindo a apresentar a este fórum de
ideias programáticas desde 2002 5
Framework da Política Pública de
Articulação da Cidadania à Sociedade do Conhecimento
1. Finalidade
•Assegurar emergência de uma cultura de cidadania - extensiva, activa e inclusiva – apelando à
iniciativa e criatividade do Estado Português para a equação de cenários não formais de promoção dos
Direitos Humanos e de uma Cultura da Paz
2. Objectivos de quem aceda à rede
2.1. Relacionais
2.2. Promoção do autodesenvolvimento
3. Estratégia de concepção do Projecto do sítio
•Criação dum protótipo de sítio, que se constitua como “laboratório” de investigação-acção, enquanto
estratégia de articulação dos eixos epistemológico, político e metodológico do projecto, na situação
que vier a ser especificada como estudo de caso das praxis pertinentes à finalidade e aos objectivos do
Projecto.
4. Observatório do Cidadão
•O ponto ómega de uma tal estratégia consiste na criação e no desenvolvimento autónomo de um
observatório do cidadão em cada um dos sítios em que se territorializa o desenvolvimento das práxis
referidas (3), cabendo a gestão da plataforma que venha a ser criada em registo de I&DT ao colectivo
dos cidadãos implicados na sua utilização interactiva com a equipa de mediação e de animação dos
5
( cf. Feedback Básico in Anexo I)
5
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recursos humanos investidos na criação e no enquadramento da base de dados emergente dos referidos
procedimentos.
5. Função do Protótipo
•O protótipo concretiza assim a aproximação da cidadania às problemáticas do território e da
administração, na lógica do serviço público distribuído em rede, o que implica a necessidade de criar
ferramentas apropriadas aos objectivos de adesão e às missões assumidas, submetendo-se a sua
utilização a teste de adaptabilidade ao universo de situações que venham a incluir-se na referida rede .
6. Partenariados
•A construção das referidas ferramentas recorrerá à operacionalização de partenariados eficazes que
trabalhem em rede para a consecução dos objectivos enunciados (2) e da finalidade visada (1).
7. Comunidade Aprendente
•A prática comunitária visa objectivos de curto, médio e longo prazo, dependendo estes últimos da
inter-acção com o contexto político em que a referida Sociedade se produz e desenvolve. Estará neste
caso, entre outros, o objectivo de opor a democracia à violência, quer na dimensão poliárquica, quer na
de política interna ao país.
8. Observatório da Cidadania•A confluência dos outputs de utilização dos observatórios do cidadãos,
distribuídos em rede pelo território do país, implica a criação de um folder de destino aberto à
ponderação dos seus registos. Para isso, é indispensável eleger um território político neutral, que garantindo acesso a todas as forças políticas do espectro formal da democracia representativa – seja da
responsabilidade directa do Parlamento, onde as questões gerais e ideológicas se debatem, confrontam
e interagem, produzindo o ambiente sistémico da governação do país.
9. Para um Plano Internacional dos Direitos Humanos
•Conectar, em termos práticos, a dimensão dos direitos civis e políticos à dos direitos económicos,
sociais e culturais, inerentes a pactos internacionais defendidos pelas instâncias internaccionais que
superintendem nas referidas problemáticas
10. Detalhe explicitador das rubricas enunciadas
10.1.Finalidade
Assegurar emergência de uma cultura de cidadania - extensiva, activa e inclusiva
1.1. Criando políticas públicas destinadas a apoiar o sujeito em todas as etapas da vida, conduzindo-os
a saberem optar entre as alternativas que se lhes vão colocando no quotidiano, na base da compreensão
dos assuntos que se lhes reportam.
1.2. Fundando um serviço público que garanta os recursos adequados para banalizar o controle das
agendas que decidem dos destinos colectivos e os modos de acesso a fontes fundamentadoras das
alternativas de decisão em presença
10.2. Objectivos de quem aceda à rede10.1.Finalidade
Assegurar emergência de uma cultura de cidadania - extensiva, activa e inclusiva –
1.1. Criando políticas públicas destinadas a apoiar o sujeito em todas as etapas da vida conduzindo-o a
6
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saber optar entre as alternativas que se lhes vão colocando no quotidiano; na base da compreensão dos
assuntos que se lhes reportam
1.2. Fundando um serviço público que garanta os recursos adequados para banalizar:
1.2.1.•o controle das agendas que decidem dos destinos colectivos
1.2.2.•os modos de acesso a fontes fundamentadoras das alternativas de decisão em presença
10.2. Objectivos de quem aceda à rede
2.1. Relacionais
••Aprender a optar entre democracia e violência como modo de relação com os outros
•2.1.2.Aprender a monitorizar a adesão de outros indivíduos ao projecto do sítio e à rede da sua
interactividade com a distribuição dos outros no “território web”
2.2. Promoção do autodesenvolvimento
2.2.1.•Alargar competências cognitivas ao longo de toda a vida
2.2.2. Aprender a mover-se nos circuitos de captação, produção e divulgação de informação referente
aos assuntos em processo de ponderação
10.3. Estratégia de concepção do Projecto
3.1. Mobilização de estratégias de formação
•adequadas ao provimento da arquitectura do sistema de informação e comunicação implícita à
observação controlada dos processos que venham a ser territorializados nos sítios de cidadania
3.1.2. adequadas à habilitação pessoal para o exercício da cidadania social
3.2. Recursos humanos nucleares
•Investigadores I&D
•Mediadores e Animadores Culturais
•Efectivos da Administração Pública habilitados e requalificados no quadro dos pressupostos da
Sociedade do Conhecimento
10.4. Observatório do Cidadão
4.1. Natureza
4.1.1.Plataforma informática
Sistema integrado de Informação suportado pela agenda dos interesses assumidos pelo sítio com
investimento no follow-up dos correspondentes percursos bem como nas dimensões do
desenvolvimento integrado e nos estudos de impacto ambiental
4.2. Missões
•4.2.1.acultar a observação controlada das situações, práticas e processos sobre os quais recaiam os
interesses manifestados
•4.2.2.habilitar os indivíduos para a livre participação na decisão, em sede de exercício do
conhecimento objectivo e de controle de agendas políticas
10.5. Função do Protótipo
5.1. Desenvolvimento de práticas de investigação –acção
•5.1.1.Com suporte em processos de animação cultural e nas redes de intersubjectividade em presença
•5.1.2.Construção de conhecimentos implicados na problematização das situações, equação das
necessidades e ponderação de soluções alternativas
7
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Construção do papel de mediação
5.2. Construção de ferramentas tecnológicas
•5.2.1.Arquitectura de sistemas de informação e de comunicação adequados à criação do Obervatório
do Cidadão
•5.2.2 Criação do Portal baseado na framework de suporte à consecução da estratégia metodológica do
Projecto integrado de inovação que se assuma como tal
10.6. Comunidade Aprendente
6.1.Perfil
•6.1.1.•Modo de formação inter-activa centrada na iniciativa do pólo da aprendizagem
•6.1.2.Contextualização das praxis de aprendizagem num clima de democraticidade lúdica e de
fomento do acesso aos recursos da Sociedade do Conhecimento
6.2. Tipologia de Investimento
•6.2.1.•Garantia de prossecução dos objectivos de curto, médio e longo prazo da comunidade em
presença
•6.2.2. Autoconstrução da cidadania implicada na progressiva transformação da postura anómica do
indivíduo, na do cidadão implicado nos objectivos da referida comunidade.
10.7. Partenariados
7.1.Perfil
Redes sociais que envolvam em cada sítio da rede física e virtual (Sítio)o conjunto de actores
institucionais implicados nas temáticas identificadas: Associações Cooperativas Mutualidades, Ong´s,
Instituições e Agentes do sistema de ensino/ formação, Autarquias e Serviços públicos…
7.2.Função
•Facultar os circuitos de comunicação e de informação implícitos à observação epistemologicamente
controlada das situações, práticas e processos sobre os quais recaiam os interesses manifestados pelo
Sitio.
• Garantir abertura à participação emergente desde a discussão dos objectivos ao processo da
correspondente prossecução
10.8. Observatório da Cidadania
8.1. Função
••Integrar em BD os resultados disponibilizados pela iniciativa dos observatórios dos cidadãos ao Sítio
de destino comum.
•8.1.2.Permitir o livre acesso dos grupos parlamentares à informação, ponderação e criação de
comunicação e de informação de retorno
8.2.Abertura
•Aos pólos da governação e administração pública na lógica da administração on line ( e-government)
•
8.2.2. •Potenciar nesse quadro o método aberto equacionado na “Estratégia de Lisboa”
10.9. Para um Plano Internacional
De Direitos Humanos
9.1.Equacionar uma dinâmica de coesão interna
8
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•9.1.1. •Ponderar através da observação das práticas comunitárias, o modo como a Sociedade se produz
e desenvolve.
•9.1.2. Identificar objectivos de coesão na articulação da dimensão poliárquica à do país.
•9.2. Globalização de medidas significativas
É, em suma, centrando-nos na teia das relações e das narrativas humanas que se podem edificar os
Observatórios do Cidadão e da Cidadania, como outputs sucessivos dum processo coeso de
transfiguração da anomia em coesão social. Assumir este processo na imprevisibilidade ínsita a toda a
acção conduzida não por súbditos de um poder tirânico, mas por sujeitos construtores do seu próprio
papel de cidadãos, é o verdadeiro desafio que se coloca às sociedades democráticas.. É por isso que
aceitá-lo se torna difícil ao poder facilitador da acção, desde que ignore que a relevância do método, do
modelo de funcionamento e do modo de actuar .reside precisamente na construção de um caminho
original da democracia assente na cidadania social, que é precisamente a categoria cívica que demarca
a fronteira entre os espaços público e privado em que a vida quotidiana decorre. O exercício do
empowerment. constitui pois mais do que um fim em si, na medida em que desencadeia potencialidades
com cuja problematização a Ciência Política poderá habilitar as praxis no sentido dum melhor
desempenho na tarefa de construção das saídas para a Sociedade do Risco que cada vez mais se
universaliza em todas as latitudes. Um Projecto de Sociedade que minimize a dimensão do Risco,
maximizando a do Conhecimento, poderá subscrever o cenário que identificámos passo a passo e que
tem como raízes a própria incubação de processos interactivos da habilitação para o exercício da
cidadania 6 , da promoção de uma vida educacional 7 e da potenciação de sistemas de trabalho e
emprego 8 susceptíveis de corresponderem a tais desideratos.
O Sítio do Cidadão -A mola real das referidas raízes passa prioritariamente pela organização do sítio
do cidadão ou da cidadania local, tendo por:
1 - Conceitos-chave da I&D mobilizada pela organização do sítio – Aprendizagem ao longo da vida,
Cidadanial/Empowerment, Contrato social, Educação/ Formação para todos, Modelo cultural do
Desenvolvimento, Saberes / Conhecimento, Sociedade do Conhecimento e ,Território Educativo
2 - Quadrantes epistémicos incidentes nas Bases de Conhecimento – “Filosofia e Direito” “Ética e
Empowerment”, “Ciências e Tecnologias” e “Estético – artístico”
3 - Core: Exploratório de praxis, como dimensão nuclear do sítio, integrando como valências a
plataforma informática específica e o laboratório de aprendizagens - replicável numa proposta de
criação do Centro de Ciência Viva para a Ciência do Quotidiano e da Cidadania, que poderá vir a ser
provido de Observatório do Cidadão e de Laboratório do Capital Social, onde confluam os formandos e
os formadores provenientes dos perfis de reconfiguração de carreiras de diplomados em perda de
emprego, que passem pelas dinâmicas dos sítios
4 - Estratégia metodológica – Investigação-Acção
A integração de tais processos em rede de distribuição territorial comporta a especificação
terminológica
destes
em
termos
das
Dimensões
e
outputs
do
Mod(el)o
6
Dimensão RECCRIA, cf. descrito no capítulo seguinte.
