XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 UMA REFLEXÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS AÉREAS Sérgio Baltar Fandiño (COPPE-UFRJ) [email protected] Milena Bodmer (COPPE-UFRJ) [email protected] A relação entre o transporte aéreo e a responsabilidade social das empresas aéreas brasileiras é apresentada a partir de relatos sobre a evolução deste modo de transporte e seus impactos. Neste sentido serão abordadas algumas conceituaçõess e contribuições para este tema. A partir disso, mostram-se recomendações com base na experiência e nos indicadores Ethos de responsabilidade social empresarial. Finalmente, as conclusões apontam para a importância da responsabilidade social e ambiental, não só como reflexão para consciência, como também para a normatização de regras e procedimentos de monitoramento e avaliação das empresas do setor visando a sustentabilidade do planeta. Palavras-chaves: Responsabilidade Social, Sustentabilidade, Empresas Aéreas XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 1. Introdução Até pouco tempo atrás, as grandes empresas aéreas dedicavam todas as suas forças para a ampliação de suas linhas aéreas e números de vôos, sem se importarem muito com os efeitos negativos da sua operação, o que denota a falta de responsabilidade social. Um dos fatores desta ampliação é a expansão das fronteiras das cidades, com a renovação e a ocupação de novos espaços (GONDIM et al 2002). O crescimento das cidades devido à economia de aglomeração e mecanismos de troca intensificados pela globalização acabam por estimular a demanda por transporte aéreo e, consequentemente, contribuindo, por um lado, para indução de desenvolvimento. Por outro lado, o aumento de transporte aéreo entra em conflito com o desenvolvimento sustentável devido à natureza da sua produção, dependente dos derivados de petróleo e altamente poluente. O contraste entre o desenvolvimento econômico e os impactos ambientais conferem para a aviação um dilema que tem que ser tratado; ou seja, que atitude deverão ter as empresas brasileiras de transporte aéreo para conviver harmonicamente com progresso que visa desenvolvimento e com responsabilidade social e ambiental. Assim, a aviação aparece como ponto nodal deste processo dinâmico pela agilidade no deslocamento de passageiros e transporte de mercadorias, contudo, o tráfego aéreo apresentase como um grande agente poluidor do meio ambiente devido ao volume de emissão de CO2 na atmosfera pelas aeronaves. Neste sentido, o objetivo deste artigo é mostrar a dualidade que existe entre a responsabilidade social das empresas aéreas e suas atividades fins. Ou seja, as empresas procurando meios para se tornarem socialmente responsáveis, em contrapartida o aumento do número de vôos polui cada vez mais o meio ambiente. Este contraste vem aumentando nos últimos anos com a demanda cada vez maior do transporte aéreo. A evolução dos negócios no setor aéreo vem aumentando o desenvolvimento do setor. Mesmo com a crise de 2001, provocada pelo o atentado ao World Trade Center, o setor vem atingindo grande expansão. No Brasil de 2001 a 2005 o setor teve um aumento de mais de 20% no número de passageiros transportados (ANAC 2006). Apesar da expansão, a gestão das empresas aéreas pouco mudou. A entrada da empresa Gol Linhas Aéreas, em 2001, acentuou mais o problema de algumas empresas que funcionavam no modelo antigo; inchadas e lentas em suas estratégias. Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil de 2000 a 2007 dez empresas encerraram suas atividades. Neste sentido, uma abordagem considerando a gestão de empresas internacionais avançadas poderia mostrar uma saída para a evolução da administração de empresas aéreas brasileiras visando a introdução da responsabilidade social. Algumas reflexões precisam ser encaminhadas; do tipo: como o transporte aéreo pode contribuir para a mudança climática, o consumo eficiente de combustível, dada a importância econômica da aviação; como o setor pode contribuir para o melhor clima, se o órgão central da aviação civil - a Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) adotar medidas mais rígidas. São essas reflexões que contribuíram como o alicerce deste artigo que foi desenvolvido a partir de uma análise exploratória de dados do setor de aviação civil do Brasil e no mundo, com seus modelos de gestão e práticas da boa responsabilidade social. 