AVALIAÇÃO DE RISCO COMO FERRAMENTA
PARA AUXILIAR O SISTEMA DE APOIO A
DECISÃO EM INDÚSTRIAS DE ALIMENTOS
Vânia Ferreira Roque, M.Sc.
Docente CCEAE/UNISUL - Doutoranda do EPS/UFSC
Florianópolis - SC - CEP: 88036-971 - Caixa Postal – 6018 - E-mail: [email protected]
João Ernesto E. Castro, M.Sc.
Docente EPS/UFSC
Florianópolis - SC - CEP: 88036-971 - Caixa Postal – 6018 - E-mail: [email protected]
ABSTRACT
The production of safe food is an essential requirement of any food industry and it is very
dangerous to work without this requirement, situation which could damage the health of the
industry’s client.
Some methodologies have been developed to try to improve the information management that is
used to help the decision making process.
This paper is about the usage of risk estimation as a helpful decision support system tool. Also, it’s
presented a model that integrates the major methodologies of safe food production and includes
removal or reduction of problems.
KEYWORDS: risk, decision system
Resumo
Produzir um alimento seguro é um dos pré-requisitos essenciais em qualquer empresa do setor
alimentício, pois sua ausência, muitas vezes, acarreta danos e injurias a saúde do consumidor,
podendo trazer conseqüências irreversíveis.
Frente a este fato, metodologias vem sendo desenvolvidas para melhor gerenciar informações que
são utilizadas para auxiliar no processo de tomada de decisão a nível operacional.
Este estudo, fundamenta-se na utilização da avaliação de risco como uma ferramenta para auxiliar
os sistemas de apoio a decisão em indústrias de alimentos. Também é apresentado um modelo de
interação entre as metodologias com o intuito de produzir um alimento seguro, seja pela redução ou
eliminação dos perigos, detectados durante sua elaboração.
1. INTRODUÇÃO
Tradicionalmente, a segurança alimentar é avaliada através de testes aleatórios de amostras
coletadas na linha de produção e, baseando-se exclusivamente nestes, são tomadas as decisões de
aceite ou rejeição dos lotes produzidos.
No caso das indústrias alimentícias, somente através da análise da totalidade dos lotes pode-se
decidir com segurança sobre o futuro do produto final. Entretanto, os aspectos destrutivos dos
ensaios inviabilizam a meta de tomar uma decisão 100% segura.
Para auxiliar neste propósito, com o intuito de minimizar as perdas oriundas da supressão dos
materiais nas amostras, várias metodologias são desenvolvidas, entre elas destaca-se a Análise de
Risco. Esta apresenta-se como uma potente ferramenta para garantir a segurança alimentar, e é
reconhecida
pelo Codex Alimentarius, a mais importante coleção de normas alimentares
apresentadas de um modo uniforme, sendo documento parte do comitê da FAO (Food
Adminstration Organization) pertencente a ONU (Órgão das Nações Unidas) e que objetiva a
proteção da saúde do consumidor e assegurar a aplicação de práticas equitativas no comércio de
alimentos.
A análise de risco preconiza a obtenção de dados a respeito dos perigos existentes nos alimentos e
tenta transferi-los ao Sistema de Apoio a Decisão da empresa para que se tomem as medidas
cabíveis a fim de evitar os efeitos dos agentes patogênicos na cadeia de processamento dos
alimentos. Esta análise é subdivida em avaliação, gerenciamento e comunicação de riscos, sendo
que a primeira etapa é o foco deste trabalho.
Desta maneira, as decisões de aceitação ou rejeição dos lotes não se restringem apenas a testes
laboratorias .
Como o objetivo de introduzir a análise de risco como uma ferramenta para auxiliar o Sistema de
Apoio à Decisão em empresa do setor alimentício serão abordadas neste trabalho aspectos das
interrelações e aplicabilidade desta ferramenta.
2. SISTEMA DE APOIO À DECISÃO
Os conceitos envolvidos no Sistema de Apoio a Decisão (SAD) são muito genéricos, e variam de
autor para autor segundo os seus princípios. Numa visão mais ampla define-se SAD como qualquer
sistema que apoia a decisão; numa visão mais restritiva, são sistemas interativos baseados em
computação, que auxiliam o tomador de decisão a utilizar modelos e dados para resolver problemas
não estruturados.
BANA & COSTA (1993) qualificam o processo de apoio a decisão, como um sistema aberto, que
na concepção sistêmica, um sistema aberto é aquele que influencia e sofre influências do ambiente
externo.