Dimensão PROMOVE, idem.
8
Dimensão RESISTE, idem.
7
9
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RECCRIA_PROMOVE_RESISTE:, sendo:
RECCRIA - Redes de Cidadania Criadoras de Inclusão Activa
(enquanto processo de resistência à exclusão social nos vários domínios da sua incidência )
PROMOVE – Promoção de projectos mobilizadores de Vida Educativa
(enquanto processo de desenvolvimento contínuo de capacidades e de competências)
RESISTE – Redes de acesso ao Sistema de Trabalho/Emprego.
(enquanto processo mobilizador de empreendedorismo e de actividades laborais, certificáveis pelo
sistema público de formação
II
O CENÁRIO RECCRIA_PROMOVE _RESISTE
Especificado no âmbito temático da Sociedade de Informação e governo Electrónico, um tal cenário
exprime capacidades tendenciais de âmbito intercomplementar. Relevemos as seguintes:
I Situar o local físico no contexto da metapólis
1. Construindo entre os níveis local e glocal o elo do “bairro” à metapólis e, nesse âmbito
1.1. Centrar o Objectivo Central na garantia de acesso ao conhecimento e aos processos de formação de
opinião e de habilitação à tomada de decisão informada e pertinente, com recurso:
- à gestão de oportunidades de relação do indivíduo com os grupos latentes de cidadania activa;
-à disponibilização de “instrumentos” para a pesquisa e problematiização de informação
pertinente à configuração de problemas;
-à formação de mediadores no âmbito da estratégia metodológica da investigação-acção
orientada para a resolução de problemas.
1.2. Edificar para o efeito o sítio de cidadania local como infraestrutura polarizadora de vivência
comunitária, nisso investindo :
- a resistência à desterritorialização, enquanto modo de descaracterização das identidades
fundadas nas práticas sociais dos habitats ;
- a emergência da conscientização glocal dos problemas;
- as práticas de produção do conhecimento problematizador das situações observadas e
experienciadas nos quadros de referência de pesquisa devidamente enquadrados em termos de
formação colaborativa .
2. Implementar nesse duplo sentido (1.1 e 1.2) Observatórios do Cidadão, ao nível dos sítios
locais, e o Observatório da Cidadania, enquanto sistema integrador das redes de sítios providos
de Observatórios locais :
2.1. Facultando como norte às experiências locais o mod(el)o de inter-acção das dimensões
RECCRIA_PROMOVE_RESISTE (cf. Anexo II.1); aberto à utilização e desenvolvimento da
informação pelos cidadãos no âmbito da prossecução dos seus próprios projectos e às escalas de
proximidade adequada à gestão do seu quotidiano
2.2.Testando o mod(el)o em sede de incubação de experiência piloto, seleccionada na base de
levantamento do conjunto de indícios que objectivamente a vocacionem para o referido papel,
estruturado na base de protocolo assumido conjuntamente com a entidade responsável pelo lançamento
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do observatório local e pela investigação decorrente.
2.3 Habilitando os sítios de cidadania social a cooperarem nas regras de jogo da cooperacção
interinstitucional nas dimensões nucleares:
2.3.1. investimento do Aparelho de Estado em recursos humanos, técnicos e tecnológicos adequados ao
provimento das redes de sítios de cidadania;
2.3.2. receptividade aos movimentos sociais na perspectiva da democracia accionada pela diversidade
de pólos de formação da decisão;
2.3.3. fomento da educação como estratégia de vida segundo a qual a escola formal seja assumida
como caso particular do acesso aos modos de aquisição de conhecimento, tendencialmente distribuído
pelo conjunto de práticas de socialização educacional, assumidas pela cidadania.
II Propiciar a conexão de redes de “procura” vs. “oferta” de serviços de apoio à Cidadania
1 Do lado da promoção da procura:
1.1. Garantir receptividade à implementação voluntária de sítios locais de habilitação para a cidadania,
articuláveis em redes interactivas, nas dimensões nucleares referidas.
1.2. Defender a decisão parlamentar de assumir o Observatório da Cidadania, como recurso político de
abertura à ponderação das propostas provindas dos Observatórios dos cidadãos e da ventilação dos seus
impactos na sociedade portuguesa:
2.Do lado da oferta:
2.1. Garantir a gestão das oportunidades emergentes dos dispositivos legais e políticos existentes e
exigíveis no quadro de funcionamento do serviço público: aberto ao impacto da cidadania social no
desenvolvimento das políticas públicas
2.1.1.. ao nível das funções e competências do Estado Central, reponsabilizado pela AR;
2..1.2.ao nível das redes sociais potenciadas pelas comunidades e pelos cidadãos junto das Autarquias
locais e dos serviços desconcentrados do Estado.
2.2. Conectar a processologia inerente à operacionalização do Cenário às Políticas da Ciência e do
Ensino Superior
III
CONCLUSÃO
Procuramos corresponder com a presente Comunicação à questões colocadas pela formulação dos
painéis temáticos deste Congresso por cujo referencial nos norteámos, relevando a importância que nos
merecem as praxis interacionistas que tenham por norte a emergência de uma Sociedade do
Conhecimento a partir do estádio actual da Sociedade da Informação. Na vertente da Sociedade de
Informação e do Governo Electrónico, equacionámos resposta aos desafios colocados através da
identificação de um percurso que passo a passo sublinha uma estratégia para a Inovação de uma
Política Pública coerente e adequada à salvaguarda de um cenário multidimensional em que a
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governação, apoiada nas modernas tecnologias electrónicas, invista no Desenvolvimento Local e na
Formação e Habilitação de Recursos adequados ao Desenvolvimento Integral, no qual se insere o da
própria pessoa humana que se assuma como cidadã da polis e do mundo. A estes desideratos
procurarão as Administrações dar resposta se elas próprias subscreverem os protocolos que as definam
como instâncias de cidadania à sua escala.
Daí que projectos como aquele a que aduzimos a dimensão promotora do Capital Social indispensável
a uma Cidadania de perfil Social, possam dar à sua escala o contributo de uma proposta de percurso e
de cenarização referencial de praxis espoletáveis e ponderáveis em sede de I&D. Esta Comunicação
insere-se nesta linha, explorando a interface entre o discurso e a acção, no âmbito da contextualização
epistemológica da própria Ciência Política em cujo registo o Projecto se situa
Somente o lançamento de parceria entre a instância de I&D com uma entidade de incubação de praxis
em torno de um Portal de Cidadania Social (Anexo I), poderá, no estado da arte em que nos
encontramos, especificar, no terreno das práticas, a teoria que subjaz ao feedback básico (Anexo II)
com que articulamos a presente Comunicação às que a precederam nos fóruns de ideias dos Congressos
CLAD.
Anexos
Anexo I
Referenciais do Portal de Cidadania Social
Página Inicial
O Sítio do Cidadão e a Rede de Cidadania
Observatório Local do Cidadão
Observatório Integrado da Cidadania
Política Pública de Cidadania Social
Anexo II
Feedbak Básico
II.1.Modelo de Interacção de valências dum sítio de cidadania
II.2. Políticas públicas e sociais na articulação dos tipos de capitais investidos no
Desenvolvimento Sustentável
Referenciais do Portal de Cidadania Social
Página Inicial
Acerca do website
Este website está construído enquanto conjunto de páginas, no qual cada uma constitui antecâmara de
outras cujo desenvolvimento se fará à medida da implementação do projecto de investigação que lhe
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subjaz.
Na presente página, remetemos para os objectivos de quem pretenda aceder ao tema da cidadania
social e ao referido projecto de a configurar enquanto activa e inclusiva. Os objectivos são tão
diferenciados quantos os segmentos do público web interessado em percorrer os caminhos propostos
Assim, na situação geral, pretender-se-á informação sobre os conteúdos das páginas, na senda da
articulação a sites temáticos afins. Noutros casos, porém, pretender-se-á também seguir o percurso da
sua exploração e noutros ainda que este sirva o envolvimento do pesquisador nos meios de prosseguir
os objectivos, quer do lado da aposta na cidadania, enquanto bem público, quer do lado da sua procura,
enquanto projecto de vida.
Acerca da política pública e da cidadania social
Na presente página remete-se o acervo de documentos da página introdutória para a identificação do
universo das políticas públicas e sociais indispensáveis à emergência do desenvolvimento sustentável e
ao empowerment.
A generalização do empowerment recorre necessariamente ao investimento em capital social por parte
das políticas públicas e sociais, situando-se as autarquias locais no estímulo motivador da sua
articulação. Mas o modo de produção da cidadania activa inclusiva é o do investimento na
aprendizagem ao longo da vida, em formato adequado à sua banalização no território e ao recurso à
investigação-acção, enquanto enquadramento de praxis.
O Sítio e a Rede de Cidadania
Acerca do sítio e da rede de base territorial
Na presente página remete-se o acervo de documentos da página antecedente para enquadramento do
modelo e do modo de funcionamento dum sítio de cidadania social, enquanto promotor de
empowerment e de inclusão social.
Com as valências da capacitação para as práticas de participação autonómica na decisão, de promoção
da educação/formação ao longo da vida e de habilitação para a empregabilidade, cada sítio integrará a
rede territorial de existências que o projecto for capaz de estimular nestas três dimensões junto das
entidades com vocação promotora.
Observatório local do cidadão
Acerca do observatório local do cidadão
Na presente página identificam-se os fundamentos do instrumento fundamental do empowerment: o
observatório do cidadão, construído na interacção deste último com todo o acervo de informação
reunido pela equipa do sítio. A esta compete centrar a prática do sítio na informação reunida,
produzida e canalizada para o observatório, no decurso da actividade de formação, mediação e
animação sociocultural e expressiva dos utentes. A cada um destes compete valorizar, em tal
enquadramento, as dimensões significativas das bases de dados e de conhecimento para o
desenvolvimento do seu próprio know-how.
A relevância do sítio dependerá da qualidade das interações produzidas, das competências reunidas e
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da capacidade de iniciativa que ele for capaz de polarizar, quer nas relações internas quer com a rede.
Observatório integrado da cidadania
Acerca do observatório de cidadania poliárquica
Na presente página identificam-se as valências do instrumento fundamental de uma política pública
fundada na generalização do empowerment. A integração das entradas a partir dos observatórios locais,
em bases de dados e de conhecimento fundadas para a captação e desenvolvimento dinâmico das
iniciativas da rede de cidadania, apela à habilitação de competências reunidas em sede neutral, mas
abertas ao conhecimento das estruturas que se interessem pelos assuntos em carteira, desde as do
Aparelho de Estado ao Parlamento.
A neutralidade que se pretende para a gestão do Observatório passará por sediar este nas instalações de
perfil técnico da Assembleia da República, onde se gera o ambiente sistémico da concepção das
políticas do país que à governação incumbem, sem se deixar de reconhecer aos Governos as
competências próprias para a definir e desenvolver, na relação com os seus programas e com as
iniciativas cidadãs.
Democracia Poliárquica
Investimento de
docentes e técnicos
=
“Forum” de promoção de
aprendizagens
RECCRIA
“Forum” de
intervenção na
pólis
Investimento de
= técnicos e
animadores sociais
Práticas de acesso …
Educação ao
longo da vida
PROMOVE
… à formação de opinião
… ao suprimento de
necessidades expressas
RESISTE
Actividade
laboral
Políticas de formação
=
Investimento de docentes
e formadores
Esquema 1 - Modelo de Interacção de valências dum sítio de cidadania (O Direito à Cidadania na Sociedade do
Conhecimento, Doc. Livre apresentado ao VII Congresso CLAD).Fonte: M.Alfreda Cruz , O Direito à Cidadania na
Sociedade do Conhecimento, in Encontro Internacional A Educação para os Direitos Humanos, in http://iie.min-edu.pt.