2 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 2. A evolução da aviação e o desenvolvimento sustentável Desde a criação da Varig em 1927, que fazia ligações regionais no Rio Grande do Sul, até a chegada da Gol em 2001 com uma operação “low-cost, low-fare”, as empresas aéreas evoluíram sob os aspectos da tecnologia dos equipamentos, da otimização e segurança das operações, e dos treinamentos simulados próximos a realidade do vôo. Neste sentido, também o sistema de aviação civil brasileiro sofreu mudanças, principalmente o órgão normatizador da aviação civil no Brasil, o DAC, criado em 1931 no governo Getúlio Vargas com o nome de Departamento de Aeronáutica Civil, passando em 1941 para a subordinação do antigo Ministério da Aeronáutica como Departamento de Aviação Civil, e na sua nova realidade desde 2005 como ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil, uma autarquia federal da união, que é o órgão regulador da aviação civil no Brasil. Segundo os últimos dados do anuário de transporte aéreo publicado pelo antigo órgão normatizador, o Departamento de Aviação Civil, o ano de 2004 foi de retomada de crescimento e consolidação da economia brasileira, uma vez que, auxiliada por ambiente externo favorável e políticas fiscal e monetária austeras, avançou em várias direções. No âmbito externo a grande preocupação foi com a economia norte-americana (a desvalorização do dólar ante as principais moedas, grandes déficits fiscais) e com a subida do preço do petróleo. Com o crescimento do PIB na ordem de 5,2%, a economia brasileira colecionou recordes em 2004, como o crescimento de 6,2% na Indústria, com forte retomada da demanda doméstica que cresceu 4,3%. Foi o melhor resultado desde 1995. Em valores correntes, o PIB brasileiro alcançou o valor de R$ 1.799 bilhões, e o PIB per capita, cresceu em 3,7 % no ano, alcançando o valor de R$ 9.995,72 (IBGE, 2004). Ainda segundo o IBGE (2004) a reativação da demanda doméstica obteve destaque no ano de 2004, e ocorreu, principalmente, pela expansão da concessão de crédito para as pessoas físicas em 22,2% e de um aumento em seus rendimentos na ordem de 1,5%. A demanda interna aquecida incentivou o investimento para aumentar a capacidade produtiva do país. Por isso, o salto dos investimentos no país em 2004 foi de 10,9%, taxa que não se via no Brasil desde 1994. O Real se valorizou perante a moeda norte americana, o que fez com que os segmentos exportadores exercessem pressão para atuações do governo tentando conter a queda do dólar. Assim, a taxa de juros foi o principal instrumento de política monetária utilizado para conter o crescimento da inflação durante o ano, sendo que a apreciação do real frente ao dólar norte americano também contribuiu para a redução dos índices de inflação no período. A inflação oficial do ano de 2004 foi de 6,27% IPC/FGV (FGV, 2004). O setor externo foi mais uma vez a principal fonte de sustentação da atividade econômica, segundo a FGV (2004), com as exportações aumentando 32,2 % em relação a 2003, totalizando US$ 96,475 bilhões. As importações se elevaram em 30,0 %, acumulando US$ 62,779 bilhões em 2003, resultando num superávit na Balança Comercial de US$ 33,7 bilhões em 2004, contra US$ 23,5 bilhões de 2003. Há que ser registrada a elevação do nível de reservas cambiais combinada com a redução da divida externa, cuja relação, no final de 2004 3 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 equivalia a 24,5%, enquanto que no ano anterior era de apenas 22,9% (há cinco anos atrás as reservas equivaliam a apenas 15,2% da dívida externa total). A atividade econômica do país afeta diretamente o desempenho da atividade do transporte aéreo, sendo que o preço do combustível e a trajetória do câmbio são as variáveis que mais influenciam os custos incidentes nas operações do setor. O combustível é o insumo de maior peso na composição dos custos, 27% e, vindo em seguida com 22% de representatividade, outros insumos da atividade, cujos custos são atrelados à moeda norte-americana (DAC, 2005). O preço médio do combustível de aviação pago pelas empresas aéreas em 2004 aumentou, aproximadamente, 31,54% em relação ao preço médio de 2003. Essa variação no preço do QAV (querosene de aviação) afetou os custos da indústria da aviação em aproximados 8,5%. O resultado das medidas adotadas para o segmento