ROY (1985) define o processo sendo “a atividade daquele que, utilizando-se de modelos claramente
explicitados mas não necessariamente completamente formalizados, promove o apoio para a
obtenção dos elementos de respostas às questões que se faz um interventor em um processo de
decisão, elementos estes que concorrem para esclarecer a decisão e normalmente para sugerir um
comportamento de forma a aumentar a coerência entre evolução do processo e o sistema de valores
e objetivos do interventor.”
De um modo geral, pode-se dizer que os SAD objetivam permitir ao usuário manipular e selecionar
informações da maneira a ajudá-lo a tomar decisões melhores e mais informadas (REIMANN,
1985).
Primeiramente, um projeto de SAD deve ser muito mais analítico que outros sistemas, e ser
construído explicitamente com uma variedade de modelos de análises de dados. Segundo, é
projetado para que os usuários trabalhem diretamente com ele e, terceiro, este sistema é interativo
onde o usuário pode mudar hipóteses e incluir novos dados.
Em relação a segurança alimentar, as decisões a serem tomadas no processamento dos alimentos
concentram-se nos perigos que podem causar algum dano a saúde humana; sendo representados
pelos perigos físicos, químicos e microbiológicos. Destes, o último, por ser de mais difícil
percepção e apresentar conseqüências mais danosas, será o foco deste trabalho.
Em relação ao perigo microbiólogico define-se
como aquele provocado por ação de toxinas
produzidas por microrganismos patogênicos antes ou depois que o alimento foi ingerido, sendo que
a principal conseqüência é o envenenamento alimentar.
Objetivando minimizar as conseqüências provocadas pelos efeitos dos microrganismos presentes
nos alimentos, a avaliação de riscos será utilizada como ferramenta para o levantamento de
informações a respeito de características intrínsecas e extrínsecas que favorecem o crescimento
microbiano, fator primordial para a tomada de decisão na produção de alimento seguros.
3. DECISÕES BASEADAS NA AVALIAÇÃO DE RISCO
As decisões sobre riscos devem incluir medidas preventivas a serem adotadas com o intuito de
reduzir ou amenizar os seus efeitos. Dentre as metodologias mais aceitas encontra-se a Avaliação de
Riscos como uma metodologia de auxilio a decisões gerenciais e operacionais. Nas empresas do
setor alimentício enfoca-se a análise de risco para auxiliar decisões operacionais na produção de
alimentos seguros. Através desta metodologia pode-se identificar os agentes causadores do efeito
adverso e quantificar o perigo que ele traz, dessa maneira, numa empresa onde apresenta várias
rotinas e sub-rotinas, tem-se condições de decidir quais devem ser executadas prioritariamente.
A avaliação de riscos é definida pelo Codex Alimentarius, segundo SCHOTHRST (1997), como
uma “estimativa da severidade e probabilidade de danos provocados pela exposição de situações ou
agentes de perigos”.
LAMMERDING (1997) classifica a avaliação de risco em:
Â
Identificação de perigo:
Realiza-se pela observação e definição de tipos de efeitos adversos a saúde humana
associado com a exposição do agente patogênico, identifica quais os perigos são passíveis de
ocorrer no alimento; no caso dos agentes microbianos, o propósito é identificar os microrganismos
produtores de toxinas. Estas informações podem ser obtidas de dados de pesquisa científica ou de
literatura, base de dados já obtidos em testes de rotinas, especialistas, etc. Dados relevantes
incluem, entre outros, resultados de estudos epidemiológicos.
Em relação aos estudos epidemiólogicos, infelizmente, o conhecimento não é completo pois, muitas
vezes, os incidentes com doenças alimentares não são notificados às autoridades de saúde. E quando
são, não se fazem exames específicos para identificar a linhagem do microrganismo patogênico.
Um exemplo comum é a constatação de Escherichia coli em alimentos, enterobactéria anaeróbia
facultativa (FRANCO & LANDGRAF, 1996) que faz parte da flora intestino de animais de sangue
quente. A presença E. coli indica que o alimento teve uma contaminação microbiana de origem
fecal e portanto apresenta condições insatisfatórias de higiene. No caso específico de E. coli, outro
aspecto que deve ser considerado, a existência de várias linhagens comprovadamente patogênicas
para o homem.