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Políticas Públicas
Governação
Administração
Ordenamento
Planificação
CE
CH
Recursos Disponíveis
Capacitação
Capacidade produtiva
Consumo
Educação
Motivação
Formação
Reciclagem do
desperdício
Trabalho
sustentável
Des-envolvimento
sustentável
↓
Inter-acção
ambiental
Redes de sociabilidade
e de inter-acção
e-Government
Cooperação
Intervenção
Cidadania
e Participação
↓
CS
Esquema 2 - As políticas públicas e sociais na articulação dos tipos de capitais investidos no Desenvolvimento
Integral, in Doc. Livre apresentado ao IX Congresso CLAD sendo:C – Capital *; E – económico; H – humano e
S – social
*Palavra-chave:acumulação
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Documento Libre
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Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública,
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XII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Sto. Domingo, Rep. Dominicana, 30 oct. - 2 nov. 2007
Documento Libre
Santiago do Chile, 17-20. 10.2005.
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* Identificada como Maria Alfreda Cruz Viana, conforme registo CLAD.
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Parte II - Ângulos de apresentação do Tema a discussão académica
Capítulos extraídos das Comunicações apresentadas - ao Congresso Internacional da
Cibersociedade (promovido pelo Observatório da Cibersociedade - com decurso online de
Novembro a Dezembro de 2006, Barcelona, Espanha) e ao Colóquio Vivre na Europa- Filosofia,
Ciência e Política Hoje, Lisboa, IFP 29 31. 10.07, promovido pelo Centro de Filosofia das Ciências
da Universidade de Lisboa com a Embaixada de França, Lisboa, Portugal)
Capital social e cidadania na sociedade do
conhecimento
Maria Alfreda Cruz Viana
Observatori per l a la Cibersocietat – Actes Digitals del III Congrés Online
de la Óbservatori per a la Cibersocietat. 20.22.2006 -03.12.2006
Capital social y ciudadanía en la sociedad del conocimiento
Autor(-a/s):
Maria Alfreda Cruz (Viana)
Abstract:
Una política pública orientada para el bienestar de los ciudadanos y asentada en el modo
de producción de una Sociedad del Conocimiento, a partir de la fase actual de la Sociedad
de Información, intenta asegurar las dimensiones públicas del bienestar y su implicación
en el desarrollo económico y humano. Para ello, se produce un modelo de dinamización
del capital social basado en estudios de ciencia-tecnología-sociedad, incluyendo la
creación de una plataforma informática específica de soporte al ciclo de observación–
interpretación–propuesta y la integración de la experiencia en el territorio concreto de una
autarquía que se asume como entidad incubadora de la praxis de participación
social/ciudadanía. Se estudia, en los términos de I&D, un modo de replicar el referido
ciclo en la red de otras ciudades digitales que, en Portugal, asuman el mismo desafío.
Texto de la comunicación:
(versión original)
1. Ponto de partida
Tomo como ponto de partida desta comunicação o próprio questionamento em que
coloco o sugestivo título deste Congresso. Assim sendo, começo por reflectir em como os
termos deste enunciado me parecem problemáticos, querendo eu com isto dizer que a
implicação que ele sugere não nos autoriza a deduzir que uma sociedade livre decorra
necessáriamente dum conhecimento aberto, sem que antes questionemos o que é
precisamente o conhecimento e a liberdade. E porque vivemos numa época em que a
crise de valores é matéria de problematização da própria condição humana e dos atributos
que fazem dos seres humanos os donos da terra, desde o momento pré-histórico em que
passaram a aliar ao domínio do fogo a capacidade de produzir objectos, é preciso situar
os valores no contexto do "pessimismo epistemológico" dos nossos dias – enunciado este
que, já na atribuição do Nobel da literatura ao escritor português José Saramago, foi
invocado perante o auditório universal do evento como chave da obra em que se inscreve
o portentoso Ensaio sobre a Cegueira, do autor laureado em 1998.
Distinguir no conhecimento os registos científico e do senso comum que interactivamente
o formam e se sedimentam nos mais variados saberes de que a sociedade dispõe e coloca
ao alcance de todos, remete para o livre arbítrio com que estes os inserem e desenvolvem,
em interconexão com os seus próprios projectos de vida. De facto, a posição do sujeito no
modo de produção, difusão e partilha do seu próprio conhecimento nas redes de
sociabilidade que frequenta não abstrai evidentemente do contexto espaciotemporal em
que se move, qualquer que seja a época e o âmbito de universalização em que um tal
contexto se exprime. Mas o livre arbítrio que define o sujeito exprime-se por um
universal invariante que atravessa todos os tempos e civilizações: sujeito é todo aquele
que é capaz de gerar e de gerir o seu próprio projecto de vida, o que passa
necessariamente pela fruição e produção do conhecimento indispensável a esse projecto.
Nesta acepção, o conhecimento é entendido como produção cognoscente resultante do
modo como o sujeito enquadra a informação a que acede, situando-a na perspectiva da
sua problematização e encadeamento na racionalidade das opções que comportem. A
Sociedade do Conhecimento será então aquela em que a dinâmica de desalienação dos
consumidores de informação produza a massa crítica indispensável à generalização da
sua ponderação e implicação na reconfiguração dos valores indispensáveis a um
funcionamento societal fundado no propósito de valorizar as regras de jogo da
racionalidade.
Que uma perspectiva individual se articula hoje com a da totalidade com soberana clareza
decorre do próprio modo como a cultura actual valida as hipóteses fundadoras da
pósmodernidade, posicionando todo o objecto - enquanto caso da " teoria do sistema
geral" (Le Moigne,1994) - aberto ao seu próprio contexto, e por isso questionado nas
interacções com este ao longo dos sucessivos estados em que retrospectiva e
prospectivamente o pensamento contemporâneo os coloca. Em ruptura simultânea com a
"teoria geral dos sistemas" e com o pensamento cartesiano em que este se sustenta, o
paradigma do pensamento pós-moderno, colocando o cartesianismo no seu
contextoproblematizador, recusa a inexistência da ciência do particular, assume a
complexidade como condição e situa o conhecimento cognitivo na interface entre a razão
e a emoção, rasgando horizontes novos ao acervo da ciência. A investigação de Damázio
(1994), no plano da neurologia e a de Touraine (19999), no plano sociológico,
comportam a caracterização de uma razão inter-relacionada com as vicissitudes do modo
como a vida comum decorre, se vulnerabiliza, se exprime, e se problematiza.
No período de 25 a 27 de Outubro do ano corrente, a Fundação Calouste Gulbenkian
questionou os valores do nosso tempo em Lisboa, perante um auditório aberto ao
contacto com alguns dos pensadores de referência da actualidade (1). Fê-lo a partir das
problemátcas do sujeito, da racionalidade, da objectividade, da verdade e do poder, bem
como dlas da expressividade com que as linguagens e a arte se implicam na articulação
entre os domínios científicos e os do senso comum, passando pela contraposição do valor
da crise à crise valores que atravessa o modo de desenvolvimento dos nossos dias. Na
sociedade global, as contradições de interpretação do património fikosófico de que a
humanidade é herdeira e o atomismo de que se revestem as praxis individuais,
comunitárias e societais, servem de lastro ou de pretexto a tensões irredutíveis entre as
lógicas dos interesses vs. do bem comum, por um lado, e do imediatismo vs.. longo prazo,
por outro. Acresce que o valor da diversidade cultural subsume-se nos antagonismos que
opõem as civilizações, como sistemas de conceber e organizar a relação dos seres
humanos com os espaços físicos e simbólicos que entre si disputam, desincentivando-as
de potenciarem sinergias conducentes a escolhas racionais na perspectiva de uma ética do
futuro. E no entanto só nesta reside a garantia da própria sobrevivência da espécie
humana e da terra que habita. À crença de que o património tecnológico e o crescendo do
seu desenvolvimento têm poder q.b. para tornar reversíveis os cataclismos naturais e
aqueles que possam ter sido duravelmente desencadeados chamou um dos autores (2), na
esteira de Hanna Arendt, a tentação do orgulho. Orgulho espúrio, portanto, dadas as
circunstâncias com que o mundo de hoje se defronta, em desgaste facilmente apreensível
durante a duração da vida humana, cada vez mais confrontada com previsões mais ou
menos apocalípticas que a situam entre o caos e a catástrofe..
O desafio que se coloca à humanidade parece ser pois o de contrapor à tecnologia pura e
dura que a razão instrumental valida, a racionalidade que submeta o seu uso à
preservação da vida tal qual se possa viver com qualidade q.b,. o que passa por contrariar
o esplendor do caos em que irresponsavelmente se implicou a forma de globalização que
formata hoje a ubiquidade da civilização dominante. Se o conhecimento se abrir nesse
sentido – qualquer que seja a sua vertente ou matriz – é possível esperar que subscreva
métodos permeáveis à ética de uma sociedade livre, ou seja aquela em que
tendencialmente todos sejam sujeitos assumidos e, mais do que isso, possam ser cidadãos
de todos os espaços que habitam, das polis à ecúmena, do local ao global, do real ao
virtual. E essa é uma questão da fenomenologia do poder que não pode resolver-se no
plano das praxis sem recurso a metodologias capazes de lhe darem sentido prático.
Assumimos como palavras-chave de referência desta comunicação, naturalmente
subsidiárias dos conceitos chave deste Congresso, as que emergem da rede de conceitos
que atravessa todo eixo de Política e Mudança Social em que ele se inscreve - ou sejam
os conceitos de conhecimento, liberdade, sujeito, cidadania, valores, projecto, poder e
ética, assumidos na vertente de aprofundamento democrático na era da Internet a que nos
dirigimos. Utilizando, no contexto das consignas desta vertente, as palavras-chave de
poliarquia, política_pública, empowerment, capital social e libertação/ desalienação,
ensaiaremos sintetizar o ponto de vista que temos vindo a enunciar em sucessivos eventos
e pela demonstração do qual pugnamos, nas circunstâncias actuais, perante a Fundação
portuguesa de Ciência e Tecnologia, através do Centro da Filosofia da Ciência da
Universidade de Lisboa que recentemente o apresentou ao Concurso de 2006, sob minha
responsabilidade, enquanto projecto designado por Promoção do Capital Social na
Sociedade do Conhecimento (3).
2. O Horizonte da Estratégia de Lisboa
De facto, o novo perfil a que a Sociedade do Conhecimento se propõe emerge da
problematização de matérias convergentes na identificação do perfil e do papel da
cidadania na própria reconstrução do papel e do perfil do Estado. O Estado Português,
imbuído da perspectiva inerente à Estratégia de Lisboa, assumia então o desiderato de se
definir ele próprio como "estado cidadão", identificando nesse âmbito uma figura
institucional capaz de configurar os contornos da revolução institucional a empreender na
matéria. " A Face Oculta da Governança" foi por isso a consigna com que o Instituto
Nacional de Administração (INA) chamou a Congresso Internacional, em fins de 2001, a
discussão dos três meridianos centrais para a equação da mudança anunciada – Cidadania,
Administração Pública e Sociedade, a qual já então se configurava nos discursos públicos
menos como Sociedade da Informação do que como Sociedade do Conhecimento.
Tendo presente as circunstâncias das sociedades actuais de perfil periférico, o ProjINA
aduziu ao conceito de cidadania qualificada de activa e teorizada como instrumento de
desburocratização dos mecanismos tradicionais da Administração Pública, a qualificação
de inclusiva, ponderando na perspectiva da I&D os pressupostos e vectores de referência
do Seminário Internacional que, em Portugal, abordara a Educação para os Direitos
Humanos, no âmbito da celebração dos 50 anos das Nações Unidas. A questão da
Cidadania e o perfil que a qualifica questionam desde então simultaneamente o Estado e a
Sociedade, no modo como ambos se estruturam e funcionam e na relação em que
interagem (4).
