Universidade do Sul de Santa Catarina
Linguagem e Infância I
Disciplina na modalidade a distância
Palhoça
UnisulVirtual
2007
linguagem_e_infancia_I.indb 1
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linguagem_e_infancia_I.indb 2
18/1/2007 09:58:30
Apresentação
Este livro didático corresponde à disciplina de Linguagem e
Infância I
O material foi elaborado visando uma aprendizagem autônoma,
abordando conteúdos especialmente selecionados e adotando uma
linguagem que facilite seu estudo a distância.
Por falar em distância, isso não significa que você estará
sozinho. Não esqueça que sua caminhada nesta disciplina
também será acompanhada constantemente pelo Sistema
Tutorial da UnisulVirtual. Entre em contato sempre que sentir
necessidade, seja por correio postal, fax, telefone, e-mail ou
Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem - EVA. Nossa equipe
terá o maior prazer em atendê-lo, pois sua aprendizagem é nosso
principal objetivo.
Bom estudo e sucesso!
Equipe UnisulVirtual.
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Raquel Stela de Sá
Linguagem e Infância I
Livro didático
Design instrucional
Viviani Poyer
Palhoça
UnisulVirtual
2007
linguagem_e_infancia_I.indb 5
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Copyright © UnisulVirtual 2007
N enhum a parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer m eio sem a prévia autorização desta instituição.
306.446
S11
Sá, Raquel Stela de
Linguagem e infância I : livro didático / Raquel Stela de Sá ; design instrucional
Viviani Poyer. – Palhoça : UnisulVirtual, 2007.
196 p. : il. ; 28 cm.
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-60694-65-5
1. Multilinguismo. 2. Linguagem e línguas. 3. Crianças – Linguagem. I. Poyer,
Viviani. II. Título.
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul
Créditos
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Tecnologia
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Edição – Livro Didático
Professor Conteudista
RaquelStela de Sá
Design Instrucional
Viviani Poyer
Projeto Gráfi co e Capa
Equipe UnisulVirtual
Diagram ação
Vilson Martins Filho
Revisão Ortográfi ca
B2B
Sumário
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 03
Palavras da professora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09
Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
UNIDADE
UNIDADE
UNIDADE
UNIDADE
1
2
3
4
–
–
–
–
O discurso sobre a infância moderna . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
A infância e a diversidade cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
A infância e as diferentes linguagens . . . . . . . . . . . . . . . . . .
As linguagens e o jogo do imaginário infantil . . . . . . . . . .
19
39
57
99
UNIDADE 5 – A Educação Infantil e a formação do pedagogo: novas
cartografias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117
UNIDADE 6 – Pedagogia e projetos de prática de ensino na Educação
Infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145
Para concluir o estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183
Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185
Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 191
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Palavras da professora
Caro estudante, bem-vindo à disciplina Linguagem e
Infância I.
O que pretendemos com esta disciplina é criar espaços de
reflexão-ação que possibilitem repensar um tipo de educação
que priorize a ampliação de repertórios culturais, apreciação
e criação em diferentes linguagens artístico-culturais das
crianças, criando estratégias, como desafio para um tipo de
prática pedagógica que contribua para a sua melhor formação.
A partir disto, você está sendo chamado a participar de um
espaço virtual de aprendizagem que o leve a perceber que tanto
educadores, como alunos, podem transformar-se em autores de
suas próprias idéias, buscando consolidar autonomia pessoal e
profissional. Sendo assim, é necessário que desde o início seja
estabelecido um “elo” da linguagem e Educação Infantil, com
aquilo que caracteriza a prática profissional do professor, o que
acontece através da pesquisa, mudando-se a mentalidade e o
olhar, com o propósito de criar na instituição escolar um novo
ambiente de ensino e aprendizagem. Neste processo, talvez
o maior desafio seja “provocá-lo” a cruzar fronteiras, antes
intransponíveis, reconfigurar saberes e poderes, possibilitar
espaços de aprendizagem nas múltiplas arenas do cotidiano
acadêmico, ambiente mais indicado para a formação de
professores.
Mas ao longo desta obra, procuro fornecer pistas sobre como
não apenas ler, mas “sentir” os discursos sobre a infância.
Muitas são as oportunidades de encontro com esse jeito de
pensar. A questão não está em repetir os autores, mas em
pensar com eles. Como ensina Foucault, o papel do intelectual
não é dar conselhos. É fornecer os instrumentos de análise,
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jamais dizer o que deve ser feito. E intencionalmente é isso que
esta obra procura fazer.
Neste esforço, aparece um espaço onde existe lugar para o
indivíduo curioso que, independentemente de seguir discursos
proferidos pelos professores, decide ocupar este espaço com suas
próprias perguntas e respostas. Na construção desse modo de ver,
é necessário ainda, apreender a imagem da infância, não como a
imagem que olhamos, mas como a imagem que nos olha e nos
interpela. É por via desse olhar diferenciado, que a cultura e a
educação revelam as múltiplas linguagens sociais. Linguagens
essas que podem tornar-se muitas vezes “invisíveis aos olhos” dos
profissionais que trabalham com elas. Essa perspectiva nos coloca
frente a um saber da infância, o qual devemos sempre nos colocar
em posição de escuta. Um saber sobre a criança heterogêneo, que
diz respeito também a nós e ao nosso mundo, quando utiliza o
lado simbólico da linguagem.
A partir daí, você poderá alcançar resultados bastante positivos:
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„
identificando como se constitui as linguagens no ser
humano;
„
analisando as múltiplas linguagens das crianças;
„
refletindo sobre a relação entre as múltiplas linguagens,
subjetividade e os repertórios artístico-culturais;
„
criando espaços de reflexão-ação que contribuam para
repensar as múltiplas linguagens na Educação Infantil e
Séries Iniciais;
„
repensando um tipo de prática pedagógica baseada nas
múltiplas linguagens que contribua para uma formação
de professores e alunos criativos e autônomos;
„
pensando um projeto de prática de ensino coerente
com um ensino e aprendizagem dos diversos tipos de
linguagens.
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A cada unidade da disciplina, você poderá refletir sobre os
diversos tipos de saberes referentes às múltiplas linguagens e a
infância.
Vamos começar nossa trajetória então?
Espero que juntos possamos ao final desta disciplina, estarmos
pensando diferentemente do que pensávamos no início. Que
tenhamos criatividade cada qual em seu lugar, para buscar novas
possibilidades para a formação do professor e para um tipo de
prática pedagógica com crianças, que privilegie as múltiplas
linguagens infantis.
Convido você então para essa caminhada!
Professora Raquel Stela de Sá
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Plano de estudo
O plano de estudos visa orientá-lo/la no desenvolvimento da
Disciplina. Nele, você encontrará elementos que esclarecerão
o contexto da Disciplina e sugerirão formas de organizar o seu
tempo de estudos.
O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva
em conta instrumentos que se articulam e se complementam.
Assim, a construção de competências se dá sobre a articulação
de metodologias e por meio das diversas formas de ação/
mediação.
São elementos desse processo:
„
O Livro didático.
„
O EVA (Ambiente virtual de Aprendizagem).
„
Atividades de avaliação (complementares, a distância e
presenciais). .
Ementa
As múltiplas linguagens humanas. Constituição e
desenvolvimento das linguagens no ser humano. A relação
entre as múltiplas linguagens, identidade e cultura. As
múltiplas linguagens e a formação do pedagogo. Ampliação
de repertórios culturais, a apreciação e criação em diferentes
linguagens artístico-culturais. Projeto de prática de ensino.
Carga Horária
60 horas-aula = 4 créditos.
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Objetivos
Geral:
Esta disciplina se propõe a criar espaços de reflexão-ação que
contribuam para repensar um tipo de educação que prioriza
a ampliação de repertórios culturais, apreciação e criação em
diferentes linguagens artístico-culturais das crianças, criando
estratégias, como desafio de um tipo de prática pedagógica que
contribua para uma melhor formação de professores e alunos.
Específicos:
„
Identificar como se constituem as linguagens no ser
humano;
„
Analisar as múltiplas linguagens (oral, escrita, virtual,
corporal, lúdica, ética e estética) das crianças;
„
Refletir sobre a relação entre as múltiplas linguagens,
identidade e os repertórios artístico-culturais;
„
Criar espaços de reflexão-ação que contribuam para
repensar as múltiplas linguagens na Educação Infantil e
as Séries Iniciais;
„
Repensar um tipo de prática pedagógica baseada nas
múltiplas linguagens que contribua para uma formação
de professores e alunos criativos e autônomos;
„
Pensar um projeto de prática de ensino coerente com um
ensino e aprendizagem dos diversos tipos de linguagens.
Conteúdo programático/objetivos
Veja, a seguir, as unidades que compõem o Livro Didático desta
Disciplina e os seus respectivos objetivos. Estes se referem aos
resultados que você deverá alcançar ao final de uma etapa de
estudo. Os objetivos de cada unidade definem o conjunto de
14
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Linguagem e Infância I
conhecimentos que você deverá possuir para o desenvolvimento
de habilidades e competências necessárias a sua formação.
Unidades de estudo: 6
Unidade 1 - O discurso sobre a infância moderna
Nesta unidade, você irá conhecer alguns aspectos referentes
aos discursos de verdade sobre a infância moderna, que darão
subsídios para você compreender melhor a criança a partir do
processo de problematização, de sua presença enigmática e de sua
singularidade.
Unidade 2 – A infância e a diversidade cultural
Nesta unidade, você irá estudar questões relativas à infância, aos
aspectos culturais e aos diversos tipos de linguagens da criança,
assim como a importância da convivência grupal, da imagem do
Outro e da liberdade de expressão na infância.
Unidade 3 – A infância e as diferentes linguagens
Nesta unidade, você verá aspectos referentes à infância
e suas diferentes linguagens e experiências. Para isto,
abordará a importância dos estudos da Teoria das
Inteligências Múltiplas, juntamente com os tipos de
Inteligência para a Educação Infantil.
Unidade 4 – As linguagens e o jogo do imaginário infantil
Nesta unidade, nos preocupamos em problematizar questões
que tivessem relação com os tipos de linguagens da criança, seus
sentidos e significados, sobre o imaginário infantil, a educação
estética e o processo de criação.
15
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Unidade 5 – A Educação Infantil e a formação do pedagogo: novas
cartografias
Nesta unidade, você terá acesso a um conteúdo reflexivo
referente ao processo de formação do Pedagogo, às
instituições escolares e seus instrumentos pedagógicos, à
Pedagogia Cultural e, finalmente, ao processo de ensino e
aprendizagem na Educação Infantil.
Unidade 6 – Pedagogia e projetos de prática de ensino na Educação Infantil
Nesta unidade, você poderá refletir sobre a Pedagogia e a Prática
de Ensino na Educação Infantil, assim como sobre algumas
experiências diferenciadas desenvolvidas na Educação Infantil e
os projetos de oficinas como ferramenta educativa.
Agenda de atividades/ Cronograma
„
Verifique com atenção o EVA, organize-se para acessar
periodicamente o espaço da Disciplina. O sucesso nos
seus estudos depende da priorização do tempo para a
leitura; da realização de análises e sínteses do conteúdo; e
da interação com os seus colegas e tutor.
„
Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço
a seguir as datas, com base no cronograma da disciplina
disponibilizado no EVA.
„
Use o quadro para agendar e programar as atividades
relativas ao desenvolvimento da Disciplina.
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Linguagem e Infância I
Atividades
Avaliação a Distância
Avaliação Presencial
Avaliação Final
Demais atividades (registro pessoal)
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UNIDADE 1
O discurso sobre a infância
moderna
1
Objetivos de aprendizagem
„
Identificar os discursos de verdade sobre a infância
moderna.
„
Perceber a origem da Infância e sua presença nas
diferentes culturas.
„
Analisar como ocorre o processo de problematização na
Educação Infantil.
Seções de estudo
Seção 1 O discurso de verdade sobre a infância
moderna
Seção 2 A infância e sua presença enigmática
Seção 3 A infância e o processo de problematização
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Nesta primeira unidade você irá conhecer alguns aspectos
referentes à Educação Infantil que darão subsídios para você
compreender a criança a partir do seu olhar.
Podemos dizer que vivenciamos um momento de transformações,
de mudanças e revisões quanto às teorias e ações em relação
à Educação Infantil. Temos urgência em refletir sobre nossas
atitudes, discutindo principalmente sobre o que move nossa
prática pedagógica. Atualmente, há um discurso latente de
que tal prática deva ser movida e centrada na criança. Nós,
educadores, não pretendemos descartar o que já se conhece nesta
área de conhecimento, mas respeitar a maneira de ser da criança,
o seu pensar e ver o mundo, ou seja, a percepção do mundo a
partir do seu olhar. A criança tem suas concepções, as quais são
construídas e reconstruídas conforme os discursos de verdade que
se dão por intermédio das práticas sociais que acontecem através
das experiências e interações relacionais.
Ao longo de nossas vidas como educadores, estamos
constantemente assumindo novas concepções e revendo os
conceitos relacionados à criança, procurando compreender suas
potencialidades, que vão além do cuidado, abrangendo todo o
processo de conhecimento. Precisamos, portanto, estar prontos
para arriscar e considerar alternativas para educá-la, abrangendo
as múltiplas linguagens, sem deixar de lado funções como o
“cuidar” e o “atender”, percebendo que todas as nossas ações junto
a ela são de cunho pedagógico, como mostra o poema de Loris
Malaguzzi (1999) a seguir:
AO CONTRÁRIO, AS CEM EXISTEM
”A criança”.
É feita de cem.
A criança tem
Cem mãos
Cem pensamentos
Cem modos de pensar
De jogar e de falar.
Cem sempre cem
Modos de escutar
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Linguagem e infância I
As maravilhas de amar.
Cem alegrias
Para cantar e compreender.
Cem mundos
para descobrir.
Cem mundos
para inventar.
Cem mundos
para sonhar.
A criança tem
cem linguagens
(e depois cem cem cem)
mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura
lhe separam a cabeça do corpo.
Dizem-lhe:
de pensar sem as mãos
de fazer sem a cabeça
de escutar e de não falar
de compreender sem alegrias
de amar e maravilhar-se
só na Páscoa e no Natal.
Dizem-lhe:
de descobrir o mundo que já existe
e de cem
roubaram-lhe noventa e nove.
Dizem-lhe:
que o jogo e o trabalho
a realidade e a fantasia
a ciência e a imaginação
o céu e a terra
a razão e o sonho
são coisas
que não estão juntas.
Dizem-lhe:
que as cem não existem
A criança diz:
ao contrário, as cem existem.”
Unidade 1
linguagem_e_infancia_I.indb 21
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 1 - O discurso de verdade sobre a infância
moderna
A inspiração para as idéias que vou aqui apresentar a você, caro
acadêmico, veio-me de autores como Michel Foucault, Phillipe
Áries, Gilles Deleuze, Júlia Varela, Jorge Larrosa, Sueli Rolnik,
Rosa Fischer, Sandra Corazza, Maria Isabel E. Bujes,
Walter Omar Kohan e outros mais, ainda que não
explicitamente citados, mas por certo, já interiorizados
no discurso que será aqui trabalhado. Discursos que se
entrecruzam com o nosso, que já circularam pelos temas
- referentes à educação de uma forma geral e à educação
infantil de forma específica - que agora nos arriscamos
a abordar. Temas que cada um capturou a sua maneira e
procurou multiplicar.
Figura: A árvore.
Fonte: <http://www.
marianamassarani.blogge.com.br>
De início, procuro examinar como a constituição da infância
moderna está associada à continuada elaboração de um discurso
sobre o que significa “ser criança”, ou seja, como se criam saberes
sobre a infância e dispositivos que acabaram por constituir um
significado, a compreensão do que é a infância. A infância como
uma construção cultural, uma imagem que os adultos necessitam
para sustentar suas próprias identidades.
Os significados atribuídos à infância são resultado
de um processo de construção social, dependendo
de um conjunto de possibilidades que se conjugam
em determinado momento da história. Sendo assim,
são organizados socialmente e sustentados por
discursos nem sempre homogêneos e em constante
transformação. Não resultam, portanto, de um
processo de evolução, nem estão acima e à parte das
divisões sociais, sexuais, raciais, étnicas. É preciso que
se atente para o fato de que, a cada época histórica,
correspondem certas práticas sociais e certos
discursos de verdade que orientam o que se pode ou
não dizer sobre certos objetos.
22
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Linguagem e infância I
Ariès explica que não existe “a infância”, isto é, que ela não
esteve desde sempre aí, de um mesmo modo. Na verdade, o que
o autor quer dizer é que precisamos cada vez mais investigar esse
conceito, tentando vê-lo nas suas inúmeras faces, com o objetivo
de dar conta da enorme complexidade que ele envolve.
De acordo com Bujes, a infância que conhecemos não é um
dado atemporal, é uma invenção da Modernidade. Foi
somente a partir do século XVI que as crianças começaram a se
tornar objetos de relevância social e política. Portanto, apenas
muito recentemente elas passaram a fazer parte da história.
Áries (1986), ao discutir as chamadas “idades da vida”, mostra
que a consolidação de um significado moderno para o termo
infância vai ocorrer apenas em meados do século XVIII. Este
pensamento aparece na modernidade através dos discursos
de verdade formulados por meio de teorias que fizeram com
que entendêssemos o fenômeno da infância da forma como a
entendemos hoje. Ou seja, uma tradição teórica pode modelar o
nosso pensamento, tanto em relação ao que pode ser dito, quanto
ao modo pelo qual se pode falar sobre um objeto.
Para aprofundar seus
estudos a esse respeito
consulte a belíssima
obra de: ARIÈS, Philipe.
História Social da Criança
e da Família. 2 ed. Rio de
Janeiro: Guanabara, 1986.
Sobre este autor e sua
obra consulte: BUJES,
Maria Isabel. Que
Infância é esta? em:
<http://www.anped.
org.br/26/outrostextos/
mc07mariaisabelbujes.
doc>
A criança tem sido alguém cujos modos de ser e estar no
mundo foram controlados e revelados através de estudos
dos métodos científicos de experimentação e observação.
Os estudos sobre as crianças passam a ser uma preocupação
social: objeto de interesse, pontos focais de discursos,
construções históricas modeladas por condições sociais
concretas. Neste contexto, elas não têm uma fala
considerada como legítima na ordem discursiva. As
idéias que elas expressam são quase sempre ignoradas e
desqualificadas pelos adultos, como se estas falas fossem
algo menor, infantil, e destituídas de razão.
Sendo assim, a infância de que tanto ouvimos falar
é um efeito dos discursos que se constituíram/
constituem sobre ela. Por isso, é mais apropriado
falarmos em invenção da infância moderna.
O discurso era de que as crianças possuíam certas características
essenciais – que sempre estiveram nelas presentes – que serviriam
de fundamento para os processos naturais (e também universais)
que caracterizavam sua infância.
Unidade 1
linguagem_e_infancia_I.indb 23
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Universidade do Sul de Santa Catarina
ROCHA, Eloisa A. Candal. A
Pedagogia e a educação infantil.
em: <http://www.rieoei.org/
rie22a03.htm>
Uma das tarefas que a Filosofia e as Ciências Humanas
modernas empreenderam foi teorizar e veicular as suas reflexões
e “descobertas” que tinham por objeto as crianças e a infância.
Tais “descobertas” nos trouxeram um amplo corpo de teorizações
que, por meio da linguagem da ciência, mais especialmente –
pretendeu constituir-se como verdade para explicar quem e como
eram (ou deveriam ser) os sujeitos infantis.
Rocha diz que uma investigação sobre as crianças e os fenômenos
que a elas se associam deve centrar-se não no que elas são, mas
como se constituíram de tal maneira. Em outras palavras, é
preciso compreender que a infância é construída, mas, acima
de tudo, que se problematize os seus modos de existência. É
importante, portanto, que se discuta a produção da infância como
dispositivos de afirmação da sociedade disciplinar e de controle,
tendo como parâmetro a lógica de valorização da vida presente no
mundo moderno.
As crianças são colocadas na mira de equipamentos
sociais e instituições por serem entendidas como seres
em processo de formação e, portanto, ordenadores da
nova arquitetura política e social.
Em educação, estamos acostumados a associar infância à
primeira idade. A psicologia do desenvolvimento tem muito
a ver com este costume, ou seja, pensamos os seres humanos
atravessando estágios, etapas, fases. Esta travessia costuma ter o
nome de evolução ou de progresso. A infância seria o primeiro
degrau que é associado a uma marca do ser em potência (do que
virá a ser no futuro) – e não em ato (do que pode ser no presente).
O que ocorre é que absorvemos teorias num grau tal que elas
governam nossas idéias e ações, chegando-se mesmo ao limite de
confundir teoria com verdade. A construção da verdade, tão bem
discutida por Michel Foucault, aparece de diferentes formas nesta
relação com a infância. Desta forma, as teorias vão se tornando
inquestionáveis e sendo vistas como a única maneira correta de
pensar e agir, ao invés de serem entendidas como um dos modos
possíveis de se proceder.
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Linguagem e infância I
Geralmente estamos acostumados a pensar em uma infância
“ideal”. Isso porque a concebemos numa perspectiva moderna,
pensando-a como um dado universal e atemporal, um período
marcado por uma progressão linear e previsível, uma idade de
ouro em que se manifestariam da forma mais original a pureza,
a inocência e as melhores promessas do gênero humano. Os
sentidos da infância, assim constituídos, condenam a criança
ao signo homogeneização, que retrata em seu reverso a
anormalidade.
A criança representa o projeto da normalidade
pensante do ser humano.
Esse modelo, por sua vez, é difundido pela Psicologia que
estabelece o sentido para o curso da vida humana. Isto significa
afirmar que essa área, na tentativa de iluminar o desconhecido
trajeto da vida humana, termina por estruturar e classificar a
experiência da criança.
Esta definição da infância, ou a necessidade de explicar o que
é tipicamente infantil, vendo as crianças com certos atributos
e características, como sujeitos de interesses e tendências
naturais que se manifestam dadas as condições propícias ao
seu aparecimento, é um dos inventos da Pedagogia (que será
reforçado posteriormente pelo saber psicológico).
Bujes explica que, quando o Ocidente inventa a infância, cria
mecanismos para copiar o modelo do adulto. Para isso, cria
mecanismos disciplinares, técnicas de governo e de regulação
médicas, morais, religiosas e pedagógicas, novas instituições
e novas ciências, como a família, a escola, a pedagogia para
corrigir, reparar, endireitar, consertar a criança.
A partir desta constatação, torna-se mais fácil perceber que
as crianças têm sido produzidas pelos discursos de verdade
que se enunciam sobre elas: discursos médicos, biológicos,
antropológicos, psicológicos, pedagógicos. Tais discursos,
constroem uma posição de sujeito ideal, um sujeito universal, sem
cor, sem sexo, sem filiação, sem amarras temporais ou espaciais.
Unidade 1
linguagem_e_infancia_I.indb 25
BUJES, Maria Isabel
Edelweiss. Alguns
apontamentos sobre as
relações infância/poder
numa perspectiva
foucaultiana. Em:
<http://www.
anped.org.br/26/
outrostextos/
mc07mariaisabelbujes.
doc>
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Corremos o risco de nos deixar falar pelas teorias que, em última
instância, não apenas falam por nós, mas também por aqueles
que consideramos sem voz, as crianças, que são mais facilmente
colocadas à margem de um movimento “natural e espontâneo”
de desenvolvimento da sociedade, em que devem triunfar os mais
capazes, em função de suas potencialidades. A constituição da
infância moderna tem a idéia de “criança natural”.
Se o sujeito moderno não constitui uma essência
universal e atemporal, ele é aquilo que foi feito dele,
isto é, resulta de aparatos discursivos e lingüísticos.
Para você conhecer mais sobre
essa discussão consulte: CORAZZA,
Sandra. O que faremos com o que
fizemos na infância. En: <http://
www.grupalfa.com.br/arquivos/
eventos_trabalhos/TEXTOS>
Sobre essa questão pesquise:
DELEUSE, apud Kohan, Pensando
a prática da Filosofia na Escola.
En: <http://www.unb.br/fe/tef/
filoesco/fundamentos.html>
Segundo Ariès (1986), a idéia de naturalização e de inocência
leva a dois tipos de atitude e comportamento em relação à
criança: protegê-la dos problemas e da sexualidade do mundo
adulto e fortalecer o seu caráter pelo uso da razão, num
movimento contraditório: para preservá-la é preciso ao mesmo
tempo torná-la mais velha. Na perspectiva apresentada por Ariès
estão fortemente imbricadas as duas condições: a da inocência e
a da cognição.
De acordo com Corazza foi a partir da necessidade de tornar as
crianças cada vez mais adultas, que a compreensão da infância
foi matando o mundo infantil, colocando-o cada vez mais nos
moldes do mundo adulto.
Para Deleuze, a infância apresenta características singulares
que necessitam de um trabalho múltiplo que, ao mesmo tempo,
é um exercício imanente de forças. Não é possível que sejam
capturadas por nenhum estado de adulto, elas se capacitam
sempre por expressões longe de um equilíbrio. Isto acontece por
intermédio de novos e incessantes mapeamentos, encontros reais
com o imaginário da criança. A criança em sua ação se constitui
de multiplicidades em processo, diferença, enquanto o eu
experimenta a vida. A infância acontece, portanto, num processo
de desequilíbrio e busca de novos territórios; novos encontros;
novas multiplicidades em processo, diferenças múltiplas e
experiências de vida constantes. Vida que é experimentada e em
movimento.
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Linguagem e infância I
Bujes em seu texto, apóia-se no problema da vontade de saber
e da vontade de poder, tal como foram formulados por Michel
Foucault, para analisar discursos recentes do Ministério da
Educação, que tratam da questão curricular na educação
infantil. A autora mostra de que modo se constroem os discursos
institucionais e científicos sobre a infância, chamando a atenção
para as “tramas” de uma linguagem feita de enunciados sobre
desenvolvimento integral, direito à cidadania, atendimento
de qualidade, melhoria do atendimento educacional, e mostra
como se passa, historicamente, de um discurso da eqüidade
para um discurso fortemente marcado pela busca da eficácia, da
produtividade e da eficiência da educação.
Sobre esse aspecto leia: O
Fio e a Trama: as crianças
na malhas do poder,
<http://www.ced.ufsc.
br/~nee0a6/BUJES.pdf >
Seção 2 - A infância e sua presença enigmática
Iniciando esta seção, gostaria que você observasse como os
discursos sobre a infância contribuem para compor novos
conceitos que permitem não só problematizar a concepção de
infância “natural”, como também identificar as descontinuidades
presentes em seus próprios pressupostos. Pensar em crianças é,
pois, aventurar-se nas suas histórias que nem sempre são contadas
da mesma maneira, que possuem diferentes personagens, mas
que as possibilitam escolher rumos a partir da perspectiva de
diferentes linguagens e olhares.
Perceber as múltiplas linguagens que constituem as
crianças como pertencentes a diversas culturas é uma
tarefa de todos que convivem com elas.
Observe, assim, que é preciso olhá-las como muitas, e não como
“a criança”, aquela idealizada por todos nós. Desta forma, teremos
a possibilidade de percebermo-nos também como infantes, não
o que fomos, mas o que seremos sempre, latentes de uma energia
que nos acompanha em busca de uma utopia possível.
Larrosa diz que enquanto seres sociais, históricos e culturais,
teremos que percorrer um longo processo de socialização; mas
Unidade 1
linguagem_e_infancia_I.indb 27
Sobre esses aspectos
consulte: LARROSA, J.
Pedagogia Profana:
Danças, piruetas e
mascaradas. 4 ed. Belo
Horizonte: Autêntica,
2003.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
também carregamos algo de novo, de enigmático que rompe com
as supostas certezas que temos de nós mesmos, do mundo, das
crianças, da infância. Neste contexto, podemos perguntar:
Por que não nos permitirmos ser tocados pela
criança, deixando que ela nos leve ao desconhecido?
Como vê-la como alguém do presente e não como
alguém que preparamos para o futuro? Por que não
aprendermos com ela sobre a vida?
Este autor salienta que as crianças são seres dos quais quase
nada se sabe, seres que normalmente não entendem a língua
do adulto. No entanto, procura-se o tempo todo justificar as
nossas ações através da investigação de suas satisfações, seus
medos, suas necessidades, suas maneiras de sentir e de pensar.
Historicamente, sabemos de seu desamparo, da violência que
se exerce sobre elas, de seu abandono, de sua miséria.
A infância é algo que nossos saberes, nossas práticas e
nossas instituições procuram o tempo todo capturar:
algo que se quer explicar e nomear, algo sobre o que
se quer intervir, algo que se deseja acolher. Ela não
é outra coisa senão objeto de estudo de um conjunto de
saberes mais ou menos científicos. Pensar a infância como
alguma coisa diferente é, justamente, pensar essa inquietude,
esse questionamento e esse vazio que ela traz. Na verdade o que
se percebe é que todos trabalham para reduzir o que ainda há de
desconhecido nas crianças e para submeter o que nelas ainda há
de diferente.
No entanto, a infância sempre escapa a qualquer
objetivação e se desvia de tudo o que é controlável.
Larrosa (1998) salienta que precisamos devolver à infância
sua presença enigmática, e encontrar a medida de nossa
responsabilidade na resposta diante da exigência que esse enigma
traz consigo. De acordo com este autor, podemos projetar na
criança os nossos desejos, nossos projetos, nossas expectativas,
nossas dúvidas ou nossos fantasmas. Inclusive, sua fragilidade
e suas necessidades se abrem com absoluta transparência ao
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Linguagem e infância I
que nós lhe podemos oferecer. Ela é sempre diferente daquilo
que podemos antecipar, porque sempre está muito além do que
sabemos ou do que queremos ou do que esperamos.
A partir deste ponto de vista, uma criança é sempre
algo absolutamente novo que dissolve aquilo que
temos como sólido na sociedade e que suspende a
certeza que temos de nós mesmos.
Uma outra questão importante apresentada por Larrosa (1998),
e indispensável para que possamos compreender o pensamento
da criança, é tratada quando deixa claro que num trabalho
pedagógico com ela, talvez o correto não seja se ter uma imagem
da infância, mas uma imagem a partir do encontro com a
infância. Um encontro que não é nem apropriação, nem reconhecimento do que já se sabe, mas o desenvolvimento de uma
experiência, um encontro com o desconhecido que não pode ser
reconhecido nem apropriado.
Prado, diz que as crianças nos surpreendem, propondo o
inusitado, o imprevisto num espaço previsto, planejado e
organizado pelos adultos. O enigma da infância se apresenta na
capacidade de as crianças pequenas construírem ordens próprias,
estruturarem grupos de pares heterogêneos e se apropriarem de
formas diferenciadas do espaço-tempo institucional pesquisado
através das brincadeiras. Sendo assim, não se pode como
educador aceitar o cerceamento de sua criatividade e liberdade. É
preciso que se denuncie a relação adulto-criança pautada numa
cultura escolar que valoriza o corpo racional, dócil, passivo,
disciplinado e submisso em detrimento ao corpo curioso, lúdico e
expressivo.
Unidade 1
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Você pode encontrar
uma discussão mais
aprofundada no texto de
Patrícia Prado: a gente
gosta é de brincar com os
outros meninos! Relações
sociais entre crianças num
Jardim de Infância. Em:
<http://www.scielo.br/
scielo.php?pid=S0101-733
02005000200019&script=
sci_arttext&tlng=em>
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 3 - A infância e o processo de problematização
Como você pode perceber hoje em dia, num universo científico
nunca antes tão discutido, os diferentes saberes emergem de
quase todas as áreas de investigação, levando-nos à observação
das práticas e/ou linguagens sociais. Os saberes não se constituem
em uma cópia da realidade, mas são frutos de um trabalho do
pensamento e de criação, de diferenciação, ou seja, de uma busca
constante que se dá através da problematização do mundo.
Vimos, portanto, que as crianças precisam pôr em jogo tudo
o que sabem e pensam sobre a situação em torno do qual foi
organizada a ação educativa. Precisam ter problemas a resolver e
decisões a tomar em função do que se propõem produzir. Sendo
assim, o conteúdo a ser trabalhado e as formas de expressão
(linguagens oral, escrita, corporal, estética, ética e lúdica) a serem
consideradas pelo educador na sua prática pedagógica necessitam
manter as características de objeto sócio-cultural.
A grande lição que tiramos é que as crianças possuem
uma natureza singular que as caracteriza como seres
que pensam o mundo de um jeito muito próprio.
Nas interações que estabelecem desde cedo com as pessoas
que lhes são próximas e com o meio ambiente, elas revelam
seu esforço para compreender a sociedade em que vivem, as
relações que presenciam e, por meio do seu corpo e de seus
movimentos, explicitam as condições de vida a que estão
submetidas e seus desejos. No processo de construção e
apropriação dos diversos tipos de saberes, elas utilizam as mais
diferentes linguagens e exercem a capacidade que possuem
de pensarem diferentemente por meio de sua imaginação
sobre aquilo que buscam descobrir. Através desta perspectiva,
constroem saberes, estabelecendo com as outras pessoas e com
o meio em que vivem uma relação sempre criativa.
Assim como acontece com as crianças, os educadores também
estão constantemente envolvidos na construção de saberes
e por isso mesmo necessitam compreender as diferentes
linguagens, para que possam proporcionar aos educandos uma
maior interação, troca e interlocução no processo de ensino e
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Linguagem e infância I
aprendizagem. Neste sentido, a oportunidade de reflexão sobre a
própria ação e as diferentes formas de atuação junto às crianças se
fazem muito importantes, possibilitando grandes avanços em sua
prática pedagógica.
Uma das grandes contribuições que se pode dar para a formação
dos educadores da educação infantil e dos anos iniciais da
educação fundamental é uma fundamentação teórica adequada
e um bom preparo ético para pensar, investigar, socializar e
propor questões que privilegiem o fenômeno educativo em sua
diversidade através das múltiplas linguagens.
A base dessa concepção está em conceber as
diferentes linguagens artístico-culturais e o
próprio conceito de educação como processo de
desenvolvimento do ser humano, no sentido da
conquista da autonomia, do auto-poder, de pensar
diferente do que se pensa.
Como você pode ver, a utilização das múltiplas linguagens
enquanto forma de expressão, comunicação e criação desde
os primeiros anos de vida, constitui-se como essencial fator
educativo, uma vez que poderão exercer uma grande influência no
modo de ver e agir da criança no mundo. O modo como a criança
reage aos objetos que vai criando, se ligando às experiências,
seleções e escolhas previamente apreendidas no contato e no uso
destas diferentes linguagens, levam-na ao poder de decisão sobre
novas escolhas e objetos.
Como construção social, as múltiplas linguagens são atravessadas
pelo ensino e aprendizagem, a um só tempo, contando também a
história cultural da humanidade e dela participando diretamente.
Sendo algo aprendido, não é uma disposição inata do
ser humano.
Não basta poder expressar o que se sente e se pensa, mas também
ter oportunidade de fazer com prazer o que se deseja, que é
próprio do sentido lúdico. Veja bem, esta diferença entre o que
se quer expressar e o modo como se faz vai depender também da
Unidade 1
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Universidade do Sul de Santa Catarina
possibilidade de escolher vários meios de expressão, que usam
diferentes linguagens, consoante a forma de educação escolhida.