Com base nos fatores de virulência, manifestações clínicas e epidemiologia, as linhagens de E. coli
consideradas patogênicas são agrupadas nas seguintes classes (FRANCO & LANDGRAF, 1996):
Â
Â
Â
Â
Â
EPEC (E. coli enteropatogênica clássica)
EIEC (E. coli enteroinvasora)
ETEC (E. coli enterotoxigênica)
EHEC (E. coli entero-hemorrágica)
EaggEC (E. coli enterogregativa)
A severidade das doenças pode ser definida pelo numero de casos hospitalizados/ número de casos
registrados durante um surto alimentar. O potencial de seqüelas também é um fator importante.
Informações de conhecimento de crescimento, sobrevivência de microrganismos, desenvolvimento
de bases de dados e modelos de dose-resposta são fortes aliados para auxiliar a identificação e
quantificar o potencial microbiológico de um alimento em particular..
Â
Caracterização de perigo:
Caracterização de perigo é a avaliação quantitativa e/ou qualitativa dos efeitos adversos associado
ao agente patogênico. Seu propósito é estimar a natureza, severidade e duração dos efeitos adversos
associados com danos provocados nos alimentos e no indivíduo atingido.
A avaliação da dose-resposta deve ser realizada para especificar a determinação entre o número de
microganismos ingeridos e a freqüência e severidade dos efeitos adversos resultado da ingestão.
Para agentes microbianos, elucidações sobre a natureza do patógeno e a interação com seu habitat
introduz alguns desafios nesta etapa, principalmente por causa da diversidade de microrganismos e
faixas de suceptibilidade e resistência na população humana.
Â
Avaliação de exposição:
A meta principal da avaliação da exposição é estimar o nível de agentes perigosos nos alimentos no
prazo de validade. Para obter estes dados, testes de estocagem e avaliação estatística devem ser
desenvolvidos, juntamente com os consumidores.
Um dos grandes problemas da avaliação de riscos microbiológicos é a exiguidade de informações
quantitativas de conseqüência da ingestão de um alimento contaminado com diferentes níveis de
microrganismos patogênicos. (BAIRD-PARKER, 1995)
O resultado da avaliação de exposição pode auxiliar na determinação de nível risco aceitável e
consequentemente no processo de apoio a decisão.
Segundo van SCHOTHRST (1998) nível risco aceitável é a adoção de considerações de impacto de
saúde
pública,
confiabilidade
tecnológica,
implicações
econômicas
que
garantam
o
desenvolvimento de alimentos seguros.
MACLER & REGLI apud BAIRD-PARKER (1995) enfatizam que a obtenção de risco aceitável
não deve considerar somente a diminuição de um risco, se isso acarretar o aumento de outro, como
é o caso de controle microbiológico de alimentos, onde a empresa usa substâncias químicas para
conter o crescimento microbiano. Neste caso, houve redução de risco por agentes microbianos, mas
aumentaram os provocados pela adição de agentes químicos.
Segundo ROSE et al. (1995) os riscos são estimados pela exposição de 1, 10, 100 e 1000 unidades
de colônias formadas (UFC) por refeição. A tabela 1 mostra casos de probabilidade de infecção
devido a Salmonella spp. e E. coli.
Tabela 1: Probabilidade de infecção associada com várias exposições de Salmonella spp. e E. coli.
Risco de infecção
Exposição / UFC
Salmonella spp.
E. coli
1
7,5x10-3
1,0x10-7
10
7,2x10-2
1,0x10-6
100
5,3x10-1
1,0x10-5
1000
9,99x10-1
1,0x10-4
Fonte: ROSE et al. (1995)
Segundo BAIRD-PARKER (1995), vários fatores influenciam o início de uma infecção entre eles
destacam-se, a particularidade, virulência de cada microrganismo e sua associação com o alimento,
incluindo efeitos do processamento, estocagem e manuseio. Há também, fatores relacionados a
constituição física e química do alimento, por exemplos, se o alimento é líquido ou sólido,
particulado ou inteiro, lipídico ou protéico, contém ou não conservantes, ácido, básico ou neutro.
Finalmente, existem fatores próprios associados com o consumo individual do alimento, incluindo
fatores nutricionais e psicológicos de cada um, estado imunológico, estado do trato intestinal e prédisposição a infecção.
A combinação desses fatores irá determinar se ocorrerá ou não a infecção e o grau de severidade.
Â
Caracterização de risco
É o resultado da avaliação das etapas anteriores, estimando os efeitos adversos comumente
relacionados a uma dada população (HATHARWAY, 1997). Caracterização de riscos também
inclui um resumo das incertezas e variabilidade de informações usadas para derivar um risco
estimado.
