EDITORIAL
Para esta edição da Revista FÓRUM PATRIMÔNIO levantou-se um tópico que vem
atraindo cada vez mais a atenção dos especialistas em Patrimônio Cultural, nas suas mais
amplas perspectivas e manifestações: “Patrimônio e Novas Mídias: Digitalização e
Geoprocessamento”. Se, em sua grande maioria, são antigos os objetos patrimoniais, bem
como os instrumentos que lhes conferem valor, a exemplo do tombamento, o mesmo não
ocorre (e nem deve ocorrer) com as tecnologias envolvidas em sua análise, preservação e
registro.
Lançando mão de inúmeros recursos avançados disponíveis na contemporaneidade, o
profissional adianta-se a passos largos rumo a uma maior compreensão do bem cultural a
ser protegido, compreensão esta que conduzirá a uma conservação verdadeiramente
preventiva e eficaz.
É o que podemos observar no primeiro artigo, que versa sobre uma tecnologia que há mais
de um século tem acompanhado a documentação do patrimônio: a fotografia. Os avanços
tecnológicos elevaram a captura de imagens a um outro patamar, reconstruindo o seu
papel e relevância. Neste novo paradigma, a fotografia ultrapassa o congelamento
imagético de um objeto para se tornar um instrumento científico de sua análise e registro
documental. Em a “Documentação Fotográfica Digital de Bens Culturais: O exemplo do
Laboratório de Documentação Científica da EBA/UFMG”, Paulo Batista apresenta os
trabalhos desenvolvidos no LDC da Escola de Belas Artes da UFMG, instalado nas
dependências do CECOR – Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais
Móveis. Não se restringindo somente à percepção da fotografia como meio de reprodução
da imagem, o professor explora as formas de tratamento, impressão e arquivamento das
mesmas. Aponta ainda para os problemas específicos deste campo do conhecimento,
discutindo suas possíveis soluções e sua contribuição como recurso investigatório das
características materiais peculiares e minuciosas do bem a ser conservado.
No segundo artigo – “Digitalização e Gerenciamento do Acervo sobre Conservação e
Restauração de Bens Culturais Móveis do CECOR”, a parceria entre o CECOR,
representado pelo professor Luiz Souza, com o Núcleo de Processamento Digital de
Imagens do Departamento de Ciência da Computação, representado pelo professor
Arnaldo Araújo e pelo pesquisador Flávio Nunes, resultou num trabalho que apresenta
alguns pontos importantes no desenvolvimento de aplicações para gerenciamento de
acervos de imagens, como a preservação digital e o projeto de aplicações de hipermídias.
Quanto à preservação digital, os autores se reportam ao fato de que a capacidade de
registrar informações aumentou exponencialmente, enquanto a longevidade dos recursos
de armazenamento decresceu de modo proporcional. Assim, manter os dados “frescos” e
codificados em formatos que possam ser lidos pelos novos sistemas de hardware e
software pode ser mais importante do que a própria durabilidade da mídia suporte. Quanto
aos projetos de hipermídia, podemos perceber que se trata de processos desafiantes,
envolvendo pessoas de variadas habilidades, como autores, bibliotecários, projetistas de
conteúdo, artistas, músicos e programadores - somente para citarmos alguns, com o intuito
de percebermos a complexidade do tema.
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Na esteira do segundo, temos o terceiro artigo, intitulado “Preservação Digital da Obra de
Guignard, importante pintor modernista brasileiro”, em que a equipe transdisciplinar do
projeto da UFMG “Pesquisa Guignard” apresenta a digitalização como instrumento de
análise e registro, envolvendo ainda áreas diversas como história da arte, conservaçãorestauração, computação, informação e educação. Outra contribuição do projeto
acontecerá por meio da criação de um Museu Virtual das obras deste pintor, a ser
disponibilizado via Internet, alargando o acesso e uso cultural de um acervo artístico de
valor inestimável e garantindo a preservação digital dentro de uma estrutura denominada
SIMPG – Sistema de Informação Multimídia para a Pesquisa Guignard.
Nos dois próximos artigos, encontramos um recurso instigante: a fotogrametria. Quase tão
antiga quanto a própria fotografia, esta técnica de geração de informação métrica e
descritiva de uma superfície ou de objetos por meio da fotografia demanda conhecimentos
profundos dos parâmetros do equipamento (a câmara), bem como de geometria. Ao longo
do tempo, os processos se complexificaram, mas ao mesmo tempo ampliaram seu
potencial de uso e precisão. E como a documentação fotogramétrica pode servir à
conservação do patrimônio histórico? De que modo a tecnologia digital pode contribuir para
os processos de documentação fotográfica das cidades? Elucidar algumas respostas
possíveis para estes questionamentos é o objetivo do pesquisador e arquiteto Wagner
Rezende, em seu artigo “Fotogrametria Digital e Patrimônio Histórico: uma proposta
metodológica”. Neste artigo, o autor se aprofunda nas análises metodológicas do recurso,
desde as descrições dos equipamentos até os resultados obtidos pelos mesmos.