A criança já nasce inserida no mundo de múltiplas linguagens
e cabe ao educador viabilizar esse acesso de forma expressiva,
articulando reflexão, pensamento, sentimentos, sensações
e desejos aí envolvidos. No entanto, não existe uma única
abordagem pedagógica para o trabalho com as múltiplas
linguagens em sala de aula, ou seja, não existem “receitas”
definitivas sobre como estimulá-las.
Por isto, seria correto dizer que desenvolver um
trabalho pedagógico com múltiplas linguagens
não deve se configurar como um método de
ensino.Ao contrário, deve-se pensar em estimular,
através de atitudes e estratégias, os diferentes
pensamentos e linguagens das crianças, que podem
ser desenvolvidos em qualquer faixa etária e nível de
escolaridade e em qualquer disciplina do currículo
escolar.
Você como futuro educador de Educação Infantil necessita,
portanto, abrir espaços para que as crianças possam experimentar
as diferentes formas de expressão e assim serem sensibilizadas a
perceber e ampliar os processos de manifestações das múltiplas
linguagens. Precisa integrar a expressividade, o movimento, a
flexibilidade, que acontecem através das diferentes linguagens,
dando vida à sua prática pedagógica com as crianças. Para isto,
é necessário que possa superar a individualidade inicial de
espectador, permitindo o surgimento de novas formas de olhar,
compreender e interpretar o atual universo educativo, a fim de
orientar seu caminhar por formas alternativas de linguagem
e educação. Por fim, como educador, precisa desenvolver nas
crianças a capacidade de auto-aprendizagem, autonomia para a
resolução dos problemas.
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Linguagem e infância I
O aprendizado da fala, da comunicação, por exemplo,
não se restringe a um tempo cronologicamente
determinado.
De acordo com Kohan (2003), somos seres de comunicação.
Nossa vocação ontológica é a de “ser mais” e fazer história
através da experiência vivida. Nós seres humanos estamos
sempre aprendendo, uma vez que, como “[...] infantes, estaremos
sempre aprendendo a falar e a ser falados, já que não falamos
tudo, não pensamos tudo, não sabemos tudo” (Kohan, 2003, p.
246). Neste contexto, infância e inacabamento se encontram.
Sendo assim, talvez elas estejam em maior sintonia com esta
forma de inacabamento que aqui estamos nos referindo, já que
estão muito mais abertas ao mundo de experiência do que os
adultos. Experiência essa compreendida por Larrosa (2002) como
aquela na qual somos tocados pelas coisas do mundo e “afetados”
por elas, de onde saímos transformados. Uma experiência aberta
à novidade, ao imprevisível, à diversidade, à busca de novas
aprendizagens.
Fonte: <http://www.procon.
go.gov.br>
É preciso desacelerar, suspender o automatismo de nossas ações
com a criança, atendo-nos aos detalhes, estando abertos ao que
se passa conosco enquanto educadores, esvaziando-nos de tantas
certezas para então poder escutá-las, recebê-las: “[...] receber é
criar um lugar: abrir um espaço em que aquele que vem possa
habitar; pôr-se à disposição daquele que vem, sem pretender
reduzi-lo à lógica que impera em nossa casa”. (Larrosa, 2003, p.
188).
Receber para o autor é estar aberto ao diálogo.
Diálogo entendido como encontro entre as
pessoas para “serem mais”, na perspectiva de sua
humanização.
Este mesmo autor (Larrosa, 2003), nos instiga também como
educadores a “escutar mais devagar”, o que significa uma ruptura,
uma transgressão em nossa sociedade. Para ele, uma pessoa
que não é capaz de se pôr à escuta, cancelou seu potencial de
formação e de transformação. Escutar é um aprendizado que
nos convida a ter menos certezas; que implica em amor ao outro
e a si próprio; em abertura ao desconhecido, ao imprevisível, a
Unidade 1
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termos uma relação mais infantil com o outro e conosco mesmo.
Consiste em despir-se de conceitos, valores, hábitos que sufocam,
que impedem o vôo, que aprisionam, que roubam do humano o
seu direito de ser dono do seu destino. Despir-se de discursos de
verdade que nos imobilizam, abrindo espaços de possibilidades
àquilo que nos é verdadeiramente significativo, para que aprender
seja, então, buscar a vontade de acordar o nosso lado adormecido.
Encerrando esta seção, gostaria de sugerir que quando
pensássemos nas crianças, pudéssemos nos aventurar a entrar
no jogo das suas histórias que nem sempre são contadas da
mesma maneira, que possuem diferentes personagens, mas que
possibilitam escolher rumos a partir da perspectiva de diferentes
linguagens e olhares.
Termino esta unidade com um poema de Fernando Pessoa sobre
a infância:
“Fui ficando só, sem cuidados.
Todos os que nos cuidavam, tomaram outros rumos e, com
eles, foi-se o carinho de que eu vivia. De novo voltam a
preocupar-se comigo não por cuidado, mas por medo.
Porque me tornei um incômodo.
A criança que eu fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou...
Quero ir buscar quem fui onde ficou.
Quero poder imaginar a vida como ela nunca foi,
e assim, vivê-la vívida e perdida, num sonho que nem dói”.
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Linguagem e infância I
Atividades de auto-avaliação
Após a leitura criteriosa da Unidade 1, efetue as atividades de autoavaliação e, a seguir, acompanhe as respostas e comentários a respeito.
Para melhor aproveitamento do seu estudo, realize a conferência de
suas respostas somente depois de fazer as atividades propostas.
1) Assinale os parênteses que contêm a seção que mais lhe chamou a
atenção e contribuiu teoricamente para o seu aprendizado. Justifique a
sua resposta nas linhas a seguir:
a) O discurso de verdade sobre a infância moderna ( )
b) A infância e sua presença enigmática ( )
c) A infância e o processo de problematização ( )
Unidade 1
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Universidade do Sul de Santa Catarina
2) Que tarefa a Filosofia e as Ciências Humanas modernas empreenderam
na constituição dos sujeitos infantis?
3) Segundo Ariès, a idéia de inocência e cognição leva a atitudes e
comportamentos em relação à criança. Quais são eles?
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Linguagem e infância I
4) Explique, com suas palavras a citação de Larrosa: “receber é criar um
lugar: abrir um espaço em que aquele que vem possa habitar; pôr-se à
disposição daquele que vem...”
Síntese
Vimos na Unidade I que os significados atribuídos à infância são
resultados de um processo de construção social, dependendo de
um conjunto de possibilidades que acontecem em determinado
momento da história. São organizados socialmente e sustentados
por discursos de verdade que estão em constante transformação.
A infância de que tanto ouvimos falar é um efeito destes
discursos que foram construídos sobre ela. Por isso, é mais
apropriado falarmos em invenção da infância moderna.
As crianças foram/são colocadas constantemente na mira dos
mecanismos sociais e institucionais por serem entendidas como
seres em processo de formação, apostando-se nelas como uma
grande possibilidade política e social do futuro. Por isso, inventase a infância copiando o modelo do adulto. Esta invenção traz
Unidade 1
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Universidade do Sul de Santa Catarina
consigo um discurso disciplinador sobre a “criança natural”,
supondo por um lado a sua infantilização e, por outro, uma
prática que sempre escapa a qualquer objetivação e se desvia
de tudo o que é controlável. O que se observa é que as crianças
possuem uma singularidade que as caracteriza como seres que
pensam o mundo de um jeito próprio. É preciso, pois, entrar nas
aventuras das crianças, nas suas histórias, escolhendo os rumos
de caminhada através da perspectiva de diferentes linguagens e
olhares.
Saiba mais
Se você ficou interessado em conhecer mais detalhes sobre a
Educação Infantil, recomendamos que consulte:
ABRAMOWICZ, A. O direito das crianças a educação infantil.
In: Pro-posições, v. 14, nº 3. Dossiê: Educação Infantil e
Gênero. Campinas: UNICAMP, 2003.
CORAZZA, S. M. História da infância sem fim. Ijuí: Unijuí,
2000.
FOUCAULT, M. A verdade e as formas jurídicas. Rio de
Janeiro: NAU Editora, 2002.
KOHAN, Walter O. Infância: entre educação e filosofia. Belo
Horizonte: Autêntica,2003.
KRAMER, Sonia. Por entre as pedras: arma e sonho na escola.
3. ed. São Paulo: Ática,2003.
LARROSA, Jorge; LARA, Pérez Nuria (orgs). Imagens do
Outro. Petrópolis: Vozes 1998.
NARODOWSKI, Mariano. Infância e poder: conformação da
Pedagogia Moderna. Bragança Paulista: Editora da Universidade
São Francisco, 2001.
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18/1/2007 09:58:36
UNIDADE 2
A infância e a diversidade
cultural
2
Objetivos de aprendizagem
„
Analisar a cultura e linguagens da Infância.
„
Perceber a criança como criadora de história e cultura.
„
Identificar como ocorre a convivência grupal e a
liberdade de expressão na Infância.
„
Repensar a dimensão ética que existe na relação com o
Outro – a criança.
Seções de estudo
Seção 1 Infância, cultura e linguagens
Seção 2 A convivência grupal e a liberdade de
expressão na infância
Seção 3 Infância e a imagem do Outro
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Para início de conversa
Diferentes especialistas abordam os aspectos fundamentais de
uma Educação Infantil, traçando as características concretas que
essa escola precisa ter: desde a cultura da infância, os valores
e as crenças, até a programação dos conteúdos e a organização
dos espaços e tempos, sem esquecer o mais importante que é
a formação dos educadores. Uma escola que precisa repensar,
desconstruir conceitos conformadores de crianças enquanto seres
de outra espécie, enquanto entidades isoladas do mundo material,
físico, afetivo, histórico, cultural e social dos adultos, mas que
não é por isso mesmo, um adulto em miniatura.
Sendo assim, você pode perceber que infância, cultura,
linguagem e experiência se identificam. É por intermédio delas
que o ser humano se constrói na história. Pela experiência a
infância se abre ao mundo e modifica-se a cada dia. É também
o caminho pelo qual ela, no momento que assume sua fala a
partir do mundo e sobre o mundo, também pode modificá-lo.
É também a condição de inacabamento que nos torna abertos
ao mundo e atores da história. Assim, a infância é uma das
manifestações do inacabamento do homem e, portanto, uma das
expressões de esperança. Talvez aí esteja a verdadeira raiz lúdica
da infância: o inacabamento. Raiz que as torna abertas ao mundo,
curiosas, inquietas, criativas, capazes de pensar diferentemente do
que se pensam, de construir uma outra história como sujeitos da
experiência. Experiência compreendida aqui como aquela na qual
as crianças são tocadas pelas coisas do mundo, afetadas por elas,
e de onde saem sempre transformadas. Uma criança enquanto
Outro, enquanto sujeito singular completo em si mesmo, que se
expressa através de seus desenhos, gestos, movimentos, histórias
fantásticas, danças, imaginação, falas, brincadeiras, sorrisos,
caretas, choros, apegos.
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Linguagem e infância I
Seção 1- Infância, cultura e linguagens
As análises culturais têm estado cada vez mais freqüentes nos
debates sobre educação, já que no cerne desta questão está a
relação entre cultura e poder. Quanto mais importante se torna
a cultura, tanto mais significativas são as relações de forças que a
governam e regulam. Tudo que tenha a capacidade de influenciar
a configuração geral da cultura, de controlar ou determinar o
modo como funcionam as instituições culturais ou de regular as
práticas culturais, exerce um tipo de poder explícito sobre a vida
das pessoas. Sendo assim, a cultura é vista não como um reflexo
de processos econômicos ou políticos, mas como constitutiva de
dispositivos, práticas sociais e de discursos de verdade.
De acordo com Larrosa, um dispositivo pedagógico age em
qualquer lugar, transformando relações entre as pessoas, no meio
onde interage, bem como nas relações que se estabelecem consigo
mesmo. Os efeitos dessas conexões e sintonias com os novos
dispositivos tecnológicos produzem cultura.
Para você conhecer um
pouco mais sobre essa
discussão, consulte o
livro: HALL, Stuart. Da
diáspora: identidades e
mediações culturais. Belo
Horizonte, MG: UFMG;
Brasília, DF: UNESCO, 2003.
LARROSA, Jorge e LARA,
Nuria Pérez (orgs.),
Imagens do outro. Rio de
Janeiro: Vozes, 1998.
Neste sentido, o conceito de cultura precisa ser
entendido enquanto ato de criação, uma teia de
significados estabelecida entre os homens constituída
de fios intermináveis que expressam uma forma de
ver, sentir e se relacionar com a vida, tornando as
coisas do mundo inteligíveis.
Para Chauí (1989, p.51) cultura é
[...] entendida como produção e criação da linguagem
[...] dos instrumentos de trabalho, das formas de lazer,
da música, da dança, dos sistemas de relações sociais, a
cultura é o campo no qual a sociedade inteira participa
elaborando seus símbolos e seus signos, suas práticas e
seus valores, definindo para si o possível e o impossível, a
linha do tempo (passado, presente, futuro), as distinções
do interior do espaço, os valores, como o verdadeiro e o
falso, o belo e o feio, o justo e o injusto, a noção de lei,
e, portanto, do permitido e do proibido, a relação com o
visível e o invisível, com o sagrado e com o profano, tudo
isso passa a constituir a cultura no seu todo.
Unidade 2
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para ver a respeito dessa questão
consulte: GUSMÃO, Neusa M. M. de.
Linguagem, cultura e alteridade:
imagens do outro. In: Cadernos de
Pesquisa. n. 107, julho, 1999.
É neste sentido que a cultura revela muitas linguagens presentes
na vida social, mas que se fazem invisíveis aos nossos olhos, já
que nossa subjetividade foi produzida por princípios e valores
universais considerados verdadeiros, legítimos e únicos. Na
medida em que o ser humano tem a percepção de que o aspecto
social se prende a estes princípios e precisa ser relativizado,
ele passa a atentar para o fato de que a cultura se expressa
por linguagens que nem sempre são visíveis e explícitas e que
exigem um olhar bastante atento e aprofundado no que se
refere às muitas realidades do campo social, seu cotidiano e seus
significados. É através de um olhar interpelador, portanto, que
a cultura e a alteridade desvelam as múltiplas linguagens da
convivência social.
A cultura é um campo em torno da formulação e
da fixação de significados sobre a formação das
subjetividades. Sempre aberta ao conflito, a cultura é
uma atividade incessante de “produção de verdades”
que necessita ser compreendida no seu processo de
fabricação.
Desta forma, ela torna-se, ao mesmo tempo, um objeto de
pesquisa de educadores, bem como a condição de possibilidade
nas suas intervenções pedagógicas e políticas. Os estudos
culturais propiciam, portanto, a compreensão da correspondência
existente entre discursos de verdade, instituições, e lutas de poder
pelo controle. Esta perspectiva nos leva a perceber que
os significados estão sendo constantemente negociados
e conectados a políticas dos discursos de verdade que
acontecem na sociedade.
Fonte: <http://www.
marianamassarani.blogger.com.br>
De acordo com Corazza (2001) a cultura infantil é uma
forma social e histórica de existência, constituída por
discursos de verdade sustentados por idéias, atitudes,
sentimentos, linguagens, proposições morais, relações
e desejos. Tal forma de vida também é produzida
por textos, arquiteturas, mercadorias, organizações,
regulamentos, enunciados científicos e instituições. Para
a autora, a cultura é, assim, o solo no qual se realizam a
educação, a pedagogia e o currículo.
42
linguagem_e_infancia_I.indb 42
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Linguagem e infância I
No entanto, para Redin quando se fala em educação, existe aí
uma cultura que não pode ser descolada de aspectos econômicos,
políticos, culturais, religiosos, educacionais, sociais, morais,
éticos, estéticos e históricos. Em tempos de transição ou de
mudanças aceleradas, faz-se necessário que a educação passe por
novas concepções do que representa um ser educado. E é nesta
nova cartografia do ser no mundo, e da própria sociedade como
campo de múltiplas relações, que autores como Félix Guattari,
por exemplo, têm feito análises muito interessantes para a
compreensão da complexidade das relações.
REDIN, Marita M.
UNISINOS. GT: Educação
de Crianças de 0 a 6 anos.
n.07. <http://www.anped.
org.br/28/textos/gt07/
gt071088int.rtf>
As idéias deste autor são relevantes para compreender essa
nova ética-estética na sociedade atual, ajudando-nos a buscar
novos paradigmas culturais e educacionais para a compreensão
da Educação Infantil e sua especificidade no que se refere ao
espaço de vida para as crianças, que está ficando cada vez mais
padronizado e distanciado da estética da existência.
Talvez possamos visualizar essa dimensão éticaestética como possibilidade de permear as partes
negadas ou esquecidas da criança.
É necessário que, quando se fale em Educação Infantil, se
congregue um conceito de cultura que, além de encorajar os
significados locais, considere igualmente como seus constitutivos,
os sentimentos e as interpretações pessoais, sendo estes
fundamentais para as crianças.
Para Elzirik o que está em jogo neste contexto, é a ruptura com o
conceito estático de infância, de conhecimento; é a necessidade de
cruzar experiências, de compartilhar caminhos, de compreender
a complexidade e a diversidade através da abertura de canais
para o diferente. Um diferente que propicia a possibilidade da
descoberta de coisas, pessoas, situações que não se imagina que
sejam possíveis e que podem ser muito importantes para repensar
a educação na infância. No entanto, este é um caminho que
provoca insegurança, pela quebra das certezas, de normas aceitas
universalmente e estáveis.
Unidade 2
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EIZIRIK, Marisa F. Por que
a diferença incomoda
tanto? <http://www.
educacaoonline.pro.
br/art_por_que_a_
diferenca.asp>
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Universidade do Sul de Santa Catarina
A autora pergunta: quantas oportunidades se
perdem de ampliar o conhecimento pelo apego ao
já sabido? Quantas possibilidades de imaginação são
desvalorizadas por conta da censura prévia do que
é proibido? Quantos mecanismos disciplinares são
utilizados na Educação Infantil que interferem naquilo
que é esperado, nos limites inscritos nas regras que
tiveram origem em outros tempos?
A autora diz, ainda, que deveríamos aproveitar as artes da
cultura infantil, perseguindo um determinado objetivo,
apostando naquilo que se acredita e, com isso, conseguir abrir
espaços possíveis, ou seja, ir onde ninguém está esperando,
penetrar em lugares desconhecidos, surpreender e ao mesmo
tempo surpreender-se com essas novas transformações.
Trabalhar com a criança é estar também neste lugar incerto,
reconstruindo-se a todo o momento, isto é, utilizando-se do
desafio da dificuldade como potência para a construção de novas
realidades do ensino e de aprendizagem infantil.
As crianças se expressam pelo olhar, pelo toque, pelas múltiplas
linguagens, pelo corpo, até mesmo pela não expressividade.
Sendo a cultura infantil plural, e estando a ela atrelado contextos
sócio-culturais diferenciados, não basta que se diga que sendo
criança se produz cultura infantil. Há que se relativizar a criação
das culturas infantis em detrimento de serem próprias de
infâncias e contextos diversificados.
Para você conhecer mais a esse
respeito acesse: COUTINHO, Ângela
M. S. Infância e diversidade: as
culturas infantis.htpp:/ced.ufsc.
br/nee0a6/.pangela.PDF.
Sendo assim, a partir do momento que se pensa a Educação
Infantil pelos saberes próprios da criança, necessita-se buscar
produzir esforços de aproximar nossas percepções às suas
múltiplas expressões, produzindo conhecimentos que legitimem
uma Pedagogia mais coerente com essa faixa etária, ou seja, que
respeite seu direito de viver a sua infância plenamente. Neste
sentido, a cultura da infância nos obriga a rever os discursos de
verdade apresentados pelo pensamento racional, a intolerância
das práticas pedagógicas discriminatórias, a considerar as
possibilidades de transitar entre as singularidades e a coletividade
de forma menos desigual.
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Linguagem e infância I
Seção 2 - A convivência grupal e a liberdade de
expressão na infância
A subjetividade da criança é constituída na convivência com
determinadas condições e possibilidades de uma série de
discursos institucionais: a família, a escola, a mídia em suas
diferentes formas. Essa captura gera imagens, sensações,
pensamentos, produzidos pelas conexões com as instâncias
afetivas, cognitivas, sensitivas, perceptivas que se tornam visíveis
através das diversas maneiras através das quais as crianças se
expressam. Neste contexto, a relação da criança é, pois, sempre
ligada a determinados contextos sócio-culturais. Implica
num vínculo com a realidade que é construída através de uma
dimensão ao mesmo tempo pessoal e social.
Estimular tal relação implica em problematizar as suas
ações, procurando transmitir significados que possam
suscitar uma comunicação mais expressiva através das
experiências de convivência grupal.
De acordo com Guattari, cada indivíduo, cada grupo social,
veicula seu próprio sistema de modelização da subjetividade, quer
dizer, uma certa cartografia feita de demarcações cognitivas, mas
também míticas, atuais, sintomatológicas, a partir da qual se
posiciona em relação a seus afetos.
PERUZZO, Rosária S.
Subjetivação na infância:
multiplicidades de percursos?
de trajetos e devires? Peruzzo
<http://168.96.200.17/ar/
libros/anped/2005T.PDF>
A participação da criança como membro
de um grupo social é importante, portanto,
para explorar a sua imaginação, memória e
experiências. Dentro do princípio de interação
social na formação da criança, destacamse os aspectos de troca, de cooperação, de
participação e ajuda mútua, pois desenvolvem
o seu pensamento e linguagem, assim como as
suas relações afetivo-emocionais.
Conforme Deleuze (1988), as crianças estão
em constante busca e exploração dos meios
que a cercam. Elas demonstram sua aceitação ou rejeição do que
lhes é apresentado ao se expressarem, deslizando entre falas,
fantasias e afetos. Estão sempre em movimento e a experimentar
Unidade 2
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Fonte: <http://www.
marianamassarani.
blogger.com.br>
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Universidade do Sul de Santa Catarina
novos jeitos e formas de relações. Estes tipos de experiências são
essenciais ao desenvolvimento das crianças como possibilidade de
expressão de seus desejos.
As crianças não só recordam ou imitam o mundo dos adultos,
mas dele se apropriam criativamente, dando-lhe outro sentido,
outra lógica para os relacionamentos que vivem.
A imaginação, o brinquedo, a fantasia do real, por
exemplo, são formas próprias do modo de ser
da criança que não podem ser deixados de ser
desenvolvidos.
Para Benjamin (1984), as crianças estão ligadas ao mundo
muito mais do que pensamos, ou seja, captam sua essência,
se sentem atraídas pelas atividades dos adultos, sem deixar de
criar um mundo simbólico que alimenta seu imaginário. Elas
pensam muito mais com o sentimento, seguem seus desejos; já os
adultos, procuram sempre a racionalidade do pensamento e do
comportamento.
A máscara do adulto impede e desencoraja a ousadia das novas
experiências, enquanto que as crianças, em seus processos de
vivenciar a vida, estão sempre dispostas a novas tentativas.
Elas vivenciam as coisas em grupo com o espírito repleto de
sensibilidade, sonhos e desejos de conquista que afloram em seus
pensamentos. O desenvolvimento da criança, portanto, se dá a
partir das suas constantes interações com o meio social em que
vive. Assim, o seu desenvolvimento depende em grande parte
do aprendizado que ela realiza num determinado grupo social, a
partir das interações com os outros indivíduos.
Precisamos dar relevo particular à forma como a
criança entra em relação com as outras, definindose um conjunto de atitudes que podem facilitar
o processo de comunicação. A qualidade de
relação que se estabelece do educador para com
a criança, influencia não só o nível de qualidade
da aprendizagem, como também o seu próprio
desenvolvimento.
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Linguagem e infância I
A criança que for impedida de fazer suas experiências e que
não tiver qualquer oportunidade de cometer seus próprios erros
não estará vivendo plenamente. Trata-se de uma forma que
a levará a ter a possibilidade de criar, de explorar formas de
relações consigo e com os outros, trocas de experiências, interrelações sociais e individuais facilitando novas aprendizagens. As
aprendizagens que as crianças adquirem estabelecem conexões
com múltiplos meios e contêm o que acontece com cada um e
entre os componentes do grupo. Isso oportuniza o surgimento do
novo, do criativo, do impensável. A convivência grupal facilita,
portanto, o trânsito daquilo que se encontra bloqueado na
criança e cria maneiras e liberdades de expressão diferenciadas.
Além disso, as relações grupais podem provocar movimentos e
modificações de valores, proporcionando o afetar e ser afetado,
aproximando-a de novas situações.
Conforme Rolnik, a palavra “afetar” não significa afeto/
afetivo e sim vibração/potência, que se refere ao afetar como
potencialização do interesse e do esforço para aprender. A autora
diz, ainda, que este afeto é “vibrátil”, ou seja, uma vibração
que é uma força, uma potência que se abre para todos os tipos
de relações. Uma nova realidade sensível, manifestação da
plenitude da vida em sua potência de diferenciação. Aquilo
que nos afeta atinge não apenas os “territórios visíveis”, mas
também o “corpo vibrátil”, primeira
instância propulsora de desejos, força
incontrolável em que a passagem
destes “afetos” acontecem.
Se o adulto souber observar e
intervir junto à criança a partir da
lógica do afetar e ser afetado por
meio da atividade lúdica, descobrirá
explorações possíveis e terá mais
facilidade para perceber que a descoberta e o desafio de criar e
pensar o novo pode permitir que a ela se desenvolva de forma
prazerosa. O desafio que se coloca é, pois, um convite para
conhecermos melhor a criança, sua subjetividade, seu modo de
subjetivação, suas habilidades, seus hábitos e potencialidades.
Mas talvez, para isto, necessitemos desenvolver novos modos
de olhar a infância, de aprendermos aquele que nos olha e nos
interpela, tal qual se refere Guattari (1992), não priorizando as
Unidade 2
linguagem_e_infancia_I.indb 47
SÁ, Raquel Stela de. Do
Corpo disciplinar ao Corpo
Vibrátil, Rio de Janeiro:
achiamé, 2003.
Fonte: <http://www.
medicina.ufmg.br/down>
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Universidade do Sul de Santa Catarina
causas, mas sim como se compõem os trajetos, os movimentos, o
devir daquilo que estamos observando. Trata-se de analisarmos
como acontecem as ações, as invenções, as criações das mesmas
para que, desta forma, possamos propor uma intervenção que se
aproxime das suas necessidades e realidade.
Seção 3 - Infância e a imagem do Outro
No livro Imagens do Outro, de Larrosa e Lara (1998),
apresenta-se a infância e seus sujeitos enquanto “o Outro de
nossos saberes” perante o qual devemos nos colocar em posição
de escuta; as crianças enquanto aquelas que apresentam seus
sentimentos, idéias, desejos e expectativas, sendo capazes de
expressá-los desde que haja quem os queira escutar.
Existem realidades sociais que só sob o ponto de vista
das crianças e de seus universos específicos podem ser
compreendidas e analisadas. Para ser convidado por elas para
entrar em seus universos específicos e sobre eles conversar sem
medo ou angústias, faz-se necessária uma cumplicidade, um
certo jogo de olhares e significados comuns.
Tomando as crianças enquanto o Outro, instaura-se o desafio de
redirecionar o olhar, rompendo com as perspectivas pelas quais
culturalmente aprendemos a enxergá-las: incompletas, sem fala,
naturais e inocentes.
A percepção da criança enquanto “Outro” é o
reconhecimento desta enquanto singularidade que
é completa em si mesmo, pertencente a um tempoespaço geográfico, social, cultural que consolida uma
sociedade específica, onde são criadoras de história e
cultura.
Larrosa e Lara (1998) explicam que, na construção desse outro
modo de ver a criança, é necessário apreender a imagem do
Outro não como a imagem que olhamos, mas como a imagem
que nos olha e nos interpela. Salientam que na educação como
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Linguagem e infância I
fabricação, como realização do possível, somos nós que definimos
a infância, que decidimos como ela é, o que falta para ela, de
que ela necessita, quais são as suas carências e suas aspirações. A
intenção destes autores é a de minar essa perspectiva através do
procedimento de inverter a direção do olhar: a infância não como
aquilo que olhamos, senão como aquilo que “nos olha” e “nos
interpela”. A infância entendida como o Outro que nasce e que é
aquilo que, ao olharmos, nos coloca em questão, tanto em relação
àquilo que somos, quanto em relação a todas essas imagens que
construímos para classificá-la, excluí-la, para nos protegermos
de sua presença incômoda, para melhor controlá-la em nossas
instituições, para educá-la como fomos educados.
A atenção ao desenvolvimento da infância talvez
permita a emergência de outra forma de pensamento
na educação e outro tipo de prática educativa mais
condizente com esta etapa de vida.
Os adultos precisam olhar para as crianças com outra
visibilidade. Elas são um Outro, mas nós os adultos não as
reconhecemos como tais. Procuramos muitas vezes estudá-las
para apropriar-nos da sua diferença, cooptar suas idéias para
sistematizá-las. Ao olhá-las, normalmente aceitamos nelas o
que aceitamos em nós mesmos e odiamos nelas o que odiamos
em nós mesmos. Ao produzirmos as suas subjetividades,
pretendemos que elas sejam como nós somos, ou no melhor dos
casos, como desejamos que sejam. Normalmente não sabemos o
que olhar e como olhar a infância.
Segundo Souza e Pereira (1998), a questão do olhar torna-se
fundamental para retomarmos o tema
da alteridade: o olhar convoca nossa
dimensão ética na relação com o
Outro. De acordo com estas autoras,
ao reconhecer a diferença no “Outro”,
recuperamos a dignidade de nos
reconhecermos nos nossos limites, nas
nossas faltas, na nossa incompletude
permanente. Reavivar ou até mesmo
construir a dimensão ética na relação
com o Outro de pouca idade e tê-la
Unidade 2
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Universidade do Sul de Santa Catarina
como um pressuposto de estudo pode ser entendido também
como cuidado em não as colocar em situação em que seus
valores de vida sejam desqualificados, valorizando seus universos
culturais.
Na verdade, os adultos se preocupam em conhecê-la, adequála, moldá-la e, desse modo, não conseguem compreendê-la.
Contudo, apesar de nossa presença direcionando a vida da
criança, a infância segue sendo um Outro, aquilo que “[...]
inquieta a segurança de nossos saberes, questiona o poder de
nossas práticas e abre um vazio em que se abisma o edifício
bem construído de nossas instituições de acolhimento” das
crianças.(LARROSA e LARA (orgs.), 1998, p.230). Quer o
adulto reconheça ou não, a infância é diferente, ela nos mostra
isso na sua linguagem, ela é radical, absoluta e irredutivelmente
diferente do mundo adulto.
Essa perspectiva que procura fazer com que os educadores
reflitam sobre a criança que extrapola os limites do já previsto
pelas ciências que dela se ocupa, que a percebe enquanto Outro, é
sem dúvida algo em construção.
A interação solicita dos educadores o aprendizado da escuta, o
que só é possível fazer quando se reconhece o Outro como sujeito
de aprendizagem, quando não se discrimina, quando se está
aberto a aprender com ele.
Somente escutando é que aprendemos a falar com o
Outro, e não para o Outro.
Larrosa instiga-nos ainda a “escutar mais devagar”, o que
significa uma ruptura, uma transgressão em nossa sociedade com
a velocidade de informação. Para o autor, “uma pessoa que não é
capaz de se pôr à escuta cancelou seu potencial de formação e de
transformação”. Escutar é um aprendizado que nos convida a ter
menos certezas; que implica em amor ao outro e a si próprio; em
abertura ao desconhecido, ao imprevisível, a termos uma relação
mais lúdica conosco e com o Outro. A atenção ao jeito de olhar
do Outro pode permitir a construção de uma nova forma de
pensamento e de outro tipo de prática social.
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Linguagem e infância I
Na concepção deste autor, a aparição da novidade radical
relaciona-se ao inesperado que interrompe toda a expectativa;
o acontecimento imprevisto que não pode ser tomado como
conseqüência de nenhuma causa e que não pode ser deduzido
de nenhuma situação anterior; o que, longe de se inserir nos
esquemas de percepção que funcionam em nosso mundo, colocaos radicalmente em questionamento.
É preciso olhar a criança enquanto Outro de nossos saberes,
enquanto seres que se expressam criativamente, que reproduzem
e criam cultura, que interpretam as coisas do mundo de maneira
própria e que se movimentam com maestria entre a realidade e
a fantasia, percebendo isto como algo positivo do e no seu viver,
desconstruindo as práticas pedagógicas que consideram a infância
como um tempo de preparação para o futuro.
E para isto, talvez possamos começar por inverter a direção do
olhar dos educadores, problematizando suas certezas para então
poder escutar e receber as crianças, abrindo um espaço em que
aquele que vem possa habitar; pôr-se à disposição sem pretender
reduzi-lo a nossa lógica. (LARROSA, 2003).
Unidade 2
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OLIVEIRA, Alessandra M.
R. de. Entender o outro (...)
exige mais, quando o outro
é uma criança: reflexões
em torno da alteridade da
infância no contexto da
educação infantil. <http://
www.anped.org.br/25/
alessandrarottaoliveirat07.
rtf >
51
18/1/2007 09:58:40
Universidade do Sul de Santa Catarina
Atividades de auto-avaliação
Efetue as atividades de auto-avaliação e, a seguir, acompanhe as
respostas e comentários a respeito. Para melhor aproveitamento do seu
estudo, realize a conferência de suas respostas somente depois de fazer
as atividades propostas.
1) Analise como a criança pode tornar-se criadora de história e cultura.
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linguagem_e_infancia_I.indb 52
18/1/2007 09:58:40
Linguagem e infância I
2) Explique o que Elzirik quer dizer quando se pergunta: quantas
oportunidades se perdem de ampliar o conhecimento pelo apego ao
já sabido? Quantas possibilidades de imaginação são desvalorizadas
por conta da censura prévia do que é proibido? Quantos mecanismos
disciplinares são utilizados na Educação Infantil que interferem naquilo
que é esperado, nos limites inscritos nas regras que tiveram origem em
outros tempos.
Unidade 2
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53
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Universidade do Sul de Santa Catarina
3) Identifique como se dá a convivência grupal e a liberdade de expressão
na Infância.
4) Organize uma relação de argumentos favoráveis para reavivar a
dimensão ética na relação com o Outro – a criança, agrupando-os em
ordem de prioridade.
1.
2.
3;
4.
5.
54
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18/1/2007 09:58:40
Linguagem e infância I
Síntese
Nesta unidade você teve a oportunidade de estudar o conceito
de cultura enquanto ato de criação, enquanto um conjunto de
significados estabelecidos entre os homens, utilizando-se de
relações intermináveis que expressam uma forma de ver, sentir e
relacionar-se com a vida.
Em especial, você viu que a cultura é um campo em torno da
formulação e da fi xação de significados sobre a formação das
subjetividades É uma forma social e histórica de existência,
constituída por discursos de verdade sustentados por idéias,
atitudes, sentimentos, linguagens, proposições morais, relações e
desejos.
Viu também que trabalhar com a criança é estar inserido nesta
cultura, neste lugar incerto, reconstruindo-se a todo o momento.