Todavia, apesar das circunstâncias favoráveis expressas dessa forma ao acolhimento de
uma linha de investigação neste domínio, o Aparelho de Estado confrontado com o
desafio formulado pela estratégia de Lisboa, não dispôs de condições para facultar a
indispensável combinação da divulgação argumentativa alargada ao domínio do
pensamento sobre as grandes questões implicadas no processo de transição da Sociedade
de Informação para a do Conhecimento com a experienciação de casos que passem pela
intervenção de entidades incubadoras do modo como tais argumentos e consignas se
podem validar através de práticas de sociabilidade activa. É essa problemática que
continua em agenda. O que se pretende é assumir o a praticabilidade do teste de uma
utopia da "família" da dos Direitos Humanos e da Paz, que é a dos Direitos Sociais
assumidos como pilares dos restantes, tomando os destinatários das acções que os visa
mais como sujeitos da construção do seu próprio destino, do que como grupos alvo das
boas intenções de quem nelas investe. Um tal Projecto procura partir da intervenção no
terreno das práticas, assumindo a argumentação de perfil ecuménico como o caixa de
ressonância e de contextualização das primeiras numa política transnacional que pode
encontrar
na
Estratégia
de
Lisboa
o
seu
primeiro
passo.
Ao objectivo concretizador dos grandes desígnios da Sociedade do Conhecimento pela
via da experienciação, se reporta a designação de Capital Social, conceito emergente no
pensamento actual da observação e intervenção nessas redes de sociabilidade que é
preciso dotar de recursos para que funcionem e evoluam. Por elas pode passar a
possibilidade de um Contrato Social que permita que o conhecimento que se e torne
vector de uma liberdade maximizada pela ética de libertação livremente assumida pelos
excluídos da res publica através do seu acesso ao poder de saber escolher, ponderar e
decidir sobre o seu destino e a sua qualidade de vida.
3. Implicação da democracia electrónica na temática enunciada
O acesso ao tempo da democracia electrónica em que vivem todos os outros viventes que
costumam observar os excluídos e decidir por,eles constitui um imperativo de implicação
das novas tecnologias de informação e de comunicação nos desideratos da mudança
social..
Enunciar o projecto passa pois por sintetizar o contexto e as linhas de força da I&D
desenvolvida no âmbito do Aparelho de Estado Português e divulgadas prioritariamente
no âmbito do Centro Latino Americano para o Desenvolvimento (5), pela convergência
de perspectivas em torno da problemática da brecha digital que constitui o desafio central
do projecto no plano da sua operacionalização. As hipóteses de que se parte são duas: a
de que uma tal mudança passa pela desalienação, em dinâmica reconstrutora do tecido
social esgarçado pelo modo de globalização em que a crise multidimensional do nosso
tempo se sustenta; e a de que a inclusão social passa por essa desalienação e pela
superação da brecha digital no que se reporta ao acesso aos meios de aceder às liguagens
universalizadoras do nosso tempo, em geral, e, em particular, à literacia informática.
Até agora, a relação com o espaço virtual que a net constitui foi facilmente assumida por
sujeitos dotados de protagonismo social que baste para lidarem eficientemente com as
múltiplas networks que organizam o território web. Impulsos transformadores e estímulos
ao revigoramento do espaço da cidadania já se vinham verificando no decurso dos anos
80 em sectores socioculturais que investigaram e reflectiram publicamente sobre os
impactos desse apelo que os atingiu por inteiro (6), mas o interesse em envolver nessa
dinâmica as comunidades mais afastadas da literacia informática para vencer o gap em
relação às restantes foi integralmente remetido para a geração seguinte através da
preparação de que o sistema escolar só viria a encarregar-se em fase avançada dos anos
90. E no entanto, a net constitui potencialmente para todos os seres humanos um apelo de
múltiplos matizes e uma poderosa linha de fuga à exclusão social. Ao assumir em 2002 a
possibilidade de poderem ser geradas competências nos estratos da população que se
encontram nessa situação abriu-se o caminho à investigação que se mantém em curso e
de
que
a
presente
comunicação
dá
notícia.
É facto que o paradigma interactivo da escola moderna chamou entretanto a terreno a
questão da escola paralela, função assumida pelas práticas e perspectivas das
comunidades de pertença original dos alunos, implicando as ciências sociais e políticas
nas abordagens multidisciplinares das situações em presença e na prospectiva de decisões
de mudança que passem pela interconectividade da rede em que qualquer situação se
inscreve. Todavia, a incapacidade de se conferir sentido a práticas emergentes, enquanto
índice de anomia social, resulta da incapacidade societal para lidar com os desafios
colocados por uma vigorosa dinâmica de mudanças, como seja a da emergência de novas
figuras regulatórias"(PUREZA, JM e FERREIRA, AC, 2002) enquanto condição de
inserção no sistema de que os casos participam. Não basta pois confiar no efeito difusor
das novas tecnologias no espaço potencialmente organizado por uma rede de
relacionamento espontâneo para que a difusão ocorra. Do mesmo modo que não há tempo
para confiar na sucessão de cohortes escolares para que a fantamasgoria da iliteracia
deixe de nos assombrar. E no entanto é facto que mesmo na "condição semiperférica que
Portugal ocupa no sistema mundial (...) a combinação entre destruição/reconfiguração
institucional" (idem, ib.) não é impossível. Um caso emblemático deste ponto de vista é o
da Finlândia que está em processo de equacionar paxis consistentes na linha do que,
nessa perpectiva, terá sido equacionado no decurso de um Meeting realizado em Lisboa
(2003) cuja organização procurou aqui concertar com os Estados Membros uma política
integrada no VI Programa do III Quadro Comunitáio de Apoio, enquanto alicerce de uma
Sociedade baseada no Conhecimento. Tal política, inerente `Estratégia de Lisboa com
foco no Espaço Europeu de Investigação (ERA), visou constituir-se como o principal
instrumento de base de uma dimensão estratégica de longo prazo construída pela União
Europeia e pelos seus Estado membros através da comparabilidade e da
multidisciplinaridade duma abordagem integrativa das diversas situações em presença. O
programa. sustentável pela ciência e por políticas públicas, com foco em prioridades
temáticas, deu relevo a uma destas que designou precisamente por "Cidadãos e
Governança na Sociedade baseada no Conhecimento" e atribuiu a responsabilidade da
sua fundamentação às Ciências Sociais e às Humanidades. As principais "Opções &
Escolhas" centradas nesta componente programática relevaram a importância de perfis de
desempenho científico de alta qualidade em áreas de políticas públicas estruturantes do
referido campo científicoaberto ao campo de geração, distribuição e uso de um
Conhecimento compaginável com os vectores da Qualidade de vida, Coesão Social e
Estratégias Políticas implicadas no funcionamento do Mercado de Trabalho e das esferas
da Educação ao Longo da vida e do Desenvolvimento Sustentável.
De facto, a valorização das ciências sociais e das humanidades na produção da Sociedade
do Conhecimento cruza-se com dois domínios de interpretação até certo ponto
alternativos: aquele que encara a pluralidade do território das ciências como central no
funcionamento da globalização, expressando-se na diversidade hierarquizada dos modo
de fazer ciência e excelência, conforme a posição que os países ocupam no sistema
mundial de produção e circulação das actividades e dos saberes científicos, com
indiferença aos restantes, e por outro lado, aquele que aposta na prevalência da
imbricação das praxis de I&D no funcionamento societal e esses são precisamente os das
Ciências Sociais e das Humanidades. Antes do Meeting Europeu de 2003 afirmar em
terreno académico de Lisboa (o ISCTE) a sua profissão de fé no apelo que uma
Sociedade baseada no Conhecimento comporta para a relevância da referida área
científica, já a Fundação Gulbenkian promovera um livro branco sobre a matéria da
responsabilidade societal das Ciências Sociais, cuja abertura preconizou. Mas o mais
importante neste domínio é a emergência da tese que deu corpo à ideia do Arquipélago
do Conhecimento (CARAÇA, J.,1994): a da tranversalidade dos saberes, desde a filosofia,
as expressões e o direito, às ciências "duras" e às "ciências da interpretação e do mistério",
em todo o caso abertas ao registo cognoscente diverso do da ciência, mas nem por isso
impossível de convergir com ele na emergência duma sociedade em que o conhecimento
se torne um bem de consumo geral - e esse será o conhecimento problematizado
quotidianamente a partir da observação de tudo o que interessa à vida e à civilização,
incluindo a ciência, a tecnologia e as expressões qualquer que seja o quadrante
epistémico em que se situem e apliquem.
4. Estratégia metodológica
É nesta teia de referências que este Projecto visa ponderar o Direito à Cidadania na
Sociedade do Conhecimento, através da implementação das políticas públicas que
garantam a universalização desse direito através da especificação do perfil com que estas
se possam adequar às circunstâncias da Sociedade portuguesa e ao quadro de referências
que a universalizam. Por isso, este Projecto parte duma contextualização identificadora
das referências epistemológicas e jurídicas de suporte à governabilidade portuguesa
contemporânea, mas tendo como matriz central de investigação o questionamento das
práticas de I&D de suporte à constituição dum Capital Social próprio de uma Sociedade
que seja capaz de assumir, em contexto de reflexão cognoscente, os objectivos
universalmente ratificados para garantia do Desenvolvimento Sustentável, bem como
para a do Contrato Social que lhe for inerente. Como dar sentido à vida e à acção é a
interrogação que se transfere para as condições e possibilidades de implementar de modo
durável os objectivos perfilhados, dando assim resposta institucional à própria questão de
partida
do
projecto.
A reflexão que desta postura decorre e incide no âmbito das políticas públicas, reporta-se
pois a dois níveis de problematização: o da validade filosófica da utopia de referência (a
dos direitos humanos enquanto património civilizacional) e o da possibilidade de
arquitectar as transformações sociais visadas pela sua concretização, através de
tecnologias emergentes da interacção das vertentes das ciências sociais pertinentes à
problemática enunciada e aberta aos restantes saberes científicos, tecnológicos e do senso
comum.
Desenvolver uma linha de I&D nesta perspectiva comporta configurá-la enquanto
laboratório de ideias, lugar de pesquisa e de elaboração de princípios de formulação,
pilotagem e avaliação das acções, bem como dos processos de desenvolvimento das
políticas públicas em que as mesmas se inscrevam, ponderando a identificação dos seus
perfis e a promoção de boas práticas susceptíveis de replicação. É o que se pretende
desenvolver no contexto da linha de força que prende as escalas local e global de
ponderação equacionada em termos de direito social Em função desta dicotomia,
distinguiremos no argumentário os seguintes âmbitos que colocamos a discussão
I - Passar da Sociedade da Informação para a do Conhecimento significa, no âmbito das
perspectiva
anteriormente
enunciadas:
A) Investir o conceito de cidadania no processo de reversão da exclusão social em
inclusão e praticando-o, enquanto direito social, bem público e modo de habilitação de
recursos humanos para o desenvolvimento sustentável, enraizado na transversalidade
ambiental;
B) Reconfigurar o processo produtivo a partir do tecido social através da banalização dos
instrumentos da Sociedade da Informação no processo de inclusão social e do
investimento no território comunitário da economia social, como matriz de inclusão;
C) Assumir como fontes prioritárias de renovação e de reconstituição económica, o
alargamento extensivo da produção de bem-estar e da intervenção pró-activa no ambiente;
D) Investir no desenvolvimento do lado cidadão da Governação nos termos que
concretizem, no caso português, o objectivo de tornar extensiva a cidadania activa, pela
via do exercício dos modos de inclusão social se podem promover na Sociedade do
Conhecimento.
E) Implementar numa entidade incubadora do Desenvolvimento do Projecto a Plataforma
informática da Website ensaiada enquanto sistema de páginas de acesso a conteúdos
disponíveis e a desenvolver no processo de integração de grupos alvos nas dinâmicas do
sítio de cidadania onde acedam a aprendizagens activas:
•
•
i) que partam dos seus interesses e enfoques dos quotidianos vividos para os
habilitar a transformarem as percepções e informações com que lidam nos
conhecimentos que resultem da capacidade para as colocarem em perspectiva;
ii) que decorram do processo de desalienação que lhes for sendo proporcionada
pelo próprio processo de empowerment a que decidam aderir.