doméstico, com o objetivo de adequar a indústria à realidade de mercado, em especial, a adequação da oferta de assentos à demanda disponível, conforme dispôs a Portaria nº 243/GC5, de 13 março 2003, pode ser constatado na recuperação observada na indústria no acumulado do ano de 2004, quando comparado ao ano anterior, segundo dados do DAC. No Brasil, aproximadamente 90% da receita das empresas aéreas é proveninete do valor pago pelas passagens. As outras atividades, contribuem muito pouco para a composição da receita final, conforme tabela 1, o que colabora com o crescimento do setor de trasporte de passageiros. Item 1999 Passagens 83,7 Fretamentos 5,2 Correios 0,7 Carga 9,7 Outros 0,7 Total 100,0 Fonte: DAC (2005) 2000 85,2 5,3 0,8 8,5 0,3 100,0 2001 85,8 4,2 1,9 7,8 0,3 100,0 2002 88,3 2,5 1,8 7,2 0,2 100,0 2003 88,1 2,6 2,5 6,5 0,3 100,0 2004 87,0 3,0 2,1 7,3 0,6 100,0 Tabela 1: Composição da receita por setor da atividade A evolução do tráfego aéreo doméstico é uma realidade. A tabela 2 que mostra a evolução do número de passageiros transportados pelo setor, segundo dados do DAC (2006). De 2001 a 2005, a TAM, lider so setor, quase dobrou o número e passageiros transportados, principalmente pela crise na VARIG e pelo aumento de novas rotas. Outro aspecto importante é o crescimento de empresas, como a GOL, que surge em 2001 e que alcança em 5 anos 800% de aumento no número de passageiros, principalmente pelo valor diferenciado da sua tarifa; e da TOTAL, que também em 5 anos aumenta o número de passgeiros transportados em mais de 500%, com o incremento de rotas regionais. EMPRESAS TAM GOL VARIG 2001 2002 2003 2004 2005 5.858.670 814.616 5.694.859 7.300.274 369.312 5.368.564 6.044.667 3.500.241 5.615.013 7.123.494 4.405.059 6.063.204 10.178.422 6.361.388 6.639.862 4 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 BRA TOTAL 22.609 RICO 47.167 RIO SUL 1.757.369 TRIP 25.483 OCEANAIR PANTANAL 78.210 NORDESTE 572.591 WEBJET PUMA ATA META 31.779 PASSAREDO 11.646 CRUISER MEGA ABAETÉ 2.339 TEAM VASP 2.869.128 TAVAJ 30.064 PENTA 60.221 TRANSBRASIL 1.851.156 Total de passageiros 19.727.908 Fonte: DAC (2006) 38.404 56.879 1.788.148 16.553 74.589 838.656 57.558 50.624 556.383 38.466 24.736 51.171 213.789 66.461 118.628 164.468 54.634 63.929 54.103 134.000 2.738 9.314 16.464 24.909 4.703 20.916 20.633 1.873 2.501 1.639 2.643.838 27.578 15.958 2.321.364 26.875 7.957 2.330.874 8.756 8.048 18.572.976 18.541.574 20.634.395 260.405 134.964 131.404 128.802 98.147 79.631 56.072 40.665 34.147 16.176 15.557 8.625 7.857 6.861 2.054 1.901 1.366 24.204.306 Tabela 2: Passageiros transportados A globalização tem grande influência no processo de evolução do transporte aéreo. O número de acordos no setor, o chamado code share, entre empresas nacionais e de outros países é uma prática constante. Mas, mesmo com toda esta evolução no setor existe uma grande lacuna no que tange a responsabilidade social das empresas aéreas. Além disso, o crescimento da frota, e o número de vôos (ANAC 2006) intensificam as operações e colocam em risco a sustentabilidade do planeta. Neste sentido, o pensamento de evolução neste setor deveria passar pela construção de aeronaves com motores menos poluentes ou uma melhor distribuição da malha aérea para que as empresas tenham menos vôos, porém com mais passageiros. Se não for assim, o quadro atual de evolução e poluição torna-se insustentável. Toda a movimentação do setor, envolve serviços onde as empresas aéreas não contemplam em contrato o item responsabilidade social para. A terceirização no setor é uma realidade nas mais diversas áreas. Das empresas que prestam serviço de limpeza, aos fabricantes de turbina, passando pelos responsáveis da composição do combustível de aviação, as empresas aéreas tem pouco poder de negocição. Um contrato mais rígido, com preocupação no impacto ambiental poderia aumentar os custos, cenário menos desejado neste momento. 