Para isto, o educador precisa enfrentar os desafios de construir
novas realidades de ensino e de aprendizagem, onde as crianças
estejam em constante busca e exploração dos meios que as
cercam, expressando suas falas, fantasias e afetos.
Então, veja bem: a importância da participação da criança como
membro de um grupo social possibilita a exploração da sua
imaginação, memória e experiências. Ocorre a partir das suas
constantes interações com o meio social em que vive. Se ela for
impedida de fazer suas experiências e se não tiver oportunidade
de cometer seus próprios erros, não estará vivendo plenamente.
O desafio que se coloca então neste tipo de trabalho é
conhecermos melhor a criança, sua subjetividade, seu modo de
subjetivação, suas habilidades, seus hábitos e potencialidades,
desenvolvendo novos modos de olhá-la com outra visibilidade,
convocando a dimensão ética na relação com o Outro. No
entanto, a interação exige por parte dos educadores o aprendizado
da escuta, o que só é possível fazer quando se reconhece o Outro
como verdadeiro sujeito de aprendizagem.
Unidade 2
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Saiba mais
Se você quiser saber mais sobre a infância e a diversidade
cultural, sugiro que consulte:
ALVES, L. R. A escola: centro de memória e produção de
comunicação/cultura. São Paulo: FAPESP, 1999.
CASTRO, Lucia Rabello de (org.). Crianças e jovens na
construção da cultura. Rio de Janeiro: RJ-NAU editora/
FAPERJ, 2001.
COUTINHO, Ângela Maria Scalabrin. Infância e diversidade:
as culturas infantis. http://www.ced.ufsc.br/~nee0a6/pangela.
PDF.
DANTAS, H. A Infância da razão. São Paulo: Manole, 1990.
PERROTTI, E. Infância, Cultura e Leitura. In: Confinamento
Cultural, Infância e Leitura. São Paulo: Summus, 1990.
SOUZA, Solange Jobim (org.). Subjetividade em questão. A
infância como crítica da cultura. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000.
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18/1/2007 09:58:40
UNIDADE 3
A infância e as diferentes
linguagens
3
Objetivos de aprendizagem
„
Compreender as linguagens e experiências das crianças
na Educação Infantil.
„
Analisar as teorias das Inteligências Múltiplas proposta
por Gardner.
„
Estudar os diversos tipos de inteligência e sua
contribuição para o desenvolvimento da criança.
„
Perceber a importância das múltiplas linguagens para a
Educação Infantil.
Seções de estudo
Seção 1 Infância: suas linguagens e experiências
Seção 2 A Teoria das Inteligências Múltiplas
Seção 3 Os tipos de Inteligência
Seção 4 A Teoria das Inteligências Múltiplas e a
Educação
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Como você já viu na unidade anterior, a primeira infância
é, sem dúvida, um período de grande importância para o
desenvolvimento e formação do ser humano. É onde as relações
afetivas e cognitivas propiciam amadurecimento emocional e
vão, pouco a pouco, construindo a personalidade das crianças.
Uma vivência negativa neste período poderá resultar em danos
irreparáveis no desenvolvimento da sua personalidade. Portanto,
a vivência de problematização, durante este período, deve ser
variada e mais completa possível.
O que se pode perceber é que a criança, através de suas múltiplas
linguagens, pode exercitar a manipulação e exploração dos
objetos, compondo e decompondo-os, designando-lhes um
espaço e uma função, dramatizando suas próprias relações,
exprimindo, desta forma, suas necessidades e expectativas
de aprendizagem. Estas linguagens propiciam uma forma de
desenvolver a capacidade de engajar-se, de manter-se ativo e
participante em todo o processo educativo. É se comunicando de
várias maneiras que ela vai aprendendo a ser um indivíduo capaz
de participar da vida em sociedade. A utilização dos diversos
tipos de linguagens propicia à criança o “aprender-fazendo,” que
pode se dar através de atividades lúdicas desafiadoras que exijam
a sua participação ativa.
Uma das funções do educador, portanto, se traduz em
problematizar, lançar desafios para que as crianças tenham a
oportunidade de pensar, analisar, formar conceitos e buscar novos
caminhos, desenvolvendo, assim, novas cadeias de aprendizagem.
E, para desenvolver essas habilidades, é necessário que desde
a Educação Infantil as crianças sejam desafiadas a resolver
problemas em situações planejadas e orientadas pelo educador,
cuja postura de envolvimento é necessária para que se facilite o
processo de ensino e aprendizagem infantil.
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Linguagem e infância I
Seção 1 – Infância: suas linguagens e experiências
Nesta seção você vai participar de uma discussão sobre a questão
da infância em relação às linguagens e experiências, remetendo
umas às outras, ou seja, na infância o ser humano se constitui
como indivíduo na linguagem, através da experiência.
Agamben (2001) salienta que a infância é ausência e busca de
linguagem, já que é na infância que se dá essa descontinuidade
humana, onde se produz a passagem da língua à palavra, do
sistema de sinais ao discurso. Para o autor, é na infância que cada
ser humano se apropria da linguagem e faz do sistema de sinais
adquirido um discurso com sentido. Sendo assim, a infância,
carente de linguagem, é também sua condição de emergência.
E não há universalidade da linguagem, mas sim um
concurso de dialetos, de patoás, de gírias, de línguas
especiais. [...] A língua é, segundo uma fórmula de
Weinreich, uma realidade essencialmente heterogênea.
Portanto, é impossível pensar em uma língua-mãe,
mas somente em uma tomada de poder por uma língua
dominante dentro de uma multiplicidade política.
(DELEUZE & GUATTARI, 2004, p.16).
De modo que a unidade de uma língua é sempre inseparável
da construção de uma cultura, de uma questão política. A
língua se forma e se estabiliza em torno de uma cultura, de
uma coletividade. Deleuze e Guattari (2004) acreditam que a
linguagem se cria e cria mundos, aponta perigosamente para
a contingência dogmática do ser no mundo. Isso quer dizer
que a linguagem dos textos pode corromper seus significados
tradicionais, criar novos contextos e permitir novas leituras, em
um processo contínuo.
Você vai perceber então que sempre que falamos em
infância nos remetemos também à experiência.
A experiência é a diferença entre o aspecto lingüístico e o
humano, entre aquilo que é dado e o que é aprendido, entre o que
temos e o que não temos ao nascer.
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Deste modo, o ser humano não está determinando de antemão,
ele é o que constitui a experiência, o que a torna possível. É na
experiência, na infância como experiência, que o ser humano
inicia a sua constituição como ser histórico.
Neste momento, vou me servir das análises de Larrosa (2001)
para que você compreenda e possa problematizar melhor o
conceito de experiência. Segundo este autor, a experiência é
aquilo que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o
que se passa, não o que acontece ou o que toca. Sendo assim, a
experiência é aquilo que invoca travessia e perigo ao sujeito que a
vive, ficando exposto aos riscos de suas incertezas. A experiência
é, neste sentido, aquilo que padecemos ligado a nossa existência
contingente e pessoal.
É algo a que damos sentido e que é irrepetível. É uma
ética e uma estética, um estilo, uma atitude, onde
ninguém pode aprender da experiência do outro.
Não serve para gerar no outro qualquer experiência,
posto que se trata apenas da descrição de algum
experimento.
Como nos ensina Larossa (2001), em educação estamos quase
sempre acelerados e nada nos acontece. Superar esta realidade,
requer um ato de desprendimento, ousadia e coragem daqueles
que estão envolvidos com a educação para fazer diferentemente
do que fazem. Isto requer estar disposto a colocar em dúvida
discursos de verdade e passar pelo incômodo de se ver num
espaço de caos, se ver perdido, mas ao mesmo tempo com os
sentidos renovados, tornando-se mais ousados, enfrentando os
perigos daquilo que se apresenta.
Então, veja bem: quem vive a experiência se define não
por sua atividade, mas por sua disponibilidade, por sua
abertura ao mundo. É essa possibilidade de se abrir ou
se expor que a criança enfrenta quando se coloca como
sujeito da experiência. A reflexão exige um espaço onde
possa haver trocas de experiências e de críticas sobre os
sentidos que damos ao que nos aconteceu.
Larossa (2001) diz que a experiência é o que nos passa, o relato
é um dos modos privilegiados de dar um sentido narrativo a isso
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que nos passa, e o sujeito da experiência, convertido em sujeito do
relato, é o autor, o narrador é o personagem principal desta trama
de sentido ou de sem-sentido que construímos com nossa vida e
que, ao mesmo tempo, nos constrói.
Para este autor, o relato da experiência é uma forma que o
sujeito da experiência, transformado em sujeito do relato, encontra
para expressar seus sentidos para o que lhe ocorreu. Narrar um
acontecimento privilegia, assim, a possibilidade de significar e
dar sentido a uma experiência vivida. Uma experiência que não
pode ser antecipada, não tem a ver com o tempo linear, esse
tempo em que nada nos passa, senão com o acontecimento do que
não se pode prever, nem predizer, nem prescrever, diz respeito a
um espaço intersticial.
Larrosa (1999) diz que o espaço intersticial é o lugar das práticas
não tuteladas pela segurança da verdade estabelecida e por
aquilo que é pré-determinado. Afirma que é o lugar do perigo,
“[ ] porque fora do mundo seguro da sala de aula, não valem as
seguranças da verdade, da cultura, do saber, do sentido. Um lugar
do perigo, do risco, do imprevisto, porque é um lugar marginal e
habitado pela diversidade onde não é possível padronizar”.
Perceba, então, que os espaços intersticiais onde
acontecem as mudanças são espaços para a realização
de projetos e de inovações no modo de fazer, no
modo de agir, no modo de pensar. É nesse espaço que
as crianças podem divagar.
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Seção 2 - A teoria das inteligências múltiplas
As inteligências dormem. Inúteis são todas as tentativas
de acordá-las por meio da força e das ameaças. As
inteligências só entendem os argumentos do desejo: elas
são ferramentas e brinquedos do desejo.
Rubens Alves, em Cenas da Vida
Você já conheceu pessoas que conseguem aprender com extrema
facilidade coisas que outros consideram muito difíceis? O
que acorre normalmente é que consideramos estas pessoas
inteligentes, porque elas seguem os modelos de referência trazidos
pelos discursos de verdade, julgando-as pelo que nos ensinaram.
No entanto, não são poucas as vezes que nos deparamos com
pessoas que têm certa deficiência em determinada área, tal como
cálculo, memória ou execução musical e facilidade em outras,
aumentando ainda mais as incertezas que temos sobre como
deveríamos encarar o que é ser uma pessoa inteligente. Para que
possamos compreender este processo, vamos nos reportar a um
grupo de pesquisa que procurou estudar a questão em análise.
Nos anos oitenta, Howard Gardner participou de um grupo,
apresentando uma teoria que revolucionou os conceitos sobre a
inteligência humana. Essa equipe de pesquisadores da Harvard
Graduate School of Education realizou uma investigação sobre
“A Natureza e Realização do Potencial Humano”. Esse grupo
foi treinado principalmente em psicologia do desenvolvimento,
assumindo um empreendimento de escrever um trabalho
sobre aquilo que fora estabelecido nas ciências humanas a
respeito da natureza da cognição humana. Neste contexto,
foram investigadas várias populações, incluindo crianças que
apresentavam perfis cognitivos irregulares – perfis difíceis de
explicar nos termos de uma visão unitária de inteligência.
A partir desta pesquisa, Gardner apresenta em seu livro
“Estruturas da Mente” a Teoria das Inteligências Múltiplas, como
uma forma de analisar as capacidades cognitivas de um ser
humano. Ele descreve o desenvolvimento cognitivo como uma
capacidade cada vez maior de entender e expressar significado
em vários sistemas simbólicos utilizados num contexto cultural,
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Linguagem e infância I
sugerindo que não há uma ligação necessária entre a capacidade
ou estágio de desenvolvimento em uma área de desempenho e
capacidades ou estágios em outras áreas ou domínios. Para ele,
num plano de análise psicológico, cada área ou domínio tem seu
sistema simbólico próprio; num plano sociológico de estudo, cada
domínio se caracteriza pelo desenvolvimento de competências
valorizadas em culturas específicas.
A partir da visão do autor, todos os indivíduos considerados
“normais” são capazes de uma atuação em diferentes tipos de
inteligência, até certo ponto independentes. Ele sugere que não
existem habilidades gerais, duvida da possibilidade de se medir a
inteligência através de testes e dá grande importância a diferentes
atuações valorizadas em culturas diversas. Demonstra que as
demais faculdades também são produtos de processos mentais, e
que não há motivo para diferenciá-las das questões lógicas. Desta
forma, amplia o conceito de inteligência que, em sua opinião,
pode ser definida como a capacidade de resolver problemas
ou elaborar produtos valorizados em um ambiente cultural ou
comunitário.
A Teoria das Inteligências Múltiplas, proposta por Gardner é,
pois, uma alternativa para o conceito de inteligência
que permite aos indivíduos uma performance
maior ou menor em qualquer área de atuação,
através da avaliação das atuações de diferentes
profissionais em diversas culturas, e do
repertório de habilidades destes na busca de
soluções, culturalmente apropriadas para
os seus problemas. Nas suas pesquisas, este
autor estudou também o desenvolvimento de
diferentes habilidades em crianças normais
e crianças superdotadas; adultos com lesões
cerebrais que não perdem a intensidade de sua
produção intelectual, mas sim uma ou algumas
habilidades, sem que outras sejam sequer atingidas. Uma criança
pode ter um desempenho precoce em uma área e estar na média
ou mesmo abaixo da média em outra.
Levando em conta as idéias de Gardner (1994), surgiram
inúmeras metodologias educacionais que procuram trabalhar
com a pluralidade das inteligências presentes no indivíduo.
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Algumas dessas metodologias trazem consigo versões
diferentes de como as inteligências devem ser educadas.
Segundo o autor, as inteligências funcionam juntas para
resolver problemas, para produzir vários tipos de estados finais
culturais, passatempos; e o propósito das instituições escolares
deveria ser o de desenvolver as várias inteligências, ajudando
as pessoas a atingirem objetivos de conhecimentos adequados
ao seu tipo de inteligência. As pessoas que são ajudadas a fazer
isso se sentem mais engajadas e competentes, e, portanto, mais
inclinadas a se desenvolverem socialmente.
Sendo assim, você que vai trabalhar com a Educação
Infantil deve considerar um passo importante para a
prática pedagógica que é reconhecer a pluralidade
das inteligências e as muitas maneiras pelas quais
as crianças podem desenvolvê-las, influenciando
de maneira significativa a forma de trabalhar, de se
relacionar, de ensinar e aprender.
Veja sobre esta questão em:
CABRAL, Marcelo. A Teoria das
Inteligências Múltiplas. <http://
www.rehagro.com.br/siterehagro/
publicacao.do?cdnoticia=344>
Veja bem, se aceitarmos as idéias do autor, podemos concluir que
todos os indivíduos, em princípio, têm a habilidade de questionar
e procurar respostas, já que possuem certas habilidades básicas
em todos os tipos de inteligência. A linha de desenvolvimento
de cada inteligência, no entanto, pode ser influenciada, tanto por
fatores genéticos e neurobiológicos, quanto por condições sócioculturais. De acordo com Cabral cada uma destas inteligências
tem sua forma própria de linguagem, além de seu sistema
simbólico. Estes sistemas estabelecem o contato entre os aspectos
básicos da cognição e a variedade de papéis e funções culturais
que o indivíduo desempenha na sociedade. Sendo assim, a noção
de cultura é básica para a Teoria das Inteligências Múltiplas.
Esta renega, pois, a possibilidade de medir a inteligência pelos
métodos convencionais, principalmente com os famosos testes
de Q.I. (quociente de inteligência). Os métodos convencionais
medem as manifestações das competências lógico-matemático e
lingüística, não dando conta de avaliar todos os outros aspectos.
Gardner (1995) esclarece que um aspecto importante da
avaliação das inteligências deve incluir a capacidade do indivíduo
de resolver problemas ou criar produtos, utilizando os materiais
do meio intelectual. No entanto, é igualmente importante
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determinar qual inteligência é favorecida quando o indivíduo
pode escolher. Este autor diz, ainda, que uma técnica para chegar
a esta inclinação consiste em expor a pessoa a uma situação
suficientemente complexa, capaz de estimular várias inteligências,
ou oferecer um conjunto de materiais de diferentes inteligências,
verificando qual deles o indivíduo escolhe e quão profundamente
o explora.
A Educação Infantil, neste contexto, deverá preocuparse menos em medir os conhecimentos e focalizar
mais a aprendizagem, enfatizando o lado criativo
da criança, dinamizando e enfocando os eventos
em equipe, promovendo talentos individuais,
incentivando e estimulando o seu desenvolvimento
segundo seus ritmos, dando ênfase a sua capacidade
de pensar e se expressar.
Utilizar eventos em grupos, em que se compartilhe
responsabilidades e respeito, usando elogios sinceros, atribuindo
tarefas motivadoras de acordo com as habilidades e os talentos
das crianças, são algumas formas de atividades que podem ser
utilizadas na Educação Infantil.
Gardner (1995) identificou as inteligências classificando-as de
acordo com os seguintes tipos: lingüística, lógico-matemática,
espacial, musical, corporal-cinestésica, interpessoal e intrapessoal.
Ele identificou inicialmente sete inteligências, mas não considera
este número definitivo, incluindo posteriormente mais três que
chamou de Inteligência Pictográfica, Inteligência Naturalista e
Inteligência Existencial ou Espiritual.
Seção 3 - Os tipos de inteligência
Para uma melhor compreensão, você verá nesta seção o quadro
com os tipos de inteligências, seus conceitos e aplicações. Veja a
seguir:
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Figura 1 – Inteligências Múltiplas, como definidas por Howard Gardner.
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Linguagem e infância I
Agora que você já conheceu o quadro e tem uma idéia acerca
dos diferentes tipos de inteligência apresentadas pelo autor,
acompanhe a seguir seus conceitos e saiba um pouco mais sobre
cada uma delas.
1 – Inteligência lingüística
A linguagem é considerada um instrumento de mediação
simbólica que caracteriza a espécie humana e é fundamental
tanto nas trocas interpessoais, como na internalização dos
processos constituídos nessas trocas. A língua materna é
transversal a todo o currículo. Ela está presente em todas as
disciplinas e, por conseguinte, as atividades sugeridas são
pertinentes em qualquer disciplina. A língua materna está
também presente em qualquer contexto da vida quotidiana. É na
família que a criança começa a ter contacto com ela.
De acordo com Gardner (2005) o conhecimento das
características da fala materna e da criança em etapas iniciais
do desenvolvimento e a identificação dos aspectos que podem
colaborar para o desenvolvimento da linguagem infantil são de
especial relevância para a Educação.
A linguagem é entendida, nesta perspectiva, como
comunicação e, portanto, é anterior ao surgimento da
palavra.
A linguagem oral se constitui no meio mais importante
para o desenvolvimento da criança, pois é através da palavra
que se manifesta a sua subjetividade, além de ser o meio
que a criança encontra para expressar o seu pensamento.
A linguagem é, pois, um processo histórico-cultural que
se define nas relações sociais. Sendo assim, a interação
comunicativa é fundamental para a formação do Eu, assim
como também para que a criança construa saberes. A
inteligência lingüística é a habilidade para usar a linguagem
para convencer, agradar, estimular ou transmitir idéias. Os
componentes centrais da inteligência lingüística são uma
sensibilidade para os sons, ritmos e significados das palavras.
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O autor explica que essa é uma habilidade mais exibida pelos
poetas. Salienta, também, que em crianças, esta habilidade
se manifesta através da capacidade de relatar com precisão
experiências vividas e para contar histórias originais. As
pessoas com este tipo de inteligência mais desenvolvida têm
muita sensibilidade para os sentidos das palavras e para a sua
manipulação. Manifestam gosto pela leitura e pela escrita e
comunicam-se bem oralmente, fazendo uma boa ligação das
idéias, tendo ainda facilidade na sua transmissão.
Veja bem, todo tema escolar deve se prestar a animados
debates com a segura intervenção do educador, visando a locução
e interlocução, sugerindo maior clareza nas idéias e ajudando as
crianças a organizarem o seu pensamento através de expressão
verbal. Qualquer tema pode abrigar desafios que podem ser
trabalhados para o desenvolvimento deste tipo de inteligência.
A partir destas explicações, pergunto: como você
pode ajudar as crianças no desenvolvimento deste
tipo de inteligência?
Antunes (2002) propõe várias atividades que podem desenvolver
este tipo de inteligência para adultos e crianças de diferentes
idades:
„
Contar histórias;
„
Possibilitar jogos de palavras;
„
Utilizar uma linguagem correta;
„
Usar debates com intervenção do educador;
„
Interpretar textos (analogias, trovas; manchetes
contextualizadas)
„
Motivar as pessoas a falar apoiando o seu trabalho;
„
Demonstrar formas melhores de comunicação;
„
Utilizar atividades como o painel aberto que convida o
grupo a expor idéias;
„
Ler alto para os alunos, com freqüência;
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„
Incentivar as apresentações teatrais;
„
Criar/desenvolver o gosto pela leitura;
„
Propor a criação de fantasias que contextualizem temas;
„
Estimular a criação de poemas e construção de paródias;
„
Promover debates sobre temas de interesse dos alunos;
„
Favorecer entrevistas, colhendo impressões, idéias,
críticas e sugestões;
„
Utilizar e criar dicionários;
„
Favorecer a confecção de diário de campo, relatórios de
observações e experiências;
„
Incentivar a escrita de cartas, manifestos e folders;
„
Promover correspondência com alunos de outras escolas.
2 – Inteligência lógico-matemática
Números e raciocínio lógico são algo que agrada particularmente
a quem possui uma inteligência lógico-matemática
bem desenvolvida. Estas pessoas possuem o gosto pela
interpretação e categorização dos fatos e da informação,
através do cálculo, do raciocínio lógico e da busca de
explicação para tudo. Sentem-se desafiadas perante
problemas que envolvem raciocínio e procuram resolvêlos de forma metódica e persistente. Divertem-se
resolvendo “quebra-cabeças” das revistas e dos jornais.
Observe que os componentes centrais deste tipo de inteligência
são descritos por Gardner (2005) como uma sensibilidade para
padrões, ordem e sistematização. É a habilidade para explorar
relações e categorias, através da manipulação de objetos ou
símbolos. E a habilidade para lidar com séries de raciocínios,
reconhecendo problemas para resolvê-los. É a inteligência
característica de matemáticos e cientistas. Embora o talento
científico e o talento matemático possam estar presentes num
mesmo indivíduo, os motivos que movem as ações dos cientistas e
dos matemáticos não são os mesmos.
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Enquanto os matemáticos desejam criar um mundo abstrato
consistente, os cientistas pretendem explicar a natureza. A
criança que possui aptidão para esse tipo de inteligência
demonstra facilidades para trabalhar bem com resolução de
problemas e para contar e fazer cálculos matemáticos.
No entanto, é preciso que você perceba que os
alunos entenderão melhor os números, as operações
matemáticas e os fundamentos da geometria se puder
torná-los palpáveis.
Assim, é importante no trabalho com crianças a utilização
de materiais concretos como moedas, pedrinhas, tampinhas,
conchas, blocos, caixas de fósforos, fitas e cordões que estimulem
o raciocínio abstrato das crianças. É importante também que ela
aprenda a observar na natureza e nos temas descritos a presença
de padrões de simetria e de formas geométricas. Para qualquer
tema, o educador poderá inventar problemas que envolvam
probabilidades ou mesmo uma interpretação de dados.
A partir do que expomos anteriormente, questiono:
Como você pode, a partir de sua formação de
educador, ajudar as crianças no desenvolvimento
deste tipo de inteligência?
Antunes (2002) diz que há vários recursos e atividades que
estimulam a inteligência lógico-matemática nas diversas faixas
etárias, quais sejam:
„
Invente problemas nos temas estudados;
„
Desenvolva fórmulas diversas, explorando-as;
„
Experimente propor diversas linhas do tempo, que
envolvam a vida dos alunos;
„
Use estratégias dos cochichos;
„
Utilize mapas conceituais;
„
Transforme textos em gráficos;
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„
Faça com que as crianças observem o padrão de simetria
e formas geométricas;
„
Invente problemas que envolvam probabilidade e
interpretação de dados.
„
Use quebra-cabeças;
„
Favoreça a utilização de jogos manipuláveis e on-line;
„
Utilize diversos materiais manipulativos;
„
Trabalhe com a categorização de fatos e de informação;
„
Use analogias e pesquisas;
„
Proporcione experiências de oficinas e laboratórios;
„
Utilize mapas de idéias e mnemônicas.
Os jogos, por exemplo, são formas lúdicas de desenvolver a
inteligência lógico-matemática. Tarefas que envolvem abstração
são do agrado de quem tem a inteligência lógico-matemática
mais desenvolvida.
As mnemônicas são palavras ou frases criadas com o objetivo de
servirem de auxiliares de memória e que podem ser criadas pela
própria criança.
Os mapas de idéias são uma das várias formas possíveis de
organizar graficamente a informação, articulando-a de forma
lógica, constituindo-se em auxiliar na compreensão das matérias
que se estuda e em revisões.
3 – Inteligência espacial
Gardner (2005) descreve a inteligência espacial como a
capacidade para perceber o mundo visual e espacial de forma
precisa. É a habilidade para manipular formas ou objetos
mentalmente e, a partir destas percepções, criar equilíbrio
e composição. Explica que esta é a inteligência dos artistas
plásticos, dos engenheiros e dos arquitetos. Em crianças da
Educação Infantil, o potencial especial nesse tipo de inteligência
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é percebido através da habilidade, por exemplo, de manusear
bem quebra-cabeças e jogos espaciais, com a especial atenção a
detalhes visuais.
A inteligência espacial refere-se à capacidade de
perceber informações visuais ou espaciais, de
transformar e modificar essas informações, e de recriar
imagens visuais mesmo sem referência a um estímulo
físico original.
Nesse tipo de inteligência, inclui-se a capacidade de construir
imagens. Tal inteligência também é usada por deficientes
visuais, para encontrarem o caminho para casa, por exemplo,
pois a inteligência espacial não depende da sensação visual
propriamente dita. Gardner (2005) afirma que as populações
cegas ilustram a distinção entre a inteligência espacial e a
percepção visual, pois uma pessoa cega pode reconhecer formas
ao passar a mão ao longo do objeto – tal método traduz a duração
do movimento, que por sua vez é percebida no formato do objeto.
Portanto, para a pessoa cega, o sistema perceptivo da modalidade
tátil equivale à modalidade visual na pessoa que enxerga.
O autor anteriormente citado diz, ainda, que além do
desenvolvimento deste tipo de inteligência nas artes visuais,
ela também é utilizada entre os geógrafos, cirurgiões e
navegadores. Veja bem, a solução de problemas espaciais é
necessária, por exemplo, na navegação e no uso do sistema
de mapas. Outros tipos de solução de problemas espaciais são
também convocados quando visualizamos um objeto de um
ângulo diferente. As artes visuais também utilizam este tipo de
inteligência no uso do espaço.
Gráficos, imagens, diagramas, mapas de idéias, mapas de
conceitos são bons auxiliares para a aprendizagem deste tipo
de inteligência. As pessoas que têm mais desenvolvida esta
inteligência gostam de desenhar, de elaborar esquemas, de fazer
trabalhar com quebra cabeças, ler livros ilustrados, optando em
usar com mais freqüência as cores. Os seres humanos mais visuais
têm um senso artístico que faz com que tudo que criam pareça
agradável aos olhos de quem observa. As atividades que podem
ser mais proveitosas para estes tipos de inteligência, incluem a
escultura e a criação de artes gráficas, associando-se a inteligência
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verbal, descrevendo com detalhes ínfimos uma imagem
– uma fotografia, por exemplo – inferindo com criatividade e
provocando surpresas.
O educador, para contribuir com este tipo de inteligência,
pode propor para as crianças maiores qualquer ilustração e
sua recriação em novos tamanhos e formas. A cartografia
também pode ser usada, já que traz uma série muito
expressiva de sinais convencionais. É interessante também
a utilização de mapas conceituais para a exposição e síntese
de idéias, e estes precisam ser criados alternando-se suas
cores e até mesmo suas formas. Podemos citar como exemplo de
atividades para este grupo de crianças maiores: fazer um mapa
aéreo detalhado da sala, com a perspectiva de quem a vê de cima.
Todos os objetos que se encontram na sala deverão ser listados,
seja no próprio desenho ou num sistema onde se numeram os
objetos e depois se faz a correspondência numa lista ao lado do
desenho. O mesmo objeto não precisa ser “etiquetado” mais de
uma vez.
Antunes (2002) apresenta algumas propostas de atividades para
este tipo de inteligência, e que deve ter seu início na educação
infantil:
„
Fazer com que a criança descubra a existência de
linguagens novas;
„
Construir textos ou equações numéricas em desenhos
arquitetônicos (várias letras, formas, cores);
„
Usar a recriação de textos e ilustrações (novas formas e
tamanhos);
„
Utilizar a cartografia com sinais convencionais, criando
outros;
„
Favorecer a descoberta dos sistemas gráficos e numéricos
e seus usos em diferentes situações;
„
Usar mensagens cifradas (artísticas e científicas);
„
Proporcionar a pesquisa e descoberta em linguagens
diferentes (cochichos vísio-espaciais);
„
Utilizar mapas conceituais, alternando cores e formas;
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„
Desenvolver gincanas: associação do tema estudado com
pinturas, desenhos, gráficos, esculturas;
„
Construir carimbos.
4 – Inteligência musical
Esta inteligência se manifesta através da habilidade para
apreciar, compor ou reproduzir, por exemplo, uma peça musical.
Relaciona-se com a discriminação de sons, habilidade para
perceber temas musicais, sensibilidade de ouvir e reproduzir
ritmos, texturas e timbre, e habilidade para produzir vários
tipos de músicas. Note que a criança pequena com habilidade
musical, por exemplo, percebe desde cedo diferentes sons no
seu ambiente. Gardner et. al. (1998) dizem que a inteligência
musical permite às pessoas criar, comunicar e compreender
significados compostos por sons, componentes esses cruciais
para a aprendizagem, incluindo o tom, ritmo e timbre
(qualidade do som).
Estes indivíduos apresentam alto grau de desenvolvimento
da inteligência musical tais como os compositores, maestros e
instrumentistas, assim como peritos em acústica e engenheiros de
áudio. Gostam de cantar, ouvir, marcar ritmos e criar melodias.
As pessoas com inteligência musical gostam de cantarolar, de
entoar algum som. Mesmo com a boca fechada, elas procuram
emitir sons criativos, diferentes, e apreendem com facilidade
canções novas. Na verdade, o que se pode notar é que elas
possuem um “ouvido musical”, ou seja, vêem e sentem sons em
tudo. Podem não ser os melhores cantores ou músicos, mas
possuem uma habilidade para interagir e entender os sons que
as outras pessoas não possuem. Sua relação com o mundo ocorre
através dos sons e ritmos sonoros. Essas pessoas se beneficiarão
mais escrevendo letras e canções para músicas, tocando
instrumentos para acompanhar seus trabalhos ou de outros,
ou desenvolvendo projetos de multimídia. Enfim, são pessoas
musicalmente inteligentes.
Uma atividade interessante para este grupo é estimulá-lo a
transformar textos, mensagens ou idéias em paródias, adaptandose os conteúdos com os quais se trabalha às músicas populares
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com letras alteradas. Um concurso de trovas ou mesmo de textos
em forma de rap pode animar pesquisas e desenvolver projetos
que explorem linguagens diferentes para um mesmo tema. Os
sons da natureza gravados podem abrigar cenários para excelentes
fundos musicais extremamente válidos para ilustrar conteúdos de
diferentes áreas.
Tomando por base o trabalho de Antunes (2002), apresentamos
algumas atividades para o desenvolvimento deste tipo de
inteligência nas diversas faixas etárias:
„
Estimular a transformação dos textos, mensagens ou
idéias em paródias;
„
Utilizar temas, eventos, descrição, abrigando formas
diversificadas de apresentações sonoras;
„
Propor a criação de músicas contextualizadas ao tema
trabalhado;
„
Incentivar a organização de apresentações com “fundo”
musical para relatos de temas;
„
Fazer um concurso de trovas envolvendo linguagens
diferentes;
„
Organizar um arquivo de fitas/CDs com efeitos sonoros
para serem exploradas;
„
Fazer a análise das linguagens dos instrumentos,
inventando diálogos;
„
Estimular as crianças nas relações entre a música e os
fatos;
„
Utilizar sucatas na confecção de instrumentos musicais;
„
Organizar concursos, gincanas, coleções de “colagens”
musicais;
„
Favorecer redações que associem o áudio e o visual.
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5 – Inteligência corporal-cinestésica
Conforme Gardner (2005), este tipo de inteligência se refere à
habilidade que as pessoas possuem para resolver problemas
através da linguagem corporal. É a forma que utilizam para
usar os movimentos corporais como as danças, os jogos,
os esportes, as artes cênicas e a manipulação de objetos
com destreza. A criança dotada da inteligência cinestésica
se move com graça e expressão a partir de estímulos
musicais, demonstrando uma grande habilidade motora.
A inteligência corporal-cinestésica envolve o uso de todo
o corpo ou de partes dele para resolver problemas ou criar
produtos. Operações centrais associadas a essa inteligência
consistem no controle sobre as ações motoras e a capacidade
de manipular objetos externos.
A cinestesia toma consciência da realidade através do
movimento do corpo.
A melhor forma de ter sucesso neste tipo de inteligência na
educação infantil é aprender o que é ensinado com o seu próprio
corpo, tais como: gestos, dramatizações, movimento, mímicas,
exercícios físicos. Essa inteligência nos pontua pessoas inquietas,
que não conseguem ficar sossegadas em seu lugar, não conseguem
ficar sentadas por muito tempo. Simplesmente raciocinam melhor
quando seus corpos estão em movimento, isto é, elas interagem
melhor com o mundo através do contato manual e corporal. As
pessoas que têm este tipo de inteligência desenvolvida adoram
esportes, inventar, construir e dançar. São curiosas e procuram,
na maioria das vezes, desmontar equipamentos e brinquedos para
saber como funcionam.
Eis alguns exemplos de profissionais com estas
características: dançarinos, atletas profissionais,
cirurgiões, mecânicos, construtores, e todos os tipos
de artífices em todas as áreas.
O que o educador pode fazer para trabalhar melhor com
este grupo e combinar o uso de alguns signos gestuais como
mensagens, informações e recados.
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Linguagem e infância I
De acordo com Antunes (2002), o que vem acontecendo
geralmente nas instituições de ensino é que se separa mente de
corpo. O corpo que a escola nos faz ver é um corpo didático,
rígido, como que um subproduto de aulas de anatomia. Se é
o corpo o lugar em que as forças massificadoras forjam uma
subjetividade de massa, é dele também que depende a criação de
modos de vida até agora nunca experimentados, já que o corpo
que obedece é o mesmo que conspira e que cria. Resistir passa
pela luta contra uma subjetividade submetida, acostumada a
repetir anos a fio.