F) Perspectivar a replicação da experiência com recurso a uma rede de protótipos locais,
ponderando-a em registo de uma investigação-acção emergente da história e do projecto
da
"utopia
útil"
de
que
se
partiu.
II - No quadro do desenvolvimento da qualidade de vida dos habitantes de um Concelho
se esta for assumida como linha de rumo do governo local, a questão que se coloca à
partida é a de identificar se ele tem potencial para integrar uma rede de municípios
promotores de uma cidadania extensiva a todos quantos, sem distinção de classe, credo
ou habilitação de base, decidam implicar-se na vertente participativa da democracia.
Fomentar esta vertente, significa fomentar a aprendizagem de linhas de fuga à exclusão
social suportadas em práticas de ponderação objectiva das alternativas que, em sede de
opção, se coloquem em todas as vertentes da qualidade de vida individual e colectiva,
com expressão na polis e nos territórios em que as arenas decisionais se inscrevem. Este
enunciado sucinto suporta-se no conjunto de teses desenvolvidas no quadro de um
projecto de I&D no INA e de que tenho vindo a dar conta em eventos problematizadores
do relacionamento entre o Poder Político e a Cidadania, como por exemplo a Conferência
Internacional sobre a Carta Urbana Europeia promovida pelo Congresso Permanente dos
Poderes Locais e Regionais da Europa em Sofia e em Maio de 2002, e os Congressos do
Centro Latino-Americano para o Desenvolvimento nas edições de 2002, 2004, 2005 e
2006, estando as edições disponíveis em rede no site www.clad.org.ve/docume.html,
Apesar da receptividade teórica às referidas teses, estas não dispensam a demonstração da
sua viabilidade prática junto das instâncias que vierem a assumir-se como responsáveis
pela sua institucionalização no(s) país(ses) que as adoptem. Pôr o processo em rota em
Portugal passa assumidamente pela necessidade de o experienciar, em municípios que, a
convite do Estado Central, se disponibilizem para lhe dar visibilidade e teste, assumindose eles como " casos –escola" da praticabilidade e pertinência de sítios de
desenvolvimento da cidadania com dimensão presencial e virtual, os quais, através de
observatórios de situação desenvolvidos e ao dispor dos munícipes e de todos os
observadores interessados, demonstrem a viabilidade do lado cidadão da democracia. Ao
Parlamento competirá receber, ponderar e integrar de modo interactivo com a governação
parlamentar o conhecimento produzido na rede de sítios. Terá para isso de se prover de
sede institucional adequada à constituição e tratamento de bases de dados resultantes da
circulação da informação dinamizada nessa interacção, nela incluindo a análise política
dos grupos parlamentares que se posicionarão sobre as questões emergentes desse
processo,
de
acordo
com
os
seus
próprios
pontos
de
vista.
III- Implementar o processo de relação entre as vertentes da cidadania e da governação
aos níveis autárquico e parlamentar, passa pelo lançamento de experiências-piloto em
concelhos liderados pelas diferentes forças políticas que implementaram o exercício do
Poder local nos últimos trinta anos com o objectivo de garantir a objectividade de um
projecto de política pública assente na dinâmica de uma democracia participativa
ideologicamente independente das regras de jogo da democracia representativa, dado essa
dinâmica ser teoricamente passível de vigorar em qualquer contexto em que estas
decorram. Em carteira está a identificação da rede demonstrativa que a implementação do
projecto convidará a integrar, subscrevendo os protocolos que se lhes vier a propor, caso
a
República
venha
a
investir
na
correspondente
implementação
IV Uma política pública orientada para o bem estar dos cidadãos visa assegurar as
dimensões públicas deste, bem como o seu retorno para o desenvolvimento societal,
económico e humano, condição esta indispensável à sustentabilidade da civilização.
Neste contexto, como poderia Portugal operacionalizar um modelo de dinamização do
capital social assente no modo de produção de uma Sociedade do Conhecimento a partir
do estádio actual da sociedade da Informação? Experienciando-o em todos os locci em
que se reunam, com activo envolvimento das entidades locais, recursos físicos,
tecnológicos e humanos adequados a adoptá-lo na perspectiva de contrariar a exclusão
social e os riscos societais que ela potencia. À estratégia de concepção do Projecto,
configurada enquanto sistema de páginas de acesso a conteúdos disponíveis e a
desenvolver, bem como a percursos de articulação entre eles e os seus possíveis
congéneres, deverá suceder-se o ensaio do seu desenvolvimento com recurso a uma rede
de protótipos locais, matéria de I&D em registo de uma investigação-acção emergente da
história
e
da
viabilização
deste
projecto.
V- A democracia poliárquica - O enfoque nas Políticas Públicas emergentes no actual
quadro de referência estrutural do país e no modo viável de nele se enfrentar a exclusão
social, parte do princípio que esta se reproduz nas dinâmicas de precarização que abrem
caminho à pobreza e ao desvirtuamento da estratégia de prossecução da Sociedade do
Conhecimento. Nesta dupla perspectiva, deverão ser sucessivamente abordadas:
•
•
i) a situação e as virtualidades de Portugal, enquanto país subscritor desta
Sociedade do Conhecimento, perfilhada pela teoria e pela prática da União
Europeia(U.E);
ii) a ponderação da escala local, como âmbito de experienciação das políticas
globais que a governação multinível for capaz de promover e de municiar,
visando a observância dos pressupostos do modelo social que lhe subjaz.
No horizonte da plenitude destas possibilidades estará a democracia poliárquica no
sentido que DAHL (2000) lhe atribui, enquanto sistema de poder distribuído, permeável à
intervenção quotidiana dos cidadãos, o que implica por parte dos poderes centrais a
disponibilidade para com eles partilharem responsabilidades, não no sentido de
derrogação das suas mas antes no sentido de reconfigurarem o ideal de democracia,
entendendo ser esse o modo de a tornar mais eficaz em face da complexidade crescente
dos problemas. Tornar "a monitorização permanente do exercício do poder como uma
prática capaz de conferir sentido à vida quotidiana dos cidadãos será uma forma de
"democratizar o próprio ideal da democracia" (7), habilitando os cidadãos a participarem
na res pública em articulação com os níveis de exercício do poder que lhes estão mais
próximos e por isso mais aptos a integrá-los na resolução das questões fulcrais do
quotidiano e no questionamento responsável dos perfis das políticas públicas.
VI- Entidades incubadoras da cidadania - No horizonte do questionamento do papel do
Estado e da função dos municípios como entidades incubadoras da cidadania assumida,
neste quadro, enquanto política pública vectorial da governabilidade, estará o
ordenamento integrado do território, âmbito da definição de políticas simultâneas de
estímulo à microeconomia, por um lado, e, por outro, à preservação do ambiente e das
paisagens, incluindo nelas o património constituído pelas heranças e expectativas dos
saberes e dos sentidos dados às práticas sociais, com que os territórios têm sido utilizados
e fruídos. Tudo isso passa pelo desafio de se procurar, "em cada particularidade glocal, o
elo entre a investigação e a prática da gestão pública que permita coordenar com sentido
estratégico um desenvolvimento sustentável, para o qual os meios operacionais da
sociedade do Conhecimento, ainda que por si só não bastem, constituem poderosas
alavancas". Ponderar tudo o que neste âmbito possa estar em jogo será um modo de abrir
à Sociedade as Ciências Sociais em geral e a Ciência Política, em particular, sem deixar
de se chamar a essa interacção os conteúdos permeáveis à utilização das tecnologias mais
variadas, desde as de utilização no âmbito das vivências quotidianas, até às que exijam
habilitação específica, desenvolvida em sede de especialização adequada. Para isso,
assumimos explicitamente a complexidade do pensamento actual na inter-acção
descomplexada entre a ciência e o senso comum, o que comporta uma linha de produção
de empowerment destinada à segmentação de públicos destinatários, mas que tenha por
pressuposto a necessidade comum de um serviço público habilitado a tomar a cidadania
activa, extensiva e inclusiva – e por isso social -, como vector de construção da
responsabilidade social e política perante as gerações actuais e vindouras.
VII – A prossecução do direito à cidadania activa e inclusiva, enquanto direito social e
bem público inerente à promoção do capital social indispensável a uma Sociedade do
Conhecimento, pode portanto alinhar-se no seguinte encadeamento e especificação.
5. Bibliografia
I Geral
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[ 1]
Conferência Gulbenkian Que valores para este tempo in
http://www.gulbenkian.pt/portal/index.html
[
2]
J.PIERRE
DUPUY;
A
Tentação
do
Orgulho,
idem
[3] De facto, enquanto projecto de uma equipa plurimensional de I&D que assume
perante a FCT a responsabilidade da sua proposta, o PCSSC sucede-se a um outro
projecto (ProJINA) que, a título individual, foi desenvolvido durante um triénio sabático
a partir de 2002 no Instituto Nacional de Administração, centrado na dimensão da
Cidadania e tendo presente a formulação da estratégia de Lisboa.
[4] Esta perspectiva cruza-se com a da obra dirigida por Boaventura Sousa Santos
editada pela Afrontamento A Sociedade Portuguesa perante os Desafios da
Globalização(1999-2005), onde se analisa e problematiza, em espécimes bibliográficos
diferenciados, como abordar os desafios da inovação inerentes à transformação da
economia e das várias problemáticas societais, repentinamente envolvidas em dinâmicas
de internacionalização que transcenderam as suas capacidades de adaptação. Daí "o
agravamento do risco social associado ao aumento da pobreza e das
desigualdades"(SANTOS,
B.S.,1999),
[5]
www.clad.org.ve
[6] Em 1989, a Sociedade Portuguesa de Filosofia e a Associação Portuguesa para o
Desenvolvimento das Comunicações promoveram em conjunto um Simpósio
Internacional sobre as Tecnologias da Informação & Sociedade(ALVES, JL, 2002). Dos
Usos da Teoria à Teoria dos Usos a variedade de temas veio a confluir na identificação de
três áreas de impacto anunciadas: "O papel da comunicação nas dinâmicas de mudança
cultural", "A Sociedade Computorizada: vida nova ou destruição?" e a "Filosofia
Artificial e o declínio da Tecnologia", entendida esta como "força de melhoria de vida",
que se alimenta da ciência em que se origina e da apropriação societal que confere
sentido
às
suas
aplicações
[7] KEANE, Is Democracy Universal Value?, Conferência Gulbenkian Que valores para
este tempo cit.
“Por um Novo Contrato Social “
Uma perspectiva de inclusão social para as
comunidades
Maria Alfreda Cruz
Lisboa, I FP, 30 de Outubro de 2007
Maria Alfreda Cruz
“Por um Novo Contrato Social “
I Uma perspectiva de inclusão social para as comunidades
«L’important est que nos utopies soient des utopies
responsables, qui tiennent compte du faisable autant
que du souhaitable, qui composent non seulement
avec les résistances regrettables du réel mais avec les
voies praticables tenues ouvertes par l’expérience
historique. C’est le lieu de rappeler avec Max Weber
que la moral de conviction ne doit pas éclipser la
moral de responsabilité» PAUL RICOEUR (1998).