3. Impactos do transporte aéreo A realidade imposta ao setor de aviação, pelas mudanças econômicas e sociais no mundo, levou as empresas a confrontar-se com problemas básicos de falta de planejamento estratégico adequado – fato evidenciado com o excesso de oferta, a elevação do preço do combustível e a 5 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 política tarifária praticada para o mercado doméstico, assim como os efeitos ainda sentidos dos atentados de 11 de setembro de 2001 no mercado internacional, que foram fatores decisivos no resultado global do setor: prejuízo de R$ 855 milhões (DAC, 2001). Segundo a ANAC, nos últimos oito anos, dez empresas deixaram de operar, a saber: Transpbrasil, Vasp, BRA, Rio-Sul, Nordeste, Nacional, Airvias, Tavaj, Varig e Fly. Mas, mesmo com esta instabilidade do setor, outras empresas surgiram, com melhores preços, o que aumentou a demanada e por consquencia uma maior oferta de vôos (DAC, 2006), o que leva a uma maior poluição atmosférica e sonora. Segundo Rocha (2008) outros gases de efeito estufa (como óxidos de nitrogênio e vapor de água) lançados na atmosfera pelos aviões podem potencializar os efeitos do CO2 sobre o clima por conta das grandes altitudes em que são emitidos. A emissão de dióxido de carbono é de 6,5 kg de carbono por passageiro da decolagem ao pouso e 0,02 kg por passageiro/kilometro (KAREN et al, 2008). A comunidade científica ainda está avaliando o grau de interferência desses gases no processo de aquecimento global. No relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), as emissões do transporte aéreo devem aumentar devido ao aumento do uso dessa modalidade de transporte, mas também porque existe uma assimetria. Enquanto o setor cresce, em média, 5% ao ano, os avanços em economia de combustível não superam os 1% a 2% anuais, o que não é suficiente para contrabalançar os 5% de aumento de uso de transporte áereo. No Brasil, segundo a Infraero, em virtude do feriado prolongado do dia 1º de maio, a média nacional de vôos atrasados com 30, 45 e 60 minutos nos aeroportos da rede foi de 19,71%; 10,26% e 7,17%, respectivamente, até o dia 05 de maio de 2008. Os números indicam que, mesmo com o novo parâmetro de atraso (30 min), a média de atraso nos últimos meses manteve-se semelhante, conforme a figura 3 Vôos em todos os Aeroportos da rede 30 minutos 45 minutos 60 minutos Jan 24,96% 16,10% 10,97% Fev 18,66% 11,42% 7,61% Mar 20,22% 12,36% 8,16% Abr 18,13% 10,84% 6,84% Até dia 5 de maio 19,71% 10,26% 7,17% Fonte: : INFRAERO (2008) Tabela 3: Atraso de vôos Os atrasos nos vôos podem acontecer por inúmeros motivos, porém uma aeronvae que permanece no solo por mais tempo com o motor funcionando, ou uma espera em órbita contribuem para um aumento da poluição atmosférica. 6 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 4. Responsabilidade social e desenvolvimento sustentável Para a aviação civil brasileira o assunto é novo, uma vez que as empresas adotam modernas tecnologias, voam em novas rotas, ampliam suas operações, mas falta vivência na área de desenvolvimento sustentável. Segundo o Instituto Ethos (1999) as empresas são agentes de promoção do desenvolvimento econômico e do avanço tecnológico e devem ter compromisso com a promoção do desenvolvimento global. A crescente interdependência, o bem-estar da humanidade dependem de ações corporativas em nível local, regional e nacional. Torres (2003) relata que algumas organizações brasileiras têm levado em conta suas relações com a comunidade, com o meio ambiente e com seu próprio corpo de funcionários e que estas relações tornaram-se uma questão de estratégia financeira e de sobrevivência empresarial, e ao se pensar a longo prazo: a responsabilidade social desenvolve humanização e ética. A responsabilidade social é um processo dinâmico, pois problemas e soluções vão aparecendo e se alterando; e no transporte aéreo o dinamismo é a base do setor. Portanto a aviação precisa ser tratada no contexto amplo de uma política de desenvolvimento sustentável. E o conceito de desenvolvimento sustentável, segundo relatório da Comissão Brundtland (1987) é aquele que satisfaz as necessidades das gerações atuais, sem por em perigo a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas. 4.1. Conceituações e algumas experiências Segundo Simon (1976) apud Silva (2005) a participação empresarial com o assunto meio ambiente tem suas raízes em 1976 no movimento surgido nos EUA, “the crisis of confidence in American Business” (a crise da confiança nos negócios americanos) e teve suas concepções básicas iniciadas na Conferência de Estocolmo em 1972. Segundo Vinha (2000) o marco histórico foi a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, em 1992. Segundo Corrêa (2003), responsabilidade social empresarial é o compromisso contínuo nos