Apresentamos, a partir das idéias de Antunes (2002), alguns
exercícios que podem contribuir para o desenvolvimento deste
tipo de inteligência:
„
Procurar envolver as crianças em simulações através da
linguagem corporal;
„
Usar atividades mímicas para desenvolver conteúdos
tradicionais (signos gestuais, mensagens, informações);
„
Motivar as crianças para utilização de teatralização
ou representações gestuais, através de seqüências de
movimentos;
„
Proporcionar espaço para experiências com danças
contextualizadas a temas curriculares diversos;
„
Estimular gincanas, caça ao tesouro com objetivo de
vencer etapas;
„
Propor espaço para o estudo e confecção de mapas,
projetos e jogos;
„
Usar o alfabeto vivo com o corpo;
„
Associar saberes a lances esportivos
6 – Inteligência interpessoal
Esta inteligência pode ser descrita como uma habilidade para
entender e responder a atitudes relativas a humores e desejos
de outras pessoas. Ela é mais apreciada por psicoterapeutas,
professores, políticos e vendedores bem sucedidos por meio
Unidade 3
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77
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Universidade do Sul de Santa Catarina
da observação. A inteligência interpessoal se manifesta em
crianças pequenas através da habilidade para distinguir
pessoas. Demonstram muito cedo uma habilidade para liderar,
uma vez que são extremamente sensíveis às necessidades e
sentimentos de outros.
Gardner (2005) diz que a inteligência interpessoal emprega
capacidades centrais para reconhecer e fazer distinções entre os
sentimentos, as crenças e as intenções dos outros. No início do
desenvolvimento, essa inteligência é vista como a capacidade
das crianças pequenas de discriminar entre os indivíduos de seu
meio ambiente e perceber o humor dos outros. Em suas formas
mais desenvolvidas, a inteligência interpessoal se manifesta na
capacidade de compreender os sentimentos e atitudes dos outros,
agir em função deles e moldá-los, para o bem ou para o mal.
Em outras palavras, essa inteligência é a habilidade
de relacionar-se com outros, dialogar com as pessoas
próximas para um objetivo determinado, entender os
sentimentos e as características pessoais dos outros.
Na inteligência interpessoal, vamos detectar a criança que
gosta de pensar através da troca de idéias com outras pessoas.
Gosta de organizar, liderar, trabalhar em grupo, participar de
acontecimentos sociais. São as pessoas conhecidas
como os ajudantes “de plantão”. Gostam de dirigir
grupos, de assistir a pessoas doentes e articular
modos de ajuda. Gostam de “dirigir” tudo, mesmo
que haja pressão ao contrário.
São falantes, e apesar de às vezes cansar o ouvinte,
falam bem, com lógica e muita criatividade.
Se desconfiarem que estão cansando o ouvinte, inventam
casos, histórias, piadas, dramas, psicodramas e até mentem
saborosamente para provocar interesse pelo que falam – e depois
enunciam que falaram mentira só para chamar a atenção da
platéia, ou deixam a mentira correr se a meta foi alcançada, ou se
o boato lhe traz “fama”.
Assim, o inteligente interpessoal associa em si mesmo a
inteligência verbal. Mas há casos de pessoas sem inteligência
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Linguagem e infância I
verbal acentuada, que se desenvolvem através do aspecto
interpessoal – uma capacidade de lidar com o outro, de
ensinar-lhe, de obter benefícios através dos contatos humanos
etc. Conseguem o melhor de si quando podem defender suas
idéias. Utilizam suas idéias para ajudar os amigos a resolverem
problemas. Relacionam-se melhor com o mundo através de suas
interações com os outros e um entendimento de como as pessoas
trabalham em grupo. As atividades onde têm melhores resultados
são aquelas em equipes esportivas, grupos de discussões e
organização de eventos.
A contextualização de notícias da televisão ou
dos jornais para assuntos do cotidiano pode abrir
interessantes explanações sobre sentimentos e
emoções. Os alunos podem ser estimulados a criar
seus diários emocionais e, ainda que os mantenham
“secretos”, sua validade como meio de autoconhecimento é indiscutível.
Sugerimos, a partir das idéias de Antunes (2002), estratégias
e sugestões para utilização do desenvolvimento deste tipo de
inteligência:
„
Utilizar as discussões onde ora professor, ora os alunos
sejam expositores e observadores;
„
O professor deve dispor de casos para seu estudo e
discussão;
„
O professor precisa estabelecer novas perspectivas para
temas (alunos sejam criadores);
„
Utilizar a contextualização de notícias da TV ou jornais
para assuntos cotidianos;
„
Envolver os alunos em campanhas filantrópicas e projetos
ambientais;
„
Valorizar bons exemplos, envolvendo pesquisas sobre
pessoas conhecidas na comunidade;
„
Organizar debates sobre problemas comunitários.
Unidade 3
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Universidade do Sul de Santa Catarina
7 – Inteligência intrapessoal
Este tipo de inteligência é a habilidade para ter acesso aos
próprios sentimentos, sonhos e idéias, lançando mão deles
na solução de problemas pessoais. É o reconhecimento de
habilidades, necessidades, desejos e inteligências próprias;
capacidade para formular uma imagem precisa de si e a
habilidade para usá-la. Como esta inteligência é a mais pessoal
de todas, ela só é observável através dos sistemas simbólicos das
outras inteligências, ou seja, através de manifestações lingüísticas,
musicais ou cinestésicas, entre outras.
A Inteligência intrapessoal relaciona-se com a noção que
o indivíduo tem dos próprios sentimentos, referindo-se à
capacidade de auto-conhecimento que ele possui. Gardner
(2005) vê essa inteligência como se desenvolvendo a partir
de uma capacidade de distinguir o prazer da dor e de
agir em função dessa discriminação. Segundo este autor,
em seu nível mais avançado, a inteligência intrapessoal
consolida uma discriminação dos próprios sentimentos,
intenções e motivações, que traz um elevado nível de autoconhecimento semelhante àquele utilizado pelas pessoas
mais velhas quando tomam uma decisão importante, ou
ao aconselharem outros indivíduos de sua comunidade.
O autor também enfatiza o papel desempenhado por essa
inteligência para permitir que os indivíduos construam
um modelo acurado de si mesmos e utilizem esse modelo
para tomar boas decisões em suas vidas. Assim, de acordo com
o autor, essa inteligência pode agir como uma “agência central
de inteligências”, permitindo que os indivíduos conheçam as
próprias capacidades e percebam a melhor maneira de usá-las.
A inteligência intrapessoal mostra-nos uma pessoa que precisa
de um tempo e de um espaço individual introspectivo para
amadurecer as sua idéias. Relaciona as novas aprendizagens com
os interesses pessoais e seus valores. Gosta de estabelecer metas
pessoais e de marcar o ritmo de execução dos projetos em que
se envolve, de fazer as suas próprias opções. São as pessoas que
gostam ou não de ficar só – e se não gostam, obtêm lucro com
essa vivência, aprendendo com ela. Elas possuem um ritmo
próprio característico do seu desejo. São descritas pelos outros
como tímidas – mas podem ser introvertidas.
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Linguagem e infância I
Estas pessoas não são anti-sociais, elas apenas pensam melhor
quando são deixadas à vontade para ditarem seu próprio ritmo,
no seu interior – no seu Eu. Elas se relacionam melhor com o
mundo sob uma ótica independente e através da auto-reflexão
se perguntando o tempo todo: Qual o sentido das coisas?
Qual o meu sentido de estar aqui agora pensando, sentindo,
agindo? Elas gostam de escrever, pesquisar e explorar assuntos
na Internet. Os Intrapessoais, portanto, obterão melhores
resultados com atividades onde possam trabalhar sozinhos,
projetos independentes, e trabalhos de pesquisa.
Alguns exemplos de profissões para pessoas com
este perfil são Psicólogos, Escritores, Filósofos,
Programadores de Computador, etc.
Atividades do tipo berlinda são interessantes quando o grupo
revela maturidade para a auto e heterocrítica. Um educador
estimulador das inteligências pessoais necessita sempre dispor de
“casos” para seu estudo e discussão em sala de aula.
Sugerimos, a partir das idéias de Antunes (2002), estratégias
e sugestões para utilização do desenvolvimento deste tipo de
inteligência:
„
Estimular temas em círculos de debates;
„
Usar estudos de caso e dramatizações sobre o mesmo;
„
Propor a criação de painéis e colagens sobre emoções
vivenciadas;
„
Estimular a criação de diários emocionais como meio de
auto-conhecimento;
„
Proporcionar debate sobre valores e virtudes;
„
Fazer o auto-retrato emocional, ampliando a auto-estima.
Gostaríamos de explicitar neste momento, que Gardner
inicialmente destacou sete tipos de inteligências, mas que jamais
fechou esse paradigma e, ele próprio, algum tempo depois,
destacou outras inteligências tais como a “naturalista” que é
a capacidade do ser humano relacionar-se com a natureza.
Mostrou também que seria possível falar em uma inteligência
Unidade 3
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Universidade do Sul de Santa Catarina
“pictográfica,” que trata da habilidade para desenhar e da
inteligência “existencial ou espiritual” que trata tanto das
questões afetivas quanto cognitivas sobre o transcendente e o
divino, a qual vamos nos reportar a seguir.
8 – Inteligência Naturalista
É a capacidade de uma pessoa de sentir-se um componente
natural, ter sensibilidade à natureza e ao meio ambiente.
Capacidade para entender o meio natural e identificar como as
coisas acontecem, compreender, por exemplo, como as plantas
crescem e se desenvolvem. Exemplos de profissões: paisagistas,
biólogos e ecologistas.
O britânico Charles Darwin, que desenvolveu uma
teoria sobre a evolução dos seres vivos, é um exemplo
de quem tem aptidão naturalista.
Gardner sugere que os jovens usem sua inteligência naturalística,
para reconhecer, classificar e organizar figuras relacionadas a
natureza. É necessário começar a procurar essa inteligência nas
crianças, pois a razão de trazer a teoria das inteligências múltiplas
para as salas de aula, é fornecer a elas a maior opção de caminhos
para serem bem sucedidas. A inteligência naturalística oferece
um meio a mais para ajudar as crianças a compreender
e aprender sobre o mundo.
O Meio Ambiente constitui um dos temas
transversais propostos nos Parâmetros Curriculares
Nacionais e introduz nas salas de aula um tema cada
vez mais atual. Para o educador, o meio ambiente não
se restringe ao ambiente físico e biológico, mas inclui
também as relações sociais, econômicas e culturais.
O objetivo é trazer reflexões que levem o aluno ao
enriquecimento cultural, à qualidade de vida e à
preocupação com o equilíbrio ambiental.
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Linguagem e infância I
A partir do exposto lhe perguntamos: como podemos
conhecer melhor o meio ambiente para que possamos
adotar práticas que auxiliem o planeta em sua luta
pela sobrevivência? Melhor ainda, de que forma
podemos estimular as crianças a se interessarem pelo
tema, buscar informações, participar ativamente de
procedimentos e ações em defesa do meio ambiente?
O que podemos lhe sugerir para desenvolver melhor este tipo
de inteligência é que leve suas crianças para um parque ou para
o jardim e plante árvores com elas, refletindo sobre este tema,
promovendo ações efetivas de defesa do meio ambiente em seu
município.
A partir das idéias de Pavani, sugerimos algumas estratégias
para utilização do desenvolvimento deste tipo de inteligência nas
diversas faixas etárias:
„
Observar e recriar a paisagem;
„
Organizar passeios com pesquisa sobre a descoberta de
pistas relevantes;
„
Coletar objetos do mundo natural;
„
Classificar espécies naturais e registrar em diário de
campo;
„
Organizar grupos;
„
Observar a natureza e fazer um diário do observador;
„
Perceber as mudanças no meio ambiente;
„
Caracterizar objetos;
„
Coleta de sons ambientais através do gravador;
„
Aprender características do mundo natural;
„
Usar lentes de aumento, telescópios ou microscópios para
estudar a natureza;
„
Desenhar ou fotografar objetos naturais;
„
Caminhar junto à natureza ou viajar em ambiente
natural;
Unidade 3
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83
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„
Jardinagem;
„
Cuidar de animais de estimação;
„
Proteger a vida natural;
„
Visitar zoológicos e jardins botânicos;
„
Visitar museus de história natural;
„
Secar flores;
„
Consultar livros sobre a natureza;
„
Pesquisar sobre o trabalho de naturalistas famosos, tais
como Darwin.
9 – Inteligência Pictográfica
É a habilidade que a pessoa possui de transmitir uma mensagem
pelo desenho que faz, figuras e imagens, memorização de cenas
e lugares. É a faculdade de reproduzir, pelo desenho, pintura, que
se dão através de objetivos e situações reais ou mentais. Exemplos
de profissões: desenhistas, escultores, designers e publicitários.
Pintores como Leonardo da Vinci e Pablo Picasso são bons
exemplos deste tipo de inteligência.
Sobre esses aspectos veja mais
em: Crofoot, Irene B. Desenho,
Pintura e Modelagem http://www.
portaldafamilia.org/artigos/
artigo255.shtml
De acordo com Crofoot, muitas pessoas consideram a arte algo
inteiramente à parte da vida diária. Olham-na como matéria
muito especializada, que só pode ser criada e apreciada pelos que
foram especialmente preparados para isto, ou pelos muito bem
dotados. Alguns educadores modernos adotaram a atitude de
encorajar toda criança a se exprimir através de algum material
de criação. Eles encontram mérito verdadeiro nas expressões
artísticas naturais das crianças.
Os adultos, antes de tentar avaliar uma experiência
artística de uma criança, devem procurar
compreendê-la, pois aquilo que ela cria é uma
expressão do que pensa ou do que sente.
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Linguagem e infância I
Normalmente, os adultos costumam julgar as expressões
artísticas infantis de acordo com os padrões de arte dos adultos.
No entanto, ela possui a sua maneira pessoal de exprimir idéias.
Eles devem olhar mais de perto para a natureza da criança, para
melhor compreender a arte infantil. Se os adultos pudessem
compreender o que as crianças sentem a respeito do mundo, iriam
entendê-las melhor.
Cada dia traz alguma coisa nova e interessante
para sua vida. Seu ponto de vista e sua reação são
inteiramente diferentes daqueles do adulto.
Conforme Crofoot, a criança forma novas idéias a respeito do
mundo através dos sentidos da audição, da visão, do gosto, do
olfato e do tato. É preciso ajudá-la a perceber melhor a beleza que
existe à sua volta. No entanto, o adulto não deve fazer isto à força
através de sua visão ou concepção de beleza. Deve compreender
que a criança, a fim de aumentar seu patrimônio de informações,
precisa fazer explorações e experimentações. Normalmente, ela
é mais sensível que o adulto e vê muito do que
a ele passa despercebido, porque o mesmo está
absorvido demais nos seus pensamentos para ver
as coisas simples ao seu redor. Ela gosta de pegar
objetos e se delicia ao sentir o tato das superfícies
macias ou ásperas.
De acordo com a autora, a criança pode ser
comparada a um artista, porque um artista
verdadeiramente criador tem essas mesmas
qualidades de percepção. A criança dramatiza a
vida que vê: é um cavalo que galopa, um aeroplano que passa
roncando por sobre as nuvens, uma locomotiva resfolegante. Pode
passar rapidamente do riso às lágrimas. Suas emoções são mais
naturais e menos reprimidas que as dos adultos. No entanto,
muitas vezes a sociedade a obriga a adotar certas convenções,
roubando-lhe sua naturalidade.
Sugerimos as seguintes estratégias para utilização do
desenvolvimento deste tipo de inteligência:
Unidade 3
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„
utilização de técnicas e atividades artísticas: desenho,
pintura, colagem, modelagem;
„
utilização de técnicas e atividades perceptivas: bonecos e
teatro de fantoche, facilitando a comunicação;
„
utilização de técnicas e atividades construtivas: sucata e
atividades artesanais;
„
desenhos de personagens e jogos interativos compondo
cenários, alegres e coloridos, que retratam a realidade
vivenciada pela criança;
„
criação de espaços de interação da criança com o meio
escolar, os desenhos de cenas, equipamentos e materiais
personificados que tomem vida, ganhem cores tornando
o ambiente mais alegre;
„
Desenvolver a leitura da expressão plástica e estética,
através da experiência de apreciação dos trabalhos
realizados pelo grupo e de obras de arte;
„
Desenvolver a prática da observação, do registro e da
reflexão sobre esses recursos, sua importância para a
expressão pessoal e cultural do homem.
10 – Inteligência Existencial ou Espiritual
De acordo com Silva (2001) a formação espiritual, consistiria
fundamentalmente na construção de uma base de conhecimentos
e informações relacionados ao sagrado. Ela seria uma fonte
privilegiada de informações, tanto afetivas quanto cognitivas
sobre o “transcendente” e o “divino”. É por essa via que
o ser humano aprende como seus interesses e aptidões
espirituais podem ser processados no sentido de um
conhecimento que transcende e confere significado.
A autora esclarece que a pessoa espiritualmente
inteligente tem adequado senso de auto-aceitação;
compreende e aceita suas próprias limitações e
imperfeições e está mais livre da arrogância e de seu
inverso, a baixa auto-estima. Tal pessoa se mostra flexível
na busca de um equilíbrio harmonioso entre autoconceito,
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auto-integração e auto-regulação, logrando com suas práticas
de meditação e contemplação, ver-se mais facilmente como um
todo. A investigação sobre o processo de maturação espiritual
traz uma contribuição original para o estudo dos processos e
o funcionamento do conhecimento humano, proporcionando,
além disto, uma grande oportunidade para o diálogo entre
espiritualidade e saúde integral.
O uso inteligente da informação espiritual pode contribuir
positivamente para o bem-estar emocional e social das
comunidades, gerando melhor qualidade de vida para as pessoas.
Para justificar essa sua posição, Gardner (2000) acrescenta:
A inteligência existencial se qualifica bem como uma
inteligência à luz do oitavo critério, pois jovens de todo
o mundo levantam as questões fundamentais sobre a
existência - Quem somos? De onde viemos? Do que
somos feitos? Porque morremos? E estas questões são
capturadas em sistemas simbólicos tais como o mito, a
arte, a poesia, a filosofia e a religião. Alguns indivíduos
parecem precoces em suas capacidades de colocar tais
questões cósmicas onde outros se prendem às coisas mais
mundanas.
Quanto aos tipos de vida espiritual, Gardner reconhece três
deles: o espiritual enquanto preocupação com questões cósmicas
ou existenciais; o espiritual como a conquista de um estado;
o espiritual enquanto efeito nos outros. Gardner vê como a
qualidade essencial dessa inteligência:
A capacidade de se situar em relação aos limites
mais extremos do cosmos o infinito e o infinitesimal
- a capacidade afim que é a de se situar em relação a
elementos da condição humana como o significado da
vida, o sentido da morte, o destino final dos mundos
físicos e psicológicos e experiências profundas como
o amor de outra pessoa ou a total imersão numa obra
de arte [...] (que aqui se valoriza) [...] é o potencial
de uma espécie para se envolver com preocupações
transcendentais, uma capacidade que pode ser despertada
e desenvolvida sob determinadas circunstâncias.
(GARDNER, 2000, p.80)
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87
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Entretanto, por sermos únicos entre as espécies, somos dotados
também de um senso de temporalidade: almejamos transcender
nossa existência e viajar para antes do nascimento e para depois
da morte, levados pela consciência e pela vontade. Estas estão
presentes nas manifestações mais precoces do comportamento
humano. Nossa busca do passado e do futuro levou-nos aos cultos
e à espiritualidade — sob a forma de tradições e religiões — e às
profecias, manifestadas nas artes e ciências.
Sugerimos algumas estratégias para utilização do
desenvolvimento deste tipo de inteligência nas diversas faixas
etárias:
„
Estimular debates sobre espiritualidade e fé;
„
Usar estudos de caso e dramatizações sobre o tema
existência e transcendência;
„
Propor a criação de painéis e colagens sobre emoções
vivenciadas;
„
Estimular a criação de diários como meio de
autoconhecimento existencial;
„
Proporcionar debate sobre existência e sobrevivência;
„
Fazer o auto-retrato existencial, ampliando a autoestima.
Com essas descobertas, Gardner quebrou paradigmas,
como mostra Antunes (2002): esses paradigmas,
ainda que não modifiquem totalmente os tradicionais
conceitos usados para definir “Inteligência”, nos dá
a compreensão sobre como aprendemos ou não
e, principalmente, substitui a concepção de que
possuímos “apenas uma inteligência”.
Desta forma, derruba-se o mito de que a transmissão de
informações pode tornar pessoas receptoras mais inteligentes
e descobre-se que, na realidade, abrigamos um elenco
extremamente diversificado de “diferentes” inteligências, sensíveis
a estímulos que, se desenvolvidos corretamente por meio de
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projetos, altera profundamente a concepção que o ser humano faz
de si mesmo e os limites de suas potencialidades.
Todos nascem com o potencial das várias
inteligências. A partir das relações com o ambiente e
de aspectos culturais, algumas inteligências são mais
desenvolvidas, ao passo que deixamos de aprimorar
outras.
Seção 4 - A Teoria das Inteligências Múltiplas e a
Educação
A importância da teoria de Gardner para a educação fica evidente
quando se analisa as diversas formas de pensamento, as relações
entre os estágios de desenvolvimento das várias inteligências e a
aquisição de conhecimento e a cultura. Apresentam alternativas
para algumas práticas educacionais, oferecendo base para: o
desenvolvimento de atividades que sejam adequadas às diversas
habilidades humanas; uma educação centrada no aluno com
currículos específicos para cada área do saber; um ambiente
educacional mais amplo e variado, e que depende menos do
desenvolvimento exclusivo da lógica.
De acordo com Gardner (1995), é importante que
se tire o maior proveito das habilidades individuais
das crianças, auxiliando-as a desenvolver suas
capacidades intelectuais e, para tanto, ao invés de usar
a avaliação apenas como uma maneira de classificar,
aprovar ou reprovar, esta deve ser usada para fazer o
aluno pensar sobre as suas capacidades nos diversos
tipos de inteligência.
No que se refere à educação infantil, Gardner (1995) sugere a
necessidade de uma atenção muito especial à singularidade da
criança, que diz respeito ao fato de que, se os indivíduos têm
perfis cognitivos diferentes uns dos outros, as escolas deveriam,
Unidade 3
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89
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ao invés de oferecer uma educação padronizada, tentar garantir
que cada um recebesse a educação que favorecesse o seu
potencial. Assim, se há a necessidade de se limitar a ênfase e a
variedade de conteúdos, que essa limitação seja da escolha de
cada um, favorecendo o desenvolvimento dos diversos tipos de
inteligência.
Quanto ao ambiente educacional, o autor chama a atenção para
o fato de que, embora as escolas declarem que estão preparando
seus alunos para a vida, a vida certamente não se limita apenas
aos aspectos lógicos. Ele propõe que as escolas favoreçam
o acesso aos diversos tipos de saberes; que encorajem seus
alunos a utilizarem esses saberes para resolver problemas que
estejam relacionados com a vida comunitária a que pertençam,
favorecendo o desenvolvimento das múltiplas linguagens. Nossa
cultura valoriza por demais a inteligência lógico-matemática, e
ser inteligente geralmente está associado a um desempenho em
áreas ligadas a este tipo de inteligência. Porém, o fato de não
termos habilidades desenvolvidas em uma determinada área, não
significa que sejamos menos inteligentes.
Para você saber sobre essa questão
pesquise: MELLO Rosangela M.
As Inteligências Múltiplas e seus
Estímulos
<http://www.gilian.escolabr.
com/crte/webquest/edutic/textos/
gardner.doc>
Para a Pedagogia, essa teoria é muito atrativa, especialmente
porque Gardner comanda um projeto de escola experimental
na Universidade de Harvard (Projeto Zero), por meio do
qual procura verificar através da pesquisa as conseqüências
de suas idéias para a Educação de uma forma geral. Em sua
escola, a música, a dança, a dramatização, o desenho não são
considerados atividades extra-classe, mas ao contrário, vêm
enriquecer e equilibrar o currículo e as estratégias didáticas
para o ensino, respeitando os diferentes modos de aprender.
Outras características do projeto são os trabalhos em equipe e a
realização de projetos de criação, apreciação e crítica de obras de
arte.
Para MELLO, certos aspectos são de fundamental importância,
devendo ser observados pelo educador quando pensar em
desenvolver estes tipos de inteligência:
90
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Linguagem e infância I
Meios ou veículos
A estimulação das inteligências inclui desde sistemas simbólicos
articulados, como as disciplinas curriculares, até a diversidade
crescente de meios, como manuais, livros didáticos, mapas,
revistas e jornais, vídeos, computadores e até “salas ambientes”.
Localizações específicas
É importante uma reflexão sobre o local onde a educação ocorre
e os momentos em que esse local está sendo utilizado para esse
processo. Essa identificação de “local” e “momento” é bem mais
importante do que, à primeira vista, possa parecer.
Agentes
Tradicionalmente esses agentes são professores, pais, avós,
instrutores, irmãos mais velhos e todos os outros que, de uma
certa forma, assumem como sua tarefa de se colocar como
estimuladores das inteligências múltiplas. Tão importantes como
o papel desses agentes, é a reflexão das qualidades que devem
construir em si mesmos.
A autora esclarece que estas pessoas necessitam analisar alguns
elementos básicos essenciais a essa ação estimuladora, tais como:
„
Mentalidade aberta para aceitar com humildade,
entusiasmo e ousadia suas potencialidades de educadoras;
„
Sensibilidade e prazer autêntico em se relacionar com
outras pessoas e em se acreditar disposto a ajudá-las a
crescer em sua trajetória de vida;
„
Postura investigativa e estudiosa e a certeza de que não
existem limites para o aprender;
„
Elevado senso crítico associado à segurança para aceitar
limitações, rever procedimentos e reformular com base
em novas descobertas;
„
Desprendimento intelectual, tornando públicas suas
descobertas e as estratégias dos bons resultados que
colhem em seu trabalho;
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„
Organicidade científica que o leve a anotar
criteriosamente seus progressos e manter vivos e
atualizados seus “diários de pesquisa” em sala de aula;
„
Serenidade para aceitar as limitações materiais e até de
credibilidade do ambiente.
Papéis dos educadores segundo Gardner:
„
Agente do currículo para o aluno: ajudar a combinar os
perfis, objetivos e interesses dos alunos a determinados
currículos e determinados estilos de aprendizagem
através das tecnologias interativas;
„
Agente da escola-comunidade: mostrar aos educandos
as oportunidades de aprendizagem que podem ter
na comunidade mais ampla. Encontrar situações na
comunidade, determinadas opções não disponíveis na
escola, proporcionando às crianças com dificuldades
colocações que lhes dariam uma chance de brilhar.
„
O professor-mestre. Sua tarefa seria bastante exigente,
envolvendo supervisionar e orientar os professores
inexperientes, assegurando que a complexa equação
aluno-avaliação-currículo-comunidade estivesse
adequadamente equilibrada.
„
Especialistas em avaliação: tentar compreender, tão
sensível e completamente quanto possível, as capacidades
e interesses dos alunos, utilizando instrumentos justos
para com o seu tipo de inteligência.
Programas
A estimulação dos diversos tipos de inteligência necessita de um
programa no qual sejam definidos objetivos gerais, específicos
e imediatos, e em que se relacionem recursos disponíveis,
pessoal envolvido, cronogramas, fontes de pesquisa e orientação
bibliográfica, estratégias, políticas de interação com os pais
e a comunidade, e outros pressupostos em direção às metas
programadas. O planejamento na escola precisa ter como base as
seguintes suposições:
92
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Linguagem e infância I
„
nem todas as pessoas têm os mesmos interesses e
habilidades,
„
nem todos aprendem da mesma maneira e
„
ninguém pode aprender tudo o que há para ser
aprendido.
Sistema de avaliação
A adoção de um sistema de avaliação em que sejam mais
importantes os progressos que o aluno apresenta, e não os
resultados que alcança. Para isto, talvez pudéssemos substituir os
boletins por “portifólios” pessoais, verdadeiras pastas individuais
que contenham ampla e diversificada relação de “produções”
do aluno, enfatizando bem mais sua evolução no domínio
das habilidades e na capacidade de fazer delas “ferramentas”
para a solução de problemas, do que a eventual e muitas vezes
desnecessária retenção de informações.
Unidade 3
linguagem_e_infancia_I.indb 93
93
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Atividades de auto-avaliação
Após a leitura desta unidade, efetue as atividades de auto-avaliação e, a
seguir, acompanhe as respostas e comentários a respeito. Para melhor
aproveitamento do seu estudo, realize a conferência de suas respostas
somente depois de fazer as atividades propostas.
1) Quais os tipos de inteligência definidos por Gardner a partir de suas
pesquisas?
2) Explique de forma resumida o que você entendeu por cada uma deles.
94
linguagem_e_infancia_I.indb 94
18/1/2007 09:58:48
Linguagem e infância I
3) Que nova visão da educação você acha que a teoria das Inteligências
Múltiplas pode lhe proporcionar?
4) Considerando a teoria das Inteligências Múltiplas, qual seria o maior
desafio para a educação? E qual seria o papel do professor?
5) Pesquise nas obras de Gardner como é proposta a avaliação
pedagógica.
Unidade 3
linguagem_e_infancia_I.indb 95
95
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Nesta unidade você se familiarizou com a compreensão das
linguagens e experiências das crianças na Educação Infantil,
analisou as teorias das Inteligências Múltiplas proposta por
Gardner, estudou os diversos tipos de inteligência e sua
contribuição para o desenvolvimento da criança, e percebeu a
importância das múltiplas linguagens para a Educação Infantil.
Você viu:
Que uma das funções do educador se traduz em problematizar,
lançar desafios para que as crianças tenham a oportunidade de
pensar, analisar, formar conceitos e buscar novos caminhos,
desenvolvendo, assim, novas cadeias de aprendizagem.
Que a experiência é aquilo que invoca travessia e perigo ao sujeito
que a vive, ficando exposto aos riscos das incertezas. É aquilo que
padecemos ligado a nossa existência contingente e pessoal.
Que uma experiência que não pode ser antecipada não tem a ver
com o tempo linear, esse tempo em que nada nos passa, senão
com o acontecimento do que não se pode prever, nem predizer,
nem prescrever.
Que todos os indivíduos, em princípio, têm a habilidade de
questionar e procurar respostas, já que possuem certas habilidades
básicas em todos os tipos de inteligência.
Que a linha de desenvolvimento de cada inteligência pode ser
influenciada tanto por fatores genéticos e neurobiológicos, quanto
por condições sócio-culturais.
Que uma técnica para uma boa aprendizagem é expor a pessoa a
uma situação suficientemente complexa, capaz de estimular várias
inteligências, ou oferecer um conjunto de materiais de diferentes
inteligências, verificando qual deles o indivíduo escolhe e quão
profundamente o explora.
Que todos nascem com o potencial das várias inteligências e
que a partir das relações com o ambiente e de aspectos culturais,
algumas inteligências são mais desenvolvidas, ao passo que
deixamos de aprimorar outras.
96
linguagem_e_infancia_I.indb 96
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Linguagem e infância I
Saiba mais
Se você ficou interessado em conhecer mais detalhes sobre a
Teoria das Múltiplas Inteligências, recomendo que recorra aos
seguintes livros:
ARFOUILOUX, J.C. A entrevista com a criança: a abordagem
da criança através do diálogo, do brinquedo e do desenho. Rio de
Janeiro: Zahar, 1995.
WIDLOCHER, D. Interpretação dos desenhos infantis.
Petrópolis: Vozes, 1971.
E aos seguintes sites:
http://www.homemdemello.com.br/psicologia/intelmult.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_das_m%C3%BAltiplas_
intelig%C3%Aancias
http://www.oestrangeiro.net/index.php?option=com_content&ta
sk=view&id=27&Itemid=55
http://www.cerebromente.org.br/n12/opiniao/criatividade2.html
http://www.abrae.com.br/entrevistas/entr_gar.htm
http://www.arsconsult.com.br/antecipa/mai97/pagina3.
htm#quadro
http://vello.sites.uol.com.br/ubi.htm
Unidade 3
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UNIDADE 4
As linguagens e o jogo do
imaginário infantil
4
Objetivos de aprendizagem
„
Analisar os sentidos e significados das linguagens da
criança.
„
Perceber como ocorre na infância as diferentes
linguagens, o faz-de-conta e o processo de criação.
„
Refletir sobre o processo do imaginário infantil e sua
relação com a estética.
Seções de estudo
Seção 1 Linguagens: sentidos e significados
Seção 2 A infância e sua relação com o faz-de-conta,
a criação e as linguagens
Seção 3 O imaginário infantil e a educação estética
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Bem, este é um tema bastante importante porque envolve
as linguagens e o jogo do imaginário infantil. Você vai ver
como o domínio dos diversos tipos de linguagens, desde os
primeiros meses de idade, é importante e fundamental para o
desenvolvimento do ser humano. Essas linguagens possuem
um papel fundamental na instituição dos sentidos que damos
às coisas do mundo. Sendo assim, elas não fazem a mediação
entre o que vemos e o que pensamos, elas constituem o próprio
pensamento.
As linguagens que utilizamos estão profundamente implicadas na
instituição de práticas e na constituição de subjetividades sociais,
oferecendo os meios pelos quais as crianças podem estruturar
o mundo. São fatores importantes também na construção das
experiências e da imaginação das crianças.
O faz-de-conta, anunciado pela imaginação e pelas linguagens
da criança, permite elaborar uma imagem sobre os outros e sobre
si, repercutindo sobre a sua formação como membro da cultura
e como indivíduo singular. A imitação, a invenção de papéis,
representados pela criança são utilizados como mediadores do
desenvolvimento das brincadeiras.
Examinando a encenação do jogo imaginário, vemos que as
crianças vão compondo os diálogos nos encontros dinâmicos de
locutores-interlocutores ativos, que se alternam nas enunciações e
fazem parte de um fluxo de imaginação contínuo.
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Linguagem e infância I
Seção 1 – Linguagens: sentidos e significados
“A criança que brinca e o poeta que faz poemas
– estão na mesma idade mágica!”
Mário Quintana
Poema: “Da mesma idade.”
Como já nos referimos anteriormente, as teorizações põem em
questão a particular concepção dos sujeitos infantis que nos foi
legada pela Modernidade, apontando para a inexistência de uma
infância referência, deixando em seu lugar a convicção de que isso
não passa de um ideal de infância que foi datado e socialmente
construído. Então, se as verdades são sempre provisórias e
problemáticas, precisam ser constantemente questionadas,
submetidas a uma dúvida constante.
Os significados de criança e de infância que guiam
os nossos atos cotidianos são constituídos nos jogos
de linguagem, e os vocabulários que utilizamos para
expressá-los não têm a capacidade de descrevê-las
fielmente. Foucault (1992) afirma que “se a linguagem
exprime, não o faz na medida em que imite e reduplique
as coisas, mas na medida em que manifesta e traduz o querer
fundamental daqueles que falam”.
Assim, as idéias que temos de criança e de infância não
correspondem a uma verdade última que caracterizaria estas
entidades; as palavras que usamos para descrevê-las, para
atribuir-lhes um sentido, não passam de modos contingentes,
arbitrários e históricos de nos referirmos a elas.
O que é preciso, então, é pôr em questão os
raciocínios amplamente aceitos, os modos de falar
corriqueiros, tornando os tipos de linguagens alvos de
problematização.