Muitas medidas de redução de risco são consideradas somente em termos de redução de
probabilidade de evento. Entretanto, pela definição, risco pode ser reduzido pela diminuição de
severidade nos efeitos adversos.
A descrição explicita e quantificação de riscos dos impactos nesta etapa pode levar a opções no
gerenciamento de maneira que reduza a severidade dos efeitos adversos. Descrição de impactos
também clarifica ações para se evitar os eventos indesejáveis. Isto pode causar mudanças em
algumas situações, como por exemplo, a mudança nos procedimentos de inspeção na higiene dos
alimentos.
Avaliação de risco formal para uma empresa sempre foi uma tarefa difícil por causa da incerteza e
dados necessários para avaliar a exposição de perigos, mas isto não justifica a desistência da
utilização da avaliação de riscos para apoiar decisões, mas sim, reforça a necessidade de uma
pesquisa mais atuante e conscientização de órgãos geradores de leis, no sentido de apoiar a pesquisa
de dados mais precisos.
4. APLICAÇÃO DE AVALIAÇÃO DE RISCOS NO SISTEMA DE
APOIO A DECISÃO
O desenvolvimento e aplicação de avaliação de riscos oferece um modelo sistemático, objetivo e
consistente. Esta metodologia trabalha os vários dados existentes no sistema, e através de suas
etapas, transforma-os em informações paulatinas que dão suporte ao sistema de apoio a decisão.
Neste caso, através da união e ordenamento entre as duas metodologias, a empresa alimentícia terá
condições de produzir e assegurar alimentos que não ofereçam danos a saúde humana, seja por
redução ou eliminação dos agentes patogênicos.
A figura 1 demonstra as relações entre as metodologias explanadas.
Dados
epidemiológicos
Literatura
Fatores
ambientais
Composição
do alimento
Leis
Pesquisa
Padrões
sociais/
comportamentais
AVALIAÇÃO DE RISCOS
Identificação de perigo
Avaliação de exposição
Avaliação de perigo
Caracterização de risco
SISTEMA DE APOIO A DECISÃO
REDUÇÃO DE RISCOS
ELIMINAÇÃO DE RISCOS
Figura 1: Relações entre as metodologias de análise de risco e sistema de apoio a decisão
5. CONCLUSÃO
Além dos recursos necessários para a competitividade e qualidade necessárias à viabilização do
processamento de um produto, as empresas de alimentos necessitam cada vez mais de informações
a cerca dos tipos de perigos que podem tornar os produtos impróprios para o consumidores.
O conhecimento e reconhecimento desses perigos é mais facilmente realizável com uma
metodologia apropriada, a análise de risco, que além de auxiliar na identificação, também prioriza a
importância e a nocividade de cada perigo.
Devido a complexidade inerente aos processos produtivos das indústrias alimentícias, somente a
interação entre as metodologias de análise de risco e sistema de apoio a decisão permite aliar os
conhecimentos técnicos e científicos as tomadas de decisões que garantam um alimento seguro, de
qualidade e competitivo.
6. BIBLIOGRAFIA
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Control 6(1):29-36, 1995.
BANA E COSTA, C.A.. Processo de apoio à decisão: problemáticas, atores e ações. Escola de Novos
Empreendedores – UNE, UFSC, 31 pg. 1993.
FRANCO, B. D.G. M.; LANDGRAF, M. Microrganismos patogênicos de importância em alimentos. P. 33-81. In:
FRANCO, B. D.G. M.; LANDGRAF, M. (eds.) Microbiologia dos alimentos. Atheneu: São Paulo. 182pp. 1996.
HATHARWAY , Steve C. Development of Food Safety Risk Assessment Guidelines for Foods of Animal Origin in
International Trade. Journal of Food Protection 60(11):1432-1438, 1997.
LAMMERDING,
Anna M. An overview of microbial food safety risk assessment. Journal of Food Protection
60(11):1420-1425, 1997.
ROSE, J. B.; HAAS, C. N. & GERBA, C. P. Linking microbiological criteria for foods with quantitative risk
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ROY, B. Méthodologie Multicritère d'Aide à la Décision. Economica, (1985).
REIMANN, C. Bernard e Waren, Allan D. User-oriented Criteria for the Selection of DSS Sofware – Communication
of the ACM – Fev. 19885, vol 28, no. 2.
van SCHOTHRST, M.. Practical approaches to risk assessment Journal of Food Protection 60(11):1439-1443, 1997.
_________ Principles for the establishment of microbiological food safety objetctives and related control measures.
Food Control 9(6):374-384, 1998.
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