negócios pelo comportamento ético que contribua para o desenvolvimento econômico, social e ambiental, pressupondo a realização de decisões empresariais que sejam resultado da reflexão sobre seus impactos sobre a qualidade de vida atual e futura de todos que sejam afetados pela operação da empresa. Para Holliday et al (2002), a necessidade de envolvimento empresarial nas questões ambientais e sociais tornou-se mais evidente. Na década de 1990, empresas como a Shell e a Nike encontravam-se despreparadas para levar a conscientização dos consumidores até as salas dos conselhos de administração. A Shell foi atingida com mais intensidade ao pretender descartar sua plataforma flutuante de exploração de petróleo Brent Spar e por mostrar-se insensível aos direitos das minorias em suas operações na Nigéria. Para que a empresa possa atender aos objetivos de lucro e permanecer no mercado, o comportamento empresarial têm sido constantemente reformulado, recriando maneiras de estender benefícios à sociedade. Recentemente, uma perspectiva mais ampliada vem conquistando adeptos, o chamado "Diálogo com Grupos Envolvidos" ou “Stakeholder 7 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 Dialogue”, que é um processo em que os interesses dos grupos envolvidos são ouvidos e as informações compartilhadas, a ponto de se construir um relacionamento necessário para evitar futuros conflitos (The Environment Council, 2002). O recente engajamento empresarial revê esta relação em prol dos benefícios sociais e da preservação ambiental e tem proporcionado às empresas um valioso suporte e aprovação dos consumidores e trabalhadores (Pinto, 2003). Uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo, a Merck, formou uma parceria com um centro de pesquisas da Costa Rica, a INBio, para estudar e preservar insetos e plantas na floresta tropical porque se sentiu ameaçada com sua destruição. A Merck fornece, desde 1991, fundos e tecnologia ao INBio, este coleta a biodiversidade para maiores explorações científicas e descobertas de novas drogas e ambos contribuem para o apoio à floresta tropical porto-riquenha. É um acordo entre um país tropical, uma corporação multinacional e uma universidade com benefícios evidentes para todos os envolvidos (Mcintosh et ali, 2001). Em função da conscientização pública e do surgimento da legislação ambiental cresce a necessidade das companhias em se adequar às preocupações ambientalistas para serem percebidas como “verdes” (Banerjee, 2002). A única empresa aérea brasileira com iniciativa de responsabilidade social parece ser a Gol, quando divulga a realização dos vôos com crianças de orfanato, mas que não deixa de representar um nível mais primário de cunho assistencialista. Na aviação brasileira os exemplos de desenvolvimento sustentável não foram encontrados numa análise exploratória. Em contrapartida, na Suíça, atualmente, estão sendo realizados testes de “vôos verdes”, com introdução de novas tecnologias para economizar combustível, segundo a National Aerospace Laboratory (2008). A principal novidade é uma melhor comunicação entre os pilotos e os controladores de vôo para evitar as “filas” de aviões à espera de autorização para pousos e decolagens. Durante a espera, as aeronaves são obrigadas a voar em círculos, queimando combustível desnecessariamente. Com a tecnologia dos vôos verdes, os controladores têm como organizar melhor ou mesmo eliminar a necessidade de uma “fila” de aviões no céu. Existem também empresas estrangeiras que realizam vôos neutros em carbono, plantando árvores que absorvam uma equivalente à quantidade de CO2 emitida. Embora seja uma medida apenas paliativa, deve ser valorizada. Mas, no Brasil, isso ainda não ocorre. 4.2. Recomendações para o setor de aviação civil Em 2003 a Organização de Aviação Civil Internacional - OACI e a International Air Transport Association - IATA produziram materiais de orientação recomendando medidas operacionais para minimização de uso de combustível e redução de emissões. No ambito nacional, segundo a Anac, para diminuir as emissões, as empresas devem otimizar as trajetórias dos vôos e adotar um melhor gerenciamento no solo, por meio da redução do tempo em que os motores ficam acionados, além de investirem em aviões mais eficientes. Entretanto, segundo o jornal valor econômico a política do governo federal é de aumento do número de linhas aéreos e de empresas. 