Podemos dizer que a aquisição de linguagens é um fenômeno
que se repete em cada ser e, de certo modo, é tema de todas
as culturas. Nas diversas culturas existem, portanto, várias
formas de comunicação. Quando o ser humano usa a palavra, a
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
linguagem oral ou escrita, se diz que é uma linguagem verbal,
já que o código utilizado é a palavra. Este código está presente
quando falamos, quando lemos e quando escrevemos. Desta
forma, expomos aos outros as nossas idéias e pensamentos.
As linguagens desempenham um papel fundamental na
instituição dos sentidos e significados que damos às coisas do
mundo. No entanto, os sentidos e os significados não estão dados
para sempre, eles são sempre transitórios, passageiros, superáveis
porque são constituídos nos discursos, na trama cotidiana da
história. Os discursos não fazem a mediação entre o que vemos
e o pensamento, eles constituem o próprio pensamento. Assim,
“quando alguém ou algo é descrito, explicado, em uma narrativa
ou discurso, temos a linguagem produzindo uma ‘realidade’,
instituindo algo como existente de tal ou qual forma”(COSTA,
2000, p.241).
De acordo com Bujes (2005), por essa razão, podemos dizer que
as linguagens estão profundamente implicadas na instituição
de práticas e na constituição de subjetividades sociais. É por isso
que o regime de visibilidade a que foi submetida a infância, nos
tempos modernos, esteve associado à proliferação dos discursos,
à intensificação da produção de narrativas sobre este novo objeto,
fazendo com que os fenômenos relacionados com a população
infantil passem a ser descritos, ordenados, medidos, calculados,
categorizados, tornando a infância alvo de determinadas
instituições e foco de tecnologias de poder.
Os discursos não constituem, portanto, projetos
deliberados de falantes que seriam autônomos a
partir de uma intenção comunicativa.
Como declara Diaz (1998), eles são assumidos a partir de uma
ordem, a partir de um sistema de produção, a partir de princípios
de controle, seleção e exclusão que atuam sobre (re) produções de
significados e sobre práticas específicas.
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Linguagem e infância I
Meira (1999), esclarece que não se prepara o professor
para desempenhos comunicativos e expressivos ao nível do
desafio do ensino e das crianças atuais, não se prepara o
professor, sobretudo, para dialogar com o mundo através
de um universo imaginário
Segundo Gomes (2001), o problema maior surge na medida em
que, ao invés de promover o diálogo, a educação apenas reproduz
o discurso dos meios de comunicação, reforçando um modo de
saber as coisas em que a informação compacta e a fórmula de fácil
reconhecimento são privilegiadas em relação à reflexão crítica e
à criação de saberes singulares. Certamente que este modo de
olhar, baseado nas representações da cultura de massas, acaba
por intricar em complexa rede de visões locais e históricas que
constituem um modo de ver e, conseqüentemente, de produzir de
forma fragmentária.
Assim como as linguagens oferecem os meios pelos
quais as crianças podem estruturar o mundo, elas
também são fatores importantes na construção
da experiência e da subjetividade nas escolas.
Ao se trabalhar as múltiplas linguagens, as
possibilidades de aprendizagem são muito
amplas em termos de tempo, espaço e trocas
interpessoais, oferecendo maior oportunidade aos
alunos para desenvolverem produções singulares
e coletivas. No entanto, parece que a preocupação,
quando se trata de escolaridade, é sempre com a padronização, a
universalização, a homogeneização dos alunos.
Então, podemos perguntar: como valorizar os diversos
tipos de linguagens na educação Infantil quando
há uma forte tendência à homogeneização das
subjetividades e uma grande tentativa de abolir as
diferenças, como se isto fosse possível acontecer?
O que é importante para quem trabalha na educação infantil
é rejeitar a idéia de homogeneidade, porque o ser humano
necessita biológica e ontologicamente de auto-construção e de
produção da diferença. De acordo com Silva (2000), a diferença
e, portanto, a subjetividade, não é um produto da natureza: ela
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
é produzida no interior de práticas de significação, em que os
significados são contestados, negociados, transformados.
O importante é respeitar e tratar a todos não como iguais, mas
como diferentes que somos, com produções diversas, histórias,
memórias e experiências, tanto individuais quanto coletivas, que
são carregadas de um saber que tem sido muito desvalorizado e
desprezado pela sociedade.
Seção 2 - A infância e sua relação com o faz-de-conta, a
criação e as linguagens
“Toda a arte é criação”
Fernando Pessoa
Este item busca estabelecer uma relação entre as múltiplas
linguagens que a criança usa para se expressar e para se
comunicar com o mundo, em uma tentativa de compreendê-la
através das linguagens, do faz-de-conta e da criação. Para isto,
é fundamental estabelecer relações entre o fazer da criança e as
suas produções artísticas, tendo sempre em mente o desafio de
oferecer instrumentos à criança para poder olhar o mundo das
artes e do jogo de faz-de-conta e com ele poder interagir.
O jogo de faz-de-conta é caracterizado pela dimensão
imaginária, mas esta tem um vínculo com o real que a
ajuda a compreender o mundo.
No espaço das ações lúdicas, a criança reelabora suas vivências
cotidianas, contribuindo muito para o seu processo do
pensamento. O que constitui a situação imaginária origina-se
daquilo que é diretamente vivenciado, observado ou conhecido.
104
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Linguagem e infância I
Bontempo (1996) acredita que a capacidade de imaginar,
que a criança vai construindo na brincadeira, envolve
uma mistura de realidade e fantasia, em que o cotidiano
toma outra aparência, adquirindo um novo significado e,
conseqüentemente, um novo aprendizado.
Assim, um aspecto instigante do funcionamento lúdicoimaginário está justamente nas instâncias em que a criança, ao
re-criar suas vivências, pode ultrapassar a “lógica do real” e, com
a complexidade das suas brincadeiras, imaginar um plano de
ocorrências imaginárias que transgridam aquela lógica. Outro
aspecto importante apontado por Oliveira (1988) refere-se ao
papel das linguagens no faz-de-conta, que é o fato de que as falas
das crianças permitem a orientação das ações e a regulação do
intercâmbio de parceiros.
Explorando as relações entre os diversos tipos de linguagens,
os objetos e a ação no brinquedo de faz-de-conta, Rocha (1994)
sugere que, aos poucos, as linguagens passem a sustentar a
criação imaginária, permitindo que a criança prescinda de
apoios concretos (ação lúdica e objeto pivô) para compor partes
da cena lúdica. Esta autora salienta, ainda, que esse papel das
linguagens na libertação do perceptual e do sensível-imediato
nos desdobramentos do brincar permite que a criança passe a
configurar cenas imaginárias, dispensando o apoio no objeto
pivô, ou dando existência a personagens, sem que
seja necessária a presença de participantes. Assim
sendo, de acordo com a autora, as linguagens podem
possibilitar à criança criar e agir com objetos ausentes,
sem nenhum suporte material, compor personagens
que, na verdade, estão ausentes do jogo, e relacionar-se
com eles, coordenando ações que podem ser apenas
indicadas.
A brincadeira, a arte e a literatura mediadas pelo
corpo que se move por meio da fantasia, que
comunica o que não é dito com palavras, são linguagens
diferenciadas que a criança usa para internalizar o mundo a que
ela pertence, exteriorizando a sua percepção do real. São formas
de experimentação, de vivências, de sensações que alicerçam a
maneira singular de estar no mundo, viabilizando também o
contato com as emoções pessoais e do outro, vivenciando relações
sociais e compartilhando a vida em grupo.
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Sendo assim, é fundamental que o educador
que trabalha com a educação infantil estabeleça
relações entre o fazer da criança, com as atividades
relacionadas a todos os tipos de linguagens, tendo
sempre em mente o desafio de oferecer instrumentos
à criança para “ler” o mundo e, com ele, poder
interagir, expressando-se através de seu corpo
como veículo de brincadeiras, enriquecendo o olhar
sensível, a educação estética e o auto-conhecimento.
Corazza (2000) explica que, com esse espaço de expressão e de
nutrição do imaginário infantil em conexão com a realidade,
a subjetividade da criança pode ser fortalecida, dando-lhe a
possibilidade de construir melhores projetos de vida através das
relações que estabelece com o outro e com a cultura.
Kishimoto propõe que a educação infantil aconteça por
intermédio do brincar e de uma concepção de criança inserida
em contexto educativo, integrando várias áreas curriculares
tais como: saúde, relações humanas, ambiente, linguagem
e expressão. A autora explica que tais áreas não visam à
estruturação de atividades, à semelhança da escolarização, mas
indicam que a criança, ao brincar, possa desenvolver, ao mesmo
tempo, a saúde, socialize-se por meio de interações com os pares,
explore o ambiente que a rodeia, expresse seus pensamentos e
crie formas próprias de expressão. Considera que a criança deve
desenvolver habilidades para interagir positivamente com seu
meio natural e social e incorporá-lo em sua vida diária, com os
objetivos de ter prazer em experimentar fenômenos e eventos da
natureza por meio de brincadeiras; brincar pela experimentação
e criar com coisas que a cercam; desenvolver interesse por
brinquedos e coisas feitas pelo homem.
Na área da linguagem, a criança precisa relatar experiências e se
expressar por palavras do cotidiano, aprendendo a ouvir os outros
e desenvolver a compreensão dos diversos tipos de linguagens.
As situações que favorecem o uso de símbolos como
o faz-de-conta são facilitadoras para o aparecimento
de linguagens, relacionando-se com a expressão do
imaginário infantil: expressar a imaginação por meio
da linguagem, movimentos corporais e faz-de-conta.
106
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18/1/2007 09:58:49
Linguagem e infância I
A proposta, ao enfatizar valores como o desenvolvimento
integral, a auto-responsabilidade, a cooperação, a inserção
da criança no mundo natural e social, o desenvolvimento da
linguagem, a criatividade, o senso estético e a expressão de
sentimentos, aproxima-se de objetivos sugeridos por sistemas
infantis de muitos países.
Seção 3 - O imaginário infantil e a educação estética
A infância é a grande fonte da nossa vitalidade imaginária. É
bem verdade que a imaginação é uma faculdade que se desenvolve
continuamente, ao longo de toda a nossa vida. Mas é também
verdade que a imaginação na infância tem uma sensibilidade
especial, que as crianças tendem a se entregar mais livremente à
fantasia, e que da plenitude da experiência imaginária na infância
depende em boa parte a saúde psicológica na idade adulta. O
poder específico da imaginação da criança tem muitas razões:
uma delas é o fato de a imaginação se nutrir de imagens novas, e
para a criança o mundo está cheio de imagens novas.
Aurélio Buarque de Holanda assim define as palavras imaginar,
imaginação e imaginário em seu Novo Dicionário da Língua:
Imaginar é construir ou conceber na imaginação; fantasiar, idear,
inventar; é o ilusório; o fantástico. Imaginação: é a faculdade que
tem o espírito de representar imagens. Imaginário: é o que só
existe na imaginação.
Meira (1999) faz referência aos desvios estéticos praticados na
sociedade, deturpações que ocorrem quando as manifestações
artísticas possuem fins meramente utilitários, ou seja, servem
apenas ao consumo. Então, o excesso de reprodução precisa ser
pensado como um problema quando começa a envolver ausência
de significado, quando não nos afeta mais, quando o que nos diz
é muito superficial.
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Quando nos referimos a afetar, estamos falando de “sentido”,
estamos falando da capacidade das coisas, sejam quais forem suas
formas de nos fazer sentir, de produzir intensidades. Aquilo que
nos afeta, atinge não apenas aquilo que é visível, mas também o
que Rolnik (1889) chama de “corpo vibrátil”, primeira instância
propulsora de desejos, força incontrolável em que a passagem
destes afetos é o que parece gerar brilho.
De acordo com a autora, as imagens que afetam nosso “corpo
vibrátil” não são apenas imagens, mas também símbolos, figuras
plenas de significados. Contudo, as formas e seus significados se
modificam no transcorrer da história, se transformam no sabor
de diferentes contextos. Sendo assim, o caráter simbólico de uma
imagem é inconstante, mutável e instável, tanto pode nos atingir
e nos fazer vibrar, quanto pode parecer sem sentido algum, não
nos afetando, apenas imprimindo uma informação vazia.
Aurélio Buarque de Holanda assim define as palavras
imaginar, imaginação e imaginário em seu Novo
Dicionário da Língua: Imaginar é construir ou
conceber na imaginação; fantasiar, idear, inventar; é o
ilusório; o fantástico. Imaginação: é a faculdade que
tem o espírito de representar imagens. Imaginário: é o
que só existe na imaginação.
Meira (1999) defende que a educação desde a infância
deve priorizar a estética e o mundo imaginário, do qual
fazem parte os mitos, os ritos e todas as formas de arte.
Propõe, também, a ampliação do poder estratégico da
imaginação por meio de um fazer criador com autoria.
Para a autora, a arte não pretende explicar o mundo, mas
transformar sua imagem e aprofundar seu enigma. Ela tem
como tema a essência dos diversos tipos de linguagens cercadas
de incertezas. Esta autora salienta, ainda, que esse fazer está
intricado com a qualificação da experiência estética, com o fazerse presente, com a intensidade emocional das crianças que fazem
essa experiência.
Todavia, conforme Gomes é muito importante o incentivo
à produção das crianças, não ignorando as referências, mas
reorganizando-as de modo singular.
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Linguagem e infância I
Quando o ato de produzir uma imagem estiver impregnado de
sentido, esta produção estará proporcionando singularidades.
Desta forma, a criança torna-se autora do que produziu, mesmo
que através de uma fórmula referendada, a sua marca. Não mais a
marca que as coisas deixaram nela, mas a marca que ela imprimiu
em alguma coisa que produziu. A autora diz, ainda, que essa
marca subjetiva é que ressignifica o que poderia estar destituído
de sentido, pois a produção envolve presença, o estar ali, o fazerse inteiro dentro de uma ação.
A incapacidade de alcançar um modelo estabelecido
pela sociedade muitas vezes gera humilhação e
perda de sensibilidade que, por sua vez, leva ao
enfraquecimento da potência de criação, até que o
próprio gesto criador fique soterrado e não possa
mais se lançar.
De acordo com Guattari (1999), é preciso lutar pela
singularização, produzindo a ruptura com os processos
que provocam os modelos ideais, criando novas formas de
subjetividade diferenciadas. De acordo com este autor, a
singularização acontece não apenas contra os meios de
comunicação, mas aproveitando seu conteúdo no
contexto da aprendizagem para fazer a crítica a estes
modelos idealizados, buscando a diferença, a
criatividade, a estética.
A Estética pergunta pelo ser da arte, pela criação
como expressão sensível, ou seja, é expressão
material de alguma coisa. A arte apresenta
semelhança com o conhecimento, quer da
sensação, quer do pensamento. Tal como a sensação, a percepção
e o pensamento são expressão de algo, também a arte o é.
A criação é um momento especial de percepção. Percepção como
campo de partida, campo de experiências e de exploração do
mundo. Percepção em que a meta que conduz o artista faz com
que o mundo pareça estar à disposição da criação e é, na verdade,
o artista que canaliza todo o mundo à sua volta para a criação de
uma forma lúdica e poética da vida.
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Só essa visão lúdica e poética da vida permite equilíbrio, permite
poder imaginar e criar, ter saídas para os muitos problemas que a
vida oferece, ter um pensamento crítico e valorizar a cultura e os
bens comunitários.
Held (1980), autora voltada para estudos do imaginário infantil,
reforça a necessidade de pais e educadores darem às crianças a
oportunidade de muitas leituras prazerosas, proporcionando a
reflexão e a crítica.
O papel do fantástico não é, de maneira alguma, dar à
criança receitas de saber e de ação, por mais exatas que
sejam. A literatura fantástica e poética é, antes de tudo e
indissociavelmente, fonte de encantamento e de reflexão pessoal,
fonte de espírito crítico, porque toda descoberta de beleza nos
torna exigentes e mais críticos diante do mundo. Isto porque
quebra clichês e estereótipos que desbloqueia e fertiliza o
imaginário pessoal, indispensável para a construção de um
tipo de subjetividade que, amanhã, saiba inventar a própria
humanidade.
Neste contexto, podemos nos perguntar: É possível
educar a imaginação infantil? É possível cultivá-la
como se faz com a inteligência ou a sensibilidade?
Quais são as condições favoráveis ao florescimento da
imaginação infantil?
Girardello diz que é possível educar a imaginação infantil e
cultivá-la como se faz com a inteligência ou a sensibilidade. Há
quem diga que a tarefa mais importante da educação é a educação
da imaginação. A autora salienta que esta educação pode se dar
através:
„
do envolvimento freqüente da criança com a arte, com a
experiência estética;
„
da experiência da arte, tendo claro que ela exige tempo,
que é outra condição benéfica para a vivência imaginativa
da criança;
„
do trabalho da imaginação que é sutil: ele se dá bem com
a calma, a concentração, o isolamento, e mesmo com
um certo tédio. A imaginação é a capacidade de olhar
através das janelas do real, e essa forma de contemplação
110
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Linguagem e infância I
exige um certo ócio, momentos sem pressa, em que a
imaginação possa atuar plenamente, nos interstícios da
percepção.
„
de uma dimensão da contemplação estética que é o
contato com a natureza, outro fator positivo para a
imaginação da criança ( fogo, o ar, a água e a terra).
„
do estímulo imaginativo que não surge só no contato
físico, mas também no encontro com o incomensurável: a
multidão de estrelas no céu, o tamanho do mar, o poder
das tempestades. Esse encantamento diante da infinita
multiplicidade da natureza, com a sua profundidade, faz
parte da emoção estética fundamental para a imaginação
definida como “o sublime”.
„
da compreensão de que a atitude dos adultos no ambiente
em que a criança vive faz uma enorme diferença: a
qualidade da vida imaginativa das crianças se beneficia
de um ambiente favorável ao seu faz-de-conta, e onde os
adultos estejam também em contato com a sua própria
vida de fantasia, e consigam apontar o mundo para as
crianças, de modo sugestivo e inspirador.
„
do incentivo por meio de histórias que permitam o
exercício constante da imaginação, o vôo para o mundo
paralelo onde através do prazer poético as crianças
estarão “trabalhando”, ou seja, cumprindo sua tarefa
fundamental de conhecer o mundo e de construírem a si
mesmas. A narrativa é uma ponte entre a imaginação e a
cultura.
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Atividades de auto-avaliação
Após a leitura desta unidade, efetue as atividades de auto-avaliação e, a
seguir, acompanhe as respostas e comentários a respeito. Para melhor
aproveitamento do seu estudo, realize a conferência de suas respostas
somente depois de fazer as atividades propostas.
1) Bujes explica que as linguagens estão profundamente implicadas
na instituição de práticas e na constituição de subjetividades sociais.
Explique o que a autora quis dizer com isso.
2) Você acredita que o professor é preparado nos seus cursos de formação
para desempenhos comunicativos e expressivos ao nível do desafio do
ensino e das crianças, e sobretudo para dialogar com o mundo através
de um universo imaginário?
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Linguagem e infância I
3) Como valorizar os diversos tipos de linguagens da criança, quando
há uma forte tendência à homogeneização das subjetividades e uma
grande tentativa de abolir as diferenças?
4) Kishimoto propõe que ao trabalharmos o brincar com a criança, se
integrem varias áreas curriculares. Que exemplos ela sugere?
Unidade 4
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Nesta unidade, você se familiarizou com a compreensão de que
a aquisição de linguagens é um fenômeno que se repete em cada
ser e, de certo modo, é tema de todas as culturas. Nas diversas
culturas existem várias formas de linguagens. As linguagens,
portanto, desempenham um papel fundamental na instituição
dos sentidos e significados que damos às coisas do mundo, por
isso é muito importante que possamos trabalhá-la com as crianças
da educação infantil.
Assim como as linguagens oferecem os meios pelos quais as
crianças podem estruturar o mundo, elas também são fatores
importantes na construção da experiência e da produção de
subjetividade das crianças nas escolas.
Com o aumento dos espaços de expressão e de nutrição do
imaginário infantil em conexão com a realidade, a subjetividade
da criança pode ser fortalecida, dando-lhe a possibilidade de
construir melhores projetos de vida através das relações que
estabelece com o outro e com a cultura.
Você viu então que é fundamental estabelecer relações entre o
fazer da criança e as suas produções artísticas, tendo sempre em
mente o desafio de oferecer a ela instrumentos para que possa
olhar o mundo das artes e do jogo de faz-de-conta e com ele
poder interagir.
A imaginação na infância tem uma sensibilidade especial já que
as crianças tendem a se entregar mais livremente à fantasia, e que
da plenitude da experiência imaginária na infância depende em
boa parte a saúde psicológica na idade adulta.
Você observou também como o caráter simbólico de uma imagem
é inconstante, mutável e instável e, com isto, tanto pode nos
atingir e nos fazer vibrar, quanto pode parecer sem sentido
algum, não nos afetando, apenas imprimindo uma informação
vazia.
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Linguagem e infância I
Saiba mais
Se você ficou interessado em conhecer mais detalhes sobre
a Teoria das Múltiplas Inteligências, recomendamos que
desenvolva pesquisas nos seguintes livros:
ALMEIDA, Elvira. Arte lúdica. São Paulo: Edusp/FAPESP,
1997.
BECCHI, Egli. Retórica da infância. PIACENTINI, Telma
(org) A modernidade, a infância e o brincar.. Florianópolis:
Perspectiva /UFSC-NUP/CED, ano 12, n.22, p. 63-95, agosto/
dez.1994.
FARIA, Ana Lúcia Goulart de. Educação pré-escolar e
cultura: para uma pedagogia da educação infantil. Campinas:
Editora da Unicamp; São Paulo: Cortez, 1999 (Coleção Teses).
FAZOLO, Eliane; CARVALHO, Maria Cristina; LEITE,
Maria Isabel; KRAMER, Sônia (organizadoras) et al. Educação
Infantil em curso. Rio de Janeiro: Ravil, 1997.
NOGUEIRA, Manuela. O melhor do mundo são as crianças:
antologia de poemas e textos de Fernando Pessoa para a infância.
Lisboa: Assírio & Alvim, 1998.
ROCHA, Eloisa Acires Candal. A pesquisa em educação
infantil no Brasil: trajetória recente e perspectiva de
consolidação de uma pedagogia. Florianópolis: UFSC, Centro de
Ciências da Educação, Núcleo de Publicações, 1999.
ROSSETTI-FERREIRA, Maria Clotilde, MELLO, Ana
Maria et.al (orgs). Os fazeres na Educação Infantil. São Paulo:
Cortez, 1998.
TONUCCI, Francesco. Com olhos de criança. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1997.
Unidade 4
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18/1/2007 09:58:51
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UNIDADE 5
A Educação Infantil e a
formação do pedagogo: novas
cartografias
5
Objetivos de aprendizagem
„
Identificar como se dá o discurso pedagógico em relação
à formação do pedagogo da Educação Infantil.
„
Analisar a gênese da instituição escolar e seus
instrumentos pedagógicos.
„
Repensar a Educação Infantil e a Pedagogia Cultural.
„
Compreender como acontece o ensino e a
aprendizagem na Educação Infantil.
Seções de estudo
Seção 1 O processo de formação do pedagogo de
Educação Infantil
Seção 2 A instituição escolar e seus instrumentos
pedagógicos
Seção 3 Educação Infantil e Pedagogia Cultural
Seção 4 O ensino e a aprendizagem na Educação
Infantil
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
Nesta quinta unidade você irá conhecer alguns aspectos referentes
ao processo de formação do educador da Educação Infantil,
apresentado como uma viagem cujo destino não nos é claro, pois
não sabemos ao certo aonde vamos chegar. Este termo “viajar”
é usado aqui com o significado de sair do território conhecido,
o que implica abrir brechas para apreender o desconhecido,
resistindo ao controle da sociedade contemporânea. Assim
pensada, toda “viagem” apresenta algo novo, traz temores ao
mesmo tempo em que traz esperanças e mudanças. A formação
neste contexto pode ser entendida como um encontro marcado
pelo diálogo, pela criação, pela aventura. Encontro que necessita
manter a paixão pela vida e que possibilita a produção de um tipo
de subjetividade não submissa, desvelando as coisas do mundo e
procurando reinventá-lo.
Sendo assim, a formação do educador da Educação Infantil
precisa ser vista como um espaço de encontro, repensando
constantemente a rotina, propiciando um planejamento que
contemple as múltiplas linguagens expressivas da criança,
preservando momentos de aprendizagens individuais e coletivas,
de socialização de decisões, de descobertas, de discussão
de opiniões divergentes. Para isto, propõe-se, a partir do
pensamento de Corazza, uma pedagogia que priorize a “prática
cultural” que só poderá ser exercida por meio de análises sobre
as questões ligadas ao poder, à linguagem, à diferença e à
multiplicidade. Neste contexto, os educadores deveriam atuar
como “pedagogos culturais”, comprometidos e implicados nas
relações de poder, formas de saber e modos de subjetivação
produzidos pela dinâmica social.
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Linguagem e infância I
Seção 1 - O processo de formação do pedagogo de
Educação Infantil
“O professor é produto acabado da disciplina escolar,
cortaram-lhe magnificamente as asas, agora é sua vez de
cortar as dos outros!”
Max Stirner
A formação do profissional da Educação Infantil, em sua grande
maioria, é bastante marcada por um tipo de conhecimento
superficial, pelo fazer; por programas pautados em metodologias
de ensino em detrimento da ênfase em dimensões socioculturais.
Formação essa que trata a vida de forma mecanizada, por uma
rotina na qual muitas coisas passam sem sequer serem
problematizadas.
Segundo Larrosa (2003), o discurso pedagógico que se
traduz pela disciplina parece que esteve por muito tempo
respaldado por uma proposta racional, perdendo o sabor
educativo. O nosso interesse é descobrir novas vias de
acesso a esse discurso que possui sabor, cheiro, gosto
do fazer educativo, propondo outro caminho não tão linear
e previsível quanto este que se estuda na maioria dos cursos de
formação.
O autor explica que, por um lado, nosso olhar é menos livre
do que imaginamos, e está fortemente influenciado por
determinados mecanismos que nos fazem ver a educação de
uma determinada forma e, por outro, não está definitivamente
aprisionado, talvez sendo possível ver de outro modo a maneira
de educar. As provocações de Larrosa no livro “Pedagogia
Profana” sugerem principalmente, esta mudança de olhar por
parte dos educadores. O autor tem como uma das preocupações
básicas a questão da formação, abrindo possibilidades para a
discussão que estou propondo no momento.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Como já me referi anteriormente, o lugar de educação
para Larrosa (2003) deveria aproximar-se da idéia de
um labirinto, que não teria um ponto central onde
todos devessem chegar.
Sobre essa questão consulte o
trabalho de: SILVA, Marta Regina.
Infância como condição da
existência humana...um outro olhar
para formação docente. http://
www.paulofreire.org/Biblioteca/
Artigos_em_PDF/Texto_Revista_
COGEIME.pdf.
Silva entende que o processo de formação é uma viagem, uma
aventura. Uma viagem cujo destino não nos é claro, não sabemos
ao certo onde vamos chegar. Uma viagem que possibilita nos
conhecer melhor, onde possamos encontrar sentidos para o
nosso trabalho e para a própria vida. Uma viagem aberta a
muitas possibilidades, a muitos caminhos, marcada por nossas
histórias e memórias. Memórias, que já não são mais apenas do
passado, mas que se reescrevem no presente ao atualizarem-se
no momento da fala. Memórias que atravessam os limites de
um tempo linear onde passado-presente-futuro se entrecruzam.
Memórias que somadas a tantas outras histórias, nossas, das
crianças e todas aquelas construídas nas diferentes culturas,
nos permitem mergulhar em seus enredos, reinventando-as,
possibilitando a abertura para a vida.
Um precioso trecho de Kastrup (2001, p. 207-208) pode nos
servir de guia para pensar o que é o processo de formação como
uma viagem :
Quando alguém viaja a um país estrangeiro, as
atividades mais cotidianas como abrir uma torneira
para lavar as mãos, tomar um café ou chegar a um
destino desejado, tornam-se problemáticas. Ao ser
bruscamente transportado para um novo ambiente os
hábitos anteriores não servem e o viajante vive sucessivas
experiências de problematização. Não se trata de mera
ignorância, mas de estranhamento e tensão entre o saber
anterior e a experiência presente. Quando viajamos somos
forçados a conviver com uma certa errância, a perder
tempo, a explorar o meio com olhos atentos aos signos e a
penetrar em semióticas novas. Somos forçados a pensar, a
aprender e a construir um novo domínio cognitivo e uma
outra maneira de realizar atividades que eram tão simples
e corriqueiras, que havíamos esquecido seu caráter
inventado. A viagem surge então como ocasião de uma
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Linguagem e infância I
aprendizagem, pois o viajante não se dava conta de que
as relações que tomava como óbvias e garantidas eram, a
rigor, construídas e inventadas.
(...) tal aprendizagem não se esgota na solução dos
problemas imediatos, mas prolonga seus efeitos e sua
potência de problematização.
(...) quando o viajante retorna à sua cidade, é tomado
muitas vezes por uma sensação de estranhamento,
tornando-se sensível a aspectos da paisagem que
normalmente lhe passavam despercebidos. O afastamento
da cidade, gerado pela viagem, prolonga-se então
num afastamento da percepção banal e recognitiva. A
abertura da sensibilidade provocada pela viagem para
a cidade estrangeira invade, então, a experiência de sua
própria cidade. A experiência de recognição cede lugar
à problematização. Os dados da sensibilidade não fazem
síntese com os da memória, gerando reconhecimento.
Memória e sensibilidade não convergem, mas
divergem, gerando uma expectativa de estranhamento
potencializada pelo frescor da sensibilidade do viajante.
Podemos dizer então, com Deleuze, que a viagem
envolveu um aprendizado porque elevou as faculdades
ao seu exercício disjunto, ultrapassando os limites
do funcionamento recognitivo. Pois a aprendizagem
começa quando não reconhecemos mas, ao contrário,
estranhamos, problematizamos. O exemplo do viajante
serve também para indicar o que deve ser considerado
como o ponto nodal do problema da aprendizagem
inventiva, a saber, a circularidade que caracteriza o
aprender a aprender.
Para Deleuze (1992), viajar é sair do território conhecido,
o que implica abrir brechas para apreender o desconhecido
“escapando”, resistindo ao controle da sociedade contemporânea.
Assim pensada, toda viagem apresenta algo novo, traz temores,
estranhamentos, e ao mesmo tempo esperanças, alegrias e
mudanças. Porque mudar evidentemente implica correr riscos,
deixar de ser o mesmo para ser um outro. Este autor explica
que se trata de “duplicar” a relação de força consigo, permitindo
resistir, fazendo a vida voltar contra o poder, por meio de regras
facultativas que produzem existência como obra de arte, regras ao
mesmo tempo éticas e estéticas que constituem estilos de vida.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
A educação é por natureza ética e estética, uma vez
que lida com a formação permanente, geradora de
esperanças e alegrias. Formação que passa pelo saber
da experiência, de sonho, de paixão, de alegria, de
dor, angústia, dúvida, enfim, de vida.
Guattari (1992), diz que a vida de cada um é única. O
nascimento, a morte, o desejo, o amor, a relação com o tempo,
com os elementos, com as formas vivas e com as formas
inanimadas são, para um olhar depurado, novos e inesperados.
Para este autor, o que caracteriza a vida, portanto, é a ação. Ela
é deflagrada a partir de informações fornecidas pelos discursos
de verdade e pelas relações de força que, uma vez interiorizadas,
definem estratégias para a ação. Toda ação no ser humano é
inteligente, amparada por estratégias, tem objetivo e obedece
à vontade. O aspecto mais importante para o ser humano é,
portanto, um crescimento em direção da oportunidade de
criação, do controle de suas ações.
A formação deve ser vista, portanto, como encontro marcado
pelo diálogo, pela criação, pela diferença, pelo imprevisível, pela
aventura. Encontro que necessita manter a paixão pela vida, que
possibilita a produção de um tipo de subjetividade não submissa,
a descoberta dos sentidos, desvelando as coisas do mundo, para
poder reinventá-lo. O processo de formação se assemelha a portas
e janelas que se abrem a outros lugares, a outros mundos, de
onde podemos retornar transformados. É um processo que nos
permite olhar com outros olhos, conhecer lugares inventados,
possibilitando abertura para a pluralidade e criatividade,
colocando em questão os padrões a que somos submetidos. Nesta
medida, a criatividade, a existência como obra de arte é também
resistência. A formação aqui é entendida como a capacidade de
criar, de desvelar as coisas do mundo, transformando-o. Sendo
assim, podemos dizer que criar não é apenas comunicar, mas
também resistir. Diz respeito à dimensão estética, à forma dos
relacionamentos com o mundo, de como o apreendemos.
O desejo é que os educadores sintam-se instigados a conhecer
e ser livres no ato de estudar, caminhando por perspectivas
desconhecidas, gerando, assim, possibilidades diferenciadas
para si e para os outros. Como afirma Foucault (1999), ninguém
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Linguagem e infância I
transforma nada, nem a si mesmo, se não consegue ver as coisas
de forma diferente, se não consegue ter abertura para o mundo.
E para isto ele precisa do rigor de estudar, ler e buscar perguntas
que possam esclarecer as suas angústias e preocupações.
O estudo é imprescindível como criação, como
experimentação, implica rigor e exigência para o
educador.
Para Larrosa (2003), estudar é ler buscando perguntas. Essa
perspectiva motiva o educador a estudar, propiciando que as
perguntas sejam cada vez mais complexas e inesperadas.
[...] o estudo é o movimento das perguntas, sua extensão,
seu aprofundamento. Tens que levar tuas perguntas
cada vez mais longe. Tens que dar-lhes densidade,
espessura. Tens que fazê-las cada vez mais inocentes,
mais elementares. E também mais complexas, com mais
matizes, com mais feições. E mais ousadas. Sobretudo,
mais ousadas. Por isso, o perguntar, no estudo, é a
conservação das perguntas e seu deslocamento.
Também seu desejo. E sua esperança. Por isso, as
perguntas do estudo não são interrompidas por nenhuma
resposta na qual não resida, por sua vez, a espera de
outras perguntas, o desejo de seguir perguntando. De
seguir lendo e escrevendo. De seguir estudando. De
seguir questionando-se... (LARROSA, 2003, p.19).
Larrosa (2003), pensa a leitura como relação de produção de
sentido, na qual mais importante do que o texto é a relação
que se trava com ele. Se o leitor estabelece o que ele chama de
uma relação de apropriação com o texto, seu objetivo é apenas
dominar o que leu. Quando, ao contrário, a leitura é uma
experiência, é porque o leitor foi afetado pelo texto.
O autor esclarece que a leitura tem a potência de afetar, de
mover, de transformar as pessoas. Esse movimento não depende
da vontade, de boas intenções, nem da memória. É um bloco
de sensações que age diretamente sobre a subjetividade. Desta
forma, o texto pode afetar os leitores e lhes dizer algo. E se
um texto afeta o leitor, é capaz de colocá-lo em movimento e
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Universidade do Sul de Santa Catarina
produzir subjetividade. De fato, a rigor, a leitura implica abrigar
as repercussões que ela vai provocar.