Prosseguindo a exploração da fotogrametria aplicada ao patrimônio edificado, temos o
artigo “A Fotogrametria Digital na Documentação do Patrimônio Arquitetônico”, de Natalie
Groetelaars e Arivaldo Amorim, ambos da Universidade Federal da Bahia. O trabalho
descreve experimentos práticos e suas conseqüentes análises no que tange às
ferramentas adotadas em diversas situações, tais como: complexidade do objeto, tipos de
produtos requeridos (fotos retificadas, desenhos e modelos geométricos tridimensionais
fotorrealísticos), níveis de precisão e de detalhamento desejados. Para tanto, são relatados
os processos utilizados na restituição digital de dois retábulos e uma capela. A demanda de
reproduções métricas dos bens culturais se calca em propósitos diversos, como registro
documental, projetos educacionais, aprofundamento teórico do bem, conhecimento e
determinação das suas técnicas de produção, análise de suas patologias e estruturação de
uma base de dados precisos que permita estabelecer as intervenções necessárias para
sua conservação-restauração e seus custos envolvidos. A serviço dessas demandas, surge
um novo equipamento fotográfico, cuja captura ocorre por meio do sistema de varredura a
laser. O escaneamento a laser de edificações e espaços urbanos revolucionou a forma de
se registrar informações construtivas de detalhe. Scanners a laser (Laser Scanner – LS)
podem capturar até 12.000 pontos por segundo ou mais, registrando não somente as
dimensões, mas também a localização espacial, cor e textura do objeto alvo. Resulta, ao
mesmo tempo, no levantamento fotográfico, métrico/dimensional e num modelo virtual 3D
de altíssima precisão. Trata-se, portanto, de uma fotografia tridimensional metrificada.
Descrever o funcionamento da tecnologia LS, apresentar um estudo de caso específico e
discutir as potencialidades do recurso é o que procuramos realizar em um artigo de nossa
autoria, intitulado: “Tecnologias de Escaneamento a Laser e Engenharia Reversa aplicadas
ao Patrimônio Cultural Urbano e Arquitetônico: Levantamento Métrico + Modelagem Virtual
+ Fotografia + Maquete Perfilada por Usinagem”. As tecnologias LS caminham ainda no
mesmo sentido das tecnologias de Geoprocessamento, a saber, enumeramos algumas:
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Sistema de Posicionamento Global (GPS), Sensoriamento Remoto (RS), Sistemas
Informativos Geográficos (SIGs), além da supracitada Fotogrametria. Compreender a
importância do Geoprocessamento na Gestão do Patrimônio Histórico é o desafio proposto
pela professora Ana Clara Moura, do Departamento de Cartografia da UFMG. Enfocando,
como exemplo, o caso de Ouro Preto, a autora aborda diferentes aplicações do
geoprocessamento: montagem de base de dados, conversão de dados, montagem de
Sistema Geográfico de Informação, construção de análises diagnósticas e prognósticas.
Estas aplicações e outras contribuições encontram-se em seu artigo “Geoprocessamento
na Gestão do Patrimônio Histórico”. Do macro ao micro, do planejamento urbano aos
elementos construtivos, a tecnologia fotográfica nos reporta a excelentes resultados.
Enquanto as metodologias até o momento apresentadas objetivam esmiuçar o exterior do
bem cultural em sua totalidade, a fotografia aliada à termografia nos permite desvendar os
seus segredos interiores, tantas vezes ocultos aos olhos, mas de revelação imprescindível.
Pesquisar e avaliar os resultados do emprego de técnicas de aferição da transferência de
calor a serviço do diagnóstico da presença de estruturas ocultas e de anomalias nas
edificações culturais é tarefa do artigo apresentado pelo Engenheiro Eduardo Cabaleiro,
professor da Escola de Arquitetura da UFMG: “Estado da Arte da Termografia”. Neste
artigo, ficam claras as vantagens da utilização de registros termográficos na condução de
ensaios não-destrutivos em bens de valor histórico, cuja integridade física é condição mais
do que desejável, quando não sine qua non. São tantos os benefícios obtidos pelas
diversas tecnologias midiáticas, aplicadas ao Patrimônio Cultural, que Arivaldo Amorim,
Natalie Groetelaars e Eugênio Lins optaram por reunir o maior número possível destas em
um só lugar. No último artigo desta edição – “Um Centro de Documentação do Patrimônio
Arquitetônico” - os autores tratam do desafio de se lidar com o patrimônio histórico, artístico
e cultural do Estado da Bahia, um dos mais ricos e significativos conjunto de bens a serem
preservados e registrados em nosso país. Neste sentido, a criação de um Centro de
Documentação junto à Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia
agruparia o esforço comum de tantas outras instituições, como o IPHAN (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e o IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e
Cultural do Estado da Bahia). Ali, as novas tecnologias reunidas se colocariam a serviço da
conservação preventiva e do registro do nosso vasto patrimônio. E aqui, encerramos esta
edição, inteiramente dedicada à completa captura e desvendamento, por meio das novas
mídias, dos aspectos materiais que compõem a nossa cultura. Ao preservá-los, garantimos
que se perpetuem a nossa história e os nossos valores, ao servirem como suporte eficaz
de tantos outros aspectos seus... incapturáveis, intangíveis, imensuráveis!
Belo Horizonte, agosto de 2008.
Ana Cecília Rocha Veiga
Co-editora
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