8 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 A gestão empresarial que tenha como referência apenas os interesses dos acionistas revela-se insuficiente no novo contexto. Ele requer uma gestão balizada pelos interesses e contribuições de um conjunto maior de partes interessadas (stakeholders). A busca de excelência pelas empresas passa a ter como objetivos a qualidade nas relações e a sustentabilidade econômica, social e ambiental. Os Indicadores Ethos propõem-se a ser uma ferramenta para a promoção desses objetivos. Estes indicadores poderiam funcionar como uma recomendação inicial por parte do órgão central de aviação civil no Brasil para que as empresas áreas iniciassem um novo ciclo de responsabilidade social e desenvolvimento sustentável. A partir do quadro atual da aviação brasileira, foi feita uma adaptação dos Indicadores Ethos setorial de responsabilidade social empresarial do setor de transporte rodoviário de passageiros para o transporte aéreo, com enfase no desenvolvimento sustentável. Assunto Questionamentos para a empresa aérea Meio ambiente Existe comprometimento da empresa com a causa ambiental? A empresa tem controle sobre os impactos e responsabilidade ambiental em toda a sua área de operação ou concessão? Está estabelecida e opera em conformidade com o estatuto da cidade quanto ao meio ambiente? Participa de programas de redução de consumo e de emissão de poluentes veiculares proposto por entidades do setor? Desenvolve programa de preservação ou recuperação de área verde no entorno das suas unidades de negócio? Investe e participa de ações de educação ambiental voltadas para as comunidades integrantes da sua área de operação ou concessão? Utiliza os espaços internos do avião para promover campanhas de conscientização do usuário sobre poluição e preservação do meio ambiente? Desenvolve programa de redução de emissão de poluentes das suas aeronaves ou de terceiros a seu serviço quanto a: ruídos (limites de decibéis de acordo com a legislação), e redução de CO2 e outros gases?. Investe na aquisição de novas tecnologias e de equipamentos ecologicamente corretos? Desenvolve projeto para aproveitamento de água pluvial e/ou reaproveitamento de água potável nas operações de limpeza da frota e hangares? Possui estação de tratamento (armazenagem, destinação e reaproveitamento) de efluentes líquidos oriundos da lavagem de aeronaves, motores e outros equipamentos? Possui estação de tratamento (armazenagem, destinação e reaproveitamento) de resíduos graxos – tinta, óleo, solvente, e estopa? Desenvolve programa de armazenagem, destinação e reaproveitamento de resíduos recicláveis? (sucata) – pneus lâmpadas, papel, filtro, ferro, alumínio, plástico Disponibiliza indicadores de desempenho dos produtos adquiridos, a fim de permitir aos fornecedores parâmetros técnicos comparativos de desempenho e qualidade? Estabelece parceria com fornecedores para desenvolvimento de novas tecnologias de segurança, desempenho e meio ambiente? Abre as portas da empresa para que os fornecedores testem novas tecnologias e novos equipamentos de segurança, desempenho e meio ambiente? Respondeu, nos últimos três anos, a processos relacionados a saúde e segurança do cliente? Educação e conscientização ambiental Fornecedores Consumidores e clientes– política de comunicação comercial Teve nos últimos cinco anos, aeronaves retiradas de circulação por pressão de 9 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 clientes ou de órgão fiscalizadores? Na participação em projetos sociais governamentais Adaptado de Ethos (2003) Participa ativamente de campanhas e projetos promovidos pelo governo/poder concedente, sobre segurança na aviação, cidadania, meio ambiente e segurança? Tabela 4: Indicadores Ethos para empresas aéreas 4.3. Dificuldades e barreiras As expectativas da Agência Nacional de Aviação Civil apontam para um crescimento de cerca de 18% do setor de transporte aéreo no Brasil, em 2008. Expansão, maior ou menor, deve se dar em todo o mundo, o que tem preocupado os cientistas, uma vez que as emissões de gás carbônico (principal responsável pelo agravamento do aquecimento global) pelos aviões – por conta da queima de combustível fóssil - respondem por 2% do total de emissões provenientes de atividades humanas. Conforme a ANAC, a quantidade de CO2 emitida em cada vôo depende do