O que foi lido fica em nós, provoca efeitos, mesmo quando não
prestamos atenção.
Para Larrosa (2003), se alguém lê ou escuta ou olha
com o coração aberto, aquilo ressoa nele; ressoa no
silêncio que é ele, e assim o silêncio penetrado pela
forma se faz fecundo.
O mergulho na leitura e na escrita permite que, ao retornar,
o leitor estabeleça uma nova relação consigo, com o mundo e
com os outros. A partir dos encontros consigo que advêm da
leitura e da escrita, pode-se chegar a ser o que se é. Mas no
entendimento do autor, isso não significa, de forma alguma, a
crença na existência de algo como um eu definido, escondido
em algum lugar, esperando para ser descoberto. Ou seja, é no
viver, no fazer, que vamos nos construindo. Não há descoberta
de si mesmo, mas invenção de si. E o caminho sinuoso que
percorremos nessa invenção pode ter muitas bifurcações.
Segundo Larrosa (2003, p.40):
Ler e escrever é colocar-se em movimento, é sair sempre
para além de si mesmo, é manter sempre aberta a
interrogação acerca do que se é. Na leitura e na escrita, o
eu não deixa de se fazer, de se desfazer e de se refazer. Ao
final, já não existe um eu substancial a ser descoberto e
ao qual ser fiel, mas apenas um conjunto de palavras para
compor e decompor e recompor.
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Linguagem e infância I
Seção 2 - A instituição escolar e seus instrumentos
pedagógicos
De acordo com Sá (2003), o problema central do ensino parece
estar nos próprios pilares da instituição escolar e dos seus
instrumentos pedagógicos. É a partir dos discursos pedagógicos e
das normas disciplinares institucionais que se vão inscrevendo na
mentalidade dos alunos as verdades, isto é, os saberes corretivos,
de normalização, os quais vão produzindo as subjetividades
submissas. Estas verdades, os saberes corretivos, rotulam e dão
sentido aos comportamentos, às atitudes, aos atos, às relações,
fabricando o “aluno desejado”, de modo que ele corresponda com
fidelidade ao padrão de indivíduo de que a sociedade necessita.
Tais transformações baseiam-se em mudar o querer das crianças,
em desejar o que lhes é oferecido. Um corpo social e uma
interioridade, um eu que quer, são os objetivos e efeitos dessa
pedagogização.
Aqueles que têm autonomia, por exemplo, são
sufocados por um discurso do disciplinamento que
passa pelos corpos, pelas formas de manifestação da
inteligência, pelas formas de representação do mundo
e pelos modos de agir. Isto acontece por intermédio
de mecanismos disciplinares, tais como o castigo, o
exame, a confissão, o julgamento, a competição, a
classificação, entre outros.
Em sua tese, Corrêa (2004) explica que a pedagogia visa
conduzir o outro rumo ao mesmo, adequar a uma realidade
social, harmonizar o socius pela pacificação de cada um, pelo
ajustamento à moral e pelo controle da potência de diferir.
Em outras palavras, novos discursos de verdade
justificam a continuidade do exercício de imobilização
de cada um desde a mais tenra idade. Cidadania,
interdisciplinaridade, direitos humanos, satisfação
das necessidades básicas de educação, sociedade
global, são as palavras da vez para o exercício do
saber-poder que continua a encontrar abrigo e força
nas estratégias educacionais de caráter uniformizador,
produzindo a subjetividade desejada.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Uma das coisas mais valorizadas pelas instituições escolares
é o processo classificatório. É muito difícil para as instituições
educacionais lidarem com a “desestruturação das modalidades
de controle pedagógico”. Se não funcionar, a instituição não
sobrevive. Por isso mesmo, a instituição procura corrigir aqueles
– tanto os professores, quanto os alunos – que saem “fora dos
trilhos”, tentando o tempo todo reduzi-los ao silêncio. A ação
pedagógica é exercida sobre cada um, principalmente sobre
aqueles que são mais tímidos.
A partir destas evidências, levantamos os seguintes
questionamentos: há espaço de liberdade para se
ocupar nas instituições escolares que conhecemos?
Quais? Onde? Como?
É possível pensar em uma Educação Infantil diferente?
É importante que os educadores possam traçar um diagnóstico
da instituição escolar, dissecando cada um dos elementos da sua
prática pedagógica, lançando a dúvida fundamental: por que a
escola tem que ter o monopólio da educação? Por que não podem
existir alternativas de ensino que se dêem fora da escola? Em um
mundo que vive em sucessivas transformações e mudanças, o
acesso às novas tecnologias não requisitariam ações que vão além
das fronteiras da educação formal? Como lidar com a Educação
infantil sem que se copiem os modelos da escola formal? Sem que
se escolarizem as crianças desde a mais tenra idade?
Neste contexto, é preciso que fique bem claro o que é
escolarização e o que é educação.
A escolarização refere-se a um processo institucional
de transmissão de um certo conteúdo curricular
disciplinar que limita as práticas educativas de
estudar, ensinar-aprender, conhecer, enquanto
processo de preparação de pessoas para a liberdade,
criatividade e solidariedade. Sendo assim, é possível
que se eduque sem que se escolarize.
Na escola, o conhecimento autorizado, antes de constituirse como conteúdo escolar curricular, passa pela seleção dos
interesses político-estatais e econômicos, expulsando qualquer
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Linguagem e infância I
tipo de iniciativa instituinte, empobrecendo desta maneira o
ato educativo e bloqueando pulsões de liberdade, autoconfiança
e autodeterminação. Neste contexto, pensar, sentir e agir é
“reconhecer-se” no modelo dado.
A intenção, portanto, é refletir sobre os próprios pilares da
instituição escolar e seus instrumentos pedagógicos, alertando
sobre a “redução” dos saberes quando se tem como objetivo
repassar idéias “universais”.
Conforme Corrêa (2004), à instituição escolar cabe normalmente
o papel de preparadora dos corpos, de máquina de
condicionamento, adequada à produção de pessoas
treináveis. Os treináveis são os que têm liberdade de
escolha e vontade própria adequadas para o controle.
Podemos escolher qualquer profissão, qualquer
candidato, qualquer produto nas prateleiras, qualquer
estilo de vida, desde que seja dentre aqueles que nos são
indicados.
A escola, portanto, continua passando por reformas. Reformas
que conservam o princípio de seqüestro e imobilização do
corpo e o exercício do conhecer sem vontade. De acordo com
Stirner (2001), o ensino precisaria ter como força propulsora: o
conhecer com vontade. Este autor explica que quem conhece com
vontade, não reconhece, por exemplo, a liberdade, libera-se.
Conforme este autor, para que se aprenda, é preciso que o ensino
se caracterize como uma produção interessada de relações, uma
investigação interessada de problemas.
O que se pretende, fundamentalmente, é contribuir
para a reflexão sobre a possibilidade de uma
Educação Infantil não disciplinar que possa contribuir
para a constituição de indivíduos que venham a
pensar e fazer diferentemente do que pensam e fazem,
modificando a sua própria maneira de olhar as coisas.
No entanto, a perspectiva não disciplinar não descarta
o conhecimento disciplinar, mas se insurge contra os
efeitos de poder produzidos por ele.
E para que isto aconteça, precisamos pensar outros lugares de
educação que desafiem a ortodoxia dos saberes, percebendo
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
muito bem como se dá a lógica interna de funcionamento das
instituições, as funções implícitas que elas cumprem. Portanto, o
desprezo pelas hierarquias não investe na negação do que existe,
mas na invenção de liberdades onde se quer que elas aconteçam.
Neste contexto, não interessa perguntar apenas o porquê ou para
que as coisas, não interessa apenas saber as origens ou finalidades,
mas “um como”, ou seja, uma problematização, uma estratégia,
uma tática para fazer diferente os lugares da Educação Infantil.
Lugares de educação que poderiam ser mais ou menos assim:
abertos para as diferenças, para a desorganização e reorganização,
para a constituição permanentemente de grupos de convívio,
onde todos tivessem canais para dizer a sua palavra, tivessem
lugar não rígido para existir; um lugar de vida própria, de
criatividade, de solidariedade, de não discriminação, de
tolerância, demonstrando-se, assim, a relatividade da verdade, da
moralidade, do certo. Um lugar onde se pudesse inventar outros
modos inusitados de pensar, de perceber, de sentir e de agir. Um
lugar onde sempre pudesse existir a fantasia e a criação. Um lugar
que não é contra a noção de sistema, nem contra a comunicação,
nem contra a informatização, nem contra a escola, mas contra a
imobilização dos corpos.
Um lugar que é contra a proibição do inédito de vida de cada um
que se investe, abrindo espaço para as forças abafadas pelo nosso
presente que não podem ser universais, devem ser inventadas in
loco. Como nos lembra Deleuze (1995), precisamos estar atentos
ao desconhecido que bate à porta.
Para Foucault (1999), a mutação consiste nisto: as forças do
homem entram em relação com novas forças de finitude. Para ele,
não existe diagrama que não comporte, ao lado dos pontos que
ele conecta, pontos relativamente livres, pontos de criatividade,
de mutação, de resistência, colocando em questão os poderes
estabelecidos. São as forças componentes que entram em relação
com outras forças que são as estratégias utilizadas na educação de
maneira a tornar possível a mudança.
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Linguagem e infância I
Seção 3 - Educação Infantil e Pedagogia Cultural
De acordo com Escher à escola, em parceria com a família e
a sociedade, é reservado o papel de desenvolver a formação da
criança, envolvendo conhecimentos, atitudes, habilidades, valores,
formas de pensar e agir contextualizando as questões sociais.
Sabe-se que os pais são os primeiros agentes socializadores e os
educadores mais importantes para seus filhos, mas apesar dessa
assertiva, na maioria das vezes não assumem a maior parte da
responsabilidade sobre eles.
Sobre essa questão
consulte: ESCHER, Ana
Maria Macedo Lopes,
In: http://www.utp.
br/mestradoemeducacao/
pubonline/ana1art.htm
De acordo com esta autora, a escola, como
um espaço de encontros, deve repensar
constantemente a sua rotina, propiciando
um planejamento que contemple as
múltiplas linguagens expressivas da criança,
preservando momentos de aprendizagens individuais e coletivas,
de socialização de decisões, de descobertas, de discussão de
opiniões divergentes e enfrentamento de conflitos, assumindose, portanto, como um espaço de produção de subjetividades de
sujeitos-aprendizes.
O ponto de partida para o trabalho com a conexão das
múltiplas linguagens é a formação dos educadores
para que resgatem as memórias de suas infâncias e
de suas histórias de vida, como as lembranças das
brincadeiras de quintais e das ruas onde brincavam,
além de ampliar seus repertórios nas trocas de
práticas pedagógicas com os demais educadores.
A nutrição do olhar do educador que trabalha com a Educação
Infantil e a recuperação de seu percurso como aluno pode
favorecer a crença no brincar, no movimento e no trabalho
corporal como caminho de aprendizagem específica da criança,
além da percepção de que as múltiplas linguagens unem as áreas,
possibilitando a construção de conhecimentos significativos e a
apropriação da subjetividade cultural.
É muito importante, portanto, que se invista em trabalhos com
projetos na Educação Infantil, procurando operacionalizar temas
de cunho transversais, onde o eu possa conviver com muitos
outros, em diálogos constituintes de novos saberes.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Sobre essa questão consulte:
PROENÇA, Maria Alice. Brincando
com arte: espaço de identidade.
http://www.aliancapelainfancia.
org.br/biblioteca/textos
Proença esclarece que os projetos precisam ser definidos como
algo em construção coletiva, feito no dia-a-dia, que exigirá do
educador ser sempre um investigador e autor da sua trajetória
com as crianças. Cabe a ele organizar os espaços disponíveis,
planejar cada passo de seu trabalho com as crianças, observar
o seu meio e registrar suas percepções, propor desafios a
partir do que constata, avaliar e replanejar o andamento do
processo, possibilitando ao grupo desenvolver o sentimento de
pertencimento e identificação com o trabalho realizado.
Normalmente, incentivam-se as crianças a se
expressarem só da maneira que se idealiza para elas.
Fala-se constantemente sobre o respeito ao ritmo
de desenvolvimento, interesses, possibilidades,
características e espaço infantil, mas, em
contrapartida, limita-se a vida das crianças a longos
períodos de imobilidade em carteiras, realizando
atividades que muitas vezes não têm significado
algum para elas.
De acordo com Prevê e Corrêa (2000), crianças que freqüentam
a Educação Infantil passam importante parte do seu dia na
instituição organizacional. Lá, outras práticas vão ocupar
seus corpos, preencher seus tempos. Aqueles que passavam
o dia correndo de bicicleta, jogando bola, ajudando os pais
em alguns afazeres domésticos, indo com uma enxada nos
ombros para as plantações, ou até mesmo os que ficavam
no vai-e-vem dos carros, pedindo esmola ou cuidando
de irmãos menores, enquanto suas mães trabalhavam
fora de casa, os que ficavam à frente da televisão, esses
e todos os outros que vivem, se movimentam a partir
de sua entrada na escola, vão progressivamente mais
e mais tendo um corpo que mostra alguém que recebe,
que passivamente espera explicações, que, sentado, espera
adquirir capacidades.
Estes autores explicam ainda que sentados numa carteira de
escola, por quatro horas diárias ou mais, olhando a parte de trás
da cabeça do colega, o corpo destes alunos normalmente precisa
ficar imóvel. Apenas algumas partes de seus corpos podem ser
ativas, ou seja, o ouvido, para captar a mensagem emitida pelo
professor; o braço, desajeitado, que custa a fazer o movimento de
pedir licença para falar; a mão, para escrever as mensagens do dia
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Linguagem e infância I
e virar as páginas do caderno; a boca, para alguma tentativa de
conversa ou um pedido de explicação, de ida ao banheiro, mas
que logo é silenciada.
Essas crianças levam muito tempo para apreender esse ritual
diário de comportamento em que partes do corpo são acionadas
para o aprendizado. Quanto mais ela avança na escolarização,
menos o corpo inteiro é solicitado, como acontecia nas
brincadeiras de rua. Assim, imóvel por quatro horas diárias
durante mais ou menos dez anos - isso se completar o ensino
médio sem reprovação -, o corpo vai transformando-se num
receptáculo, num vazio a ser preenchido.
Pode-se dizer que foi assim que a maioria de nós passou seu
tempo na escola. E ainda hoje vemos a criança delimitada e
prisioneira de um tempo que não lhe pertence mais.
Será que elas têm espaço para falar, cantar, criar
histórias, trocar fatos e afetos do seu cotidiano
com seus amigos e com seus professores? Creio
que não. Parece que na instituição escolar não
há mais tempo para a linguagem e o prazer.
Onde permitimos que as crianças exercitem
o movimento, a fala, a criatividade? Onde as
mesmas podem colocar os seus desejos? Onde
está a festa espontânea como celebração da
liberdade e felicidade nesta instituição? Onde elas
descobrem o vigor de suas bocas e suas mãos
criando e não repetindo falas e gestos forçados
que nada lhes dizem?
A Pedagogia, como discurso científico, normalmente abriga
e justifica as práticas disciplinares da escola, ajustando cada
um ao controle. Normalmente, na instituição escolar não há
lugar para um tipo de concepção de educação que trabalhe
em função da produção de um outro tipo de subjetividade
marcada pela singularidade, pela diferença. Na maioria das
vezes, o tipo de relação formal utilizada nestas instituições
dificulta a interlocução, revelando-se incapaz de estimular
iniciativas de caráter criativo, expressivo, coletivo. No plano
das idéias, esta instituição possui também uma grande
dificuldade em romper com estereótipos, derrubando as
barreiras ao livre exercício do pensamento, preparando os
alunos para a nova sociedade da informação.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Na verdade o discurso é que, por um lado, as crianças precisam
desvendar o mundo e, por outro, fecha-se a porta da descoberta,
da curiosidade e da experiência com encaminhamentos definidos
e impostos pelo adulto. No entanto, as crianças precisam ser
educadas para a liberdade. A sociedade está a exigir não mais
a submissão, a heteronomia, a reprodução, mas outros tipos de
habilidades, tais como, liderança, capacidade de inovação, de
decisão, de sensibilização, de enfrentar desafios, de buscar o novo.
Um desafio se coloca, portanto, ao professor de
Educação Infantil: que tipo de pedagogia pode
propiciar uma reflexão sobre um novo olhar sensível
e reflexivo sobre a criança, procurando compreender
e aceitar os sinais que manifesta e que comunica a
respeito do que é e espera do adulto.
Corazza (2001), propõe que se trabalhe com uma Pedagogia
Cultural priorizando a “prática cultural” que só pode ser exercida
por meio de análises sobre as questões ligadas ao poder, à
linguagem, à diferença e à multiplicidade. Neste contexto, o
educador se preocuparia menos com questões metodológicas
de transmissão e processos de avaliação, e mais com os modos
como os saberes e os produtos culturais foram/são fabricados,
divulgados e consumidos.
Esse tipo de pedagogia se caracteriza como sendo uma
prática que questiona os discursos de verdade que moldam as
experiências, as relações, os gestos e os gostos cotidianos. Neste
sentido, privilegia a análise do “mundo da cultura”, procurando
compreender de que modo o funcionamento do poder, o
estabelecimento de privilégios e a constituição de determinadas
subjetividades movimentam a vida de uma sociedade e de seus
membros em uma dada direção e não em outras.
Corazza (2001), explica ainda que a Pedagogia Cultural
procura tornar os currículos escolares mais atentos ao poder
do discurso cultural e ao heteromorfismo de seus jogos de
linguagem. Um tipo de pedagogia que procura diagnosticar
como a linguagem funciona, sob o primado de um suposto
“consenso” que garante e marginaliza atitudes diferenciadas:
fortalece e enfraquece modos de existência; estimula e impede
certos prazeres e desejos; reabsorve a diversidade cultural em
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Linguagem e infância I
falsas unidades, sistemas estáveis e sínteses doutrinais. Para
realizar essas tarefas, a autora diz que a Pedagogia Cultural
atua de maneira radicalmente não-disciplinar. Defende que
só se conseguirá educar se não operarmos mais dentro das
“camisas-de-força” das rotinas preestabelecidas, como já
vem acontecendo desde a mais tenra idade. Ela sugere uma
“alquimia” de todos os saberes sem distinção por séries, ciclos,
idades ou áreas de conhecimento que sejam necessários e úteis
para refletir sobre os movimentos sociais.
Corazza (2001), diz que os educadores deveriam ser na realidade
“pedagogos culturais”, comprometidos e implicados nas
relações de poder, formas de saber e modos de subjetivação
produzidos pela dinâmica social. Por isto mesmo,
precisam considerar a sala de aula, o pátio, o ginásio
de esportes, as ruas, as praças, os shopping centers, os
cinemas, o rádio, a televisão, a publicidade, a discoteca,
as organizações como espaços pedagogicamente culturais,
onde sempre é possível “desconstruir”e “reconstruir” as relações
entre cultura, conhecimento e poder.
A Pedagogia Cultural, de acordo com esta autora, demanda que
nos tornemos muito menos “escolares” e muito mais “culturais”,
menos “professores” e “pedagogos” e mais “artista-culturais”,
engajados na reconceitualização e mudanças das questões
sociopolíticas. Ela explica o que significa ser um intelectual
artista, ou seja, aquele que já tem condições de pensar, dizer
e fazer algo diferente com a sua docência, ou seja, que, ao
problematizar, possa proporcionar criatividade e invenção. Um
intelectual artista que saiba desenvolver práticas pedagógicas
ainda inimagináveis e, talvez, nem mesmo possíveis de serem
pensadas e realizadas. Práticas essas que estimulam outros modos
de ver e ser visto, dizer e ser dito.
Diz, ainda, Corazza (2001) que é através do
impedimento da ação infantil promovida pelo adulto
que tem início a moral pedagógica, começando
por negar a infantilidade; desenvolvendo-se pelo
enfraquecimento da infância; e concluindo pelo
desaparecimento radical do infantil.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Explica também que a experiência infantil a ser apreendida na
relação constitutiva criança-escola requer uma análise que leve
em conta os sentidos que os discursos imprimem ao reeditar a
ordem natural do desenvolvimento humano, bem como seus
efeitos de dominação sobre as práticas pedagógicas e sobre os
modos de subjetivação que promovem.
Segundo Larrosa (2003), poderíamos pensar a criança e a
educação a partir do par “experiência” e “sentido”, apostando
na necessidade não somente de “raciocinar”, “calcular”,
“argumentar”, mas, sobretudo, de pensar no modo como damos
sentido ao que somos e ao que nos acontece. Ele acredita que
é preciso que se faça da pedagogia e da aprendizagem novos
territórios, nos quais seja possível discutir os processos de
significação de nós mesmos e de nossas relações com os outros
e com o meio ambiente. Uma docência que ponha em jogo
inusitadas maneiras de ensinar a produção e as trocas de todos os
saberes, as recepções e as disputas de todos os poderes.
De acordo com Corazza (2001), é preciso pensar uma docência
que nos convoca a lutar pela criação de espaços para todas as
culturas diferenciadas que habitam o mundo e cada um de nós;
que busca instituir novas significações para que os discriminados
possam ter voz e vez; que procura recuperar e reformular os
saberes submetidos; que dialoga e trabalha com as diferenças
para superar as desigualdades, pois são estas que inferiorizam os
diferentes, que assume o risco de educar “na diferença” para que
o consenso nunca mais feche os horizontes sociais, empurre-nos
para o conservadorismo ou violente a heterogeneidade da cultura.
Seção 4 - O ensino e a aprendizagem na Educação
Infantil
De acordo com Stirner (2001), para que se aprenda, é preciso
que o ensino se caracterize como uma produção interessada de
relações, uma investigação interessada de problemas. Para esse
autor, a aprendizagem acontece na invenção de liberdades onde
quer que elas aconteçam.
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Linguagem e infância I
Conforme Deleuze (2003), para que haja a aprendizagem é
preciso que se abra passagem para as forças criativas, isto é, que
se crie um plano de consistência, materializando as sensações
de modo a perceber e fazer perceber as forças, ver e fazer ver o
invisível na manifestação do paradoxo. O paradoxo quebra o
exercício comum, levando cada faculdade diante de seu próprio
limite. De acordo com este autor, a aprendizagem é algo que
possibilita a invenção e a constituição de outros estilos de vida.
O contato do educador infantil com a aprendizagem
criativa pode provocar quebras na recognição,
forçando a pensar e a construir novas formas de ser e
de agir.
Por este motivo, Deleuze (2003), considera como fundamentais
os encontros. No entanto, para ele, os encontros acontecem
com signos e não com pessoas ou objetos. São os encontros com
os signos que nos afetam e que nos trazem maior diferença.
No contato com eles, não cabe representação, reprodução,
transmissão de informação, apenas a circulação de afetos, que
desencadeiam transformações. Sendo assim, os signos têm caráter
de força e potência de problematização.
Este autor salienta, ainda, que o sentido desses signos é uma
essência que se afirma em toda sua potência. Quando somos
afetados pelos signos, sentimo-nos contagiados e tendemos
a nos transformar. Mas para sermos afetados, é preciso que
algo nos desperte.
Pela atração dos signos é que se pode pensar e aprender
algo. Para Larrosa (2003), o professor que nos atinge é
aquele que não oferece uma verdade, mas uma exigência,
uma tensão, um desejo, conduzindo o aprendiz a uma
viagem aberta que possibilita tanto o desprendimento das
regras convencionais, quanto um voltar-se a si mesmo.
Deleuze (2003), esclarece que somente os signos são capazes
de provocar o pensamento, o aprendizado, a leitura, a criação.
Explica, também, que nunca se sabe como uma pessoa
aprende; mas, de qualquer forma que aprenda, é sempre por
intermédio de signos, e não pela assimilação de conteúdos
objetivos. O autor pergunta: quem sabe como um estudante
pode tornar-se repentinamente “bom em latim”? Que signos
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
lhe serviriam de aprendizado? O signo implica em si a
heterogeneidade como relação. Nunca se aprende fazendo
como alguém, mas fazendo com alguém, que não tem relação
de semelhança com o que se aprende.
Como existe essa especificidade em relação aos
signos, cada pessoa será mais ou menos sensível a
diferentes tipos de signos. E essa sensibilidade em
relação aos signos pode decorrer de um aprendizado.
Segundo Deleuze (2003), para alguém ser marceneiro, por
exemplo, tem que se tornar sensível aos signos da madeira por
meio do aprendizado e da prática, assim como um médico deve
buscar se tornar sensível aos signos da doença. E só nos tornamos
leitores, sendo sensíveis aos signos do livro.
A aprendizagem possui signos que forçam a pensar. Os signos
têm a potência de gerar experiências, de sair da padronização e de
produzir novas subjetividades. Impulsionados pelos signos é que
podemos pensar.
Pensar é, pois, alojar-se no estado presente que serve de limite,
tornando o passado ativo e o presente aberto para que surja
algo novo. O essencial para o pensamento criador é, portanto,
aquilo que está fora da epistémê da época, aquilo que força a
pensar diferentemente do que se pensa. A epistémê para Foucault
constitui-se na ordem intrínseca do saber, como assinala
Machado:
Epistémê não é sinônimo de saber; significa a existência
necessária de uma ordem, de um princípio de ordenação
histórica dos saberes anterior à ordenação do discurso
estabelecida pelos critérios de cientificidade e dela
independente. A Epistémê é a ordem específica do saber;
é a configuração, a disposição que o saber assume em
determinada época e que lhe confere uma positividade
enquanto saber. (MACHADO, 1982. p.148-149).
De acordo com Guattari e Negri (1987), pensar é ter
liberdade quanto àquilo que se faz. O ato de pensar não
decorre de uma simples possibilidade natural; é, ao contrário,
a única criação verdadeira. A criação é a gênese do ato de
pensar no próprio pensamento.
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Linguagem e infância I
Para os autores, essa gênese implica algo que tira o pensamento
do seu natural, de suas possibilidades apenas abstratas, para
tornar-se aprendizagem. A criação, como gênese do ato de
pensar, mobiliza a inteligência, memória ou imaginação, pondo
o pensamento em movimento. Sendo assim, criar é sempre
produzir linhas e figuras de diferenciação. O pensamento
diferenciado é, pois, um pensamento de resistência, um
pensamento da vida, visto que a vida é potência.
Só há aprendizagem, então, quando há um
estado de paixão, uma vontade de saber.
Para Foucault, a aprendizagem deve se dar a partir da ética que
não é universal. Ela é local, pois depende das relações sociais,
fruto de singularidades. A ética implica o estabelecimento de
relações que, em vez de serem pautadas por dominação, são
exercidas em forma de composição entre os seres. Onde os
seres envolvidos se mantêm singulares do começo ao fim, não
isentos de tensões e de potencial criativo, se aproximando, cada
vez mais, da vida como uma obra de arte. A ética que o autor
propõe é, sobretudo, um convite à prática da liberdade, à luta
para abrir possibilidades de novas relações para si e para os
acontecimentos do mundo.
Só há aprendizagem, portanto, quando há uma ética
do respeito, da solidariedade e da cooperação para
com os seres humanos.
De acordo com Gagnebin (1994), a primeira regra para que haja
uma verdadeira aprendizagem é não temer os desvios, não temer
a errância. Explica a autora que os programas utilizados nas
escolas devem somente servir de esboços para o percurso de uma
temática. Salienta também que quando algo acontece na sala de
aula, este algo pode se constituir numa verdadeira questão a ser
tematizada. Neste momento, vale a pena demorar, parar, dar um
tempo, descrever o impasse, para poder perceber que algo está
começando a ser vislumbrado, algo novo que ainda não havia sido
pensado antes.
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Esta autora propõe ainda uma segunda regra, que é não ter
medo de “perder tempo”, reaprendendo a paciência. Para ela, a
paciência pedagógica é uma virtude do pensar e, igualmente,
uma tática modesta, mas efetiva de resistência.
Uma terceira regra de uma aprendizagem desviante apontada
pela autora é a não preocupação em ser “atual”, estar na moda,
mas em assumir uma não-conformidade ao tempo, percebendo o
surgimento do devir no passado ou no presente, ainda indefinido.
Diz que é preciso resistir à tentação de ser um “intelectual” que
quer sempre encontrar uma saída, uma solução, uma lei, uma
verdade para resolver os problemas. Explica ainda que é preciso
não confundir “taxinomia”, arranjo de diferentes disciplinas em
várias gavetas, com pensamento, pois pensar é, antes de tudo,
duvidar, criar caminhos, perder-se nas trilhas e inventar atalhos.
A autora propõe ainda uma quarta regra para uma aprendizagem
desviante: ter humildade, não levando tão a sério as “opiniões”
alheias. Se há algo em que a reflexão pode realmente ajudar
a pensar, é a necessidade de ultrapassar, de ir além, isto
é, de “transcender” aos modelos estabelecidos, através de
problematizações e dos processos criativos.
E a autora conclui: podemos exercer, treinar, mesmo numa sala
de aula, pequenas táticas de solapamento, exercícios de invenção
séria e alegre, exercícios de paciência, de lentidão, de gratuidade,
de atenção, de angústia assumida, de dúvida, enfim, exercícios de
solidariedade e de resistência que nos darão subsídios para que
sejamos verdadeiros educadores.
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Linguagem e infância I
Atividades de auto-avaliação
Após a leitura criteriosa da Unidade V, efetue as atividades de autoavaliação e, a seguir, acompanhe as respostas e comentários a respeito.
Para melhor aproveitamento do seu estudo, realize a conferência de
suas respostas somente depois de fazer as atividades propostas.
1) De que forma as colocações de Kastrup, expostas na seção 1, podem
nos servir de guia para pensar sobre o processo de formação do
educador da Educação Infantil?
Unidade 5
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Universidade do Sul de Santa Catarina
2) Qual a importância do estudo para a formação do educador na
concepção de Larrosa?
3) Corazza propõe que se trabalhe na Educação Infantil através de uma
Pedagogia Cultural. Explique como a autora entende essa proposta.
140
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Linguagem e infância I
4) Identifique qual a diferença entre educação e escolarização.
Unidade 5
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141
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Vimos na Unidade V aspectos relevantes sobre a Educação
Infantil e a formação do pedagogo, tais como:
„
a formação dos profissionais, em sua maioria, é bastante
marcada por um tipo de conhecimento superficial,
pelo fazer; por programas pautados em metodologias
de ensino em detrimento da ênfase em dimensões
socioculturais;
„
o processo de formação pode se comparar a uma viagem
na qual a ênfase é sair do território conhecido, abrindo
brechas para apreender o desconhecido, “escapando”,
resistindo ao controle da sociedade contemporânea;
„
a formação deve ser vista como um encontro marcado
pelo diálogo, pela criação, mantendo sempre a paixão
pela vida;
„
o estudo, na formação do educador, implica rigor e
exigência constante; a leitura tem a potência de afetar, de
mover, de transformar.
„
um desafio se coloca para o professor de Educação
Infantil: refletir sobre um novo olhar sensível e reflexivo
sobre a criança, procurando compreender e aceitar os
sinais que manifesta e que comunica a respeito do que é e
espera do adulto.
„
a nutrição do olhar do educador que trabalha com
Educação Infantil e a recuperação de seu percurso como
aluno pode favorecer a crença no brincar, no movimento
da criança como caminho de aprendizagem;
„
os educadores deveriam ser, na realidade, "pedagogos
culturais", comprometidos e implicados nas relações
de poder, formas de saber e modos de subjetivação
produzidos pela dinâmica social;
142
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18/1/2007 09:58:56
Linguagem e infância I
„
precisamos pensar a criança e a educação a partir da
“experiência” e do “sentido”, apostando na necessidade
não somente de raciocinar, calcular, argumentar, mas,
sobretudo, de pensar no modo como damos sentido ao
que somos e ao que nos acontece;
„
o professor que nos atinge é aquele que não oferece uma
verdade, mas uma exigência, uma tensão, um desejo,
conduzindo-nos a uma viagem aberta que possibilita
tanto o desprendimento das regras convencionais, quanto
um voltar-se a si mesmo.
Unidade 5
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143
18/1/2007 09:58:56
Universidade do Sul de Santa Catarina
Saiba mais
Se você ficou interessado em conhecer mais detalhes sobre a
Formação do Pedagogo, pesquise em:
DELEUZE, G. Crítica e clínica. Tradução de Peter Pal Pelbart.
São Paulo: Editora 34, 1997.
___________. Conversações, 1972 – 1990. Tradução Peter Pál
Pelbart. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.
GALLO, S. Deleuze e a filosofia da educação. Enciclopédia de
Filosofia da Educação,
2000. Disponível em: http://www.humanas.unisinos.br/info/
laercio/Projeto/Deleuze %20e%20Educar.htm. Acesso em: nov.
2005.
LARROSA, J. Pedagogia profana: danças, piruetas e
mascaradas. 4. ed. Tradução Alfredo Veiga-Neto. Belo
Horizonte: Antêntica, 2003.
____________. Notas sobre a experiência e o saber da
experiência. Tradução João Wanderley Geraldi. Revista
Brasileira de Educação, Campinas, n 19, p. 20-28, jan./fev./
mar./abr. 2002.
144
linguagem_e_infancia_I.indb 144
18/1/2007 09:58:56
UNIDADE 6
Pedagogia e projetos de prática
de ensino na Educação Infantil
6
Objetivos de aprendizagem
„
Analisar a prática pedagógica utilizada na Pedagogia e
suas conexões.
„
Compreender como ocorre o olhar sobre a infância na
prática de ensino da Educação Infantil.
„
Apresentar algumas experiências diferenciadas na
Educação Infantil.
„
Propor projetos de oficinas como ferramenta educativa
para a Educação Infantil.
Seções de estudo
Seção 1 Pedagogia e Prática de Ensino: transitar
pelo território do saber fazendo conexões
Seção 2 Prática de Ensino na Educação Infantil: um
olhar de compreensão sobre a infância
Seção 3 Algumas experiências diferenciadas
desenvolvidas na Educação Infantil
Seção 4 Os projetos de oficinas como ferramenta
educativa
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de conversa
A Pedagogia, como um conjunto de técnicas e métodos de ação
e intervenção sobre o comportamento humano, revela-se, cada
vez mais, uma disciplina com um objeto científico e um objeto
de observação autônoma e específica. Isto leva os pedagogos e
especialistas afins a transformarem a Pedagogia num objeto de
compra e venda, com conceitos e metodologias próprias. Embora
mantenha laços de indissolubilidade com o ser humano e a
sociedade, tende a funcionar como instrumento de adaptação
racional dos seres humanos aos desígnios das instituições
escolares, do Estado e do mercado.
Contemporaneamente, persiste uma grande dificuldade em
compreender o sentido e a lógica de uma Pedagogia criativa
e livre, quando, em muitos casos, ela não é mais do que um
fenômeno de castração do ser humano a serviço da racionalidade
instrumental do mercado e do Estado.
Uma Pedagogia criativa que se esforça para que cada criança
adquira um tipo de conhecimento mais completo de si próprio e
da vida em geral, habilita-a a procurar os meios indispensáveis
à conservação da existência, despertando os sentimentos de
independência e liberdade; desenvolvendo entre elas o princípio
do auxílio mútuo, base de toda a solidariedade, e não tendo a
pretensão de formar sábios.