Esta comunicação pode inscrever-se nos domínios da utopia. Com efeito,
parafraseando RICOEUR,.no Exórdio desta 1ª Parte, confesso assumir a
pertinência das utopias úteis, o que me permite perfilhar a possibilidade dum
Contrato Social capaz de pôr em questão os critérios inerentes à regulação da
vida em sociedade, designadamente a das pessoas submetidas aos poderes
discricionários vigentes na etapa da globalização em que se inscrevem hoje
todos os países do mundo. À partida teremos então de nos interrogar sobre se
os conceitos nucleares da bioética e da biopolítica poderão compaginar-se com a
perspectiva actual da condição humana, no sentido de nos permitirem encarar a
recusa da exclusão sofrida por todos os que não pertencem ao sistema de
controle político e societário dos nossos dias. No quadro duma Europa que
permanece refém duma globalização que constrange os direitos individuais e
colectivos necessários ao acesso universal à cidadania formal, o enraizamento
desta temática filosófica nos terrenos da investigação científica porá em equação
e em experimentação, na dialógica governação vs, cidadania, um contrato social
capaz de garantir que os valores que lhe forem implícitos poderão ser
questionados em sede experimental dum processo de incubação de cidadania
activa e inclusiva.
À partida, a cidadania pode então ser encarada enquanto núcleo dum projecto
de sociedade emergente duma consciência de desenvolvimento integrado que
se apoia na dimensão social e humana. Com efeito, os direitos e deveres
individuais são matéria de consciência individual no contexto social e cultural
que o envolve e, nesse sentido, são balizas duma interacção simbólica, através
da qual a solidariedade pode suplantar as dinâmicas de exclusão sofridas pelos
seres vulneráveis perante os poderes que os submetem. É nesse sentido que ao
assumir-se que se a cidadania pode ser um estado de desenvolvimento do ser
humano, ela deve tornar-se móbil de um política concreta que encare a
universalização do desejo de a alcançar, o que será conforme com a plenitude
da condição humana.
1
O processo implícito corresponde a fazer surgir um projecto de difusão
generalizada de empowerment., baseado na aprendizagem de como
operacionalizar decisões referentes à vida quotidiana. Efectivamente, enquanto
processo de produção de um bem público, o poder inerente ao empowerment, terá
segundo esta tese, capacidade para interpelar o poder institucional, uma vez
que se traduz na disseminação de relações decisionais na tessitura/contextura
social, exigindo do aparelho institucional a universalização dum serviço público
de apoio aos procedimentos de aprendizagem relativos aos conteúdos que, no
âmbito discursivo, possam estar em questão, matéria em que se inscrevem por
exemplo os estudos de impacte decisional em qualquer domínio em que a
decisão recaia. Em todo o caso é preciso seguir esta prospectiva através dum
projecto global, porque sem ele o próprio pensamento se perde1 A configuração
de um tal projecto em fase de emergência em Portugal, ensaia a definição duma
política pública multidimensional, apoiando-se em programas de formação
relativos ao exercício do empowerment, na relação entre o gouvernment e os
cidadãos. É necessário que o quotidiano seja permeável à intervenção de todos
os que desejam participar nela e por consequência é expectável que os excluídos
possam ser destinatários de uma política que possa outorgar-lhes o direito de
aprender a escolher e a praticar a cidadania no tempo e no espaço que habitam.
Defende-se pois que eles devem poder preparar-se para viver a sua vida,
tomando consciência da panóplia dos seus direitos e deveres perante si
próprios, os outros e o ambiente e que para os encorajar, as comunidades
territoriais possam providenciar o indispensável provimento de recursos
estratégicos nos locais onde as comunidades aprendentes possam efectivar-se
para esse efeito. Deste modo, todo o lugar que o assuma garante a montagem e
gestão dum observatório para o conjunto da comunidade, enquanto
instrumento produzido pela expertise inerente ao enquadramento cognitivo dos
conteúdos abordados pelos cidadãos, através das suas démarches de apropriação
dos mesmos. Trata-se portanto dum observatório para o cidadão concretizar o
objectivo de exercer, ele mesmo, a cidadania activa, livre e responsável.
É indispensável, para isso, uma política de interacção sólida entre os serviços de
apoio público à pesquisa e à oferta públicas da cidadania activa e inclusiva, o
que pressupõe:
- O investimento do Aparelho de Estado em recursos humanos, técnicos e
também em tecnologias adequadas o aprovisionamento das redes de sítios de
cidadania, providos de um sistema de comunicação on line permissível da
integração de cada observatório à medida da sua chegada ao sistema.
- A receptividade aos movimentos sociais na perspectiva de uma democracia
accionada pelos diversos pólos de formação de decisão.
-A promoção da educação enquanto estratégia de vida, tomando como
sustentação o conjunto de práticas de socialização educacional assumidas no
contexto cultural dos nossos dias.
11
H. LEFÉVRE, selon ARMAND AJZENBERG (1992), « La Citoyenneté, pour quoi faire », Réseux,
insertion,citoyenneté, Pour, nº 134, pp.11-15
2
-O apelo às autarquias locais para assegurarem receptividade aos movimentos
sociais e à implementação de redes sociais de apoio à integração do serviço
público indispensável à expansão da cidadania.
O suporte teórico desta perspectiva remete para a concepção de democracia
políárquica2, regime que leva mais longe do que a democracia formal os
pressupostos básicos da democracia, assumindo como suportes institucionais
da poliarquia as assembleias decisionais dos representantes eleitos pelos povos,
um sistema eleitoral credível, a garantia da liberdade de expressão e à
autonomia de associação e de acesso à diversidade das fontes de informação,
mas também o direito de acesso a processos tendentes à universalização da
cidadania, tendo esta por perfil as características de activa e inclusiva.
Em síntese, é possível conceber um modelo destinado a encararmos a renovação
dos laços comunitários, com apoio nos valores e projectos de intervenção nos
assuntos públicos. Foi o desafio que pessoalmente procurei encarar no Instituto
Nacional de Administração, mediante um projecto de pesquisa para o
Desenvolvimento, aberto às várias vertentes que possam ser implicadas na
implementação de um serviço público de apoio à cidadania activa e inclusiva,
único meio de nela fazer residir a possibilidade duma paz pública adstrita aos
valores da equidade e da justiça social. Encarando a máxima difusão territorial
possível deste projecto, em ligação às autarquias locais, o processo de
implementação em rede que se almeja permitirá que todos os que procuram
questionar os dilemas e as alternativas com as quais são confrontados no seu
quotidiano, possam ter acesso a um método para tal aprender. A esta rede de
sítios podem pertencer as escolas, mas também outros agrupamentos, através
da procura de interessados no projecto de aprendizagem e de formação
concernentes a uma cidadania activa e inclusiva perante os poderes - e tudo isso
qualquer que seja a idade, a função social ou o grau de conhecimento de que se
é depositário. Essa será uma responsabilidade da Sociedade do Conhecimento,
das suas instituições, das suas práticas tecnológicas metodológicas, em contexto
de solidariedade inovadora. Em contrapartida da formação obtida pelo
exercício da cidadania, a organização do ensino e do trabalho nesta Sociedade,
pode beneficiar significativamente da motivação e da implicação dos
indivíduos habilitados para conceberem e para gerirem eles próprios o seu
projecto de vida, enquanto dimensão essencial de empowerment.
II Por uma política fundacional da Cidadania Extensiva
La politique est la exhibition dune moyen en tant que tell, c’est à
dire en tant que champ d’action et de pensée humain. GIORGIO
AGEMBEN, Notes sur la Politique, Wikipédia, 2.07.07
2
Supportes institutionais identificados por DAHL (2000) em referência ao espace territorial adstrito à
ladministração do Estado
3
Parafraseando AGEMBEN, no exórdio desta 2a parte, assumamos então uma
política fundacional da cidadania extensiva, exibindo-a enquanto campo de
acção e de pensamento humano e centremo-la no questionamento da educação.
Educar para a cidadania é sempre sinónimo de educar em cidadania – o que
quer dizer desenvolver capacidades e competências individuais e sociais em
registo atitudinal de civilidade e exigência, as dimensões nucleares da
cidadania.E isso ocorre nas comunidades em curso de aprender atitudes de
civilidade e de exigência dentro e fora da escola, .seja a jusante, seja em
alternativa à escola, dependendo isso das circunstâncias vividas. Impliquemonos decisivamente no processo exterior à escola, porque não basta preparar o
futuro e os cidadãos que o mudarão face ao presente. Queiramos também que o
presente seja permeável à mudança através da intervenção de todos quantos
possam construi-la. Aceitemos que os excluídos possam ser destinatários de
uma política que lhes dê o direito de escolher e de praticar a cidadania no
tempo e no espaço que habitam. E apostemos em como eles se podem preparar
para viverem a sua vida, com a consciência dos direitos que lhes assistem - e
que, para isso, a sociedade determine investimento público e recursos
estratégicos reunidos nos lugares que suportem comunidades aprendentes.
Disto decorre entretanto que enquanto infraestrutura social da pólis, o sítio de
cidadania – fisicamente instalado e equipado com recurso ao envolvimento
autárquico, seja como promotor ou como aderente da iniciativa mobilizadora pode implicar-se no conjunto das políticas públicas expressas no território, para
assegurar uma participação cidadã alargada aos vários aspectos do quotidiano.
Isso inclui os projectos e a gestão orçamental dos planos anuais que interfiram
com ele, da polis aos “polis”, do centro urbano ao subúrbio, do condomínio ao
“bairro”. Enquanto recurso político, o sítio de cidadania será o elo do bairro à
metapolis, se se dotar de recursos estratégicos para o efeito, recriando
continuamente a cidadania activa, promovendo projectos mobilizadores de
vida, apoiados na actividade educativa, resistindo aos ditames da globalização
e da cultura que dela depende, sempre que eles possam sublinhar e reforçar a
exclusão social.
Equacionemos então uma política de interacção consistente entre serviços de
apoio público à procura e à oferta de cidadania activa. Isso pressupõe
Do lado da pesquisa:
-1
Justificar a decisão a decisão parlamentar de criar o Observatório do
Cidadão como recurso político de promoção da cidadania da cidadania
activa e inclusiva nas comunidades, com recurso à pesquisa orientada,
para
-
Estimular a implementação voluntária de sítios de incubação da cidadania,
enquanto locais aptos para a emergência dos observatórios, articuláveis
em redes interactivas, nas dimensões seguidamente enunciadas.
4
1 -RECCRIA - rede de criação de inclusão activa
( enquanto processo de resistência à exclusão social nos vários
domínios da sua incidência )
PROMOVE – rede de projectos mobilizadores de vida, apoiados na actividade
educativa (enquanto processo de desenvolvimento contínuo de
capacidades e de competências)
RESISTE – rede de acesso ao sistema de trabalho/emprego.