tipo de aeronave, mas, em média, atinge 70 gramas por passageiro por quilômetro. Em uma viagem de ida e volta de Porto Alegre a Recife uma aeornave emite 1,9 tonelada de gás carbônico por passageiro. Essa mesma quantidade de CO2, que o homem levou apenas algumas horas para emitir, levaria 37 anos para ser absorvida por 13 árvores da Mata Atlântica em seu processo de fotossíntese (ONG Iniciativa Verde, 2008). No relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), as emissões do transporte aéreo devem aumentar devido ao aumento do uso dessa modalidade de transporte, mas também porque existe uma assimetria. Enquanto o setor cresce, em média, 5% ao ano, os avanços em economia de combustível não superam os 1% a 2% anuais, o que não é suficiente para contrabalançar os 5% de aumento de uso de transporte áereo. Um dos traços mais impactantes da recente evolução da economia mundial tem sido a integração dos mercados e queda das barreiras comerciais. Para grande parte das empresas, isso significou a inserção, muitas vezes forçada, na competição em escala planetária. Em curto espaço de tempo, elas viram-se compelidas a mudar radicalmente suas estratégias de negócio e padrões gerenciais para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades decorrentes da ampliação de seus mercados potenciais, do surgimento de novos concorrentes e novas demandas da sociedade. Na era da informação, da nova economia, são profundas as mudanças no modo de as sociedades se organizarem. Alteram-se os papéis dos Estados nacionais, das empresas e das pessoas. Esse contexto apresenta como desafio para as empresas a conquista de níveis cada vez maiores de competitividade e produtividade, e introduz a preocupação crescente com a legitimidade social de sua atuação. Como resposta, as empresas passam a investir em qualidade, num aprendizado dinâmico que se volta inicialmente para os produtos, evolui para a abordagem dos processos, até chegar ao tratamento abrangente das relações compreendidas na atividade empresarial, com os 10 XXVIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2008 empregados, os fornecedores, os consumidores e clientes, a comunidade, a sociedade e o meio ambiente. 5 – Conclusão A Anac garante que a frota de aeronaves comerciais do Brasil é uma das mais modernas do mundo. A agência lembra que uma aeronave produzida na década de 70 emitia 50% mais gases de efeito estufa por passageiro por quilômetro do que os aviões utilizados atualmente pelas linhas aéreas brasileiras. Boa parte dessa modernização se deve à competição entre as empresas fabricantes em busca de aviões com menores custo operacional e consumo de combustível. O consumidor também pode estimular positivamente esse processo, preferindo voar com empresas que utilizem aeronaves tecnologicamente mais eficientes e menos poluentes. Num país de dimensões continentais como o Brasil, em que alternativas menos poluentes como os transportes ferroviários e hidroviários são pouco desenvolvidos, as viagens de avião muitas vezes são inevitáveis. Diante deste quadro, a obrigação de uma certificação verde por parte das empresas aéreas brasileiras, seria um importante instrumento a ser adotado pela ANAC e pelo Ministério do Meio Ambiente diante da evolução do setor. Uma profunda reflexão sobre o futuro do planeta, passa por uma conscientização de governos, empresas aéreas e consumidores. O momento atual exige regras e ações efetivas com grande dinamismo. Uma empresa de transporte aéreo no Brasil tem algumas formalidades para ser homologada, mas outras exigências deveriam fazer parte do protocolo inicial, como uma certificação verde de caráter obrigatório sob a supervisção da Agencia Nacional de Aviação Civil e do Ministério do Meio Ambiente. Mesmo com o pequeno percentual, de 2% do total de emissões provenientes de atividades humanas, nas emissões de CO2, o crescimento do setor a cada ano aponta para a necessidade de recomendações específicas. Neste sentido, a introdução de um programa de responsabilidade social para as empresas aéreas, assim como um monitoramento efetivo é uma necessidade urgente. Esta concepção inicial com os indicadores do instituto Ethos seria um modelo interessante para a saída deste estado de inércia que se encontra o setor. Referências ANAC. Dados Estítisticos sobre transporte aéreo. 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