Esta pedagogia se preocupa em perceber que as crianças assim
como caminham, cantam, falam e jogam, possuem diversos
tipos de linguagens que precisam ser desenvolvidas. Nosso erro é
presumir que essas múltiplas linguagens infantis, cuja existência
é impossível negar, é apenas uma tentativa ingênua e desajeitada
de imitar as atividades dos adultos. Em toda a atividade infantil
há sempre um elemento de imitação, mas o que a criança deseja
não é imitar e sim comunicar alguma coisa, utilizando as diversas
linguagens.
O impulso sempre presente em todos os trabalhos infantis é uma
necessidade subjetiva interna e desta compreensão dependerá a
escolha entre ensinar as crianças a imitar os padrões adultos ou
reconhecer que elas têm padrões próprios, compatíveis com suas
idades e suas necessidades de expressão.
146
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Linguagem e Infância I
O que ensinamos às crianças por meio de projetos é uma
determinada maneira de se expressar através dos sons, palavras,
linhas, cores, ou seja, tudo é matéria-prima com a qual a criança
pode aprender a se comunicar com o mundo exterior. Sendo
assim, se nós pudermos contribuir para eliminar o medo da
criança, teremos libertado o seu potencial de desenvolvimento
emocional, assim como poderemos levá-la para o mundo mais
positivo da autonomia e cooperação. Essas mesmas qualidades
devem ser usadas para estabelecer laços humanos e sociais até que
a criança seja capaz de realizar-se no mundo adulto.
Seção 1 – Pedagogia e Prática de Ensino: transitar pelo
território do saber fazendo conexões
O ensino contemporâneo sofre excessiva
compartimentalização dos saberes. Podemos compreender
essa fragmentação como uma questão epistemológica, já que
praticamente todo o saber da humanidade é legitimado num
determinado momento da história, por intermédio da busca
dos seus fundamentos à interpretação da realidade e à noção
de verdade.
A organização curricular do ensino segue este padrão, colocando
as disciplinas como realidades estanques. Muitas das discussões
em torno da busca de alternativas de superação da fragmentação
dos saberes apontam para a interdisciplinaridade como uma
forma de integração das disciplinas. No entanto, o modelo
interdisciplinar, de acordo com Gallo (2003), continua a ser
arbóreo, ou seja, possui o modelo de uma árvore, onde cada
galho significa uma disciplina que não se cruza, não se encontra
espontaneamente.
Este é o modelo curricular das políticas públicas e
funciona por meio do modelo oficial, que corresponde
a uma educação instituída, produzida nos gabinetes,
nos documentos legais que se pretende universalizar
e que funciona como máquina de controle,
produzindo indivíduos em séries, fragmentando
saberes, tempos e espaços.
Unidade 6
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147
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Este autor diz ainda que para contrapor-se a esse modelo oficial,
é preciso que se remeta ao conceito de educação como resistência.
Educação como resistência, segundo este autor, é educar
questionando-se, por intermédio de um ato de revolta contra os
fluxos instituídos e resistência às políticas impostas.
Uma educação que, conforme Deleuze e Guattari (1995),
não se presta à hierarquização, mas é a proliferação de
pensamentos, como se fosse um rizoma que pode ser
conectado a qualquer outro, em qualquer momento que seja
necessário. Numa perspectiva rizomática, o princípio da
educação passa a ser a transversalidade, ou seja, transita-se
pelo território do saber construindo sentidos, fazendo diversas
conexões. Para uma melhor compreensão, trazemos, a seguir,
um desenho de um rizoma:
Portanto, não interessa a esse tipo de educação criar modelos,
propor caminhos, impor soluções, isto é, não se trata de buscar
a integração dos saberes, mas de fazer conexões sempre novas
e criadoras. Para isto, os campos dos saberes necessitam estar
abertos, são como horizontes sem fronteiras com trânsitos livres
e inéditos. Gallo (2003) diz que este tipo de educação não está
preocupada com a universalização dos saberes, ocorre nos espaços
micropolíticos, no âmbito das salas de aula, nas ações cotidianas,
opondo resistências e produzindo diferenças.
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Linguagem e Infância I
O processo educativo rizomático, de acordo com este autor,
é necessariamente singular, diferente daquele resultante do
processo de subjetivação das massas. A aprendizagem, nessa
perspectiva, é um processo sobre o qual não se pode ter absoluto
controle, ou seja, está para além de qualquer máquina de controle.
A educação rizomática procura observar, agir nos intervalos, no
meio do saber e do não-saber, deslocando-se entre um e outro,
produzindo saberes, intensidades e experimentações.
Kanitz diz que o primeiro passo para aprender a pensar
é aprender a observar. Só que isto, normalmente, não é
ensinado na escola.
Sobre esse aspecto
consulte: KANITZ, Stephen.
Observar e Pensar.
http://www.kanitz.com.
br/veja/observar.asp
Hoje os alunos são proibidos de observar o mundo
porque ficam trancafiados numa sala de aula,
estrategicamente colocada bem longe do dia-a-dia e
da realidade.
Salienta o autor que ensinar a observar deveria ser a primeira
preocupação da educação, pois quase metade das grandes
descobertas científicas surgiu não da lógica, do raciocínio ou do
uso de teoria, mas da simples observação, auxiliada por novos
instrumentos, como o telescópio, o microscópio, o tomógrafo, ou
pelo uso de novos algoritmos matemáticos.
Ensinar a observar, portanto, não é tarefa fácil. Para isto,
precisamos eliminar os preconceitos ou pré-conceitos, que são a
carga de atitudes e discursos de verdade que interiorizamos e nos
impedem de enxergar o verdadeiro mundo. Diz ainda o autor que
se desejamos ter uma visão independente, precisamos observar
primeiro a nós mesmos.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 2 - Prática de Ensino na Educação Infantil: um
olhar de compreensão sobre a infância
De acordo com Silva (2004), o educador precisa ter um olhar
sobre a criança que respeite o seu direito de ser criança, de “ser
mais”, de ser recebida como um ser original. Um olhar que não a
subordine ao adulto, mas que possibilite entre eles um encontro,
sendo o mesmo marcado pelo diálogo que implica em respeito e
amor por si e pelo outro.
Um olhar que possibilite uma outra compreensão
sobre a infância, deixando de vê-la como um tempo
de imaturidade, incapacidade, inferioridade, de
dependência, passando a pensá-la como novidade,
encontro, imprevisibilidade e criação. Um olhar que
rompa com a idéia de uma temporalidade cronológica
que define a existência humana em etapas evolutivas.
Kohan (2003), a partir das idéias de Agamben, fala-nos de uma
infância que vai além de sua etapa cronológica, ampliando-a, no
sentido de pensá-la como condição de possibilidade da existência
humana. Nesta compreensão, ela nos acompanha por toda
a vida, independente da idade, não estando, portanto,
necessariamente relacionada apenas às crianças.
Considerando a fala de Kohan (2003), inicia-se um processo
de reflexão sobre a dimensão que os conhecimentos assumem
na educação das crianças da Educação Infantil, assim como
sobre a construção de procedimentos teórico-metodológicos que
possam viabilizar não somente a investigação nesta faixa etária,
mas também um encontro com o outro (as crianças), com a
alteridade da infância como nos lembra Larrosa (1998).
Oliveira (2001), diz que é preciso captar as vozes, os sentimentos,
os sentidos, os gestos, os olhares, os silêncios, as contradições do
universo infantil, enfim, as diferentes linguagens das crianças
e, simultaneamente, ter as crianças como outros. As crianças
possuem inúmeras formas de expressão, de comunicação, de ser e
existir no mundo, as quais precisam ser consideradas.
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Linguagem e Infância I
Esta dimensão coloca-se numa relação extremamente
vinculada aos processos gerais de constituição da criança: a
expressão, o afeto, a sexualidade, a socialização, o brincar, a
linguagem, o movimento, a fantasia, o imaginário, ou seja,
as suas múltiplas linguagens.
Rocha (1999), esclarece que este conjunto de relações pode
ser identificado como o objeto de estudo de uma Pedagogia
da Educação Infantil que se preocupa com a educação da
própria criança, isto é, com seus processos de constituição
como seres humanos em diferentes contextos sociais, sua
cultura, suas capacidades intelectuais, criativas, estéticas,
expressivas e emocionais.
Não é por acaso que a autora prefere o termo educar no
contexto da Educação Infantil. Ela esclarece que este termo
parece dar um caráter mais amplo que o termo ensinar que,
em geral, refere-se mais diretamente ao processo de ensino
e aprendizagem no contexto escolar.
Esta autora salienta ainda que a função das
instituições de Educação Infantil não deveria limitar-se
ao domínio do conhecimento, assumindo também
funções de complementaridade e socialização,
relativas tanto à educação como ao cuidado, tendo
como objeto as relações educativas estabelecidas
entre e com as crianças pequenas.
A multiplicidade de fatores que estão presentes nestas
relações, sobretudo, nas instituições responsáveis pela
infância, exige do educador um olhar transversal que
favoreça a constituição de uma educação que tenha como
objeto a própria relação expressa nas ações intencionais
que, diferentemente da escola de Ensino Fundamental,
envolvem, além da dimensão cognitiva, as dimensões
expressivas, lúdicas, criativas, afetivas, nutricionais, etc.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 3 - Algumas experiências diferenciadas
desenvolvidas na Educação Infantil
3.1 - A Escola da Ponte em Portugal
Especialista em Música e em Leitura e Escrita, José Pacheco, de
52 anos, coordena, desde 1976, a Escola da Ponte em Portugal,
uma instituição pública que se notabilizou pelo projeto
educativo inovador que tem como base à autonomia das
crianças e adolescentes. Este educador diz que quem quer
inovar deve sempre ter mais interrogações que certezas.
De acordo com Marangon (2004), ele não é o
primeiro — e nem será o último — a desejar uma
escola que fuja do modelo tradicional. Ao contrário
de muitos, este educador pode se orgulhar por ter
transformado seu sonho em realidade. Há 28 anos
coordena a Escola da Ponte, uma escola da rede
pública portuguesa de ensino básico, localizada a
30 quilômetros da cidade do Porto, que em nada se
parece com aquelas que conhecemos.
Conforme Pacheco (apud Maragon, 2004), até 1976, a
escola era igual a qualquer outra. Cada professor ficava em
sua sala, isolado com sua turma e seus métodos. Não havia
comunicação ou projeto comum. O trabalho escolar era
baseado na repetição de lições. Explica o educador que, nesta
época, havia três professores e apenas noventa alunos. Ao
longo do tempo, em vez de cada docente lecionar para uma
turma de trinta alunos, passou-se a juntar todos.
O objetivo destes professores era promover a autonomia e
a solidariedade entre os alunos. Antes disso, porém, foram
chamados os pais para explicar o projeto e discutir o que
pensavam sobre o assunto. Eles apoiaram o modelo que fora
projetado e até hoje funciona mais ou menos neste esquema, onde
participam de todas as decisões.
Maragon (2004), diz que na Escola da Ponte, a cada ano, as
crianças criam as regras de convivência que serão seguidas
inclusive por educadores e familiares. No entanto, há também
problemas de adaptação a essa realidade, ou seja, há professores
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Linguagem e Infância I
que vão embora e alunos que estranham tanta liberdade. No
entanto, este tipo de escola tem se mostrado viável por, pelo
menos, dois motivos: primeiro, porque os educadores estão
abertos a mudanças; segundo, porque as famílias dos alunos
apóiam e defendem a escola idealizada por Pacheco.
Rubem Alves visitou essa escola e ficou maravilhado com o seu
funcionamento, produzindo um livro chamado: “A escola que
sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir. São Paulo: Papirus,
2001.” Ele diz que muitos professores interiorizaram um modelo
tradicional de escola que ainda hoje influencia o olhar, a memória
e as experiências dos mesmos, não sendo capazes, portanto,
de reconhecer a novidade no que existe, quanto mais sonhar e
desejar o que não existe.
O que se vê normalmente é que os conhecimentos
dos programas escolares não produzem vida, são
respostas dadas às perguntas que as crianças não
fazem, por isso mesmo não entendem porque
precisam aprender determinadas coisas. Os
programas geralmente são uma violência que se faz
com o jeito como o corpo da criança tem de aprender.
A Escola da Ponte não segue um sistema baseado em seriação
ou ciclos e seus professores não são responsáveis por uma
disciplina ou por uma turma específica. As crianças definem
quais são suas áreas de interesse e desenvolvem projetos
de pesquisa, tanto em grupo como individuais. O autor,
anteriormente citado, explica que a ponte é uma passagem e a
escola é uma ponte, um lugar de encontro.
Para o autor, o caminho dissociado da experiência de quem o
percorre é apenas uma proposta de trajeto, não um projeto de
vida. Para ele, o caminho verdadeiramente só existe quando
o percorremos – mas só o percorremos quando o percebemos
dentro de nós, ou seja, o caminho se faz ao caminhar. É o rastro
que nele projetamos. São os caminhos que fazem os caminhantes
e não o contrário.
Alves (2001), diz que os professores que trabalham nesta escola
têm a mesma formação que os de outras instituições, o diferencial
é que sentem uma inquietação quanto à educação e admitem
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
existir outras lógicas. Esta escola é a única no país que pode
escolher o corpo docente. Hoje, são vinte e sete professores cada
um com suas especializações.
De acordo com Pacheco (apud Maragon, 2004), muitos alunos
que estudam nesta escola e que têm entre 5 e 17 anos, chegam
extremamente violentos, com diagnósticos psiquiátricos e
psicológicos e vão modificando o seu modo de ser com o tempo.
Este professor esclarece também que há crianças e jovens que
chegam e não sabem o que é trabalhar em grupo, não conhecem
a liberdade, apenas a permissividade, assim como não sabem o
que é solidariedade, somente a competitividade.
Nesta escola, as crianças não são educadas para a
competição, mas para a ajuda mútua. A inveja, a
agressividade, a rivalidade estão quase que ausentes.
Quando se deparam com a possibilidade de definir as regras de
convivência que serão seguidas por todos, ou não decidem nada
ou o fazem de forma pouco ponderada.
Seus membros concorrem para a formação de uma vontade
e de um tipo de saber coletivo, onde as normas orientam as
relações societárias que decorrem das necessidades sentidas
por todos, de acordo com o coletivo.
Pacheco (apud Maragon, 2004), diz ainda que há uma grande
resistência em aceitar este modelo de escola, que é baseado
em três grandes valores: a liberdade, a responsabilidade e a
solidariedade. Algumas pessoas consideram que todos precisam
ser iguais e que ninguém tem direito a pensamentos divergentes.
Na Escola da Ponte, todos reconhecem os objetivos comuns
e se conhecem na intimidade, como em uma família. É nesse
ponto que o projeto se distingue daqueles realizados pelas outras
escolas.
Alves (2001) afirma que o que mais lhe impressionou na
intervenção pedagógica dos profissionais da Escola da Ponte, foi a
seriedade no olhar, nos gestos, nas palavras de adultos e crianças.
As crianças pesquisam e aprendem com o grupo. As que sabem
mais responsabilizam-se pelo acompanhamento e apoio à
aprendizagem das que sabem menos.
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Linguagem e Infância I
Todas as sextas-feiras são realizadas assembléias onde
os integrantes da escola refletem sobre projetos e
problemas da escola.
De acordo com este autor, tudo obedece a uma outra lógica.
Não há aulas, não há turmas, não há testes para avaliar, não há
manuais para todos, os professores se confundem com os alunos.
Há uma lógica singular de organização.
A educação, mais do que um caminho é um percurso que, feito
à medida de cada aluno, é partilhado por todos. As crianças,
juntamente com os professores, elaboram quinzenalmente os
seus planos de trabalho, seus roteiros, discutem e aprovam as
atas das assembléias, identificam e verbalizam suas dificuldades,
disponibilizam-se a ajudar os colegas.
Ao final deste tempo, fazem uma reunião e uma avaliação do
que foi aprendido. A partir disso, o grupo se dissolve e forma
outro para aprender outro assunto. Mais do que adquirir
conhecimentos, as crianças aprendem, nesta escola, atitudes
éticas. A ética perpassa silenciosamente, sem explicações, as
relações em sala de aula.
Alves (2001) cita que um belo exemplo sobre isto é
o seguinte: Um homem primitivo permanece muito
tempo na chuva e o seu o corpo sofre. O sofrimento o
faz pensar a partir do problema que precisa resolver.
Neste momento a sua inteligência entra em ação,
pensa o que fazer para deixar de sofrer. Instruído
pela inteligência, ele toma uma decisão. Surge outro
problema, o corpo volta a sofrer, o sofrimento acorda
a inteligência e faz com que trabalhe novamente.
A solução original já não serve mais e a inteligência
passa a inventar ferramentas, técnicas diferenciadas à
medida que o corpo se defronta com as necessidades
práticas. Sendo assim, a inteligência é essencialmente
prática e está a serviço da vida.
O autor diz ainda que foi muito importante ver funcionar uma
escola diferente, que compreende como os saberes são gerados e
nascem; uma escola em que o saber vai nascendo das perguntas
que o corpo faz; uma escola em que o ponto de referência não é o
programa oficial a ser cumprido, mas o corpo da criança que vive,
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
admira, encanta-se, pergunta, brinca; que é iluminada pelo brilho
dos inícios.
Barthes (apud Alves, 2001) afirma que seu ideal de escola é
aquele em que há a criação de um espaço parecido com aquele
que existe quando uma criança brinca ao redor da mãe. Ele diz
ainda que o importante não é o objeto feito, mas o espaço lúdico
que se ensina sem que se fale sobre ele. Espaço onde crianças e
adultos são companheiros numa mesma aventura, isto é, onde
todos se ajudam. O espaço da aula é como o espaço do jogo: o
jogo, para ser divertido e fazer sentido, tem regras de convivência
combinadas pelo grupo.
Na escola da Ponte, como em outros lugares, é indispensável
alterar a organização e interrogar práticas educativas
dominantes, questionar convicções, incomodar os acomodados.
Os alunos são educados não apenas para a autonomia, mas
através dela, nas margens de uma liberdade matizada pela
responsabilidade. Há uma cadeia de solidariedade entre eles. A
disciplina é a liberdade que, conscientemente exercida, conduz
a uma ordem que não é imposta.
Conforme Read (apud Alves, 2001), a educação
pode assegurar que a vida seja vivida em toda
a sua criatividade e em sua plenitude sensorial,
emocional e intelectual. Educar é assim mais
do que preparar alunos para fazer exames,
é ajudar as crianças a entenderem o mundo
e realizarem-se como pessoas para além do
tempo de escolarização. É sempre uma aventura
coletiva de partilha: de afetos e sensibilidades, de conhecimentos
e saberes, de expectativas e experiências, de atitudes e valores, de
sentidos de vida.
3.2 - As Lições de Reggio Emília
GENTILE, Paola. Pedagogia dos
sentidos. http://novaescola.abril.
uol.com.br/ed/153_jun02/html/
ed_infantil.htm
De acordo com Gentile, após o término da Segunda Guerra,
as mulheres de Villa Cella, próxima a Reggio Emilia, cidade
no norte da Itália, decidiram construir e gerir uma escola para
os filhos, pois todas as da região haviam sido destruídas. O
terreno foi doado; o material de construção tirado das casas
bombardeadas; e o restante dos recursos veio da venda de um
tanque de guerra, cavalos e caminhões deixados pelos soldados.
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Linguagem e Infância I
O professor Loris Malaguzzi, também jornalista na época, foi
checar a história, empolgou-se com a iniciativa e abandonou o
emprego para sistematizar o tipo de ensino que estava nascendo.
As escolas são gerenciadas pelos Comitês Escola-Cidade,
formados por membros de toda a sociedade. Eles se reúnem a
cada três meses para debater os projetos educativos. Hoje são
76 unidades, que recebem 16% do orçamento da cidade, cerca
de 19 milhões de dólares por ano, o que corresponde a 75% da
necessidade das escolas. O restante é coberto por mensalidades
proporcionais à renda da família.
Loris Malaguzzi , o idealizador da abordagem Reggio Emilia,
pensa a escola como uma construção em contínuo ajuste que
deve, de tempos em tempos, rever seu sistema sem interromper
seu curso natural. Considera fundamental que o sistema de
escolarização expanda-se para o mundo da família, integrandoa e respeitando seu direito de conhecer e participar do trabalho
desenvolvido pela escola.
Sobre este assunto,
pesquisar em: CURY,
Maria Cecília. A
abordagem inovadora
do Reggio Emilia http://
www.educacional.
com.br/entrevistas/
interativa_adultos/
entrevista002.asp
Pondera ser essencial que o foco de seu sistema seja a
criança, mas não só ela.
Em Reggio Emilia, o sentido de “escola” confunde-se com o
sentido de “comunidade” e essa confusão é proposital por parte
dos fundadores da escola. Não existe um espaço físico limitado ao qual chamamos de escola - e um outro espaço que atribuímos
o nome de “comunidade”.
Toda a comunidade educa e assim os limites da escola,
apenas fisicamente, são restritos aos muros da entidade,
uma vez que todos seus membros estão aptos para
desenvolverem uma ação educativa.
As escolas atuam como eixo centralizador de diferentes
processos educacionais que estão presentes nas ruas,
praças, nos lares e nos templos e, sobretudo, na consciência
de todos os moradores. Em Reggio Emília, existe uma
“comunidade de aprendizagem” e nada disso parece ser
semelhante ao conceito de escola que conhecemos.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
As escolas em Reggio Emilia surpreendem por sua beleza e
estética, isto é, em cada canto há um detalhe, existe uma ordem
estética no ambiente. Fica evidenciado, nestas escolas, que,
por meio da documentação e do trabalho em grupo, é possível
preparar ambientes estéticos e atividades que conduzem as
crianças a perceberem e a representarem o mundo natural e
cultural em que vivem. O trabalho com as crianças, apesar de se
nutrirem da arte e da estética, vai além.
A arte é uma ferramenta para o pensamento.
Nestas escolas, o currículo é aberto e trabalha-se
com projetos - chamados de projetos de estudos em
profundidade - que começam com base em uma idéia
e germinam por um longo período, envolvendo desde
a observação de idéias interessantes da criança até o
desenvolvimento dessas idéias em experiências vivenciadas.
As reflexões resultantes dessas experiências geram novas
aprendizagens que, por sua vez, vão constituir desafios para
outras atividades. Assim, um projeto pode durar meses. Um
bom projeto é aquele que permite a contribuição de cada
criança, de modo que ela possa interagir com os grupos,
resolvendo conflitos, estabelecendo metas, utilizando as
suas múltiplas linguagens.
Toda escola em Réggio Emilia tem um ateliê e um
atelierista, que é um profissional que entende de arte e
estética. Malaguzzi (apud Cury) fala que, se pudesse, teria
criado uma escola composta inteiramente por laboratórios
similares a ateliês. Uma escola feita de espaços, nos quais as mãos
das crianças pudessem sempre estar em processo de criação.
Nestas escolas, há um cuidado em registrar e documentar
todo o trabalho e eventos que acontecem por meio da
escrita, de fotos e de filmagens. Essa documentação é,
posteriormente, compartilhada com as crianças, com a
família, com os outros membros da escola, com o público.
Neste contexto, tanto os professores, como os alunos,
assumem a perspectiva de pesquisadores.
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Linguagem e Infância I
A alfabetização não é o foco em Reggio Emilia, já que a
compreensão dos professores é que a criança pode aprender a ler
ou a escrever como resultado dos desdobramentos dos projetos
desenvolvidos. Se isso não ocorrer, acontecerá depois no outro
nível de escolaridade, ou seja, não há pressa para alfabetizar.
O importante é que ela adquira as ferramentas
fundamentais para pensar, ficando aberta a qualquer
forma de aprendizagem.
A autora diz ainda que nos projetos utilizam-se estratégias que
facilitam o contato da criança com situações desafiadoras. Como
todo o percurso é registrado, documentado e exibido, a criança
tem permanente contato com a escrita. Cada grupo de, no
máximo cinco crianças, tem duas professoras, enquanto uma atua
diretamente, a outra registra tudo o que acontece nos encontros.
A literatura também é constante, o que facilita o gosto pela
aprendizagem da leitura.
A abordagem Reggio Emilia só trabalha com a Educação
Infantil. Nos projetos, não há limitação de tempo, observando o
seguinte caminho: organização, discussão e exploração do tema,
representação e experiência conclusiva. O projeto é introduzido
por meio da problematização e envolve experiências de exploração
e discussão em grupo, seguidas de representação e expressão,
através do uso de meios simbólicos, tais como o desenho, o
movimento, os jogos, a construção com blocos, os jogos.
Conforme esta autora, a criança inicia a aprendizagem pela
convivência. Na escola infantil, ela convive
com outras crianças, passando a ter um grupo
para brincar e viver experiências de trocas. No
grupo, ela aprende as regras da convivência,
isto é: dividir, partilhar, fazer valer seus
direitos, respeitar o espaço e o direito do outro.
Nestas escolas, cada um sabe seu papel
educativo. O currículo é feito para atender
os desafios que a vida comunitária propõe,
portanto, não existem programações rígidas, fi xas, que se repetem
de um ano para outro, mas sim o pulsar de uma vida que se
modela diante de cada desafio. Os pais quando matriculam seus
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Universidade do Sul de Santa Catarina
filhos nestas escolas, matriculam-se juntos e descobrem o papel
imprescindível que devem desempenhar, pois lhes são passadas
muitas funções, surgindo um forte envolvimento dos mesmos no
trabalho e desenvolvimento dos filhos.
Para saber mais sobre esses
aspectos, consulte: ANTUNES,
Celso. As lições de Reggio Emília
http://www.educacional.
com.br/articulistas/celso_
bd.asp?codtexto=171
Antunes (1998) procura mostrar quais “lições” podemos extrair
de um modelo de educação, adaptado a nossa realidade e às
circunstâncias das escolas de Educação Infantil que temos.
A primeira lição que o autor coloca, e talvez a mais significativa,
é aceitar que as crianças possuem saberes, sentimentos e
imaginação, trabalhando as múltiplas linguagens, e que, entre
elas, nenhuma deve destacar-se.
O autor esclarece que podemos aprender falando, interpretando,
desenhando, musicando, dançando, enfim, expressando-nos de
diferentes maneiras. Diz, ainda, que é essencial que as crianças
conheçam, experimentem e respeitem todas essas maneiras,
descobrindo-se em sua relação com o mundo. As representações
visuais são vistas como recursos para um aprofundamento sobre
os saberes que se constroem.
Outra lição importante deixada pelo autor, é que
precisamos substituir a visão de um mundo de
conhecimentos organizados em disciplinas por um
outro, em que os saberes de todas as áreas aconteçam
por meio de projetos nos quais um tema de interesse
dos alunos é colocado para estudo.
A terceira lição envolve a questão do relacionamento entre os
professores e crianças, onde não ocorre a hierarquia dos saberes.
Ela é substituída por um relacionamento centrado em torno
de um projeto visando à conquista de diversos tipos de saberes.
Não existem, portanto, lições preestabelecidas para todas as
crianças; professores e pais podem criar múltiplas atividades, que
contribuam para a compreensão do que está sendo estudado.
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3.3 - A Escola Livre Paideia
A escola livre Paideia funciona de forma autogestionária; quer
dizer, não segue as formas padronizadas de ensino oficial, seja
estatal ou privado, tanto individualmente como de forma coletiva.
Tem formada uma cooperativa e um coletivo.
Para você conhecer a
escola, acesse: http://
www.escolapaideia.
com.br
O coletivo compõe-se de pessoas que realizam seu trabalho na
escola, em tempo integral, com outras pessoas que têm outros
trabalhos fora da escola e que, quando os terminam, incorporamse à dinâmica da escola.
Quem convive com a experiência da escola libertária Paideia, em
Mérida, na Espanha, é privilegiado por ter tido a oportunidade
de ser contaminado pela paixão de conhecer os projetos da escola,
a organização do seu coletivo e a Pedagogia que experimentam.
Esta escola busca, por meio da ação das crianças que a
freqüentam, criar espaços de liberdade, transformando-os em
“espaços de convivência”, condição fundamental para a autogestão
educativa, na compreensão dos seus fundadores.
De acordo com Rebouças, a escola da Anarquia existe há 24
anos, lutando no dia-a-dia pela felicidade e liberdade das crianças
que a freqüentam. Uma escola onde trabalham pessoas que
estão convencidas de que a história pessoal tem início já na sua
infância e que, por isso mesmo, acreditam em uma utopia para
o futuro através de uma infância feliz, solidária, igualitária,
autogestionária e coletivamente livre.
Para ter mais informações
sobre esse assunto, acesse:
REBOUÇAS, Moésio.
Paideia, Escola Livre
http://www.ainfos.ca/02/
jun/ainfos00175.html
De acordo com Rebouças, o Centro Educativo
Paideia foi e continua sendo uma experiência
riquíssima. Para aqueles que se interessam
por uma prática pedagógica “desalinhada”
em relação às capitalísticas, para aqueles
que apostam que uma outra educação e uma
outra escola são possíveis, ela segue sendo
uma referência fundamental. A principal
característica desta escola é educar para a singularidade. Esta
é a principal lição da Paideia para os educadores socialmente
comprometidos com a liberdade e a transformação.
Na página: http://www.paideiaescuelalibre.org é possível
encontrar a origem da escola, seu funcionamento, suas idéias
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Universidade do Sul de Santa Catarina
sobre pedagogia libertária e uma extensa bibliografia sobre ela,
um álbum de fotos da escola e de algumas atividades que são
desenvolvidas, uma cyber-livraria para poder comprar livros
e vídeos, um boletim que os alunos e alunas da escola fazem,
informações do grupo de Mulheres pela Anarquia e muito mais.
Vale a pena conferir este site e conhecer uma das experiências
libertárias mais contagiantes da atualidade.
O ponto de partida da escola para o trabalho é a
formação dos educadores no sentido de que resgatem
as memórias de suas infâncias e de suas histórias
de vida, como as lembranças dos quintais mágicos
e das ruas onde brincavam, além de ampliar seus
repertórios nas trocas de práticas pedagógicas com os
demais educadores e a coordenação.
A Escola Paideia expressa sua didática em arte, cultura e lazer
com seus professores especializados em artes visuais, música,
teatro, acervo de brinquedos e fantasias.
A nutrição do olhar do educador e a recuperação de seu percurso
como aluno favorecem a crença dos mesmos no brincar, no
movimento, no trabalho corporal, além da percepção da
arte, literatura e música como caminhos de conexão com as
múltiplas linguagens, propiciando um verdadeiro pensar e,
conseqüentemente, uma melhor educação.
De acordo com o site http://www.escolapaideia.com.br/, os
princípios didáticos mais utilizados pela escola são:
„
Enfoque no desenvolvimento das múltiplas inteligências,
nas competências e habilidades e não no acúmulo de
conhecimentos e informações;
„
O aluno é considerado sujeito do processo de construção
do conhecimento;
„
O conhecimento é construído em interação com os pares;
„
Há integração dos tipos de conteúdos: conceituais (saber),
procedimentais (saber fazer) e atitudinais (saber ser);
„
Existe a preocupação em trabalhar de forma
interdisciplinar e transdisciplinar;
162
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18/1/2007 09:59:01
Linguagem e Infância I
„
Existe a construção coletiva dos valores morais e
éticos, com o conseqüente fortalecimento da vivência
democrática na instituição e fora dela (compromisso
com o entorno social, econômico, político e cultural da
comunidade onde estão inseridos);
„
Os educandos responsabilizam-se pelo cumprimento das
regras e princípios morais e éticos;
„
Comunicação constante entre família e escola através
de reuniões com pais, eventos culturais e entrevistas
individuais;
„
Garantia de que o Plano Curricular seja contínuo
e integrado, respeitando-se as especificidades das
etapas educacionais dos diferentes cursos: Educação
Infantil, Ensino Fundamental 1 (1ª a 4ª série) e Ensino
Fundamental 2 (5ª a 8ª série);
„
Avaliação contínua, com prevalência dos aspectos
qualitativos sobre os quantitativos, em relação a todos os
tipos de conteúdos.
A Proposta Pedagógica apresentada para Educação Infantil da
Escola Paideia é a seguinte:
Na primeira etapa da educação básica, a finalidade é o
desenvolvimento integral da criança até os 6 anos de
idade. Este desenvolvimento processa-se em diversos
âmbitos de experiência.
Formação pessoal e social
Refere-se às experiências que favorecem a construção do
indivíduo. São questões que envolvem o desenvolvimento de
capacidades de natureza global e afetiva da criança, em esquema
simbólico de interação com o outro, com o meio e consigo
mesma. Oferecem-se condições para que a criança aprenda a
conviver, a ser e a estar com o outro e consigo mesma, em atitude
de aceitação, respeito e confiança.
Unidade 6
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Conhecimento de mundo
Refere-se à construção das diferentes linguagens pela criança e
as relações das diferentes linguagens que ela estabelece com os
vários objetos de conhecimento: aspectos da cultura, linguagens
que favorecem a expressão e comunicação de sentimentos,
emoções e idéias.
Princípios Didáticos
„
Desenvolvimento de uma imagem positiva de si, atuando
de forma cada vez mais independente, com confiança em
suas capacidades, com percepção de suas limitações;
„
Desenvolvimento e conhecimento progressivo de
seu próprio corpo, suas potencialidades e limites,
desenvolvendo e valorizando hábitos de cuidado com a
própria saúde e bem-estar;
„
Estabelecimento de vínculos afetivos e de troca com
adultos e crianças, fortalecendo sua auto-estima e
ampliando gradativamente suas possibilidades de
comunicação e interação social;
„
Estabelecimento e ampliação das relações sociais,
aprendendo aos poucos a articular seus interesses e
pontos de vista com os demais, respeitando a diversidade
e desenvolvendo atitudes de ajuda e colaboração;
„
Observação e exploração do ambiente com atitudes de
curiosidade, percebendo-se como integrante e agente
transformador e preservador do meio ambiente.
Utilização da brincadeira como expressão de emoção,
sentimentos, pensamentos, desejos e necessidades;
„
Utilização de diferentes linguagens (corporal, musical,
plástica, oral e escrita) de forma a expressar-se, a
compreender e ser compreendido, avançando no seu
processo de construção de significados;
„
Conhecimento de algumas manifestações culturais com
o objetivo de interessá-la e levá-la a respeitar, participar e
valorizar a diversidade;
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Linguagem e Infância I
„
Aquisição progressiva de regras básicas de convivência
e princípios morais e éticos, aprendendo a distinguir
os comportamentos adequados e os não-adequados na
convivência em grupo;
„
Comunicação constante com a família, através de
reuniões de pais, eventos culturais e entrevistas
individuais;
„
Garantia de que o trabalho pedagógico da Educação
Infantil seja contínuo e integrando-se às próprias
especificidades e às do Ensino Fundamental;
„
Avaliação contínua do processo de desenvolvimento
integral da criança, com prevalência dos aspectos
qualitativos sobre os quantitativos.
Seção 4 - Projetos de oficinas como ferramenta
educativa
4.1 - A Estratégia de ação nos projetos com Oficinas
Utilizamos a palavra oficina para dar fundamento teórico às
práticas educativas, para designar um espaço físico/temporal
não disciplinar, onde e quando se podem construir movimentos,
relações, objetos, transformar materiais, recriando-os em novas
formas e significados, com o objetivo de fazer pensar, de propiciar
a aprendizagem de um determinado tema de interesse do grupo.