( enquanto processo mobilizador de actividades laborais,
certificáveis pelo sistema público de formação de adultos
2. Do lado da oferta:
- Garantia de emprego para os profissionais de emprego e de animação
cultural, fundada na gestão das oportunidades
emergentes dos
dispositivos legais e políticos, o que se pode enquadrar no
funcionamento do serviço público aberto às tendências flexíveis da
Sociedade do Conhecimento. Com efeito, esta valoriza as pragmáticas de
colocar a informação, qualquer que seja, em perspectiva consistente
como projecto referencial de organização da “coisa pública” e dos
espaços indivdual, públicoe social de longo prazo, ainda que
atravessados pela vida quotidiana. Disso deriva o apelo às autarquias
locaispara a receptividade aos movimentos sociais e à implementaçãode
redes sociais de suporte à integração do serviço públicoindispensávelà
praxis do empowermen.t:
-
Implementação do Observatório da Cidadania, instalado em “ território”
institucional adequado à integraçãodas redes de observatórios dos
cidadãos. Enquanto depositário da informação emergente das sedes
descentralizadas de promoção do empowerment, a observação que lhe é
própria baseia-se na utilização e na criação de informação produzida
pelos cidadãos no que respeita ao desenvolvimento dos seus próprios
projectos e pode ser assumida na perspectiva da análise decisional
O Mod(el)o de interacção oferta/procura sublinha ( cf. Apresentação PPT) :
- O investimento do Aparelho de Estado em recursos humanos, técnicos e
tecnológicos, adequados ao provimento das redes de sítios de cidadania,
distribuídos pelo territóri e providos de sistema de comunicação on line
- A receptividade aos movimentos sociais na perspectiva de uma
democracia accionada pelos vários pólos de formação da decisão;
- O fomento da educação como estratégia de vida, na qual a escola formal
seja assumida como caso particular do acesso aos modos de aquisição de
5
conhecimento, também distribuído pelo conjunto de práticas de socialização
educacional, assumidas no contexto cultural de hoje,
É este o modelo que nos propomos testar, a fim de que a cidadania deixe de ser
um conceito discricionário, capaz de acelerar, no processo de globalização
actual e apoiando-se na info-exclusão, as restantes dimensões de segregação
social. E ainda para que a democracia – enquanto forma de poder distribuído
pelas comunidades que reivindiquem o direito de participar nela – possa oporse à tentação totalizante duma Sociedade do saber que se auto-representa e
reproduz “ como gigantesca prova de natação, destinada a afogar a maior parte,
para depois premiar os vencedores”- palavras com as quais CAVET DE
MAGALHÂES; pedagogo português dos anos 70, se referia já então à educação
entre nós. E nos jornais para que todos o soubessem…
Esta dupla finalidade (recusa da infoexclusão, por um lado, e, por outro, o
envolvimento na via poliárquica da democratização do saber, acaba de
encontrar, em Portugal, a disponibilidade de uma autarquia local para se
assumir como entidade incubadora de cidadania no âmbito do modelo que lhe
foi proposto pelo Centro de Filosofia da Ciência , em função do envolvimento
da referida autarquia em matérias conexas com as dimensões encaradas no
modelo. No âmbito da formalização do partenariado de corrente, o Executivo
da Autarquia Municipal de Montijo–porque é dela que se trata -, propõe-se
deduzir da sua postura as responsabilidades propiciatórias inerentes à
convergência dos seus pontos de vista com os da Coordenação do Projecto
assumido pelo Centro, no que concerne à ética do serviço público à escala local.
III - As dimensões enfrentadas e seus impactes
“Precisamos de considerar se e como ultrapassar o nosso
nível de democracia. Ponhamos a questão deste modo.(…) A
tarefa imediata é conseguir a democratização ao nível
poliárquico. Mas o desafio dos cidadãos nas democracias
mais consolidadas é descobrir como alcançar um nível de
democratização
para
além
da
democracia
poliárquica”(DAHL, 2000)
Parafraseando o exórdio desta 3ª Parte, encaremos sucintamento nos
campos da o pensamento e da acção, o desafio com que DAHL
confronta os cidadãos nas democracias mais consolidadas: o de
descobrir como alcançar um nível de democratização para além da
democracia poliárquica.
As dimensões encaradas são a conceptual e a política de formação de quadros
difusores de praxis que têm como referencia a referida dimensão conceptual.
Na dimensão conceptual relevemos a Democracia poliárquica, o Sítio de
6
cidadania e o Observatório da Cidadania, sendo que em todos os casos, os
conceitos são os envolvidos nas respectivas semânticas
A- Quanto à Democracia poliárquica
Conceitos-chave: democracia vs poliarquia (numa articulação que comporta
o reconhecimento dos suportes institucionais identificados por DAHL)
refere-se à maneira de se poder contar com um regime democrático pleno e
extensivo, enquanto “resultado integrado pelas práticas sociais de acesso
glocal à livre formação de opinião e à identificação objectiva do processo de
supressão das carências sofridas. Tudo isso exigindo dialógicas de
compreensão e de proposição, seja na resistência, seja na alternativa, no
sentido de se atingir a mudança ou a consolidação de situações e de praxis
diagnosticas ou prospectivas
Conceitos complementares:
a) interdependentes: cidadania activa, promoção de aprendizagens,
intervenção na polis, educação/formação ao longo da vida, actividade
laboral;
b) operacionalizadores: sítios, redes, sistemas e políticas de investimento
distribuído em consonância com os pressupostos abrangidos pelo conceito
Quanto ao Sítio e ao Observatório de cidadania os conceitos são os que
presidem aos fundamentos e dimensões das actividades envolvidas
B – No caso do Sítio
Fundamentos:
Modelo de interacção
Observatório do cidadão
Dimensões da actividade dos sítios:
-cidadania inclusiva e activa
- promoção da educação ao longo da vida
- inclusão no sistema de trabalho/emprego.
C- No caso do Observatório da cidadania
Fundamentos: redes de articulação das actividades dos sítios segundo o
paradigma network
Dimensões da actividade
- rede de cidadania criadora de inclusão activa ( RECCRIA)
- projectos mobilizadores de vida educativa ( PROMOVE)
7
- rede do sistema de trabalho/ emprego (RESISTE).
Central para o modo de operacionalização do modelo é a política de formação
de quadros capaz de privilegiar a estratégia metodoógica da Investigaçãoacção.
Uma política de formação de quadros – com destino ao provimento de sítios
de cidadania, incluindo os seus observatórios .
-concretizando, no plano epistemológico, a clarificação e os modos de
conceptualização trazida por esta perspectiva à compreensão dos problemas
que afectama vida das sociedades actuais e também as possibilidades da sua
abordagem através do investimento das ciências sociais abertas às
pragmáticas e aos domínios científicos que lidam com a complexidade;
- operacionalizando, no plano prático, os métodos para avaliar a
especificidade dos problemas a resolver, bem como a influência dos contextos
nacionais e internacionais nos tipos de problemas estudados, para melhor
compreensão das resistências com as quais as correspondentes soluções se
confrontam e para formular da melhor forma os enunciados eficazes das
propostas decorrentes;
- privilegiando neste âmbito, a estratégia e o conjunto de métodos de
investigação-acção, enquanto suporte da teia de ligações entre investigadores
e formadores, por um lado, e, por outro, entre os actores sociais , os cidadãos e
os políticos, conforme a figura que o explicita;
- concretizando, no plano político, os recursos que permitirãoo
conhecimento abalizado das questões a resolver e a aplicação das políticas
públicas adequadas ao seu tratamento.
Investigação
y
Investigadores
Mudança x
z
Investigadores
+ Formadores
Conhecimento
Actores Sociais
+ Politicos
Cidadãos
+Actores Sociais
Acção
Os eixos da problemática da investigação-acção, segundo LOPES DA SILVA ( 1996, p.75) :
x–eixo epistemológico
y- eixo metodológico
z- eixo político
8
CATEGORIAS DE IMPACTOS- Entre os múltiplos impactos possíveis deste
posicionamento fracturante em relação à situação e que se vive actualmente
neste país, assumido como caso da Europa, o modo de operacionalizar o
modelo propõe-se testar as seguintes categorias.
Resistência activa à exclusão social e/ou política através:
-
-
Incentivo à prática da cidadania inerente à problematização dos
direitos humanos, sociais, culturais e civilizacionais, a partir da
animação cultural de redes de intersubjectividade.
Estimulação de identidades territoriais a partir da observação
participante do quotidiano, e da função de tais identidades na
(re)criação ou manutenção de laços sociais.
Criação de trabalho através
-
-
Integração de docentes e outros profissionais desempregados em
quadros de municiamento das funções dos sítios, equiparando-os a
serviço público efectivo.
Habilitação de profissionais para as actividades de investigaçãoacção inerentes à metodologia de aprendizagem proporcionada pelos
sítios, incluindo habilitação em exercício.
Criação de alternativas à prática da violência e à vivência da
insegurança através
-
Criação de clima motivador das práticas de convívio e de discussão
da informação difundida pela comunicação social.
Estímulo à motivação para a emergência de projectos de vida .
Apoio à equação de projectos de desenvolvimento territorialmente
integrado.
Capacitação para a discussão da agenda do poder político
IV A integração social enquanto bem público
( Síntese)
Em síntese, tomamos por referenciais desta comunicação as posturas de
RICOEUR, AGAMBEN e DAHL, respectivamente quanto aos contornos de uma
utopia útil, ao modo como a política se pode exibir como pensamento e campo
de acção e finalmente quanto à urgência de se descobrir, numa democracia
consolidada, o modo de atingir um nível de democratização para além do da
democracia políárquica que ainda nem sequer atingimos. Trata-se pois de
suscitar uma proposta posta fracturante que “tenha em conta o factível tanto
quanto o desejável,, defrontando não apenas as resistências saudosistas mas
9
também as vias praticáveis mantidas abertas pela experiência”..Nesta
arquitectura, a integração social enquanto bem público é a saída almejada
1 – Começo então por reter a mensagem de LIPOVETSKY acerca da
improbabilidade da felicidade real nesta sociedade configurada enquanto motor
da civilização da felicidade. Do seu ponto de vista, a esperança na resolução
deste paradoxo reside na possibilidade de uma mutação sociocultural, fundada
na emergência dum novo sistema de valores, em ruptura com os que suportam
a frustração hedonista , cuja espiral alienatória convive com as dinâmicas de
exclusão individual e social, as quais residem no âmago da frustração e das
decorrentes formas de violência.
2- Creio que é necessário remontar ao conceito de felicidade inerente à orgânica
da civilização grega, enquanto conceito reportado ao percurso da vida
individual compatível com os valores socialmente ratificados, o que implicava o
sentimento pessoal de inclusão e de visibilidade por parte da comunidade – e
tudo isso com exclusão de todos a que a sociedade não atribuía a condição de
cidadão…
A contemporaneidade comporta para além destas similitudes e
constrangimentos, um leque de desafios conexos com o perfil psicológico da
Sociedade da Informação, até mesmo do Conhecimento, conceito este assumido
enquanto informação colocada em perspectiva e em prospectiva pelo sujeito
responsável pelos pontos de vista e construídos e reconstruídos ao longo do seu
percurso de vida. Portanto, a participação das pessoas no controle da
informação e no exercício das escolhas dependendo da sua apropriação
cognitiva, é a questão chave de toda a política pública verdadeiramente aberta
aos desafios da contemporaneidade cultural e da organização da vida em
sociedade.
3 – A participação reporta-se à questão da cidadania, enquanto interacção
direitos/deveres no Universo dos Direitos Humanos, Sociais, Culturais e
económicos, com supremacia dos primeiros e a subscrição dos princípios éticos
e cívicos socialmente ratificados. A Sociedade do Conhecimento, emergente da
aceleração dos saberes pelas novas tecnologias e pelos progressos científicos
deverá estabelecer o direito ao Conhecimento.
4 – Para encarar o envolvimento das autoridades locais neste domínio e no
contexto da Sociedade do Conhecimento, será necessário configurar uma
política pública no quadro alargado dos princípios da Carta dos Direitos
Humanos, articulando os poderes políticos, s cidadãos e os peritosadequados à
prossecução dos objectivos de referência das políticas inclusivas, tendo em
conta a sua apropriação diferencial por parte das várias classes e segmentos
sociais.
5 – A realização de tais políticas deve apoiar-se na promoção de novos lugares
de difusão de informação e de habilitação dos seus destinatários para a escolha
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das suas próprias opções de entre a panóplia de soluções possíveis para os
problemas analisados. A referida promoção reporta-se às práticas de
funcionamento das comunidades de aprendizagem totalmente voluntária, com
ligação possível às Organizações não Governamentais e com suporte público no
que se refere a investimentos solidários para apropriação da informação,
designadamente no plano dos recursos tecnológicos, pedagógicos, de
investigação-acção e de animação cultural, assumidos no contexto do
quotidiano vivido.
6 – Estes lugares de aprendizagem informal, adstritos deste modo à promoção
da cidadania activa e integrativa, poderão comportar diferentes configurações
compatíveis com ao orgânica territorial da cidade, em ligação às instituições dos
sistemas de educação e de emprego, abertos à inovação apoio à criatividade.