A natureza não disciplinar e, conseqüentemente, o pensamento
sobre educação que se propõem produzir com os projetos de
oficinas, normalmente, vão-nos “empurrando” para algumas
pessoas que compartilham conosco esse tipo de pensamento,
tornando-nos fundadores de um espaço educativo com “... amplas
possibilidades de vivermos a auto-organização e autoformação em
contato com grupos escolarizados ou não, mas interessados em
saber mais, em aprender”.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Além disso, os projetos que trabalham com oficinas são os
resultados do modo como os “oficineiros-pesquisadores” vêem-se
capazes de experimentar, decidir, propor em termos de linhas de
ação, de crítica e de teorização. (PEY, 1995, p.101).
Por que a proposta de projetos que trabalham com
oficinas?
Porque a prática da oficina, desenvolvida ao longo do tempo,
foi-nos demonstrando cada vez mais que nela não se pode ficar
restrito às informações racionais, que é preciso ir além, criar
características próprias, diferenciadas daquelas que ocorrem
nas atividades formais de ensino, quebrando as amarras e a
rigidez dos conteúdos escolares, determinados como sendo
propriedade das disciplinas.
A história dos projetos de oficinas, como modalidade educativa
no desdobramento do nosso trabalho, surgiu a partir
de uma vontade de desenvolver uma perspectiva não
burocrática na educação; é fruto do “metabolismo”
entre um trabalho de pesquisa, uma prática sendo
desenvolvida e um referencial com o qual se possa
estabelecer um diálogo.
O próprio ato de construir algo criativo faz com
que as pessoas lidem com vários tipos de saberes,
técnicas e percepções, possibilitando a interação entre discurso
e ação. Na oficina, as pessoas reúnem-se voluntariamente em
torno de um tema-ação de interesse comum. Com isto, procurase assegurar três eixos de pesquisa: a não-hierarquização de
saberes, a não-hierarquia de funções e a manutenção de relações
interpessoais horizontais.
Conforme Pey (1995), esses eixos têm, em comum, a negação do
autoritarismo centrado em quaisquer tipos de hierarquia, ou seja,
a não disciplinaridade, que se constitui na produção de saberes de
resistência, carregados de potência, de força; a auto-organização
constitui-se na destruição das estruturas organizacionais
heterônomas que mantêm as relações de subordinação e
infantilização no espaço coletivo; e a dialogicidade constitui-se
na “quebra” das relações hierárquicas ao nível das interações
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Linguagem e Infância I
interpessoais. Resumindo, quanto ao conteúdo, ela sai do âmbito
disciplinar para o não disciplinar; no âmbito da organização, ela
sai da heterogestão hierárquica para a autogestão e, no âmbito das
relações, ela procura trabalhar relações dialógicas e convivenciais.
O projeto de desenvolvimento de oficinas aborda vários
temas e deve partir do desejo do educador-oficineiro, que
vem com a oficina de certa forma “pensada” e, quando as
crianças começam a desenvolver as atividades, acontecem os
“desdobramentos”. Ou seja, a oficina parte do oficineiro e se
“desdobra” para os desejos das crianças. Sendo assim, é preciso
encontrar a melhor maneira de fazer isto, não existe um
método correto, mas sim uma longa preparação.
O que faz o projeto com oficinas ser diferente é a sua
modalidade, a maneira como o educador-oficineiro
a faz funcionar em termos de postura, de um jeito
diferente de trabalhar. É este jeito diferente, é a
atitude, é a ética do educador-oficineiro perante o que
faz, que o torna diferente.
O projeto de investigação que acontece por meio
desta modalidade educativa é, portanto, um trabalho
possível como atitude que procura permitir aos
indivíduos compreender como foram constituídos,
libertando-se das cadeias das disciplinas e do
disciplinamento.
Uma atitude, que não se caracteriza por enfrentar frontalmente
os poderes, mas por usar todas as formas que, de uma maneira
ou de outra, contrapõem-se à normalização e à domesticação que
resultam das ordens impostas.
Ela não tem a pretensão de investigar os saberes das crianças para
sistematizá-las, mas, ao contrário, pretende trabalhar com um
tema de interesse e, a partir daí, ir se “desdobrando”, tomando
um rumo não definido, não esperado. Sendo assim, a oficina,
como modalidade educativa, possui apenas um objetivo inicial, o
seu final é quase sempre totalmente imprevisível.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Sendo assim, os projetos que trabalham com oficinas
procuram rejeitar o esquadrinhamento do tempo,
do espaço, dos corpos e dos saberes, partindo de
curiosidades, indagações, explorações, vivências
daqueles que participam. Convida as crianças a se
afastarem do modelo de organização hierárquica, da
classificação, dos discursos hegemônicos.
Encarada desse modo, o fazer da oficina vai tornando as
pessoas mais sensíveis para uma série de expressões que estão
normalmente guardadas dentro de si. Expressões tais como:
criatividade, autogestão, liberdade, autonomia, apoio mútuo,
estão sempre ligadas à ética e à estética.
A partir destes princípios, o projeto desenvolvido com
oficinas preocupa-se em trabalhar com a experiência
pessoal, abrindo para possibilidades de não generalização,
valorizando a história e a memória, que exigem trocas de
experiências com grupos de reciprocidade, de interesses e
respeito ao mundo cultural do outro.
Dirigir o olhar para projetos de prática de oficinas, tendo
como prisma os aspectos éticos e estéticos, faz-nos vêlos como um campo aberto de oportunidades para ações
educativas distintas e mais amplas do que aquelas que
normalmente encontramos na escola regular.
O que se pode perceber é que estes projetos podem produzir
um novo tipo de subjetividade porque, ao invés de trabalhar de
forma repetitiva, vazia, disciplinada, as crianças se esforçam
em reorientar sua finalidade, sua organização no sentido
da diferença, da potência, da re-criação interna
permanente.
As crianças vão criando laços, o que também
significa que a capacidade de afetar e ser afetadas uns
pelos outros aumenta, aumentando também a confiança
no grupo. Como afirma Rolnik (1989), o que importa
nas relações é “... fazer passar os afetos: é isso que parece
gerar brilho”. Esta autora diz ainda que é preciso ter o
desejo de se deixar afetar pelo outro, pelo devir e pela
incerteza criadora. O desejo, portanto, é fundamental
nessa produção.
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Linguagem e Infância I
Os projetos de oficinas sempre procuraram trabalhar com
relações não-hierárquicas, nas quais é possível viver “atospoderes”, ou seja, revestir de poder o ato de quem age, resgatando
o sentido da poesia, procurando alargar os estreitos caminhos
por onde a educação tem-se movido, oportunizando a capacidade
de errar, de arriscar, de ensaiar, de experimentar, de produzir,
de lançar conhecimentos não “acabados”, de avançar por meio
de saberes não “estabelecidos”; de produzir algo que não existe,
produzir uma singularidade na própria existência das coisas, dos
pensamentos e das sensibilidades.
Os projetos vivenciais com oficinas devem priorizar,
portanto, a dialogicidade como tema essencial na
relação entre as pessoas. É desse tipo de relação
dialógica, dessa prática convivencial que se obtém
uma força coletiva de produção de saber superior à
soma das forças individuais; que se produz saberes em
autorias e obras.
De acordo com Illich (1973), a prática convivencial refere-se a “...
uma ferramenta moderna que está a serviço da pessoa integrada
na coletividade e não a serviço de um corpo de especialistas”.
Neste ponto, é importante ver a crítica à escolarização e ao
especialista, empreendida por este autor em várias de suas obras.
Compreender os diversos tipos de saberes sob o prisma das
relações convivenciais na infância é permitir-se a produção e a
invenção de existências, de possibilidades e limites, de energia,
onde cada criança é modelo de si mesma; é passar da troca
de produtos para a “troca de energia”, que acontece através da
potência, da força, do afetar e ser afetado, e que caracterizam a
prática da convivencialidade.
Conviver é exercitar a capacidade de cada um de constituir-se
como pessoa livre, solidária e autônoma; uma capacidade de
instituir os desejos, rompendo com a institucionalização das
necessidades, produto de uma sociedade consumista, que utiliza o
corpo como dispositivo de consumo, levando-o a perder seu valor
como prática corporal, que faz parte de um modo singular de
expressão e, portanto, da própria cultura.
Unidade 6
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Por que pensamos os projetos de oficina como uma
ferramenta de convivencialidade?
Porque na definição de Illich (1973), ferramenta convivencial
é aquela que está disponível para o usuário em função
dos seus interesses. Quando uma coisa é uma ferramenta
convivencial? Quando a pessoa utiliza esta ferramenta
quando quiser, à medida que desejar sem que jamais ela seja
compulsória. Então, pensamos que o projeto de oficinas
funcione como ferramenta de convivencialidade, tem de ser
buscada pelas pessoas, desejada pelas pessoas e não colocada
compulsoriamente para as pessoas viverem.
O educador-oficineiro deve oferecer um leque de oportunidades
para que as pessoas que ele trabalha possam escolher o que mais
lhes interessa e, assim, torne-se minimamente uma ferramenta
convivencial.
A oficina, neste contexto, é um jeito de caracterizar
uma prática social na qual as pessoas, juntas,
independentemente de qualquer rótulo que as
associe a uma função ou a uma qualificação, possam
pensar, desenvolver e produzir saberes, ao mesmo
tempo em que são produzidas pelos saberes que
produzem.
4.2 - O educador-oficineiro: seus princípios e suas
preocupações
Descobrimos em Rolnik (1989) e na sua cartografia
sentimental, uma “aliada” da melhor qualidade para que
pudéssemos dar fundamentação aos projetos com oficinas em
forma de cartografia, fortalecendo nossa vontade de afirmar a
singularidade de nossa experiência nesta área. Chamamos de
“educadores-oficineiros” as pessoas que organizam as oficinas,
com o mesmo sentido que a autora utiliza para referir-se ao
“cartógrafo”, baseando-se na antropofagia.
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Linguagem e Infância I
É preciso que fique claro que o termo Antropofagia foi inspirado
no Manifesto Antropofágico do Movimento Modernista
Brasileiro. Este grupo de modernistas radicais propunha
devorar a cultura e as técnicas importadas e suas reelaborações,
com o intuito de transformar o produto importado em
exportável. Altamente xenófobo, esse movimento propunha
o desenvolvimento de uma cultura brasileira, o retorno ao
primitivismo em estado puro, sem compromissos sociais,
políticos, econômicos ou religiosos.
Quando se propõe inicialmente projetos com oficinas, as
estratégias são mais concentradas na ação do educador-oficineiro,
ou seja, no que ele propõe. No entanto, à medida que a oficina vai
acontecendo com grupos diferenciados, ela vai se modificando,
abrindo-se cada vez mais à intervenção dos outros, como salienta
Corrêa (2000, p.51):
Deixa de ser um programa, uma seqüência de atividades
que tão bem funcionam com grupos escolarizados, e
passa a ser um campo aberto, uma terra de quem dela
queira servir-se, cultivá-la e fazê-la avançar até uma
espécie de ‘ecossistema’ de saberes. A oficina passa a
constituir-se numa busca de modos de conhecer que
não provoquem a negação total do que um indivíduo
sabe, daquilo que vive, daquilo que os que amam sabem,
do saber que o rodeia, constituindo-se em práticas que
tenham a ver com alegria de viver, e não com a sujeição
a tecnologias pedagógicas que o querem outro, um outro
que ele não quer ser. Não importa o quanto este outro
possa vir a ser útil e bom, é um outro, não ele mesmo.
Este outro é o resultado da sua submissão.
O educador-oficineiro organiza possibilidades de
convivência com grupos que desejam explicitar o que sabem
sobre temas de interesse existencial coletivo, procurando
saber sempre mais a partir da relação educativa que
se estabelece com os outros. Ele organiza, portanto, a
interlocução entre os conhecimentos diferenciados, sobre os
temas em estudo, visando obter e compartilhar os diversos
tipos de saberes, produzindo obras e autorias.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
As oficinas são, portanto, expressões que se
constroem coletivamente, através de fluxos de
saberes dos modos de ser, sentir, saber, fazer e pensar.
Ela pode ser caracterizada como algo que coloca o
construtor em construção. Não há roteiro definido,
nem conclusões prontas, mas um espaço onde a
contribuição de cada um abre trilhas para múltiplas
realizações possíveis, nas quais podem se reconhecer
como autores naquilo que fazem. Sendo assim, nas
oficinas as trocas são mais importantes que sua
origem.
Nesta modalidade educativa, o “educador-oficineiro” procurará
oportunizar mais e mais a coragem das pessoas de exteriorizarem
as suas falas, as suas expressões, os seus afetos, a experimentação,
fazendo com que elas passem a agir e a falar em nome próprio,
ou seja, no singular. Conforme Corrêa (2000), estas falas que se
estabelecem em torno do tema-eixo de cada oficina são suscitadas
à medida que se propicia ativação da expressão dos participantes,
que é resultado da quebra de hierarquia.
De acordo com este autor, a possibilidade que o educadoroficineiro tem de eleger livremente seus temas de estudo, suas
fontes de pesquisa, de poder reunir à sua volta pessoas que se
interessem pelo tema que propõe, de reunir-se num local que
julgue ser mais adequado para o que quer realizar e, finalmente,
de pôr-se à disposição para ensinar o que sabe e, também,
aprender o que os outros sabem, vai ao encontro do exercício da
autonomia e da auto-educação, valores importantes para uma
educação mais livre.
Para um trabalho de oficina é essencial, portanto,
que o educador-oficineiro tenha claro que
perspectiva vai nortear o seu trabalho, por conhecêla profundamente e/ou nela acreditar, para que,
em conseqüência disso, possa utilizá-la. Se isto não
ocorrer, haverá falta de sentido, impossibilitando que
aponte para uma direção.
É importante também salientar que, à medida que ele acredita
nesta perspectiva, provoca um maior envolvimento dos
participantes, não com a preocupação de que as pessoas acreditem
no que ele crê e façam o que ele quer, mas para que criem outras
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Linguagem e Infância I
formas de participação. Se o educador-oficineiro não parte de
algum lugar, deixando tudo solto, o desafio deixa de existir; o
“convite” perde o realce da necessidade de atendê-lo.
Tanto para os educadores-oficineiros quanto para as
crianças participantes da oficina, a necessidade para
criar é essencial, pois isto propicia o transitar pelos
saberes (autorizados ou não) sem que haja os limites
impostos pelas disciplinas, refletindo, pensando e
sentindo as harmonias possíveis.
Para Rolnik (1989), o importante é que a teoria se faça
juntamente com os participantes, absorvendo matérias de
qualquer procedência. Tudo o que servir para cunhar matéria de
expressão e criar sentido para o oficineiro é bem-vindo. Todas as
entradas são boas, desde que as saídas sejam através de múltiplas
linguagens. Neste sentido, ele deve servir-se de fontes as mais
variadas, tanto em termos de ação, como de discursos de verdade.
Este deve ser o critério de sua escolha: descobrir que matérias de
expressão, que composições de linguagem favorecem a passagem
das intensidades que percorrem seu corpo no encontro com os
corpos que pretende entender.
Entender, para o oficineiro, não tem nada a ver com
explicar e muito menos com interpretar, revelar. Para
ele, não há nada que esteja nas entrelinhas, o que há
são intensidades buscando expressão. Sendo assim, é
quase que impossível seguir uma espécie de protocolo
normalizado nos projetos que trabalham com oficinas. Os
procedimentos a serem utilizados não são tão importantes,
porque o educador sabe que deve inventá-los em função daquilo
que pede o contexto em que se encontra.
O seu critério de avaliação é o do grau de intimidade que cada
um se permite, a cada momento, com o caráter que o desejo
imprime na condição humana. É claro que esse tipo de avaliação
nada tem a ver com padrões ou medidas, mas com aquilo que o
“corpo vibrátil ” - termo utilizado por Rolnick (1989) para definir
o corpo como potência de criação - capta no ar, uma espécie de
“ feeling” que varia inteiramente em função da singularidade de
cada situação, inclusive do limite de tolerância do próprio corpo
que está avaliando, em relação à situação que está sendo avaliada.
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
É o valor que se dá a cada um dos movimentos do desejo, ou seja,
o grau de abertura para a vida que cada um se permite a cada
momento. Como afirma Rolnik (1989), o que lhe interessa é a
expansão da vida, é o quanto esta encontra canais de efetuação.
O que define o perfil do educador-oficineiro, portanto,
é a sensibilidade que prevalece, à medida do possível
nas suas oficinas.
Já que não é possível definir seu método, mas apenas sua
sensibilidade, ele leva consigo princípios e um breve roteiro de
preocupações, que necessitam ser definidos e redefinidos para
si constantemente. Com efeito, o que ele precisa trabalhar é a
potência de criação permanente do sentido e das pessoas que
participam das oficinas: é essa potência que precisa ser reativada,
tratando o pensamento como criação.
Para Foucault (1984), isto significa pensar numa forma de
conceber a vida como uma “obra de arte”, vinculada à produção
de singularidades e diferenças, bem como liberar acontecimentos
criativos, com o objetivo de dissolver o pensamento reduzido às
convenções autoritárias para a busca do conhecimento.
O trabalho do educador-oficineiro consiste, então,
em reorientar as novas produções do desejo das
criancas no sentido da “expansão da vida” - critério
do cartógrafo, como se refere Rolnik -, ou, ainda,
como propõe Guattari (1992, p.33) : “A única finalidade
aceitável das atividades humanas é a produção de uma
subjetividade que enriqueça de modo contínuo sua
relação com o mundo.”
Embora se tenha um eixo temático explicitado pelo próprio
título, cada oficina é suporte para um sem-número de
possibilidades e de resultados. Isto se deve ao entrelaçamento
entre o que se propõe, que diz respeito a uma escolha do
educador-oficineiro, e as experiências de cada criança.
É importante, portanto, que o educador-oficineiro decida sobre
um tema de interesse que virará um tema de estudo, procurando
reunir o máximo possível de material nas bibliotecas, nas redes
de computadores, em outras pesquisas que tratam do tema,
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Linguagem e Infância I
pesquisas de campo, para que, juntamente com isto, possa
desenvolver uma experiência de oficina, procurando levar o
material que dispõe às pessoas interessadas. É quando começa
a buscar os meios para falar sobre o seu tema, que a ação do
oficineiro tem a ver com a atitude de um verdadeiro educador.
Atividades de auto-avaliação
Após a leitura criteriosa da Unidade VI, efetue as atividades de autoavaliação e, a seguir, acompanhe as respostas e comentários a respeito.
Para melhor aproveitamento do seu estudo, realize a conferência de
suas respostas somente depois de fazer as atividades propostas.
1) Hoje existem muitas discussões acerca da superação da fragmentação
dos saberes apontando para a interdisciplinaridade como uma forma
de integração das disciplinas. No entanto, Gallo propõe um outro
modelo diferenciado que chama de transversal. Qual a diferença entre
estes dois modelos para a educação?
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Universidade do Sul de Santa Catarina
2) De acordo com Silva o educador, para exercer um trabalho com a
Educação Infantil, precisa ter um olhar transversal que respeite o
direito da criança. Que tipo de olhar é esse, que ele estabelece como
importante para o sucesso da prática pedagógica do educador?
3) Os projetos com oficinas procuram assegurar-se em três eixos de
pesquisa. Explique quais são eles e o que significa cada um.
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Linguagem e Infância I
Síntese
Você viu, nesta Unidade, aspectos relevantes à Pedagogia
e Prática de Ensino na Educação Infantil, com o objetivo
de melhor compreensão da infância, algumas experiências
pedagógicas diferenciadas na Educação Infantil, além da
apresentação de projetos de oficinas como ferramenta educativa.
Em especial, que a organização curricular do ensino formal segue
o padrão de currículo, que coloca as disciplinas como realidades
estanques. Este é o modelo curricular utilizado pelas políticas
públicas e funciona por meio do modelo oficial que corresponde a
uma educação instituída produzida nos gabinetes.
Para contrapor-se a esse modelo oficial, vamos remeter
para o conceito de educação como resistência, ou seja,
uma educação que não se presta à hierarquização, mas à
proliferação de pensamentos. O primeiro passo para chegarse a essa educação é aprender a pensar, a observar. Ensinar
a pensar e observar deveria ser a primeira preocupação
da educação escolarizada. Uma educação que possibilite
refletir sobre a dimensão que os conhecimentos assumem na
educação das crianças da Educação Infantil.
Viu também que para uma educação funcionar desta maneira,
nós podemos propor, como uma das estratégias possíveis para
a Educação Infantil, projetos de oficinas tomadas como ação
educativa em si, abrindo-se como campo de pesquisa em
educação autônoma; projetos que são o resultado do modo como
os educadores-pesquisadores vêem-se capazes de experimentar,
decidir, propor linhas de ação, de crítica e de teorização; projetos
que trabalham com oficinas que se preocupam em trabalhar com
a experiência das crianças, abrindo-se para possibilidades de
desenvolvimento das múltiplas linguagens, o que exige trocas de
experiências com grupos de reciprocidade, de interesses e respeito
ao mundo cultural do outro.
Apresentamos também algumas experiências diferenciadas na
Educação Infantil, entre elas, a da Escola da Ponte, em Portugal,
que não segue um sistema baseado em disciplina e nem em
seriação ou ciclos. As crianças definem quais são suas áreas de
Unidade 6
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Universidade do Sul de Santa Catarina
interesse e desenvolvem projetos de pesquisa, tanto em grupo
como individuais.
Referimo-nos a outros tipos de escolas de Educação Infantil, que
se localizam em Reggio Emilia, na Itália, e que surpreendem
pela beleza, ambientes estéticos e atividades que conduzem a
criança a perceber e a representar o mundo cultural em que vive.
Nestas escolas, o currículo é aberto e trabalha-se com projetos,
que começam com base em uma idéia e germinam por longo
período, envolvendo a observação de idéias.
Outra escola referida é a escola libertária Paideia, em Mérida,
na Espanha. O desafio que se coloca então, nesta escola, é
buscar, por intermédio da ação das crianças que a freqüentam,
criar espaços de liberdade, transformando-os em espaços de
convivência, condição fundamental para a autogestão educativa.
Saiba mais
Para obter mais detalhes sobre a prática pedagógica na Educação
Infantil e projetos de oficinas, recomendamos que pesquise em:
EDWARDS, C.; GANDINI, L.; FORMAN, G. As Cem
linguagens da criança. Porto Alegre: ArtMed, 1999.
D`AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática. [on-line] http://
sites.uol.com.br/vello/ubi.htm
QUINN, Daniel. Meu Ismael: o fenômeno continua. São Paulo:
Petrópolis, 1999.
COLECTIVO PAIDEIA. Intento de educación
antiautoritária y psicomotriz en preescolar. Mérida: Editorial
Josefa Martin Luengo, 1978-79.
___________ PAIDEIA: una escuela libre. Madrid: Ziggurat,
1985.
178
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18/1/2007 09:59:04
Linguagem e Infância I
GALLO, Sílvio. Pedagogia do risco: experiências anarquistas
em educação. Campinas: Papirus, 1995.
ILLICH, Ivan. Educação e desenvolvimento. in: A IDÉIA,
Lisboa, verão/outono de 1985, nº 38-39.
____________ Uma Sociedade sem escolas. Petrópolis:
Vozes, 1988, 8ª ed.
________ et alii. Educação e liberdade. SP: Imaginário, 1990.
LUENGO, Josefa Martín. Desde nuestra Escuela Paideia.
Móstoles: Ediciones Madre Tierra, 1990.
Unidade 6
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18/1/2007 09:59:04
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Para concluir o estudo
De que valeria a obstinação do saber se
ele assegurasse apenas a aquisição dos
conhecimentos e não, de certa maneira,
e tanto quanto possível, o descaminho
daquele que conhece? Existem momentos
na vida onde a questão de saber se se pode
pensar diferentemente do que se pensa, e
perceber diferentemente do que se vê, é
indispensável para continuar a olhar e a
refletir (FOUCAULT, Michel. História da
Sexualidade 2: o uso dos prazeres. Rio de
Janeiro: Graal, 1994., p. 13).
Nosso intuito com estas palavras finais, não é de que você
possa responder completamente aos questionamentos
aqui colocados, mas de que eles possam multiplicar suas
incertezas e “estranhamentos”, fazendo com que pense
diferentemente de como pensava no início da disciplina.
Agora, acreditamos que você já tenha claro, que a
educação é um campo de produção de subjetividades e de
exercício de relações de saber-poder, onde é fundamental
o ato de questionar para a formação de alunos e
professores. No entanto, para que este questionamento
aconteça é preciso que haja, por parte dos alunos, uma
radicalidade do ato de perguntar.
Ao final do estudo, portanto, espero que você tenha
tido a oportunidade de entender a complexidade das
questões relativas às múltiplas linguagens da criança e
da importância de uma formação ética do educador da
Educação Infantil.
Ao adentrar no campo de estudos das múltiplas
linguagens da criança, espero ter possibilitado
a você a compreensão sobre a complexidade e
dinamicidade deste campo de estudo, tomando
como ponto de partida as vozes das crianças, suas
linguagem_e_infancia_I.indb 181
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linguagens e manifestações, considerando, sobretudo,
as transgressões e os gestos de resistência dos pequenos.
Essas múltiplas linguagens das crianças necessitam ser
permanentemente colocadas como objeto de reflexão.
Espero que você tenha aproveitado bem todas as alternativas
apresentadas pela disciplina, proporcionando-lhe um olhar
diferenciado sobre a infância.
Ser um educador-pesquisador é buscar sempre fazer e pensar
diferentemente do que se faz e do que se pensa por meio de
atitudes éticas e estéticas, como você viu na disciplina. Atitudes
que proporcionam o novo, o criativo, o repensar constante da
prática pedagógica e da própria vida.
É preciso que você encontre paisagens específicas no ensino e na
aprendizagem, que lhe encaminhem para o encontro de portas
entreabertas, que vão lhe proporcionar espaço para movimentos
que se colocam na contramão de uma prática pedagógica
tradicional. Trata-se, portanto, da procura por espaços possíveis
de mudança, onde seja possível transitar pelo intransitável,
quebrando a solidez dos discursos de verdade e contestando o
imperativo do curso da rotina institucional padronizada.
Espero que você possa ter, a partir desta obra, uma experiência
tão intensa quanto a nossa ao escrevê-la.
Um grande abraço!
Raquel
linguagem_e_infancia_I.indb 182
18/1/2007 09:59:05
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18/1/2007 09:59:06
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Sobre a professora conteudista
Raquel Stela de Sá graduou-se em Educação Física
pelo CEFID/UDESC em 1975. Completou o curso
de Especialização em Educação Física na UFSC em
1978. Fez Mestrado em Educação no CED/UFSC em
1992. Encerrou o curso de doutorado em Engenharia de
Produção pela UFSC 2002.
É professora aposentada pela UFSC, onde
trabalhou no Curso de Graduação em Educação
Física durante 25 anos com várias a disciplinas,
entre elas recreação infantil.
Atua recentemente no Mestrado em
Psicopedagogia da UNISUL, como professora
contratada, onde já ministrou disciplinas tais como:
Psicopedagogia, Transdisciplinaridade e Novas
Tecnologia, Educação, Sociedade e Gestão Escolar
e Educação e Linguagens Múltiplas.
Tem como linha de pesquisa os seguintes temas:
Educação Infantil, Linguagem e Múltiplas
Inteligências, Ludicidade e Corporeidade,
Formação do Educador, Prática Pedagógica e
Oficinas como Modalidade Educativa.
Possui doze artigos completos publicados em periódicos,
quatro capítulos de livros publicados, dois livros escritos
com outros autores e um escrito individualmente.
Orientou treze trabalhos de Mestrado, trinta e oito de
Especialização e vinte e quatro de Graduação.
Participou de quinze bancas examinadoras de
dissertação de Mestrado, treze de Especialização e
dez de Graduação.
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Respostas e comentários das
atividades de auto-avaliação
A seguir acompanhe as respostas e comentários sobre
as atividades de auto-avaliação apresentadas durante as
unidades da disciplina Linguagem e Infância I.
Para um melhor aproveitamento do seu estudo, realize a
conferência de suas respostas somente depois de realizar as
atividades propostas.
Unidade 1
1) Estas respostas só visam garantir e facilitar a compreensão do
conteúdo estudado. Portanto, apenas diga qual a seção lhe
chamou mais atenção e justifique-a.
2) Quando nos referimos à tarefa que a Filosofia e as Ciências
Humanas modernas empreenderam na constituição
dos sujeitos infantis, estamos nos preocupando com a
compreensão de como esta área de conhecimento ao longo
do tempo foi constituindo a mentalidade dos seres humanos.
Analise esta questão a luz dos autores estudados. A idéia é ir
conhecendo a complexidade e aprofundando estes conceitos.
3) Aqui você deve abordar segundo Ariès a idéia de inocência
e cognição e no que estas idéias podem levar a utilização de
certas atitudes e comportamentos na educação da infância.
Na perspectiva apresentada por este autor você deve dizer
como estas duas condições estão imbricadas.
4) A idéia, nesta atividade, é que você aprofunde as questões
apontadas por Larrosa no que se refere a seguinte citação:
“receber é criar um lugar: abrir um espaço em que aquele que
vem possa habitar; pôr-se à disposição daquele que vem...”
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18/1/2007 09:59:06
Universidade do Sul de Santa Catarina
Unidade 2
1) Solicitamos que você faça a análise do item 1 da unidade 2, referindo-se
a como a criança pode tornar-se não só aquela que copia e imita, mas
também como criadora de história e cultura.
2) A idéia desta atividade é fazer com que você analise a multiplicidade de
questões levantadas por Elzirik quando ele faz as seguintes perguntas:
quantas oportunidades se perdem de ampliar o conhecimento pelo
apego ao já sabido? Quantas possibilidades de imaginação são
desvalorizadas por conta da censura prévia do que é proibido? Quantos
mecanismos disciplinares são utilizados na Educação Infantil que
interferem naquilo que é esperado, nos limites inscritos nas regras que
tiveram origem em outros tempos?
3) Espero que, com base nos estudos realizados, seus conceitos tenham
se aprofundado. É importante identificar o caráter relacional e a
dinamicidade deles no que se refere à identificação de como se dá a
convivência grupal e a liberdade de expressão na Infância abordada
pelos autores selecionados.
4) Nesta questão espero que você organize uma relação de argumentos
favoráveis para reavivar a dimensão ética na relação com o Outro – a
criança, agrupando-os em ordem de prioridade, o que confirmará a sua
compreensão deste aspecto essencial aos seus estudos.
Unidade 3
1) A partir dos estudos realizados por Gardner, gostaria que você dissesse
quais os tipos de inteligência definidas por ele em suas obras. Ou
seja, que explicite a classificação organizada por este autor nas suas
pesquisas sobre inteligências múltiplas.
2) Explique de forma resumida o que você entendeu por cada uma
delas. Espero que, com base nos estudos realizados nesta unidade,
seus conceitos tenham se aprofundado proporcionando uma maior
amplitude de conhecimentos.
3) Aqui você deve abordar que nova visão da educação você acha que a
teoria das Inteligências Múltiplas pode lhe proporcionar nos estudos
da Educação Infantil. Você deve ter identificado que o conceito de
194
linguagem_e_infancia_I.indb 194
18/1/2007 09:59:07
Linguagem e infância I
inteligência abordada por este autor não é relacionado apenas a um
tipo de inteligência, mas estamos diante do estudo de várias áreas que
envolvem reflexão e saberes teórico-práticos.
4) Muito bem. Você que estuda linguagem e infância e considerando o
estudo que realizou sobre a teoria das Inteligências Múltiplas, diga qual
seria o maior desafio para a educação e o papel do professor neste
processo.
5) Não abordamos aqui a proposta a avaliação pedagógica apresentada
Gardner. Gostaríamos que você refletisse e pesquisasse na internet este
assunto.
Unidade 4
1) Bujes explica que as linguagens estão profundamente implicadas
na instituição de práticas e na constituição de subjetividades sociais.
Gostaríamos que você explicasse o que a autora quer dizer com isto.
A sua análise constitui um exercício em que não há resposta certa ou
errada, mas o produto da interação entre sua percepção de atitudes e
valores ali propostos e os que norteiam o seu cotidiano.
2) Procure refletir a partir do que você estudou neste item sobre o
educador, sobre a preparação do professor nos cursos de formação
em termos de desempenhos comunicativos e expressivos ao
nível do desafio do ensino na Educação Infantil, relacionando este
conhecimento a sua vivência cotidiana.
3) Espero que a leitura desta unidade tenha possibilitado a você um
aprofundamento das discussões presentes na área específica da
Educação Infantil, dando-lhe subsídios para refletir sobre como
valorizar os diversos tipos de linguagens da criança, quando hoje há
uma forte tendência à homogeneização das subjetividades e uma
grande tentativa de abolir as diferenças nas instituições educacionais.
4) A partir dos estudos realizados por Kishimoto, procure refletir sobre
como integrar as várias áreas curriculares, abordando o brincar na
infância e que exemplos a autora sugere para o desenvolvimento deste
trabalho.
195
linguagem_e_infancia_I.indb 195
18/1/2007 09:59:07
Universidade do Sul de Santa Catarina
Unidade 5
1) A formação docente se caracteriza pelo pensar como forma de fazer
diferentemente do que e faz, enfrentando o novo, o diferente. Traga
outras características e aprofunde as relações apresentadas por Kastrup
sobre educação e viagem, vista na seção 1 desta unidade, que podem
nos servir de guia para pensar o que é o processo de formação do
educador da Educação Infantil.
2) Um dos aspectos mais importantes para o processo de formação
docente é o fato dos cursos priorizarem o estudo e a pesquisa. Analise
tais pontos levantados por Larrosa nesta unidade, fazendo relação com
a Educação Infantil.
3) Corazza propõe que se trabalhe na Educação Infantil com uma
Pedagogia Cultural. Gostaríamos que aqui você explicasse como a
autora entende essa proposta de Pedagogia e no que ela se difere de
uma Pedagogia tradicional.
4) Educar é uma coisa, escolarizar é outra. Solicitamos aqui que você
reflita sobre essa questão e identifique qual a diferença entre educação
e escolarização?
Unidade 6
1) Atualmente existem muitas discussões acerca da superação da
fragmentação dos saberes apontando para a interdisciplinaridade
como uma forma de integração das disciplinas. Faça uma distinção
entre interdisciplinaridade e transversalidade apresentada pelo autor
Gallo para a melhoria do processo educativo.
2) A idéia desta atividade é fazer com que você reflita sobre como Silva
entende o trabalho do educador na Educação Infantil através de um
olhar transversal que respeite o direito da criança. Analise que olhar
é esse que ele estabelece como importante para o sucesso da pratica
pedagógica do educador e a melhoria do ensino e aprendizagem nesta
etapa.
3) Ao final da disciplina, você deve ter identificado que os projetos com
oficinas que propomos se asseguram em três eixos de pesquisa.
Procure explicar quais são eles e o que significa cada um para o
processo educativo.
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Linguagem e Infância I