7 - Este é o contexto em que será possível:
abrir novas perspectivas às pessoas mais vulneráveis, no que se refere a
habilitação para intervir, com conhecimento de causa, nas matérias públicas
respeitantes ao seu quadro de vida, incluindo as hipóteses de desenvolvimento
pessoal e o modo de encarar os desafios da empregabilidade dos nossos dias;
assegurar uma dimensão de mercado social de emprego às classes
profissionais fustigadas pelo desemprego, nele incluindo o impacto do declínio
demográfico na escolarização, com recurso ao investimento das competências
excedentárias pela via das acções de qualificação pertinentes;
captar iniciativas cidadãs no que se refere à identificação de prioridades
para a resolução de problemáticas complexas, tomando em consideração lógicas
solidárias e participativas.
garantindo particular atenção às estratégias da violência, tentar opor às
pragmáticas de dominação e de confrontação, a da interacção social encarada
pelo ângulo da negociação paritária e da convivialidade interpessoal.
De tudo isto decorre uma política pública implicada na prevenção das
pandemias sociais dos nossos dias, nomeadamente a da violência,
sistematizando, nessa perspectiva, pesquisas conduzidas em matérias das
diversas ciências humanas, sociais e políticas que dizem respeito a tais
problemáticas. Além disso, a política pública para estimular uma cidadania
activa e integrativa será, do nosso ponto de vista, fundamental para sustentar
todas as outras políticas inclusivas, implementadas no sentido duma
coexistência pacífica na cidade e nas instituições educacionais que nela se
enraízam. No seu contexto, pode-se reforçar a consciência reflexiva e crítica das
pessoas, esclarecendo-as sobre os constrangimentos fora de controle ao nível
local, desde que sejam desencadeados por fenómenos de organização global da
exploração de recursos e de gente, em proveito de empreendedores que
dispõem de vantagens “cegas” do modo dominante da globalização. Além de
estabelecer o quadro de alianças para defender a cidade da dominação dos
grandes interesses fundiários e especulativos, as autoridades locais podem
investir não somente na melhoria do quadro de vida dos cidadãos, mas também
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no alargamento a todos da oportunidade de lhes fazer face. Colocar o
quarteirão/o bairro no coração duma política de coesão social pode passar
pelas mais diversificadas acções de participação, designadamente no que diz
respeito à identificação de prioridades para o orçamento do Município.
Resta a questão fundamental: Porque não fazer esta revolução a partir da
escola? Porque os lugares, os tempos e os ritmos que faltam à nova forma de
aprendizagem ao longo da vida são absolutamente emergentes de novas
necessidades, do ponto de vista da justiça social e da segurança das pessoas e
da sociedade. É preciso recusar a exclusão social, tal como existe no âmago ou
fora da escola, enfrentando uma mudança de cultura educativa, tal como
P.PERRENAUD definiu no Congresso de Lucena em 1999. Um projecto de
Sociedade do Conhecimento deve, do meu ponto de vista, ponderar as suas
teses como balizas da reforma de pensamento necess´sria em todos os lugares
de aprendizagem, a partir da apropriação social dos seus pressupostos.
Com efeito, o que faz falta é:
.partir duma epistemologia realista e crítica que aceite os limites do
conhecimento das pessoas que queiram aprender, reconhecendo a impotência
da acção pedagógica clássica formatada para o aluno modelo,
.reconhecer que, pelo contrário, as tendências centrais têm sobretudo um
interesse de referenciação, sendo porém que a dinâmica de um sistema vivo é
procedente da sua abertura ao exterior;
reconhecer também o estímulo do método para a construção do saber
problemático, organizado a partir da formulação dos problemas e das
hipóteses, no sentido de identificar constantes e variáveis descritivas,
susceptíveis de explicar a situação observada e de prospectar o seu futuro;
. reconhecer, neste quadro, o direito à incerteza e ao valor pedagógico do
erro, quando a aprendizagem adopta o tateamento heurístico e aceita o carácter
provisório e inacabado de programas e de didácticas disciplinares, para
valorizar os procedimentos de resolução de problemas;
. adoptar uma prática de objectivação, quando a comunidade tomar-se e
ser tomada como objecto de análise e de teorização, na relação dinâmica com o
exterior, para comparar os seus processos e estratégias, em presença de outras
organizações e campos sociais.
São estes os fundamentos assumidos no Projecto desenvolvido no estrito
sentido teórico no âmbito da Administração Pública Portuguesa, “ ao sol” da
Estratégia de Lisboa. Presentemente, o Centro de Filosofia da Ciência propõe-se
reter os seus pressupostos na dimensão programática da Ciência vs. Política,
tendo a Ética como ligação sustentável. O questionamento do referido Projecto
comporta o seu lançamento e controle em sede experimental, a fim de se
sujeitar a questionamento sustentável. Mas, por outro lado, qualquer que seja a
sustentabilidade demonstrada, ela não poderá fazer-se valer no que se refere à
pragmática de implementação enquanto o poder político não resolver colocar
em questão os seus próprios fundamentos, assegurando, no seu funcionamento,
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as instituições que possam permitir a dimensão poliárquica da democracia. É
facto que, em Portugal, a cultura da participação vem fazendo caminho desde
os anos setenta. Por exemplo, a assembleia de eleitos de Lisboa decide, de
tempos a tempos, recomendar ao executivo a adopção do método anual do
“orçamento participativo”, e é talvez na ligação a esta perspectiva que a
municipalidade irá em breve retomar os trabalhos de direcção estratégica do
ordenamento do território urbano. É talvez um progresso, mas em todo o caso,
há muita gente fora da possibilidade de configurar uma opinião objectiva acerca
dos assuntos mais complexos e consequentemente de tomar o seu destino sob o
seu próprio controle. E isso permanece no coração da frustração pessoal e da
violência quotidiana. É necessário portanto encarar esta problemática no campo
da formação de competências pessoais para um empowerment que possa ser
assumido em exercício de cidadania aberta à inclusão de todos que
verdadeiramente o desejem.
Em minha opinião, o espaço público pode ser a dimensão revigorante da
condição humana e dos direitos individuais, bem como os colectivos, seja o
direito à liberdade, à dignidade e à felicidade, tanto quanto ao bem-estar
essencial durante toda a vida. Tudo isso passa por reconhecer o carácter
funcional e fundador do bem comum. Além disso, o terreno de emergência da
cidadania activa e inclusiva é o espaço social, enquanto categoria de fronteira
entre os espaços individual e público. Os critérios operatórios dos conceitos
bioéticos poderão ser retomados neste terreno, partindo da tese que põe em
questão a biopolítica tradicional. Com efeito, para opor à rede de conceitos do
“poder
soberano”,
“vida
desprotegida/vida
nua”,
“terreno
concentracionário/campo de concentração” e “ estado de excepção”, os da
democracia poliárquica e da universalidade dos direitos humanos, é necessário
tomar balanço no exercício do discurso e da acção em todos os espaços
habitados e percorridos pelos povos, na aventura da sua trajectória de vida.
É preciso portanto colocar a cidade no âmago desta estratégia, enfrentando a
maneira de relevar a dimensão produtiva do poder e de submeter ao
questionamento das suas possibilidades e limites, no seio dos âmbitos
territoriais que o suportam e o enquadram. O fecho de abóbada do processo
decisional deve apoiar-se no Parlamento, porque ele é o coração do sistema de
ponderação das diversas perspectivas sobre os assuntos colocados em questão,
afim de procurar as suas soluções, abertas por seu turno à ratificação dos
cidadãos.
Será necessário um Contrato Social nesse sentido, porque, tal como ARENDT
sublinhou, no momento de nascer sabe-se que a vida se extinguirá um dia, mas
ninguém nasce para morrer: nasce-se para que a vida possa prosseguir o seu
próprio desenvolvimento. E isso vale para todos. É a inalienável condição
humana. É preciso portanto exigir o respeito que lhe é devido, à medida das
possibilidades que se possa pôr em marcha por entre os poderes soberanos que,
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apesar de tudo, resistem em prosseguir o caminho de vigiar e punir, ancorado
nos pressupostos inerentes à exclusão social.
Lisboa, I FP, 30 de Outubro de 2007
Maria Alfreda Cruz
Esta comunicação comporta 4 vectores
I Uma perspectiva d’inclusão social para as comunidades ( pp.1-3)
II Por uma política fundacional da Cidadania Extensiva ( pp.3-5)
III As dimensões enfrentadas e seus impactes ( pp.5 -7)
IV A integração social enquanto bem público (p.7-10)
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CRUZ, M. Alfreda (2003), Le droit de tous a la citoyennete (une perspective
d'inclusion
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http://www.iiasiia.be/schools/aeconf/miamipapers/ofcruz
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Idem (2000) Democracia, Lisboa, Temas e Debates.
DEMO, Pedro (2000),. A Política Social do Conhecimento, Petropolis, Vozes.
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MORO. Giovanni (2000), The Citizen’s Side of Governance, com. présentée
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PETRELLA, Ricardo (2000), O bem comum: elogio da solidariedade, Porto, Campo
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Ética e o Futuro da Democracia, Coord. J. LOPES ALVES; Lisboa Colibri/Sociedade
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SILVA, M.I. Lopes (1996), Práticas Educativas e Construção de Saberes, Lisboa,
M.E/IIE.
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Síntese Biográfica da autora
Síntese Biográfica da autora
Maria Alfreda Cruz, de seu nome completo Maria Alfreda Cordeiro da Cruz Ribeiro
Viana, geógrafa com o grau de doutor em Ciências do Ambiente, no ramo do
Ordenamento do Território, tem desenvolvido o seu percurso profissional numa
pluralidade de vertentes, em que se integra a que se reporta à linha geral das
Comunicações ao CLAD, no âmbito de uma Governabilidade implicada na Democracia
Poliárquica. Garantiu a articulação das problemáticas da Educação e do Território em
todos os âmbitos e contextos de aplicação da sua condição de geógrafa, academicamente
qualificada para a transversalidade inerente à vertente do Ordenamento do Território.
Enquanto quadro da Função Pública, desenvolveu metodologias técnico-científicas para o
Desenvolvimento nas funções desempenhadas desde 1973 no sector da Educação, quer no
Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério da Educação (1973-1989), onde
coordenou o Sector de Ordenamento da Rede Escolar e, em 1978, o Curso de
Disparidades Regionais e Micro planeamento - Formação em Planeamento dos quadros
do Ministério da Educação, da responsabilidade conjunta deste e do Instituto
Internacional da Educação/UNESCO, quer no do Ministério do Planeamento e da
Administração do Território(1990-1993), do último dos quais foi representante institucional
no Programa Educação para Todos, até que, já no quadro do Instituto de Inovação
Educacional (ME), lhe coube ponderar, no âmbito deste Programa e num território
específico, as directrizes da Reforma do Sistema Educativo portuguesa feridas pelos
princípios da Declaração Mundial de Jomtiem.
Na relação das Ciências Sociais com as da Educação, tem assumido a Epistemetodologia
da transdisciplinaridade, sendo centrais na sua problematização as temáticas da
Sociedade do Conhecimento e da Investigação Científica Para o Desenvolvimento
Humano e Social, comportando o desenvolvimento de estudos de caso em termos de I&D,
nos campos da pesquisa empírica direccionada para políticas públicas implicadas na
socialização. Assumiu, nessa mesma perspectiva e no âmbito de um triénio sabático
proporcionado em 2001 pelo Ministério da Educação, um projecto de investigação em
políticas públicas intitulado "O direito à Cidadania na Sociedade do Conhecimento/Um
Serviço Público para a Cidadania", sendo nessa qualidade que tem vindo a apresentar aos VII,
IX e X,XI e XII Congressos do CLAD as Comunicações referidas no âmbito da presente
Bibliografia. Actualmente é membro do Centro de Filosofia da Ciência da Universidade
de Lisboa (http://cfcul.fc.ul.pt), situando em ponderação epistémica a área metodológica da
Investigação e Desenvolvimento relativa à Ciência Política.
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Uma visão optimista